Por Jorge Mattoso e Pedro Rossi, no site Brasil Debate:
O crédito é como um elástico, você estica e ele volta, mas se esticar demais ele pode arrebentar. No atual estágio da economia brasileira o crédito poderia ajudar na retomada ou há sinais de que essa ferramenta chegou ao seu limite? Para responder é preciso considerar a natureza do crédito na economia e seu papel no crescimento econômico. Também é preciso pensar na triste realidade que se coloca frente ao crédito e ao crescimento econômico na atualidade.
Até o início dos anos 2000, o acesso aos bancos e ao crédito esteve restrito a parcelas muito limitadas da população, sobretudo aquelas empregadas formalmente e de maiores rendas. A ampliação do acesso bancário às camadas menos favorecidas da população foi iniciado no primeiro governo Lula graças a uma política de “bancarização”, que, por um lado, visava a favorecer o acesso a contas bancárias e, para isso, a Caixa econômica Federal criou contas correntes limitadas, mas sem custo, chamadas inicialmente de Conta Caixa Aqui, depois de Caixa Fácil.
Dado seu sucesso, foi seguida pelo BB e pelos bancos privados, embora os bancos tenham passado – após algum tempo – a cobrar taxas pelos serviços. Por outro lado, ampliou-se o número de lotéricas, correspondentes e agências bancárias, possibilitando o acesso aos serviços bancários em regiões até então “ignoradas” pelo setor financeiro.
Pouco a pouco, outros fatores também contribuíram para uma maior inclusão financeira e para o aumento do volume de crédito na década de 2000. Dentre estes, a revalorização dos bancos públicos, a disponibilização de recursos ao crédito, a redução do desemprego, o acentuado aumento da formalização do trabalho, o aumento do salário médio real das famílias, o uso de cartões e os programas sociais do governo, que promoveram a abertura de contas para o recebimento dos benefícios.
Já o cenário atual é completamente distinto, pois, em meio à maior contração da renda da história, as políticas públicas vão na contramão do estímulo ao crédito e ao crescimento, com a austeridade fiscal que já dura dois anos e a ampla desestruturação das políticas sociais, da Petrobrás e dos bancos públicos. Nesse contexto, além de desconstruir os instrumentos capazes de estimular uma recuperação econômica, o governo abre mão do uso do crédito como ferramenta de estímulo ao crescimento.
Individualmente, o crédito possibilita uma ampliação autônoma da renda, uma vez que ele permite gastar além do limite da renda pessoal. Já no agregado, ele proporciona o aumento da demanda e, portanto, pode estimular o crescimento da renda nacional. Ou seja, o crédito tem a capacidade de acelerar o circuito da renda, gerando consumo, investimento, emprego e renda.
Assim, crédito e renda andam juntos e se reforçam mutuamente, e os momentos de expansão da renda costumam ser aqueles de maior expansão do crédito. Por outro lado, os períodos de desaceleração e de queda da renda, costumam estar associados à desaceleração da concessão de crédito. Portanto, o crédito é uma ferramenta capaz de acelerar o crescimento da renda, assim como a renda é a base de sustentação do crédito. Mas quais são os limites para essa relação?
Do lado da demanda, o volume de crédito pode ser impactado pelo aumento da taxa de desemprego, pela redução da renda e pela elevação da inadimplência. Reduzem-se as ambições de consumo das famílias e, consequentemente, a demanda por crédito. E as empresas reduzem, primeiro, a demanda por crédito de longo prazo destinado ao investimento e ao aumento da capacidade produtiva, depois o crédito de curto prazo, destinado a financiar o giro da produção.
Já do lado da oferta, diante de uma crise profunda como a atual e na ausência de políticas anticíclicas dos bancos públicos, os bancos tendem a aumentar os custos e as exigências para a concessão de crédito, além de reduzir os prazos e volumes concedidos.
Nesse sentido, em cenários de crise e incerteza para as empresas e famílias, não há mecanismo espontâneo de aumento do crédito que possa ajudar na recuperação da economia. Há, no entanto, um conjunto de políticas públicas que, visando ao crédito e à renda, precisam ser acionadas para fazer com que a roda do crescimento volte a girar.
Quanto às políticas de crédito, é indispensável a recuperação do papel dos bancos públicos e das políticas a eles associadas. Esses precisam retomar suas políticas de financiamento à agricultura e construção civil, assim como recuperar a ampliação do acesso da população ao sistema bancário – sobretudo da parcela com menor renda e que sofreu mais intensamente os efeitos da recessão e do desemprego – com reabertura de contas correntes simplificadas e sem custo, retomada do papel dos correspondentes bancários e disponibilização de recursos ao crédito.
Além disso, é preciso equacionar os problemas de inadimplência de empresas e famílias com uma redução mais intensa das taxas de juros (que em termos reais continuam as mais elevadas do mundo), a facilitação do refinanciamento e a limitação de taxas de juros abusivas além da adoção de políticas tributárias capazes tanto de reduzir as dívidas tributárias de empresas e famílias quanto de reduzir o nosso já histórico padrão de desigualdade tributária.
Essas políticas são necessárias, mas insuficientes, como já dizia Keynes “você pode conduzir um cavalo para beber água, mas não pode obrigá-lo a beber”. Assim, as políticas de crédito, que visam, sobretudo, ao lado da oferta, precisam ser acompanhadas de políticas de renda, voltadas para o emprego e o crescimento econômico, como a revalorização do salário mínimo, da expansão do gasto social, do investimento público e do incentivo ao investimento privado. E, para isso, é preciso um governo legítimo, democraticamente eleito, que inspire confiança e que possa reverter as políticas de austeridade que sufocam e impedem uma retomada do crescimento.
