Reproduzo entrevista concedida à jornalista Juliana Sada, publicada no blog Escrevinhador:
Criada em setembro de 1968, a revista “Veja” é a publicação semanal brasileira de maior tiragem, teoricamente com cerca de um milhão e duzentos mil exemplares. Criada por Mino Carta, atualmente diretor de redação da CartaCapital, e Victor Civita – estadunidense filho de italianos, fundador do Grupo Abril –, a revista foi por um longo período paradigma para o jornalismo brasileiro. Por sua redação, passaram nomes importantes da profissão; e, por suas páginas, grandes personagens da história – entre seus entrevistados estão Vinícius de Moraes, Yasser Arafat, Salvador Dalí, Tarsila do Amaral e Sérgio Buarque de Holanda.
Mas, em anos recentes, a revista tornou-se alvo de intensas críticas. Na internet, disseminam-se pequenas e grandes iniciativas de informação e contraponto ao tipo de jornalismo feito por lá. Esse mesmo Escrevinhador denunciou a entrevista que nunca existiu, mas que a revista publicou; e mostrou a história do professor que foi alvo de manipulação pelo veículo, além da peculiar análise do semanário sobre a Bolívia.
O jornalista Fábio Jammal Makhoul decidiu debruçar-se sobre a revista Veja para formular sua tese de mestrado em ciência política para a PUC de São Paulo. A dissertação analisou a publicação durante o primeiro mandato de Lula, de janeiro de 2003 a dezembro de 2006. Fábio constatou que houve, de modo deliberado, uma cobertura tendenciosa com o objetivo de desestabilizar o governo. Os números são impressionantes: “40,6% da cobertura de Veja sobre o primeiro governo petista noticiou os escândalos do Planalto e, conseqüentemente, Lula e o PT de forma negativa”. O governo ocupou “54 capas de Veja, das 206 publicadas no período”, destas “32 tratavam de escândalos, segundo classificação da própria Veja, ou seja, 59,3% do total”.
Segundo Fábio, esse sistemático ataque levou ao surgimento de inúmeras críticas que “abalaram a própria revista, que se sentiu na obrigação de reafirmar sua ‘imparcialidade e independência’ a todo o tempo em 2005 e 2006”. O Escrevinhador entrevistou Fábio Jammal Makhoul para expor e debater seu estudo e o papel desempenhado pela revista. Confira a seguir:
Como surgiu a ideia de estudar a revista Veja?
O principal motivo que me levou a pesquisar a revista Veja é jornalístico. A degradação do jornalismo da revista nos últimos anos foi assustadora. Veja é a maior revista semanal de informação do Brasil, com tiragem superior a 1,2 milhão de exemplares. Um número muito maior que o das demais publicações do segmento. Veja é a quarta maior revista de informação do mundo e seu jornalismo já foi referência para toda mídia impressa brasileira. Mas, nos últimos anos, o semanário também se transformou no maior fenômeno de anti-jornalismo do país.
De 2005 para cá, a revista se perdeu completamente em reportagens baseadas em ilações e xingamentos, que ignoraram as regras mais básicas do jornalismo e rasgaram todos os códigos de ética da profissão. Virou um verdadeiro pasquim, com matérias que se revelaram fantasiosas e recheadas de ataques e manipulações da informação. Isso não quer dizer que o PT e o governo Lula sejam os bonzinhos da história e nem as vítimas da grande imprensa. Pelo contrário, houve erros gravíssimos na administração federal, que precisavam ser apurados e divulgados pela mídia.
Entretanto, o jornalismo da grande imprensa conseguiu ser mais antiético que os próprios políticos que eram acusados, com erros grosseiros que comprometeram a imagem desses veículos, principalmente a da revista Veja, que foi a mais engajada na tentativa frustrada de derrubar o presidente da República em 2005 e 2006.
Muito se fala sobre cobertura parcial da Veja. Por meio da sua pesquisa, foi possível constatar a veracidade dessas observações?
Sim, e nem precisava de uma pesquisa acadêmica ou mais aprofundada. Basta uma leitura simples da revista para constatar que Veja tem um lado quando o assunto é política. Hoje temos uma bipolarização partidária no Brasil, com PT e PSDB monopolizando a disputa eleitoral. E a revista Veja está claramente do lado do PSDB e completamente contra o PT. Se você pesquisar a revista desde o início dos anos de 1980 vai constatar que o Partido dos Trabalhadores e o próprio Lula nunca tiveram um tratamento positivo nas páginas de Veja.
Essa história de imparcialidade da imprensa não existe. Os veículos de comunicação são empresas e têm seus interesses e preferências políticas. O jornal O Estado de S. Paulo, por exemplo, sempre foi conservador e nunca escondeu isso. Assumir uma posição ideológica ou política não é ruim. É até saudável e democrático, os grandes jornais da Europa e dos Estados Unidos fazem isso. Pelo menos, o leitor sabe claramente qual é a orientação editorial da publicação. O problema é quando se abandona o jornalismo para se transformar num panfleto político-partidário. E foi o que aconteceu com Veja de 2005 para cá.
Nos dois primeiros anos do primeiro mandato de Lula, o semanário ainda fez jornalismo, mas, ao apostar que poderia derrubar o presidente da República em 2005, perdeu a aposta e a credibilidade. Com o escândalo do “mensalão”, Veja captou o antilulismo e o antipetismo da chamada classe média que lê a revista e iniciou sua campanha pelo impeachment do presidente. Só que a questão política serviu para que Veja se sentisse à vontade para cometer os abusos que quisesse. Uma coisa é a crítica política que se viu no Estadão e n’ O Globo, por exemplo. Outra coisa é partir para o xingamento, como fez Veja.
Você poderia citar capas e matérias que seguramente continham distorções, inverdades, ataques ou parcialidade?
Há muitos exemplos, principalmente em 2005 e 2006. Uma das capas que mais me chamou a atenção foi a da edição de 16 de março de 2005. A revista tentou fabricar uma crise para os petistas, com uma reportagem que prometia ser “bombástica”. A manchete da capa era: “Tentáculos das Farc no Brasil”. Em letras menores, a revista diz que “espiões da Abin gravaram representantes da narcoguerrilha colombiana anunciando doação de 5 milhões de dólares para candidatos petistas na campanha de 2002”.
A capa é chamativa, cheia de dólares ao fundo e uma foto do militante petista que teria recebido dinheiro das Farc. Embora a revista tenha considerado a reportagem forte o suficiente para ser a capa da edição, no corpo da matéria há três ressalvas de que o semanário não tinha como comprovar as acusações. O tema foi repercutido por um mês até sumir das páginas de Veja. O Ministério Público e o Congresso Nacional investigaram e não acharam nada e a revista sequer se desmentiu o publicou o final da história. Capa parecida foi a de 2 de novembro de 2005, que dizia que a campanha de Lula recebeu dólares de Cuba. A matéria é toda fantasiosa e com denúncias em off que nunca se confirmaram.
Uma das partes da sua dissertação se intitula “O discurso político das capas”. Você poderia explicitar qual é este discurso?
Nos quatro anos do primeiro mandato de Lula, o governo e o PT foram os principais temas da capa de Veja, ocupando mais de um quarto das manchetes do período. Com 49 capas negativas, a revista lançou mão de uma estratégia discursiva que visava claramente dar a Lula o mesmo destino de Collor: o impeachment. Sem sucesso neste intento, o semanário passou a trabalhar para evitar a reeleição do petista. A revista não foi nada sutil em sua estratégia, pelo contrário, foi arrogante, agressiva, preconceituosa.
O preconceito, aliás, foi uma das modalizações discursivas contra o governo mais utilizadas pela publicação, principalmente na capa. Desde o primeiro ano do mandato, em 2003, a revista procurou tematizar sobre a ética no PT. O enunciador sempre deixou claro que ela não passava de discurso para chegar ao poder, mas, assim que os escândalos começaram, Veja tratou de provar que o PT era pior que os demais partidos neste quesito. Entre os muitos preconceitos despejados pelo enunciador na capa está a associação entre o PT e bandidos; de traficantes a assassinos.
A suposta falta de escolaridade e de atenção dos petistas com a educação também foram bastante exploradas, sendo que o enunciador não se intimidou para fazer alusão ao animal burro em diversas ocasiões. O esquerdismo do PT também foi apresentado negativamente e de forma preconceituosa. Veja mostrou aos leitores que a máquina pública foi tomada pelos petistas, que aparelharam o Estado como fizeram os soviéticos. Aliás, autoritarismo foi outro tema explorado, que procurou mostrar um PT stalinista e ditador.
A corrupção, entretanto, foi o tema mais explorado nas capas que retrataram o PT e o governo Lula. Com uma série de escândalos em pauta, a revista usou uma das estratégias mais controversas e criticáveis: a comparação entre Lula e Collor. Comparações são sempre complicadas, mas o enunciador de Veja, posicionado e ideológico, relacionou os dois presidentes de forma simplista e forçada.
Com esta modalização discursiva, Veja pôde finalmente trabalhar pelo impeachment de um Lula sem moral, sem ética, corrupto, chefe de quadrilha, despreparado e que fez um primeiro mandato pífio, segundo as capas do semanário. Assim, a revista ousou também decretar o fim do PT. Errou em todas as apostas. Para justificar suas derrotas, Veja encontrou uma explicação baseada em mais preconceitos. Na edição de 16 de agosto de 2006, quando as pesquisas apontavam vitória fácil de Lula na disputa pela reeleição, Veja veiculou uma capa com a foto de uma jovem negra segurando o título de eleitor. A manchete era: “Ela pode decidir a eleição”. O subtítulo explica quem é ela: “nordestina, 27 anos, educação média, 450 reais por mês, Gilmara Cerqueira retrata o eleitor que será o fiel da balança em outubro”. Ou seja, ela é o retrato do Brasil e não dos leitores da revista, que são das classes A e B. Para esses, que o enunciador de Veja aposta que sabem votar, resta a resignação, já que os negros, pobres, analfabetos e nordestinos vão decidir as eleições.
