Por Flávia Calé, no site Direto da Ciência:
Na sabatina do ministro Abraham Weintraub ontem, terça-feira (7), na Comissão de Educação, Cultura e Esporte do Senado, ficou evidente seu despreparo para comandar uma das pastas mais importantes da República. Demonstrou desconhecimento dos desafios da educação brasileira e, pelo que se viu, sua missão se resume a fazer do ministério um instrumento de chantagem com a sociedade pela aprovação da Reforma da Previdência.
Repetiu como um mantra, numa nítida subestimação dos senadores que o questionavam e da população que o assistia, que as medidas anunciadas não se tratam de cortes de 30% no orçamento das universidades federais, mas, sim, de contingenciamentos desses recursos, que podem ser revertidos se o Congresso Nacional aprovar a nova reforma da Previdência.
Ora, em primeiro lugar, são bastante controversos os resultados econômicos que o governo proclama que virão após o ataque à Previdência pública. Lembremos que a reforma trabalhista foi vendida como a grande saída da crise econômica, mas seu resultado prático não alavancou a atividade econômica nem gerou um emprego a mais sequer. Mas, além disso, o ministro mente quando diz que esses cortes não terão impacto nenhum nas universidades.
Em nota, a Universidade Federal da Bahia (UFBA) aponta que o bloqueio dos recursos equivale a R$ 37,3 milhões e que serão afetados o pagamento de despesas ordinárias, ou seja, pagamento das contas de água, energia, telefone, manutenção de espaços e equipamentos, pagamento de terceirizados, entre outras questões básicas para seu funcionamento. Ou seja, os “bandejões” podem ser, sim, afetados, diferentemente do que afirmou Weintraub ao garantir que a medida não atingiria a alimentação dos estudantes.
Mente ainda ao dizer que foi obrigado a realizar os cortes em função da Lei de Responsabilidade Fiscal. Conforme apresentou o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), o orçamento, quando aprovado nas casas legislativas, já está enquadrado nos parâmetros da lei, não necessitando de alterações em função dela. Faltou o ministro, portanto, responder para onde vão esses recursos do contingenciamento.
Na realidade, o projeto é deixar as universidades à míngua do ponto de vista financeiro e de pires na mão para buscar recursos na iniciativa privada – numa espécie de privatização branca –, já que essas instituições não seriam espaços “sacrossantos”, que não possam buscar “outras formas” de custear sua manutenção. A independência do orçamento público que ele defende é inconstitucional. A Autonomia Universitária, como a conhecemos, diz respeito à gestão financeira, ou seja, pressupõe que existam recursos públicos a serem geridos de acordo com os projetos definidos autonomamente em cada universidade.
Mas o que chama mesmo a atenção é sua percepção do que é o povo brasileiro. Ao esboçar um superficial raciocínio sobre a composição étnica do povo brasileiro e a nossa miscigenação característica, chega à conclusão de que somos um bando de vira-latas.
Como sabemos, quem consagrou a expressão “complexo de vira-latas” foi Nelson Rodrigues, que usou esse termo para explicar o sentimento de inferioridade entre brasileiros, inclusive cronistas esportivos, que previam o fracasso na Copa de 1958 da Seleção Brasileira, que acabou sendo campeã. O complexo seria, então, essa visão pequena de si mesmo, uma permanente sensação de incapacidade de realização de grandes feitos. Este sentimento está presente quando fala em difundir startups pelas universidades do Nordeste para “espalhar capitalismo” pela região. É como se o Nordeste fosse feudal!
Ao dizer que somos “vira-latas”, o ministro fala mais sobre si do que sobre o Brasil. Revela a mediocridade com que enxerga nosso país, já apresentada nas diversas observações pejorativas às nossas instituições educacionais e de pesquisa. Quando busca um patamar para a educação brasileira, não olha a nossa dimensão continental, as nossas riquezas naturais. Ignora que nossa produção científica e tecnológica, apesar de todo o desinvestimento, produz conhecimento de ponta. Desdenha o fato de sermos ainda a oitava economia do mundo. Pasmem, o ministro disse que sua meta é transformar o Brasil no Chile, com todo respeito aos nossos “Hermanos”.
Não, ministro, isso não aceitaremos. Não temos o complexo de vira-latas partilhado pelas elites que têm vergonha do país e acham que tudo que vem do Norte da América é melhor. Somos orgulhosos do povo miscigenado que construímos, ainda que tenha sido um processo doloroso e sofrido. É um povo que tem orgulho e conhece o valor de ser brasileiro. Seguiremos resistindo e nosso próximo encontro será no dia 15 de maio, nas ruas do país.
* Flávia Calé da Silva é mestranda em História Econômica na Universidade de São Paulo e presidenta da Associação Nacional de Pós-graduandos (ANPG).
