Charge: Becs/Cartoon Movement |
A extrema direita europeia comemora duas vitórias seguidas. A primeira aconteceu além-mar: a de Javier Milei na distante Argentina. A segunda foi em casa: a vitória do Partido pela Liberdade, do radical Geert Wilders, na Holanda. Há traços em comum em ambas as vitórias.
A de Milei teve uma diferença de votos em relação a seu rival Sergio Massa, muito maior do que a prevista nas pesquisas de opinião que lhe eram favoráveis, havendo outras que davam a vitória ao adversário. A de Wilders surpreendeu mais ainda os institutos de pesquisa, pois estes o colocavam num modesto quarto lugar na fragmentada política holandesa, onde há uma miríade de partidos pequenos, médios e grandes.
Qual o traço em comum?
As extremas direitas desfrutam do que se pode chamar de um “voto escondido”, que só aparece no momento decisivo da eleição.
Provavelmente entre os que se declaram “indecisos”, talvez também entre os que declaram a intenção de votar em branco ou de anular o voto. Há também a migração de parte do voto conservador nos partidos tradicionais, mais ainda para a direita. Outro traço em comum está no emprego de certas palavras-chave, como a de “mudança” ou de “desconfiança” em relação à política e políticos tradicionais.
A extrema direita parece capitalizar, em momentos de profunda crise econômica, o descontentamento e a desilusão com a política e os políticos como um todo: é o chamado “voto no outsider”, ou “aquele que vem de fora do sistema”, o que não deixa de ser uma ilusão, pois os políticos que tiram vantagem deste estado de espírito em geral crescem dentro deste mesmo “sistema”.
Tal foi o caso de Milei, cuja carreira política começou na mídia, mas enveredou pelo parlamento nacional em 2021.
Wilders é um político veterano, dos mais antigos na política holandesa. No Brasil, o próprio Jair Bolsonaro desfrutou de anos como deputado no Congresso Nacional.
As extremas direitas desfrutam do que se pode chamar de um “voto escondido”, que só aparece no momento decisivo da eleição.
Provavelmente entre os que se declaram “indecisos”, talvez também entre os que declaram a intenção de votar em branco ou de anular o voto. Há também a migração de parte do voto conservador nos partidos tradicionais, mais ainda para a direita. Outro traço em comum está no emprego de certas palavras-chave, como a de “mudança” ou de “desconfiança” em relação à política e políticos tradicionais.
A extrema direita parece capitalizar, em momentos de profunda crise econômica, o descontentamento e a desilusão com a política e os políticos como um todo: é o chamado “voto no outsider”, ou “aquele que vem de fora do sistema”, o que não deixa de ser uma ilusão, pois os políticos que tiram vantagem deste estado de espírito em geral crescem dentro deste mesmo “sistema”.
Tal foi o caso de Milei, cuja carreira política começou na mídia, mas enveredou pelo parlamento nacional em 2021.
Wilders é um político veterano, dos mais antigos na política holandesa. No Brasil, o próprio Jair Bolsonaro desfrutou de anos como deputado no Congresso Nacional.
Diferenças
Mas entre Milei e Wilders há também algumas diferenças notáveis. O primeiro radicalizou o quanto pôde suas declarações polêmicas durante a campanha presidencial, atacando ferozmente tudo e todos, inclusive os políticos conservadores que depois vieram a apoiá-lo no segundo turno, contra o candidato de centro-esquerda.
Já Wilders, nesta campanha de 2023, digamos, “amaciou” seu discurso. Conhecido inimigo de imigrantes e refugiados, islamofóbico, defensor histórico de propostas como a de proibir mesquitas e o próprio Alcorão, o livro sagrado dos muçulmanos, começou a dizer que pretendia “governar para todos os holandeses”, independentemente de origem ou religião. A tal ponto chegou sua conversão a este novo perfil, que seus adversários chegaram a dizer que ele pretendia passar por uma “Madre Teresa” na política.