Na introdução do seu trabalho, você apresenta a revista Veja como protagonista de escândalos. Ao que você se refere ao chamar a Veja de protagonista?
Podemos dizer que praticamente toda a chamada grande imprensa aproveitou os erros e desmandos do PT na primeira gestão do Lula para denegrir a imagem do partido e impedir a reeleição do presidente. Mas a revista Veja foi protagonista porque foi a mais enfática na campanha contra os petista e a que mais cometeu erros do ponto de vista jornalístico. Além disso, suas reportagens serviram tanto para iniciar um escândalo como para mantê-lo na pauta da mídia. Em muitos momentos, principalmente durante o escândalo “mensalão”, as reportagens de Veja alimentaram os jornais diários e a própria TV.
Você afirma que “ao todo, Veja publicou 206 edições entre 1° de janeiro de 2003 e o dia 31 de dezembro de 2006. Neste período, a revista produziu 621 reportagens sobre o primeiro governo do PT. Dessas, 252 trataram dos escândalos.” Isso quer dizer que, na média, havia três matérias sobre o governo por edição e sempre uma sobre algum escândalo?
Sim, e mesmo quando a matéria não era sobre escândalos, o enfoque que era dado ao Lula e ao PT era negativo. No meu trabalho deixo claro que o Partido dos Trabalhadores, uma vez no poder, cometeu uma série de irregularidades que deveria sim ser apurada e noticiada. Mas a forma com que a grande imprensa fez a cobertura, principalmente a Veja, visava apenas derrubar o PT do poder e não denunciar as mazelas do nosso sistemas político e eleitoral brasileiro, que estão no cerne do “mensalão” e de vários outros escândalos e que continuaram intactos. Muitos desses problemas que geram toda sorte de abuso de poder são antigos e foram mostrados por diversos autores.
Talvez o melhor lugar para se buscar conhecimento sobre o funcionamento da política seja na obra de Nicolau Maquiavel. Não é à toa que sua bibliografia é chamada de realismo político. Lá se encontra a pura realidade sobre a política. Para divagar um pouco, me arrisco a fazer um paralelo entre Maquiavel e o governo Lula. O PT sempre empunhou a bandeira da ética e bradou que é possível ter “pureza” dentro do jogo político e eleitoral brasileiro. Mas, para chegar ao poder, teve de lançar mão das mesmas práticas que condenava em outros partidos, assim como fez para governar o país. Um jornalismo investigativo sério e isento poderia constatar isso e denunciar de forma séria e isenta. Assim, o PT mostraria o realismo político, que desnudaria os problemas que assolam nossos sistemas político e eleitoral.
Uma cobertura sóbria, que não fosse tendenciosa ao ponto de mostrar que o governo do PSDB sim foi puro, poderia causar uma indignação suficiente para que o Brasil finalmente fizesse uma reforma que melhorasse efetivamente os nossos sistemas político e eleitoral. Mas, ao fazer uma cobertura parcial e tendenciosa, o jornalismo chamou mais a atenção do que os escândalos que noticiava, não contribuindo em nada com o país.
As capas analisadas, de 2003 a 2006, seguiram sempre o mesmo tom ao tratar do PT? É possível delimitar períodos de maiores ofensivas ou recuos?
Veja só se manteve recuada nos ataques no primeiro ano do mandato de Lula, 2003. Em 2004, começou sua ofensiva, embora de forma meio tímida. Mas em 2005 e 2006, Lula e o PT foram os principais temas da capa. Em 2005, das 52 edições, Lula e o PT aparecem de forma negativa em 24 capas, sendo 18 delas classificadas pela própria Veja no tema escândalo. Ou seja, quase a metade das edições abordaram o presidente negativamente. Em 2006, último ano de governo, Veja publicou 15 capas sobre Lula e o PT, todas desfavoráveis em pleno ano eleitoral.
Nos quatro anos do primeiro mandato de Lula, o governo e o PT foram os principais temas da capa de Veja, ocupando mais de um quarto das manchetes do período. Foram 49 capas negativas, sendo 39 só em 2005 e 2006. Comparativamente à atuação de governos passados, o tratamento da imprensa e de Veja à gestão Lula foi muito desigual. Durante a era tucana, por exemplo, as denúncias contra o governo federal não tiveram muito destaque. Em 1997, o presidente Fernando Henrique Cardoso foi acusado de comprar votos para a aprovação da emenda que permitiu sua reeleição, havia denúncias sobre as privatizações e corrupção em vários órgãos ligados ao governo federal, como a Sudam e a Sudene. Naquele ano, apenas uma capa foi feita sobre as acusações, com a foto de Sérgio Motta, então ministro-chefe da Casa Civil, e a chamada da capa era: “Reeleição”.
Já em 2005, com Lula na presidência, forma dezoito capas sequenciais durante quatro meses de puro bombardeio. Veja chegou a defender o fim do PT e que isso seria benéfico para a política brasileira, já que até na oposição sua atuação foi prejudicial para o país. Veja nunca havia defendido o fim de nenhum partido e nem usado tantos adjetivos negativos como usou para falar sobre os petistas.
Em 2006, em pleno período eleitoral, a revista veiculou cinco capas negativas para o governo, entre 23 de agosto e 25 de outubro. Isto quer dizer que as capas de metade das edições de Veja que circularam enquanto as eleições se definiam eram ruins para Lula. Enquanto isso, Geraldo Alckmin (PSDB), seu principal adversário, não apareceu negativamente em nenhuma capa de Veja neste período. Pelo contrário, neste período o candidato do PSDB era mostrado de maneira positiva. Só no período do segundo turno das eleições, Lula foi alvo de quatro reportagens de Veja e em todas elas ele aparece de forma negativa. Já Geraldo Alckmin aparece em duas matérias neste período. Ambas com abordagens positivas para o tucano.
As manchetes veiculadas nas capas estavam de acordo com a reportagem produzida ou havia discrepâncias com o intuito de chamar a atenção do leitor?
As manchetes eram mais sensacionalistas, mas as reportagens também seguiam a mesma linha. Ainda assim, é possível perceber muitas discrepâncias, como aquela capa das Farc que eu já citei. Na capa, Veja afirma que o PT recebeu dinheiro das Farc e na matéria há três ressalvas de que o repórter não conseguiu nenhuma prova. Outra capa que chama a atenção é aquela que eu também citei sobre a nordestina, negra e pobre que iria decidir a eleição em favor de Lula. O subtítulo diz que Gilmara Cerqueira tinha 27 anos. Mas na foto é possível observar a data de seu nascimento no título de eleitor e pode-se ver que ela tinha 30 anos na época e não 27 como rebaixou Veja para enquadrá-la ao perfil do eleitor médio. Ou seja, vale até mentir a idade da moça para montar um perfil da qual ela não se enquadra totalmente.
Além das capas, você analisou também os editorais da Veja. Foi possível encontrar correspondência entre a posição oficial da revista e o conteúdo por ela produzido, que em tese é independente?
As críticas que a revista Veja recebeu durante o primeiro governo Lula, principalmente nos dois últimos anos, abalaram a própria revista, que se sentiu na obrigação de reafirmar sua “imparcialidade e independência” a todo o tempo em 2005 e 2006. Durante a crise do “mensalão”, Veja usou a maior parte dos editoriais de junho a dezembro de 2005 para justificar a matéria da semana anterior e ratificar seu compromisso com um jornalismo sério. Logo no primeiro editorial do início da crise do mensalão, em 1º de junho de 2005, Veja garante que “não escolhe suas reportagens investigativas com base em preferências partidárias ou ideológicas”. E o curioso é que todos os editoriais das edições seguintes eram para justificar suas reportagens, sempre reafirmando uma imparcialidade que não se via nas reportagens.
Você discute o paradigma da imparcialidade e neutralidade no qual é baseado o discurso dos meios de comunicação entretanto você apresenta argumentos sobre a inviabilidade destes paradigmas se concretizarem. A partir da sua pesquisa, é possível concluir se a parcialidade da revista Veja é fruto de uma política deliberada ou consequência da inviabilidade de se fazer um jornalismo imparcial?
É fruto de uma politica deliberada. É claro que é quase impossível fazer um jornalismo totalmente isento. Mas você pode pelo menos buscar a isenção, ouvindo os dois lados, dando o mesmo peso para as diferentes versões e não utilizando adjetivos, por exemplo. Veja nem tentou ser imparcial, pelo contrário. Ela tinha uma estratégia discursiva e a seguiu até o fim com um objetivo bem claro: derrubar Lula da presidência.
Ao se contrapor ao governo Lula e ao PT, a revista Veja apresentava qual projeto para o Brasil apoiava ou qual setor o representava?
A primeira edição após a reeleição de Lula, publicada em 8 de novembro de 2006, é a que mostra mais claramente a posição da revista. A matéria de capa defende que é preciso deixar para trás a “visão tacanha” de que a miséria pode ser superada pelo “princípio bolchevique” de tirar dos ricos e dar aos pobres.
Para Veja, a miséria só será superada pela produção de riqueza e para isso “o gênio humano não concebeu nada mais eficiente do que o velho e bom capitalismo, com seus mercados livres, empreendedores ambiciosos e empresas inovadoras”. Veja aconselha Lula a “aposentar para sempre a ideia de palanque de que o Brasil é como um sobrado – em que só há andar de cima e andar de baixo e, portanto, o único trabalho é fazer com que todos passem a habitar o pedaço de cima. Isso é uma interpretação tão tosca da sociedade brasileira que, na sua estupidez simplificadora, neutraliza o papel crucial e dinamizador exercido pela classe média”.
