domingo, 5 de agosto de 2018

Que Congresso queremos no Brasil?

Por Antônio Augusto de Queiroz, na revista Teoria e Debate:

A composição do próximo Congresso, caso não haja mudança relevante no humor do eleitor, pode ser mais atrasada, fisiológica e pró-mercado do que a atual. Por isso a importância de a esquerda e a centro-esquerda priorizarem a eleição de deputados e senadores para impedir que o pior aconteça.

A prática política dos parlamentares acomodados em partidos de centro, centro-direita e direita, independentemente da visão ideológica do futuro presidente da República, vai continuar a mesma. Ou seja, eles vão tentar manter e até ampliar o balcão de negócios dos últimos dois anos, tanto via partidos quanto por intermédio de bancadas informais, pelas razões a seguir.

Em primeiro lugar porque o índice de renovação será menor que a média histórica das últimas eleições, com a reeleição da maioria absoluta dos atuais deputados, que estão viciados nessa forma de fazer política.

Em segundo lugar porque a pulverização partidária continuará enorme e os grandes partidos, com mais de cinquenta parlamentares, tende a reduzir suas bancadas, dificultando a formação de maiorias por parte do governo.

Em terceiro lugar porque as bancadas informais irão crescer, de um lado, estimuladas pelas “conquistas” que tiveram na atual legislatura, na qual o governo atendeu praticamente todos os pleitos dos ruralistas, por exemplo, e, de outro, pelas facilidades da “janela partidária”, que fragiliza a fidelidade partidária, permitindo que o parlamentar mude de partido sem perda de mandato.

Realmente, o governo Michel Temer – para se livrar das denúncias e aprovar sua agenda impopular e antinacional – viciou os parlamentares ao institucionalizar a troca de votos por favores e benefícios do Estado, especialmente renúncias e anistias fiscais.

Como decorrência do processo eleitoral, especialmente devido ao elevado absenteísmo no comparecimento às urnas, duas mudanças constitucionais ganharão força no futuro Congresso: o fim do voto obrigatório e a candidatura avulsa.

No caso da extinção do voto obrigatório, dois fatores – que estarão presentes no atual processo eleitoral – poderão ser determinantes.

O primeiro é que quase metade dos eleitores irá se abster de votar, vai votar branco ou anular o voto, o que demonstrará a falência de obrigatoriedade do voto.

O segundo é que o baixo comparecimento dos eleitores fará com que os eleitos – presidente, governadores, senadores e deputados – passem a representar pouco mais de um terço da população, ampliando a crise de representatividade.

Sobre as candidaturas avulsas, dois também fenômenos tendem a ser determinantes. O primeiro será o crescimento, também o fortalecimento, das bancadas informais. O segundo, a “janela partidária”, que permite ao parlamentar mudar de partido sem perda de mandato.

Em relação à agenda de reformas, esses parlamentares mais à direita do espectro político, por seus vínculos com o mercado, tendem a apoiar mudanças com viés liberal-fiscal, de um lado voltadas para o Estado mínimo e, de outro, direcionadas ao desmonte dos serviços públicos, ao corte de gasto público e à repulsa à criação ou majoração de tributos.

Num cenários desses ganha força a agenda de privatizações, a reforma administrativa, com terceirização, redução de órgãos e pessoal, e a reforma da Previdência, com ampliação da idade e do tempo de contribuição e com redução do benefício.

Para se contrapor às práticas, aos vícios e à agenda neoliberal, além da pressão da sociedade, é preciso a eleição de uma robusta bancada de centro-esquerda e esquerda, seja para dar respaldo a um governo comprometido com o interesse nacional e a proteção social, seja para fazer oposição a um governo liberal-fiscal.

A confirmação ou não dessas tendências e riscos depende do eleitor. Só a consciência dessa possibilidade é que poderá forçar o eleitor a escolher deputados e senadores que fujam a esse padrão. Ou se renova a composição do Congresso ou as atuais práticas serão intensificadas na próxima legislatura. E não se pode confiar apenas na pressão da sociedade para impedir a repetição dos vícios e práticas atuais, que levarão inexoravelmente ao colapso do sistema representativo.

* Antônio Augusto de Queiroz é jornalista, analista político e diretor de documentação do Diap.

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