Outra diferença significativa está na natureza da própria eleição. No sistema presidencialista argentino, Milei foi eleito diretamente chefe de Estado, embora seu partido seja absolutamente minoritário no parlamento, o que aponta para uma necessária negociação com as forças conservadoras tradicionais no país (se ele a fará é outro capítulo desta história).
Mas entre Milei e Wilders há também algumas diferenças notáveis. O primeiro radicalizou o quanto pôde suas declarações polêmicas durante a campanha presidencial, atacando ferozmente tudo e todos, inclusive os políticos conservadores que depois vieram a apoiá-lo no segundo turno, contra o candidato de centro-esquerda.
Já Wilders, nesta campanha de 2023, digamos, “amaciou” seu discurso. Conhecido inimigo de imigrantes e refugiados, islamofóbico, defensor histórico de propostas como a de proibir mesquitas e o próprio Alcorão, o livro sagrado dos muçulmanos, começou a dizer que pretendia “governar para todos os holandeses”, independentemente de origem ou religião. A tal ponto chegou sua conversão a este novo perfil, que seus adversários chegaram a dizer que ele pretendia passar por uma “Madre Teresa” na política.
Outra diferença significativa está na natureza da própria eleição. No sistema presidencialista argentino, Milei foi eleito diretamente chefe de Estado, embora seu partido seja absolutamente minoritário no parlamento, o que aponta para uma necessária negociação com as forças conservadoras tradicionais no país (se ele a fará é outro capítulo desta história).
Nacionalismos
Já no fragmentado quadro político holandês, o partido de Wilders foi o mais votado, mas alcançou 37 cadeiras das 150 cadeiras da Câmara Baixa. Os partidos conservadores tradicionais mostram-se recalcitrantes em aceitá-lo como futuro primeiro-ministro, o que pode colocá-lo na difícil posição de “ganhar, mas não levar” no cômputo político definitivo.
E tais processos e procedimentos na Holanda costumam ser muito complicados: a coalizão que ora deixa o poder levou quase um ano para ser negociada, e se desfez em poucas semanas, o que levou a esta eleição que favoreceu Wilders e seu partido radical. Seja como fôr, a eleição holandesa mostra a força crescente da extrema-direita numa Europa que enfrenta uma situação econômica muito difícil.
Mesmo que não ganhe ou não leve, é ela que vem ditando a pauta política, brandindo a xenofobia, ou seja, a rejeição a estrangeiros, sejam refugiados ou imigrantes, a rejeição ao Islã e, com maior ou menor veemência, a desconfiança quanto à União Europeia.
Aliás, durante sua campanha, Wilders anunciou que, caso chegasse ao governo, promoveria um plebiscito sobre a permanência da Holanda na União Europeia, o que mostra que os velhos nacionalismos estreitos, que devastaram o continente tantas vezes no passado, continuam na espreita.
Já no fragmentado quadro político holandês, o partido de Wilders foi o mais votado, mas alcançou 37 cadeiras das 150 cadeiras da Câmara Baixa. Os partidos conservadores tradicionais mostram-se recalcitrantes em aceitá-lo como futuro primeiro-ministro, o que pode colocá-lo na difícil posição de “ganhar, mas não levar” no cômputo político definitivo.
E tais processos e procedimentos na Holanda costumam ser muito complicados: a coalizão que ora deixa o poder levou quase um ano para ser negociada, e se desfez em poucas semanas, o que levou a esta eleição que favoreceu Wilders e seu partido radical. Seja como fôr, a eleição holandesa mostra a força crescente da extrema-direita numa Europa que enfrenta uma situação econômica muito difícil.
Mesmo que não ganhe ou não leve, é ela que vem ditando a pauta política, brandindo a xenofobia, ou seja, a rejeição a estrangeiros, sejam refugiados ou imigrantes, a rejeição ao Islã e, com maior ou menor veemência, a desconfiança quanto à União Europeia.
Aliás, durante sua campanha, Wilders anunciou que, caso chegasse ao governo, promoveria um plebiscito sobre a permanência da Holanda na União Europeia, o que mostra que os velhos nacionalismos estreitos, que devastaram o continente tantas vezes no passado, continuam na espreita.
* Publicado originalmente na RFI.
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