Veja diz que falta ao presidente maior clareza sobre como promover de maneira mais vigorosa as condições para que a iniciativa privada produza mais conhecimento tecnológico de ponta, inove mais e multiplique seus índices de produtividade. E acrescenta: “Para fazer o país avançar, produzir riqueza e gerar justiça, o presidente Lula tem muitos desafios para superar – e um deles começa em casa. O Partido dos Trabalhadores, que se transformou numa usina de escândalos, divulgou uma nota oficial cobrando que no novo mandato Lula faça um ‘governo de esquerda’. Ninguém sabe exatamente o que isso quer dizer, mas é certo que significa mandar às favas o equilíbrio fiscal e o controle da inflação em troca de um crescimento econômico tão duradouro quanto um voo de galinha”.
Essa é a primeira vez na cobertura do governo Lula que Veja assume com todas as letras que fala em nome das classes mais abastadas e que defende uma política e um projeto de Estado mais à direita do que voltados para o social. Sua intenção é proteger o capital como fica claro neste texto. Para a revista, é preciso esquecer a ideia de que “o único trabalho é fazer com que todos passem a habitar o pedaço de cima”. Ou seja, não interessa colocar os mais pobres no mesmo patamar dos ricos é preciso “promover de maneira mais vigorosa as condições para que a iniciativa privada produza mais conhecimento tecnológico de ponta, inove mais e multiplique seus índices de produtividade”.
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terça-feira, 31 de agosto de 2010
Os indicadores do direito à comunicação
No dia 8 de setembro, às 18h30, na Livaria da Vila (Rua Fradique Coutinho, 915, Vila Madalena, SP), ocorrerá o lançamento do livro "Contribuições para a construção de indicadores do direito à comunicação", de autoria de Diogo Moyses, João Brant e Michelle Prazeres. Reproduzo abaixo resenha deste importante livro:
Motivado pela ausência de referências concretas para medir o grau de efetivação do direito à comunicação, o coletivo Intervozes propôs o desenvolvimento de indicadores para ajudar a preencher essa lacuna. O livro "Contribuições para a construção de indicadores do direito à comunicação" é resultado de uma pesquisa sobre o tema realizada pela organização com o apoio da Fundação Ford e se propõe a estimular o debate sobre indicadores para a avaliação quantitativa e qualitativa do direito à comunicação no país. O estudo foi coordenado por Diogo Moyses, João Brant e Michelle Prazeres, que respondem também pela organização da publicação.
A ideia de realizar uma pesquisa sobre o tema surgiu em 2004, quando o Intervozes trabalhava no capítulo brasileiro de um estudo internacional promovido pela Campanha CRIS (Communication Rights in the Information Society) sobre liberdade de expressão, pluralidade e diversidade nos meios de comunicação e acesso às tecnologias de informação e comunicação. A partir de inquietudes surgidas no bojo desse estudo, o Intervozes iniciou o projeto de desenvolvimento de indicadores, que contou com a colaboração de pesquisadores da área, como Regina Mota, da UFMG, Murilo Ramos, da UnB, Venício Lima, pesquisador aposentado da mesma universidade, e César Bolaño, da Universidade Federal de Sergipe. O livro reúne os resultados da pesquisa e traz propostas concretas de indicadores sobre efetivação do direito à comunicação.
Segundo os organizadores da publicação, a pesquisa foi motivada por questões prosaicas. “Hoje nós não temos referências para dizer, por exemplo, se a situação da comunicação em relação à concentração de propriedade é melhor ou pior do que era 10 anos atrás”, diz João Brant. Para Michelle Prazeres, “são poucas as experiências de sistematizar os dados primários disponíveis que permitem análises concretas sobre o cenário de efetivação do direito à comunicação no Brasil”. Entre essas experiências, destaca-se o site Donos da Mídia, que organiza dados do Ministério das Comunicações e da Anatel sobre propriedade das empresas de rádio e televisão.
Para Venício Lima, professor aposentado da UnB e um dos consultores da obra do Intervozes, “o direito à comunicação é um direito que não foi positivado. Assim, qualquer contribuição que possa ser dada para mostrar sua importância e abrangência é uma contribuição muito grande para o avanço na consolidação desse direito. E o trabalho do Intervozes foi feito em uma época em que ninguém tinha feito nada parecido”, explica. Regina Mota, da UFMG, que também participou do processo de elaboração da pesquisa do Intervozes, destaca: “A tarefa foi árdua e os desafios imensos, dado o caráter de múltiplas variáveis que compõem os indicadores do direito à comunicação. Mas o passo fundamental foi dado e beneficiará a pesquisa, as políticas públicas e os avanços na Comunicação Social bem como a visão do seu alcance político.”
A intenção do Intervozes é ampliar a discussão sobre o tema e, ao mesmo tempo, propor caminhos para a democratização do setor. “É certo que a existência de indicadores e análises periódicas não significa, por si só, a realização das transformações pelas quais se batalha; mas sua aplicação motiva processos importantes”, explica Diogo Moyses.
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Motivado pela ausência de referências concretas para medir o grau de efetivação do direito à comunicação, o coletivo Intervozes propôs o desenvolvimento de indicadores para ajudar a preencher essa lacuna. O livro "Contribuições para a construção de indicadores do direito à comunicação" é resultado de uma pesquisa sobre o tema realizada pela organização com o apoio da Fundação Ford e se propõe a estimular o debate sobre indicadores para a avaliação quantitativa e qualitativa do direito à comunicação no país. O estudo foi coordenado por Diogo Moyses, João Brant e Michelle Prazeres, que respondem também pela organização da publicação.
A ideia de realizar uma pesquisa sobre o tema surgiu em 2004, quando o Intervozes trabalhava no capítulo brasileiro de um estudo internacional promovido pela Campanha CRIS (Communication Rights in the Information Society) sobre liberdade de expressão, pluralidade e diversidade nos meios de comunicação e acesso às tecnologias de informação e comunicação. A partir de inquietudes surgidas no bojo desse estudo, o Intervozes iniciou o projeto de desenvolvimento de indicadores, que contou com a colaboração de pesquisadores da área, como Regina Mota, da UFMG, Murilo Ramos, da UnB, Venício Lima, pesquisador aposentado da mesma universidade, e César Bolaño, da Universidade Federal de Sergipe. O livro reúne os resultados da pesquisa e traz propostas concretas de indicadores sobre efetivação do direito à comunicação.
Segundo os organizadores da publicação, a pesquisa foi motivada por questões prosaicas. “Hoje nós não temos referências para dizer, por exemplo, se a situação da comunicação em relação à concentração de propriedade é melhor ou pior do que era 10 anos atrás”, diz João Brant. Para Michelle Prazeres, “são poucas as experiências de sistematizar os dados primários disponíveis que permitem análises concretas sobre o cenário de efetivação do direito à comunicação no Brasil”. Entre essas experiências, destaca-se o site Donos da Mídia, que organiza dados do Ministério das Comunicações e da Anatel sobre propriedade das empresas de rádio e televisão.
Para Venício Lima, professor aposentado da UnB e um dos consultores da obra do Intervozes, “o direito à comunicação é um direito que não foi positivado. Assim, qualquer contribuição que possa ser dada para mostrar sua importância e abrangência é uma contribuição muito grande para o avanço na consolidação desse direito. E o trabalho do Intervozes foi feito em uma época em que ninguém tinha feito nada parecido”, explica. Regina Mota, da UFMG, que também participou do processo de elaboração da pesquisa do Intervozes, destaca: “A tarefa foi árdua e os desafios imensos, dado o caráter de múltiplas variáveis que compõem os indicadores do direito à comunicação. Mas o passo fundamental foi dado e beneficiará a pesquisa, as políticas públicas e os avanços na Comunicação Social bem como a visão do seu alcance político.”
A intenção do Intervozes é ampliar a discussão sobre o tema e, ao mesmo tempo, propor caminhos para a democratização do setor. “É certo que a existência de indicadores e análises periódicas não significa, por si só, a realização das transformações pelas quais se batalha; mas sua aplicação motiva processos importantes”, explica Diogo Moyses.
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Cala boca, Willian Waack
Por Altamiro Borges
Um vazamento de áudio, na quinta-feira passada (26), expôs a postura arrogante do âncora do Jornal da Globo, que vai ao ar no final da noite. No momento em que a Dilma Rousseff rebatia as acusações levianas sobre a quebra de sigilo fiscal de dirigentes tucanos, Willian Waack deixou escapar a frase: “Manda calar a boca”. Diante da difusão do vídeo pela internet, somente agora a TV Globo emitiu uma nota pedindo desculpas aos telespectadores pela “falha técnica”.
Segundo o sítio Comunique-se, a poderosa emissora garante que Willian Waack não se referiu à presidenciável, mas apenas pediu silêncio à equipe, já que o barulho “prejudicava a concentração dos apresentadores”. Mesmo assim, a lacônica nota tenta enterrar o constrangedor episódio: “Aos telespectadores, a TV Globo pede desculpas pela falha”. Nem o pedido de desculpa nem, muito menos, a estranha justificava devem convencer os que acompanham o trabalho deste jornalista.
Servidor do Instituto Millenium
Willian Waack nunca escondeu a sua oposição frontal ao governo Lula. Com seus comentários e suas caretas, ele sempre procura desqualificar as iniciativas do atual governo, em especial às que se referem à política externa e aos métodos democráticos de diálogo com os movimentos sociais. Seus alvos são as “amizades” de Lula com “ditadores populistas”, como Hugo Chávez, Cristina Kirchner e Evo Morales, e a sua “conivência” como movimentos “fora da lei”, como o MST.