Na sabatina do ministro Abraham Weintraub ontem, terça-feira (7), na Comissão de Educação, Cultura e Esporte do Senado, ficou evidente seu despreparo para comandar uma das pastas mais importantes da República. Demonstrou desconhecimento dos desafios da educação brasileira e, pelo que se viu, sua missão se resume a fazer do ministério um instrumento de chantagem com a sociedade pela aprovação da Reforma da Previdência.
Repetiu como um mantra, numa nítida subestimação dos senadores que o questionavam e da população que o assistia, que as medidas anunciadas não se tratam de cortes de 30% no orçamento das universidades federais, mas, sim, de contingenciamentos desses recursos, que podem ser revertidos se o Congresso Nacional aprovar a nova reforma da Previdência.
Ora, em primeiro lugar, são bastante controversos os resultados econômicos que o governo proclama que virão após o ataque à Previdência pública. Lembremos que a reforma trabalhista foi vendida como a grande saída da crise econômica, mas seu resultado prático não alavancou a atividade econômica nem gerou um emprego a mais sequer. Mas, além disso, o ministro mente quando diz que esses cortes não terão impacto nenhum nas universidades.
Em nota, a Universidade Federal da Bahia (UFBA) aponta que o bloqueio dos recursos equivale a R$ 37,3 milhões e que serão afetados o pagamento de despesas ordinárias, ou seja, pagamento das contas de água, energia, telefone, manutenção de espaços e equipamentos, pagamento de terceirizados, entre outras questões básicas para seu funcionamento. Ou seja, os “bandejões” podem ser, sim, afetados, diferentemente do que afirmou Weintraub ao garantir que a medida não atingiria a alimentação dos estudantes.
Mente ainda ao dizer que foi obrigado a realizar os cortes em função da Lei de Responsabilidade Fiscal. Conforme apresentou o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), o orçamento, quando aprovado nas casas legislativas, já está enquadrado nos parâmetros da lei, não necessitando de alterações em função dela. Faltou o ministro, portanto, responder para onde vão esses recursos do contingenciamento.
Na realidade, o projeto é deixar as universidades à míngua do ponto de vista financeiro e de pires na mão para buscar recursos na iniciativa privada – numa espécie de privatização branca –, já que essas instituições não seriam espaços “sacrossantos”, que não possam buscar “outras formas” de custear sua manutenção. A independência do orçamento público que ele defende é inconstitucional. A Autonomia Universitária, como a conhecemos, diz respeito à gestão financeira, ou seja, pressupõe que existam recursos públicos a serem geridos de acordo com os projetos definidos autonomamente em cada universidade.
Mas o que chama mesmo a atenção é sua percepção do que é o povo brasileiro. Ao esboçar um superficial raciocínio sobre a composição étnica do povo brasileiro e a nossa miscigenação característica, chega à conclusão de que somos um bando de vira-latas.
Como sabemos, quem consagrou a expressão “complexo de vira-latas” foi Nelson Rodrigues, que usou esse termo para explicar o sentimento de inferioridade entre brasileiros, inclusive cronistas esportivos, que previam o fracasso na Copa de 1958 da Seleção Brasileira, que acabou sendo campeã. O complexo seria, então, essa visão pequena de si mesmo, uma permanente sensação de incapacidade de realização de grandes feitos. Este sentimento está presente quando fala em difundir startups pelas universidades do Nordeste para “espalhar capitalismo” pela região. É como se o Nordeste fosse feudal!
Ao dizer que somos “vira-latas”, o ministro fala mais sobre si do que sobre o Brasil. Revela a mediocridade com que enxerga nosso país, já apresentada nas diversas observações pejorativas às nossas instituições educacionais e de pesquisa. Quando busca um patamar para a educação brasileira, não olha a nossa dimensão continental, as nossas riquezas naturais. Ignora que nossa produção científica e tecnológica, apesar de todo o desinvestimento, produz conhecimento de ponta. Desdenha o fato de sermos ainda a oitava economia do mundo. Pasmem, o ministro disse que sua meta é transformar o Brasil no Chile, com todo respeito aos nossos “Hermanos”.
Não, ministro, isso não aceitaremos. Não temos o complexo de vira-latas partilhado pelas elites que têm vergonha do país e acham que tudo que vem do Norte da América é melhor. Somos orgulhosos do povo miscigenado que construímos, ainda que tenha sido um processo doloroso e sofrido. É um povo que tem orgulho e conhece o valor de ser brasileiro. Seguiremos resistindo e nosso próximo encontro será no dia 15 de maio, nas ruas do país.
* Flávia Calé da Silva é mestranda em História Econômica na Universidade de São Paulo e presidenta da Associação Nacional de Pós-graduandos (ANPG).
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