Poucos dias de governo Bolsonaro já são suficientes para conhecermos parte significativa de suas entranhas, do jogo do poder que se dá a partir dos núcleos que o compõem, do papel de cada um desses grupos, das divergências reais e potenciais entre eles.
Na visão do arguto e sempre lúcido analista Luis Nassif, corroborada por outros respeitáveis comentaristas, o governo que resultou da ação política de militares e juízes, para cuja conquista Bolsonaro foi usado como cavalo de Tróia, se divide da seguinte forma:
Núcleo militar – Os militares ocupam, além da vice-presidência, sete ministérios importantes e, inebriados pela retomada do protagonismo político, trabalham para aprofundar e estender seu raio de ação e influência por meio da obtencão de cargos no segundo e terceiros escalões.
Núcleo fundamentalista e religioso – Formado por retardados mentais que rezam na cartilha de manicômio de Olavo de Carvalho – casos dos ministros das Relações Exteriores e da Educação –, ou vociferam teses oriundas de um fanatismo religioso de inspiração medieval, como a inacreditável ministra-pastora Damares.
Núcleo de Bolsonaro – Ao presidente, incapaz de articular, diante de câmeras e microfones, três frases consecutivas que façam algum sentido, cabe apenas o papel de disseminar fake news via twitter, com ataques ao PT, aos movimentos sociais e à esquerda, para manter viva a guerra ideológica da campanha eleitoral.Também integram esse time seus filhos, prontos para dar pitacos de teor fascista e obscurantista em todas as áreas, e o general Heleno, do Gabinete de Segurança Institucional (GSI).
Núcleo do estado policial – Moro, como prêmio por ter alijado Lula das eleições, ganhou superpoderes que vão do controle da Polícia Federal ao Coaf (o que lhe permitirá monitorar a movimentação bancária de opositores e jornalistas), passando pela formulação e execução de políticas de segurança pública. Sua principal missão é consolidar o estado policial no país.
Núcleo rentista – Chefiado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, esse agrupamento de convicções ultraneoliberais não medirá esforços para liquidar direitos trabalhistas, previdenciários e sociais. De sua agenda consta também a venda de todo o patrimônio da nação. Testa de ferro dos banqueiros no governo, Guedes de tudo fará para honrar a confiança da banca.
Com algumas nuances, penso que essa seja mesmo a radiografia que mais se aproxima da realidade da divisão de poder em Brasília. O problema está na aposta de alguns de que os militares sejam capazes de, por conta de sua formação pautada na disciplina, hierarquia e racionalidade, imprimir um mínimo de moderação e impedir que os rumos do governo sejam 100% ditados pelo mercado.
Ledo engano. O sentimento nacionalista que marcou gerações das Forças Armadas ficou no passado. Não por acaso elas assistem passivamente à entrega do pré-sal, uma riqueza estratégica do país e que poderia ser o passaporte para o futuro do povo brasileiro, como dizia Lula, às petroleiras estrangeiras. Cabe lembrar que o almirante que assumiu a pasta das Minas e Energia prometeu durante sua cerimônia de posse priorizar a privatização da Eletrobrás.
Que não nos iludamos: o antipetismo visceral da caserna, que tomou o lugar do anticomunismo dos tempos da guerra fria e da doutrina da segurança nacional, empurrou a esmagadora dos militares de alta e baixa patente, da ativa e da reserva, para o ultraneoliberalismo, fenômeno que deve ser exclusividade nativa.
Não é por outro motivo que o general Villas-Bôas, que não hesitou em pressionar e coagir o STF para manter Lula preso, se calou ante o congelamento de gastos sociais por 20 anos, a liquidação da CLT e, na certa, apoia a reforma da Previdência, desde que ela não mexa nos privilégios da tropa.
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