No seminário do Instituto Millenium, em março passado, ele foi um dos mestres de cerimônia do convescote dos barões da mídia e ficou visivelmente empolgado com os incontáveis ataques ao “autoritarismo do governo Lula”. Na ocasião, a direita midiática procurou unificar sua pauta para a campanha presidencial e deixou explícito que concentraria todo o seu fogo contra a candidata Dilma Rousseff. Willian Waack foi uma das estrelas desta conspiração direitista e golpista.
Entrevista ou provocação policialesca
Mesmo após o lamentável episódio do vazamento do áudio, o apresentador segue caninamente as orientações traçadas no Millenium. No Jornal da Globo de ontem, que iniciou uma nova série de entrevistas com os presidenciáveis, ele se postou como um torturador diante da ex-ministra, no mesmo tom provocador do seu coleguinha Willian Bonner. Não fez nenhuma pergunta sobre as propostas da candidata ou sobre temas de relevo para a sociedade. Tentou, apenas, desgastá-la.
Como observou o blogueiro Luis Nassif, a entrevista procurou explorar factóides, insistindo nas especulações sobre quebra de sigilo fiscal, fatiamento do futuro ministério, influência de José Dirceu e outras bravatas demotucanas. “Surpreendente, porque Waack é dos mais preparados jornalistas da televisão. Se descesse do pedestal para discutir conceitos com a candidata, poderia ter proporcionado aos telespectadores um dos momentos altos do jornalismo nessa campanha”.
Momento de revolta do âncora
Mas não dá mais para esperar “jornalismo sério” de Willian Waack. Seus compromissos hoje são outros. O vazamento do vídeo simplesmente pode ter expressado um momento de ira do âncora da TV Globo, indignado com o definhamento da candidatura do demotucano José Serra e com crescimento de Dilma Rousseff. Afinal, os telespectadores não seguem mais as suas opiniões e as suas caretas. Na prática, a sociedade está mandando um recado: “Cala boca, Willian Waack”.
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Mídia clama por um fato novo
Reproduzo artigo do escritor Washington Araújo, publicado no sítio Carta Maior:
"E um fato novo se viu/ Que a todos admirava:/ O que o operário dizia/ Outro operário escutava." (Vinícius de Moraes, O operário em construção)
E todos os que fazem a cobertura das eleições 2010 no Brasil parecem ter feito um pacto em torno de uma mesma torcida: meu reino por um fato novo. Todos sabemos que a matéria-prima do jornalismo, ao menos aquele dissociado do estilo-jabuti (o que se coloca em árvore nessa ou naquela posição), são os fatos novos. Fatos que indicam ação, movimento, mudança. Com uma campanha precocemente exaurida pela inexistência quase absoluta de fatos, vemos jornalistas, colunistas, comentaristas, apresentadores de TV e radialistas suplicando que venham os tais fatos, assim como ao longo de décadas o sertanejo nordestino ansiava para que a chuva viesse. No contexto atual o assunto é bem complexo. É que não podem ser quaisquer fatos, sejam velhos ou novos.
O que se implora é que sejam fatos beirando o extraordinário, com cores cataclísmicas e ímpeto aterrador. E não podem ser fatos quaisquer, não. Ao contrário, precisam ser caracterizados por sua natureza antigovernista e profundamente oposicionista. E se têm que vir, que venham logo pois do contrário será tarde demais. Neste exato momento os fatos que embalam anseios e orações, desejos e exercícios mentais não podem ocorrer após o dia 3 de outubro de 2010. Se ocorrerem, não terão valor algum. Serão apenas fatos precocemente envelhecidos ante a pressão do calendário eleitoral, que a cada dois anos se impõe à vida ordenada da sociedade brasileira. Fiz-me entender?
"Uma ação afirmativa e veemente"
Fazendo brevíssima viagem no tempo, tomemos como data-início o dia 6/8/2010 e como data-fim o dia 27/8/2010 e teremos uma descrição bem ao gosto do filósofo espanhol Ortega Y Gasset (1883-1955), quando gravou em alto relevo no pensamento universal a máxima "eu sou eu e minhas circunstâncias".
Para Ricardo Kotscho, decano do jornalismo político no país, um possível fato novo seria o que assumisse o formato da boca do jacaré.
"A não ser que nos próximos debates ou nos programas eleitorais no rádio e na TV, que começam a ir ao ar no próximo dia 17, surja algum fato novo fantástico capaz de virar o jogo, a atual tendência é a consolidação das curvas das pesquisas, com a `boca do jacaré´ se abrindo a favor de Dilma" (6/8/2010).
Para Álvaro Dias, destemido senador paranaense, o fato novo tem que ter aquele poder de criar ondas que uma pedra consegue quando é arremessada corretamente por sobre a superfície de lago calmo: "Temos de buscar fatos novos, sacudir essa campanha com uma ação afirmativa e veemente" (Álvaro Dias, PSDB-PR, Folha de S.Paulo,14/8/2010).
"Um grande impacto"
Para Marcos Coimbra, sociólogo e proprietário do Instituto Vox Populi, o assunto abre caminho para situar o fato novo no fazer jornalístico diário e para circunscrever o fato novo dentro de rígidos parâmetros da ética e do bom senso:
"A imprensa precisa de notícias, de preferência surpreendentes. Sem `fatos novos´, fazer o jornal é mais difícil. Por isso, os jornalistas os amam. E os jornalistas que não querem a vitória de quem está na frente? E as empresas de comunicação que têm simpatias por quem está em segundo ou terceiro? Aí, se os fatos novos teimam em não surgir, a tentação de criá-los é grande. Inutilmente, pelo que conhecemos de nossas eleições presidenciais anteriores. Quando a maioria do eleitorado cisma que vai votar em alguém, não há `fato novo´ que a mova. É como fogo de morro acima. Ou água de morro abaixo" (Marcos Coimbra,15/8/2010).
O jornalista Fernando Rodrigues, com o faro sempre apurado, busca no passado alguma semelhança com o presente e traz à memória o famigerado caso dos "aloprados" de quatro anos atrás:
"[Em comparação com as eleições de 2006] hoje, não há sinal de Dilma querer faltar a debates. Também não existe indício de um `aloprados 2´ a caminho – embora o de 2006 tenha sido um raio em céu azul no dia 15 de setembro. Sem erros do PT, as coisas ficam difíceis para Serra" (Folha de S.Paulo, 18/8/2010).
A propósito, convém fazer remissão à entrevista que Carlos Augusto Montenegro, presidente do Ibope, empresa que virou sinônimo de pesquisa de opinião pública no Brasil, concedeu à revista Veja (Edição 2127, de 26/8/2009). O título dizia tudo: "Lula não fará seu sucessor". Pois bem, passados exatos doze meses, eis o que lemos na entrevista da diretora-executiva do Ibope, Márcia Cavallari:
"A 45 dias das eleições presidenciais, apenas um fato novo, fora de controle, poderá mudar o rumo da campanha... Não exime que na reta final da campanha aconteça algum fato que possa trazer um impacto grande nas campanhas..." (Agência Reuters, 19/8/2010).
"Não se pode dar a eleição por decidida"
Em tom taciturno recolhemos também do editorial do jornal Folha de S.Paulo a percepção do jornal sobre a possibilidade de "fatores imprevisíveis", nome pomposo para aquilo que os reles mortais chamam apenas "fato novo". Aponta para chances teóricas não capazes de vencer o pleito de 2010, mas sim, de conceder "sobrevida" à postulação oposicionista:
"Pode até ser que a candidatura José Serra à Presidência experimente alguma oscilação estatística até o dia 3 de outubro. E fatores imprevisíveis, como se sabe, são capazes de alterar o rumo de toda eleição. Não há como negar, portanto, chances teóricas de sobrevida à postulação tucana" (Folha de S.Paulo, editorial, 21/8/2010).
Para a senadora mato-grossense do sul Maria Serrano, a ideia de fato novo rima com o imponderável, com o apelo a que se avance o bom combate até seu último minuto. Há um quê de angústia em sua súplica:
"O clima de desânimo marcou as reações dos tucanos, que agora dizem esperar um `fato novo´ para levar a eleição ao segundo turno. Isso impacta a gente. Não é fácil, mas só podemos desistir no último minuto. É ruim esperar o imponderável, mas precisamos lutar até o fim" (Folha de S.Paulo, 22/8/2010).
Para o jornalista José Roberto de Toledo, atualmente no jornal Estado de S. Paulo, co-autor de Era FHC – um balanço e de Marketing Político e Persuasão Eleitoral, o "fato novo" é co-irmão do "fato aloprado". Segundo Toledo, a possibilidade de vir a existir é o que impede a presente eleição de ser considerada "decidida". Eis o que ele escreveu:
"Quando a eleição vira assunto do dia-a-dia, o acesso às informações sobre a campanha é praticamente simultâneo a todo o eleitorado, seja nas capitais, seja no Brasil profundo. Isso pode tanto reforçar tendências quanto provocar alterações bruscas, a partir de um fato inesperado, um `aloprado´. Também por isso não se pode dar a eleição por decidida" (O Estado de S. Paulo, 23/8/2010).
"Tendência só mudará com fato muito relevante"
O decano dos cronistas brasileiros, Carlos Heitor Cony, em seu lugar de destaque na página 2 da Folha de S.Paulo, é econômico no palavrório, generoso nos julgamentos e agourento para um dos polos da disputa presidencial:
"Acontece que nesta atual campanha, com a disparada das intenções de voto para Dilma, ficou escancarada a participação legal e eleitoral de Lula nos comícios e na TV. A vantagem de sua candidata tenderá a subir – a menos que ocorra um fato novo que beneficie o contendor ou bagunce o coreto montado pelo PT" (Folha de S.Paulo, 26/8/2010).