Por fim, mesmo em uma situação extremamente grave, o crédito ainda pode reassumir seu papel em uma indispensável retomada do processo de crescimento econômico e distribuição de renda. No entanto, como observado, precisará vir acompanhado de outras políticas que deem conta das consequências da atual crise econômica sobre empresas e famílias.
Até o início dos anos 2000, o acesso aos bancos e ao crédito esteve restrito a parcelas muito limitadas da população, sobretudo aquelas empregadas formalmente e de maiores rendas. A ampliação do acesso bancário às camadas menos favorecidas da população foi iniciado no primeiro governo Lula graças a uma política de “bancarização”, que, por um lado, visava a favorecer o acesso a contas bancárias e, para isso, a Caixa econômica Federal criou contas correntes limitadas, mas sem custo, chamadas inicialmente de Conta Caixa Aqui, depois de Caixa Fácil.
Dado seu sucesso, foi seguida pelo BB e pelos bancos privados, embora os bancos tenham passado – após algum tempo – a cobrar taxas pelos serviços. Por outro lado, ampliou-se o número de lotéricas, correspondentes e agências bancárias, possibilitando o acesso aos serviços bancários em regiões até então “ignoradas” pelo setor financeiro.
Pouco a pouco, outros fatores também contribuíram para uma maior inclusão financeira e para o aumento do volume de crédito na década de 2000. Dentre estes, a revalorização dos bancos públicos, a disponibilização de recursos ao crédito, a redução do desemprego, o acentuado aumento da formalização do trabalho, o aumento do salário médio real das famílias, o uso de cartões e os programas sociais do governo, que promoveram a abertura de contas para o recebimento dos benefícios.
Já o cenário atual é completamente distinto, pois, em meio à maior contração da renda da história, as políticas públicas vão na contramão do estímulo ao crédito e ao crescimento, com a austeridade fiscal que já dura dois anos e a ampla desestruturação das políticas sociais, da Petrobrás e dos bancos públicos. Nesse contexto, além de desconstruir os instrumentos capazes de estimular uma recuperação econômica, o governo abre mão do uso do crédito como ferramenta de estímulo ao crescimento.
Individualmente, o crédito possibilita uma ampliação autônoma da renda, uma vez que ele permite gastar além do limite da renda pessoal. Já no agregado, ele proporciona o aumento da demanda e, portanto, pode estimular o crescimento da renda nacional. Ou seja, o crédito tem a capacidade de acelerar o circuito da renda, gerando consumo, investimento, emprego e renda.
Assim, crédito e renda andam juntos e se reforçam mutuamente, e os momentos de expansão da renda costumam ser aqueles de maior expansão do crédito. Por outro lado, os períodos de desaceleração e de queda da renda, costumam estar associados à desaceleração da concessão de crédito. Portanto, o crédito é uma ferramenta capaz de acelerar o crescimento da renda, assim como a renda é a base de sustentação do crédito. Mas quais são os limites para essa relação?
Do lado da demanda, o volume de crédito pode ser impactado pelo aumento da taxa de desemprego, pela redução da renda e pela elevação da inadimplência. Reduzem-se as ambições de consumo das famílias e, consequentemente, a demanda por crédito. E as empresas reduzem, primeiro, a demanda por crédito de longo prazo destinado ao investimento e ao aumento da capacidade produtiva, depois o crédito de curto prazo, destinado a financiar o giro da produção.
Já do lado da oferta, diante de uma crise profunda como a atual e na ausência de políticas anticíclicas dos bancos públicos, os bancos tendem a aumentar os custos e as exigências para a concessão de crédito, além de reduzir os prazos e volumes concedidos.
Nesse sentido, em cenários de crise e incerteza para as empresas e famílias, não há mecanismo espontâneo de aumento do crédito que possa ajudar na recuperação da economia. Há, no entanto, um conjunto de políticas públicas que, visando ao crédito e à renda, precisam ser acionadas para fazer com que a roda do crescimento volte a girar.
Quanto às políticas de crédito, é indispensável a recuperação do papel dos bancos públicos e das políticas a eles associadas. Esses precisam retomar suas políticas de financiamento à agricultura e construção civil, assim como recuperar a ampliação do acesso da população ao sistema bancário – sobretudo da parcela com menor renda e que sofreu mais intensamente os efeitos da recessão e do desemprego – com reabertura de contas correntes simplificadas e sem custo, retomada do papel dos correspondentes bancários e disponibilização de recursos ao crédito.
Além disso, é preciso equacionar os problemas de inadimplência de empresas e famílias com uma redução mais intensa das taxas de juros (que em termos reais continuam as mais elevadas do mundo), a facilitação do refinanciamento e a limitação de taxas de juros abusivas além da adoção de políticas tributárias capazes tanto de reduzir as dívidas tributárias de empresas e famílias quanto de reduzir o nosso já histórico padrão de desigualdade tributária.
Essas políticas são necessárias, mas insuficientes, como já dizia Keynes “você pode conduzir um cavalo para beber água, mas não pode obrigá-lo a beber”. Assim, as políticas de crédito, que visam, sobretudo, ao lado da oferta, precisam ser acompanhadas de políticas de renda, voltadas para o emprego e o crescimento econômico, como a revalorização do salário mínimo, da expansão do gasto social, do investimento público e do incentivo ao investimento privado. E, para isso, é preciso um governo legítimo, democraticamente eleito, que inspire confiança e que possa reverter as políticas de austeridade que sufocam e impedem uma retomada do crescimento.
Por fim, mesmo em uma situação extremamente grave, o crédito ainda pode reassumir seu papel em uma indispensável retomada do processo de crescimento econômico e distribuição de renda. No entanto, como observado, precisará vir acompanhado de outras políticas que deem conta das consequências da atual crise econômica sobre empresas e famílias.
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