Para o presidente da Arko Advice Pesquisas, Murilo Aragão, tudo pode ser resumido em bem ajeitada metáfora futebolística onde o fato novo esperado pela oposição tem que necessariamente surgir nas asas do extraordinário.
"No entanto, Serra está em grandes dificuldades, pois além de ter que enfrentar circunstâncias adversas, não joga bem para conseguir mudar o quadro atual. É como se o time estivesse jogando no campo do adversário, com a maioria da torcida contra, e jogando mal. Está dependendo do erro do adversário para poder crescer nas pesquisas ou de um fato novo extraordinário" (Murilo Aragão, 26/8/2010).
Mauro Paulino, diretor do Datafolha, resume em apenas 25 palavras a corrida presidencial. Mesmo com roupagem da brevidade, Paulino ressalva a relevância de um fato "muito relevante":
"Mantida a tendência de crescimento da candidata Dilma Rousseff (PT), que só mudará se ocorrer um fato muito relevante, a eleição presidencial terminará no primeiro turno" (O Globo, 27/8/2010).
A quem interessaria?
Coincidência ou não, o fato é que 24 horas depois que Dilma Rousseff abriu 20 pontos de vantagem sobre José Serra, conforme pesquisa divulgada pelo instituto Datafolha, os principais jornais desta sexta-feira (27/8/2010) traziam em suas primeiras páginas as seguintes manchetes:
* Folha de S.Paulo: "Nova quebra de sigilo abre batalha PT-PSDB"
* Estadão: "Suspeitos de violar sigilo de tucanos são blindados pela Receita"
* O Globo: "Núcleo da Receita no ABC devassou dados de 140"
* Jornal do Brasil: "Só um escândalo derruba Dilma"
* Zero Hora: "Oposição se une em ataque ao PT pela quebra de sigilos"
* Veja online: "Quebra de sigilo – Receita vê indícios de esquema para venda de informações sigilosas"
* Época online: "Receita diz que violação é fruto de `esquema´"
* Portal G1/Globo: "Receita vê indícios de `balcão de venda´ de informações fiscais"
* Globo online: "Numa última tentativa, a ordem, ainda que não consensual na campanha tucana, foi de jogar todas as fichas no episódio da violação do sigilo fiscal..."
E a pergunta que se impõe é: as nove manchetes acima relacionadas, todas em torno da quebra de sigilo fiscal de diversas pessoas ligadas ao PSDB, trazem consigo marcas que apontam para o inesperado, o fantástico, o extraordinário?
Mas, antes de responder a esta questão, que é obviamente facílima de responder, há que se utilizar a percepção, a intuição e a inteligência jornalística para responder a outras questões ainda mais importantes:
A quem interessaria (no duro mesmo!) a quebra do sigilo fiscal nos últimos meses de 2009 de Eduardo Jorge Caldas Pereira, vice-presidente do PSDB, de seus companheiros de partido, de Samuel Klein (dono da Casas Bahia) e da apresentadora da TV Globo Ana Maria Braga?
Quem estaria mais necessitado de um balão de oxigênio que atendesse pelo nome fato novo?
.
"E um fato novo se viu/ Que a todos admirava:/ O que o operário dizia/ Outro operário escutava." (Vinícius de Moraes, O operário em construção)
E todos os que fazem a cobertura das eleições 2010 no Brasil parecem ter feito um pacto em torno de uma mesma torcida: meu reino por um fato novo. Todos sabemos que a matéria-prima do jornalismo, ao menos aquele dissociado do estilo-jabuti (o que se coloca em árvore nessa ou naquela posição), são os fatos novos. Fatos que indicam ação, movimento, mudança. Com uma campanha precocemente exaurida pela inexistência quase absoluta de fatos, vemos jornalistas, colunistas, comentaristas, apresentadores de TV e radialistas suplicando que venham os tais fatos, assim como ao longo de décadas o sertanejo nordestino ansiava para que a chuva viesse. No contexto atual o assunto é bem complexo. É que não podem ser quaisquer fatos, sejam velhos ou novos.
O que se implora é que sejam fatos beirando o extraordinário, com cores cataclísmicas e ímpeto aterrador. E não podem ser fatos quaisquer, não. Ao contrário, precisam ser caracterizados por sua natureza antigovernista e profundamente oposicionista. E se têm que vir, que venham logo pois do contrário será tarde demais. Neste exato momento os fatos que embalam anseios e orações, desejos e exercícios mentais não podem ocorrer após o dia 3 de outubro de 2010. Se ocorrerem, não terão valor algum. Serão apenas fatos precocemente envelhecidos ante a pressão do calendário eleitoral, que a cada dois anos se impõe à vida ordenada da sociedade brasileira. Fiz-me entender?
"Uma ação afirmativa e veemente"
Fazendo brevíssima viagem no tempo, tomemos como data-início o dia 6/8/2010 e como data-fim o dia 27/8/2010 e teremos uma descrição bem ao gosto do filósofo espanhol Ortega Y Gasset (1883-1955), quando gravou em alto relevo no pensamento universal a máxima "eu sou eu e minhas circunstâncias".
Para Ricardo Kotscho, decano do jornalismo político no país, um possível fato novo seria o que assumisse o formato da boca do jacaré.
"A não ser que nos próximos debates ou nos programas eleitorais no rádio e na TV, que começam a ir ao ar no próximo dia 17, surja algum fato novo fantástico capaz de virar o jogo, a atual tendência é a consolidação das curvas das pesquisas, com a `boca do jacaré´ se abrindo a favor de Dilma" (6/8/2010).
Para Álvaro Dias, destemido senador paranaense, o fato novo tem que ter aquele poder de criar ondas que uma pedra consegue quando é arremessada corretamente por sobre a superfície de lago calmo: "Temos de buscar fatos novos, sacudir essa campanha com uma ação afirmativa e veemente" (Álvaro Dias, PSDB-PR, Folha de S.Paulo,14/8/2010).
"Um grande impacto"
Para Marcos Coimbra, sociólogo e proprietário do Instituto Vox Populi, o assunto abre caminho para situar o fato novo no fazer jornalístico diário e para circunscrever o fato novo dentro de rígidos parâmetros da ética e do bom senso:
"A imprensa precisa de notícias, de preferência surpreendentes. Sem `fatos novos´, fazer o jornal é mais difícil. Por isso, os jornalistas os amam. E os jornalistas que não querem a vitória de quem está na frente? E as empresas de comunicação que têm simpatias por quem está em segundo ou terceiro? Aí, se os fatos novos teimam em não surgir, a tentação de criá-los é grande. Inutilmente, pelo que conhecemos de nossas eleições presidenciais anteriores. Quando a maioria do eleitorado cisma que vai votar em alguém, não há `fato novo´ que a mova. É como fogo de morro acima. Ou água de morro abaixo" (Marcos Coimbra,15/8/2010).
O jornalista Fernando Rodrigues, com o faro sempre apurado, busca no passado alguma semelhança com o presente e traz à memória o famigerado caso dos "aloprados" de quatro anos atrás:
"[Em comparação com as eleições de 2006] hoje, não há sinal de Dilma querer faltar a debates. Também não existe indício de um `aloprados 2´ a caminho – embora o de 2006 tenha sido um raio em céu azul no dia 15 de setembro. Sem erros do PT, as coisas ficam difíceis para Serra" (Folha de S.Paulo, 18/8/2010).
A propósito, convém fazer remissão à entrevista que Carlos Augusto Montenegro, presidente do Ibope, empresa que virou sinônimo de pesquisa de opinião pública no Brasil, concedeu à revista Veja (Edição 2127, de 26/8/2009). O título dizia tudo: "Lula não fará seu sucessor". Pois bem, passados exatos doze meses, eis o que lemos na entrevista da diretora-executiva do Ibope, Márcia Cavallari:
"A 45 dias das eleições presidenciais, apenas um fato novo, fora de controle, poderá mudar o rumo da campanha... Não exime que na reta final da campanha aconteça algum fato que possa trazer um impacto grande nas campanhas..." (Agência Reuters, 19/8/2010).
"Não se pode dar a eleição por decidida"
Em tom taciturno recolhemos também do editorial do jornal Folha de S.Paulo a percepção do jornal sobre a possibilidade de "fatores imprevisíveis", nome pomposo para aquilo que os reles mortais chamam apenas "fato novo". Aponta para chances teóricas não capazes de vencer o pleito de 2010, mas sim, de conceder "sobrevida" à postulação oposicionista:
"Pode até ser que a candidatura José Serra à Presidência experimente alguma oscilação estatística até o dia 3 de outubro. E fatores imprevisíveis, como se sabe, são capazes de alterar o rumo de toda eleição. Não há como negar, portanto, chances teóricas de sobrevida à postulação tucana" (Folha de S.Paulo, editorial, 21/8/2010).
Para a senadora mato-grossense do sul Maria Serrano, a ideia de fato novo rima com o imponderável, com o apelo a que se avance o bom combate até seu último minuto. Há um quê de angústia em sua súplica:
"O clima de desânimo marcou as reações dos tucanos, que agora dizem esperar um `fato novo´ para levar a eleição ao segundo turno. Isso impacta a gente. Não é fácil, mas só podemos desistir no último minuto. É ruim esperar o imponderável, mas precisamos lutar até o fim" (Folha de S.Paulo, 22/8/2010).
Para o jornalista José Roberto de Toledo, atualmente no jornal Estado de S. Paulo, co-autor de Era FHC – um balanço e de Marketing Político e Persuasão Eleitoral, o "fato novo" é co-irmão do "fato aloprado". Segundo Toledo, a possibilidade de vir a existir é o que impede a presente eleição de ser considerada "decidida". Eis o que ele escreveu:
"Quando a eleição vira assunto do dia-a-dia, o acesso às informações sobre a campanha é praticamente simultâneo a todo o eleitorado, seja nas capitais, seja no Brasil profundo. Isso pode tanto reforçar tendências quanto provocar alterações bruscas, a partir de um fato inesperado, um `aloprado´. Também por isso não se pode dar a eleição por decidida" (O Estado de S. Paulo, 23/8/2010).
"Tendência só mudará com fato muito relevante"
O decano dos cronistas brasileiros, Carlos Heitor Cony, em seu lugar de destaque na página 2 da Folha de S.Paulo, é econômico no palavrório, generoso nos julgamentos e agourento para um dos polos da disputa presidencial:
"Acontece que nesta atual campanha, com a disparada das intenções de voto para Dilma, ficou escancarada a participação legal e eleitoral de Lula nos comícios e na TV. A vantagem de sua candidata tenderá a subir – a menos que ocorra um fato novo que beneficie o contendor ou bagunce o coreto montado pelo PT" (Folha de S.Paulo, 26/8/2010).
Para o presidente da Arko Advice Pesquisas, Murilo Aragão, tudo pode ser resumido em bem ajeitada metáfora futebolística onde o fato novo esperado pela oposição tem que necessariamente surgir nas asas do extraordinário.
"No entanto, Serra está em grandes dificuldades, pois além de ter que enfrentar circunstâncias adversas, não joga bem para conseguir mudar o quadro atual. É como se o time estivesse jogando no campo do adversário, com a maioria da torcida contra, e jogando mal. Está dependendo do erro do adversário para poder crescer nas pesquisas ou de um fato novo extraordinário" (Murilo Aragão, 26/8/2010).
Mauro Paulino, diretor do Datafolha, resume em apenas 25 palavras a corrida presidencial. Mesmo com roupagem da brevidade, Paulino ressalva a relevância de um fato "muito relevante":
"Mantida a tendência de crescimento da candidata Dilma Rousseff (PT), que só mudará se ocorrer um fato muito relevante, a eleição presidencial terminará no primeiro turno" (O Globo, 27/8/2010).
A quem interessaria?
Coincidência ou não, o fato é que 24 horas depois que Dilma Rousseff abriu 20 pontos de vantagem sobre José Serra, conforme pesquisa divulgada pelo instituto Datafolha, os principais jornais desta sexta-feira (27/8/2010) traziam em suas primeiras páginas as seguintes manchetes:
* Folha de S.Paulo: "Nova quebra de sigilo abre batalha PT-PSDB"
* Estadão: "Suspeitos de violar sigilo de tucanos são blindados pela Receita"
* O Globo: "Núcleo da Receita no ABC devassou dados de 140"
* Jornal do Brasil: "Só um escândalo derruba Dilma"
* Zero Hora: "Oposição se une em ataque ao PT pela quebra de sigilos"
* Veja online: "Quebra de sigilo – Receita vê indícios de esquema para venda de informações sigilosas"
* Época online: "Receita diz que violação é fruto de `esquema´"
* Portal G1/Globo: "Receita vê indícios de `balcão de venda´ de informações fiscais"
* Globo online: "Numa última tentativa, a ordem, ainda que não consensual na campanha tucana, foi de jogar todas as fichas no episódio da violação do sigilo fiscal..."
E a pergunta que se impõe é: as nove manchetes acima relacionadas, todas em torno da quebra de sigilo fiscal de diversas pessoas ligadas ao PSDB, trazem consigo marcas que apontam para o inesperado, o fantástico, o extraordinário?
Mas, antes de responder a esta questão, que é obviamente facílima de responder, há que se utilizar a percepção, a intuição e a inteligência jornalística para responder a outras questões ainda mais importantes:
A quem interessaria (no duro mesmo!) a quebra do sigilo fiscal nos últimos meses de 2009 de Eduardo Jorge Caldas Pereira, vice-presidente do PSDB, de seus companheiros de partido, de Samuel Klein (dono da Casas Bahia) e da apresentadora da TV Globo Ana Maria Braga?
Quem estaria mais necessitado de um balão de oxigênio que atendesse pelo nome fato novo?
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Onde o poder da grande mídia não chega
Reproduzo artigo do professor Venício Lima, publicado no Observatório da Imprensa:
Os incríveis índices de aprovação do presidente Lula e do seu governo e a expectativa de que a candidata por ele apoiada vença as eleições ainda no primeiro turno – agora confirmada pela unanimidade dos institutos de pesquisa de "opinião pública" – vem deixando muita gente boa desorientada.
Teóricos de ocasião e autodesignados "formadores de opinião" estão perdidos diante do insucesso da cobertura de oposição sistematicamente praticada pela grande mídia nos últimos anos – aliás, confirmada pela presidente da ANJ em março passado – e têm oferecido explicações sem sentido para salvar as aparências.
Quem forma a "opinião pública"?
Afinal o que é opinião pública? Qual é o papel da grande mídia na sua formação? Quem são os seus formadores? Qual é o papel da mídia – e, portanto, dos jornalistas – na democracia representativa liberal?
A opinião pública tem sido objeto de estudo e reflexão desde pelo menos o século 18 e, no século 20, passou a fazer parte do debate conceitual e teórico na academia. Mais do que isso, seu significado se tornou objeto da própria disputa política de vez que serve aos interesses privados da grande mídia (a) defini-la como resultado das pesquisas que financia ou faz; (b) atribuir a si mesma o papel de "falar em nome da opinião pública"; e, sobretudo, (c) ser considerada como sua principal formadora.
O que está envolvido em tudo isso, por óbvio, é a disputa pelo poder: o enorme poder de "fazer a cabeça" das pessoas.
Descartada pelo marxismo clássico como falsa consciência e ideologia que mascara o interesse de classe, a opinião pública ocupa um papel central nas chamadas democracias consentidas liberais (G. Sartori), pois é considerada, no plano das idéias, o equivalente ao "preço das mercadorias", uma e outro resultantes da livre competição racional no mercado.
A opinião do cidadão informado e esclarecido surgiria do confronto plural de idéias no processo racional de debate público informado pela mídia. O sujeito da opinião, portanto, não seria o membro alienado de uma "massa", mas o cidadão esclarecido de um "público".
Na perspectiva liberal, caberia à mídia, acima dos interesses em jogo, o papel de fornecer ao público a pluralidade e a diversidade das informações necessárias à formação de sua opinião e, claro, à tomada de decisão política, em geral, e eleitoral, em particular. A liberdade da imprensa seria, portanto, a garantia do fluxo livre de informações, responsável pelo funcionamento do mercado de idéias e, em última instância, da própria democracia representativa.
Os excluídos despertam...
Como explicar, então, que, apesar de estar sendo "bem informada", a maioria da opinião pública brasileira esteja se formando politicamente com opinião oposta àquela explicitamente defendida pela grande mídia, ou seja, favorável não só ao presidente Lula, mas ao seu governo e à sua candidata?
Tenho argumentado a algum tempo que a grande mídia insiste em não enxergar a nova realidade (ver, por exemplo, neste Observatório, "A velha mídia finge que o país não mudou"). Certamente são muitas as explicações para o que vem acontecendo em relação à opinião pública brasileira.
Entre elas, com certeza, está a maior diversidade de fontes de informação política hoje disponível [internet] e o crescimento às vezes imperceptível do nível de consciência de camadas significativas da população sobre a mídia comercial, seu enorme poder e seus interesses. E ainda: a crescente consciência de que a comunicação é um direito fundamental da cidadania.
Jovens da periferia de Brasília
Essa longa reflexão vem a propósito de rápido, mas intenso contato que tive com grupos de jovens e educadores populares da periferia de Brasília, discutindo com eles sobre as relações entre a mídia e a violência durante o seminário "A juventude quer viver: diga não à violência e ao extermínio de jovens", realizado na Universidade Católica de Brasília, no último fim de semana.
O acesso às novas tecnologias e as facilidades de filmar, gravar, produzir sons e imagens e distribuí-los a baixo custo nas próprias comunidades periféricas, cria novos "espaços públicos" externos e fora do alcance da grande mídia.
Um exemplo: chega a ser surpreendente o conteúdo de músicas hip-hop que artistas populares criam descrevendo criticamente o padrão de cobertura que a grande mídia oferece sobre o jovem da periferia dos centros urbanos. Basta a esses artistas o confronto da sua realidade cotidiana com o que se escreve, se fala e se mostra a seu respeito. Revela-se comparativamente para milhões de jovens como o seu cotidiano é omitido ou grosseiramente distorcido. Eles são de fato excluídos e assim se consideram.
Para esses jovens, restrições à liberdade de expressão são uma realidade histórica, só que praticadas não pelo Estado, mas exatamente pela grande mídia que não oferece a eles o acesso e o espaço que deveria ser seu de direito [direito de antena].
Novos tempos
Essa realidade começa a ser mudada, todavia, pelos próprios jovens. E sem qualquer participação da grande mídia: são rádios comunitárias, shows de hip-hop, portais na internet, vídeos e outros recursos que começam a formar redes alternativas de comunicação comunitária a serviço da liberdade de expressão de milhares e milhares de jovens da periferia.
Nestes "espaços públicos" a grande mídia não interfere na formação da opinião. Aqui o conteúdo dos jornalões, das revistas semanais e das redes dominantes de rádio e televisão serve, na verdade, para confirmar a exclusão social e cultural, além de alimentar a crítica conscientizadora.
Talvez esteja aí – nas comunidades organizadas de jovens das periferias das grandes cidades – uma das explicações para o retumbante fracasso da grande mídia na formação da opinião pública em relação ao presidente Lula, ao seu governo e à sua candidata à Presidência.
O tempo dirá.
.
Os incríveis índices de aprovação do presidente Lula e do seu governo e a expectativa de que a candidata por ele apoiada vença as eleições ainda no primeiro turno – agora confirmada pela unanimidade dos institutos de pesquisa de "opinião pública" – vem deixando muita gente boa desorientada.
Teóricos de ocasião e autodesignados "formadores de opinião" estão perdidos diante do insucesso da cobertura de oposição sistematicamente praticada pela grande mídia nos últimos anos – aliás, confirmada pela presidente da ANJ em março passado – e têm oferecido explicações sem sentido para salvar as aparências.
Quem forma a "opinião pública"?
Afinal o que é opinião pública? Qual é o papel da grande mídia na sua formação? Quem são os seus formadores? Qual é o papel da mídia – e, portanto, dos jornalistas – na democracia representativa liberal?
A opinião pública tem sido objeto de estudo e reflexão desde pelo menos o século 18 e, no século 20, passou a fazer parte do debate conceitual e teórico na academia. Mais do que isso, seu significado se tornou objeto da própria disputa política de vez que serve aos interesses privados da grande mídia (a) defini-la como resultado das pesquisas que financia ou faz; (b) atribuir a si mesma o papel de "falar em nome da opinião pública"; e, sobretudo, (c) ser considerada como sua principal formadora.
O que está envolvido em tudo isso, por óbvio, é a disputa pelo poder: o enorme poder de "fazer a cabeça" das pessoas.
Descartada pelo marxismo clássico como falsa consciência e ideologia que mascara o interesse de classe, a opinião pública ocupa um papel central nas chamadas democracias consentidas liberais (G. Sartori), pois é considerada, no plano das idéias, o equivalente ao "preço das mercadorias", uma e outro resultantes da livre competição racional no mercado.
A opinião do cidadão informado e esclarecido surgiria do confronto plural de idéias no processo racional de debate público informado pela mídia. O sujeito da opinião, portanto, não seria o membro alienado de uma "massa", mas o cidadão esclarecido de um "público".
Na perspectiva liberal, caberia à mídia, acima dos interesses em jogo, o papel de fornecer ao público a pluralidade e a diversidade das informações necessárias à formação de sua opinião e, claro, à tomada de decisão política, em geral, e eleitoral, em particular. A liberdade da imprensa seria, portanto, a garantia do fluxo livre de informações, responsável pelo funcionamento do mercado de idéias e, em última instância, da própria democracia representativa.
Os excluídos despertam...
Como explicar, então, que, apesar de estar sendo "bem informada", a maioria da opinião pública brasileira esteja se formando politicamente com opinião oposta àquela explicitamente defendida pela grande mídia, ou seja, favorável não só ao presidente Lula, mas ao seu governo e à sua candidata?
Tenho argumentado a algum tempo que a grande mídia insiste em não enxergar a nova realidade (ver, por exemplo, neste Observatório, "A velha mídia finge que o país não mudou"). Certamente são muitas as explicações para o que vem acontecendo em relação à opinião pública brasileira.
Entre elas, com certeza, está a maior diversidade de fontes de informação política hoje disponível [internet] e o crescimento às vezes imperceptível do nível de consciência de camadas significativas da população sobre a mídia comercial, seu enorme poder e seus interesses. E ainda: a crescente consciência de que a comunicação é um direito fundamental da cidadania.
Jovens da periferia de Brasília
Essa longa reflexão vem a propósito de rápido, mas intenso contato que tive com grupos de jovens e educadores populares da periferia de Brasília, discutindo com eles sobre as relações entre a mídia e a violência durante o seminário "A juventude quer viver: diga não à violência e ao extermínio de jovens", realizado na Universidade Católica de Brasília, no último fim de semana.
O acesso às novas tecnologias e as facilidades de filmar, gravar, produzir sons e imagens e distribuí-los a baixo custo nas próprias comunidades periféricas, cria novos "espaços públicos" externos e fora do alcance da grande mídia.
Um exemplo: chega a ser surpreendente o conteúdo de músicas hip-hop que artistas populares criam descrevendo criticamente o padrão de cobertura que a grande mídia oferece sobre o jovem da periferia dos centros urbanos. Basta a esses artistas o confronto da sua realidade cotidiana com o que se escreve, se fala e se mostra a seu respeito. Revela-se comparativamente para milhões de jovens como o seu cotidiano é omitido ou grosseiramente distorcido. Eles são de fato excluídos e assim se consideram.
Para esses jovens, restrições à liberdade de expressão são uma realidade histórica, só que praticadas não pelo Estado, mas exatamente pela grande mídia que não oferece a eles o acesso e o espaço que deveria ser seu de direito [direito de antena].
Novos tempos
Essa realidade começa a ser mudada, todavia, pelos próprios jovens. E sem qualquer participação da grande mídia: são rádios comunitárias, shows de hip-hop, portais na internet, vídeos e outros recursos que começam a formar redes alternativas de comunicação comunitária a serviço da liberdade de expressão de milhares e milhares de jovens da periferia.
Nestes "espaços públicos" a grande mídia não interfere na formação da opinião. Aqui o conteúdo dos jornalões, das revistas semanais e das redes dominantes de rádio e televisão serve, na verdade, para confirmar a exclusão social e cultural, além de alimentar a crítica conscientizadora.
Talvez esteja aí – nas comunidades organizadas de jovens das periferias das grandes cidades – uma das explicações para o retumbante fracasso da grande mídia na formação da opinião pública em relação ao presidente Lula, ao seu governo e à sua candidata à Presidência.
O tempo dirá.
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segunda-feira, 30 de agosto de 2010
Outro modelo para um outro jornalismo
Reproduzo o instigante artigo de Renato Rovai, publicado na Revista Fórum:
Os veículos tradicionais da mídia comercial brasileira vivem sua maior crise. Não apenas do ponto de vista econômico, mas também no que diz respeito à credibilidade e à própria natureza do negócio que operam.
Por muito tempo detiveram o monopólio da produção e da distribuição da informação – o que lhes garantiu poder político e econômico. Hoje o modelo ruiu por conta das novas tecnologias e por isso alguns veículos radicalizaram seus posicionamentos editoriais, assumindo um discurso mais panfletário e partidarizado.
A verdade é que a política editorial desses veículos não mudou, continua a mesma. Mas agora completamente descarada. Não mudou inclusive porque as famílias que controlam os grupos midiáticos no Brasil são as mesmas há algumas décadas.
Exceção à Rede Record, vinculada à Igreja Universal, as famílias Marinho, Frias, Mesquita, Civita, Saad, Sirotsky e Abravanel estão no ramo há pelo menos três décadas. O último a entrar no grupo foi Silvio Santos, em 1981. Talvez até por esse motivo seja considerado o patinho feio da turma.
O que fez esse grupo perder poder foi principalmente a construção de uma imensa rede de produção colaborativa de informação.
A história começa em março de 1989 quando o britânico Timothy John Berners Lee apresenta ao Conselho Europeu para Pesquisa Nuclear (CERN), instituto localizado em Genebra (Suiça), um projeto denominado “Gerenciamento de informação: uma proposta”. Esse projeto viria a resultar na world wide web (WWW), ou seja, a internet da forma que a conhecemos hoje e que possibilita a troca de pacote de dados via hipertexto. E tem continuidade com a criação, em 17 de dezembro de 1997, por Jorn Barger, do weblog, que depois viria a se tornar o que hoje conhecemos por blogues.
Em 1999, há pouco mais de dez anos, o número de blogues era estimado em menos de 50. No final de 2000, alguns milhares. Atualmente, segundo estudo da Technorati “State of Blogosphere”, existem mais de 130 milhões de blogues.
Essa combinação decretou o fim da era do monopólio da informação. E por mais que os veículos tradicionais de comunicação ainda tenham força para disputar a opinião pública, seu poder relativo é muito menor nesse fim de primeira década do século 21 do que em outros tempos.
A questão que se coloca hoje é como transformar essa nova esfera comunicacional em um espaço mais democrático e democratizante do ponto de vista das relações sociais. Para que isso ocorra, é preciso escapar da lógica do modelo que hoje está em crise.
Atualmente, os veículos dependem fundamentalmente da publicidade para sobreviver. E como diz o velho ditado “manda quem paga a conta”. Ou seja, eles acabam sendo porta-vozes do grande capital.
Há o risco de essa lógica também vir a ser dominante no espaço virtual se o modelo de financiamento da produção e distribuição da informação não for alterado.
Para que isso não aconteça, é fundamental que se entenda que o jornalismo é uma necessidade para que a democracia seja exercida na sociedade contemporânea. E por isso ele não pode ser realizado apenas por veículos que, por conta das suas opções mercadológicas e/ou políticas, consigam atrair grupos privados para financiá-los.
Ao mesmo tempo não se deve supor que, para que haja diversidade informativa, apenas o fomento a iniciativas estatais com vínculos governamentais equilibra as coisas.
O exemplo italiano demonstra o equívoco desta opção. Berlusconi, por exemplo, controla hoje todo o setor privado de comunicação e mais o aparato estatal, transformando a RAI em mais uma de suas empresas. Esse modelo já se mostrou, além de centralizador, viciado e inibidor da ousadia jornalística.
Por isso é preciso diferenciar jornalismo público de estatal. Sua diferença básica é que o primeiro não precisa se relacionar e nem prestar contas ao governo se for realmente público.
Entre as soluções existentes está a de debater quanto a sociedade está disposta a pagar para ter informação de qualidade. Para ter um jornalismo realmente independente.
Na Inglaterra, por exemplo, a principal fonte de recursos da BBC é a licença de 131,50 libras esterlinas ao ano paga por todos os cidadãos que têm um aparelho de TV funcionando.
Isso não quer dizer que é necessária a criação de uma nova taxa no Brasil para financiar a comunicação. Mas ao mesmo tempo seria imprescindível definir uma receita a ser utilizada para o financiamento desse jornalismo.
Que também não precisaria ser como no modelo inglês, em que se construiu uma rede com o gigantismo da BBC. Poderia ser o reconhecimento de que esse jornalismo público já vem acontecendo em diferentes veículos que estão fora da lógica tradicional de mercado. E que precisariam ser estimulados.
Ou seja, reconhecer que tanto na blogosfera quanto na produção impressa e eletromagnética o Brasil já tem uma quantidade grande de veículos que, se incentivados, poderiam gerar uma diversidade informativa que melhoraria em muito a qualidade da nossa democracia.
Um modelo que poderia servir como exemplo é o do financiamento das universidades públicas. Nelas, apesar de os recursos serem públicos, a autonomia e a independência são respeitadas. O que permite nesses espaços uma ampla pluralidade de opiniões.
Para construir um outro jornalismo é fundamental discutir também o seu financiamento. E ao mesmo tempo debater quais deveriam ser os compromissos que este jornalismo radicalmente público deveria assumir com a sociedade.
Entre eles deveriam se destacar o respeito a um código de ética da comunicação pública a ser construído a partir de um amplo debate, tanto entre especialistas da área como em consultas públicas. Um código que se tornaria uma legislação específica.
Também seria compromisso fundamental que a informação produzida por esses veículos fosse de livre circulação. Que não tivesse sua circulação impedida por contratos de direitos autorais restritivos.
A criação deste novo modelo não impediria e nem limitaria a continuidade do modelo comercial tradicional. Ou seja, a informação produzida e distribuída na lógica da mercadoria continuaria existindo, mas não teria exclusividade de mercado. Concorreria com uma outra produção sustentada por todos que necessitam de informação para exercer a cidadania.
Esse debate permite uma série de outras considerações. O que é certo é que o atual momento é o mais rico em possibilidades para que a correlação de forças no espaço da comunicação se altere de forma definitiva. A correlação de forças, neste caso, se dá entre o que é público e o que é privado, e entre o direito à comunicação e ela apenas como mercadoria.
Mas para que essa mudança aconteça é preciso criar mecanismos para que, por um lado, as novas tecnologias de comunicação não sejam completamente controladas pelos grandes grupos. E, por outro, para que essa enorme rede de produtores de informação tenha condições de sobrevivência econômica.
Ambos os desafios são difíceis de enfrentar, mas o segundo é ainda mais complexo porque não se resolve apenas na base da resistência. É preciso se desafiar a construir o novo. Ou seja, um novo modelo. E para que isso aconteça é preciso estar livre para a reinvenção das nossas expectativas.
Não podemos mais pensar em veículos de comunicação como aparelhos ideológicos. Eles devem ser espaços da garantia da multiplicidade.
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Os veículos tradicionais da mídia comercial brasileira vivem sua maior crise. Não apenas do ponto de vista econômico, mas também no que diz respeito à credibilidade e à própria natureza do negócio que operam.
Por muito tempo detiveram o monopólio da produção e da distribuição da informação – o que lhes garantiu poder político e econômico. Hoje o modelo ruiu por conta das novas tecnologias e por isso alguns veículos radicalizaram seus posicionamentos editoriais, assumindo um discurso mais panfletário e partidarizado.
A verdade é que a política editorial desses veículos não mudou, continua a mesma. Mas agora completamente descarada. Não mudou inclusive porque as famílias que controlam os grupos midiáticos no Brasil são as mesmas há algumas décadas.
Exceção à Rede Record, vinculada à Igreja Universal, as famílias Marinho, Frias, Mesquita, Civita, Saad, Sirotsky e Abravanel estão no ramo há pelo menos três décadas. O último a entrar no grupo foi Silvio Santos, em 1981. Talvez até por esse motivo seja considerado o patinho feio da turma.
O que fez esse grupo perder poder foi principalmente a construção de uma imensa rede de produção colaborativa de informação.
A história começa em março de 1989 quando o britânico Timothy John Berners Lee apresenta ao Conselho Europeu para Pesquisa Nuclear (CERN), instituto localizado em Genebra (Suiça), um projeto denominado “Gerenciamento de informação: uma proposta”. Esse projeto viria a resultar na world wide web (WWW), ou seja, a internet da forma que a conhecemos hoje e que possibilita a troca de pacote de dados via hipertexto. E tem continuidade com a criação, em 17 de dezembro de 1997, por Jorn Barger, do weblog, que depois viria a se tornar o que hoje conhecemos por blogues.
Em 1999, há pouco mais de dez anos, o número de blogues era estimado em menos de 50. No final de 2000, alguns milhares. Atualmente, segundo estudo da Technorati “State of Blogosphere”, existem mais de 130 milhões de blogues.
Essa combinação decretou o fim da era do monopólio da informação. E por mais que os veículos tradicionais de comunicação ainda tenham força para disputar a opinião pública, seu poder relativo é muito menor nesse fim de primeira década do século 21 do que em outros tempos.
A questão que se coloca hoje é como transformar essa nova esfera comunicacional em um espaço mais democrático e democratizante do ponto de vista das relações sociais. Para que isso ocorra, é preciso escapar da lógica do modelo que hoje está em crise.
Atualmente, os veículos dependem fundamentalmente da publicidade para sobreviver. E como diz o velho ditado “manda quem paga a conta”. Ou seja, eles acabam sendo porta-vozes do grande capital.
Há o risco de essa lógica também vir a ser dominante no espaço virtual se o modelo de financiamento da produção e distribuição da informação não for alterado.
Para que isso não aconteça, é fundamental que se entenda que o jornalismo é uma necessidade para que a democracia seja exercida na sociedade contemporânea. E por isso ele não pode ser realizado apenas por veículos que, por conta das suas opções mercadológicas e/ou políticas, consigam atrair grupos privados para financiá-los.
Ao mesmo tempo não se deve supor que, para que haja diversidade informativa, apenas o fomento a iniciativas estatais com vínculos governamentais equilibra as coisas.
O exemplo italiano demonstra o equívoco desta opção. Berlusconi, por exemplo, controla hoje todo o setor privado de comunicação e mais o aparato estatal, transformando a RAI em mais uma de suas empresas. Esse modelo já se mostrou, além de centralizador, viciado e inibidor da ousadia jornalística.
Por isso é preciso diferenciar jornalismo público de estatal. Sua diferença básica é que o primeiro não precisa se relacionar e nem prestar contas ao governo se for realmente público.
Entre as soluções existentes está a de debater quanto a sociedade está disposta a pagar para ter informação de qualidade. Para ter um jornalismo realmente independente.
Na Inglaterra, por exemplo, a principal fonte de recursos da BBC é a licença de 131,50 libras esterlinas ao ano paga por todos os cidadãos que têm um aparelho de TV funcionando.
Isso não quer dizer que é necessária a criação de uma nova taxa no Brasil para financiar a comunicação. Mas ao mesmo tempo seria imprescindível definir uma receita a ser utilizada para o financiamento desse jornalismo.
Que também não precisaria ser como no modelo inglês, em que se construiu uma rede com o gigantismo da BBC. Poderia ser o reconhecimento de que esse jornalismo público já vem acontecendo em diferentes veículos que estão fora da lógica tradicional de mercado. E que precisariam ser estimulados.
Ou seja, reconhecer que tanto na blogosfera quanto na produção impressa e eletromagnética o Brasil já tem uma quantidade grande de veículos que, se incentivados, poderiam gerar uma diversidade informativa que melhoraria em muito a qualidade da nossa democracia.
Um modelo que poderia servir como exemplo é o do financiamento das universidades públicas. Nelas, apesar de os recursos serem públicos, a autonomia e a independência são respeitadas. O que permite nesses espaços uma ampla pluralidade de opiniões.
Para construir um outro jornalismo é fundamental discutir também o seu financiamento. E ao mesmo tempo debater quais deveriam ser os compromissos que este jornalismo radicalmente público deveria assumir com a sociedade.
Entre eles deveriam se destacar o respeito a um código de ética da comunicação pública a ser construído a partir de um amplo debate, tanto entre especialistas da área como em consultas públicas. Um código que se tornaria uma legislação específica.
Também seria compromisso fundamental que a informação produzida por esses veículos fosse de livre circulação. Que não tivesse sua circulação impedida por contratos de direitos autorais restritivos.
A criação deste novo modelo não impediria e nem limitaria a continuidade do modelo comercial tradicional. Ou seja, a informação produzida e distribuída na lógica da mercadoria continuaria existindo, mas não teria exclusividade de mercado. Concorreria com uma outra produção sustentada por todos que necessitam de informação para exercer a cidadania.
Esse debate permite uma série de outras considerações. O que é certo é que o atual momento é o mais rico em possibilidades para que a correlação de forças no espaço da comunicação se altere de forma definitiva. A correlação de forças, neste caso, se dá entre o que é público e o que é privado, e entre o direito à comunicação e ela apenas como mercadoria.
Mas para que essa mudança aconteça é preciso criar mecanismos para que, por um lado, as novas tecnologias de comunicação não sejam completamente controladas pelos grandes grupos. E, por outro, para que essa enorme rede de produtores de informação tenha condições de sobrevivência econômica.
Ambos os desafios são difíceis de enfrentar, mas o segundo é ainda mais complexo porque não se resolve apenas na base da resistência. É preciso se desafiar a construir o novo. Ou seja, um novo modelo. E para que isso aconteça é preciso estar livre para a reinvenção das nossas expectativas.
Não podemos mais pensar em veículos de comunicação como aparelhos ideológicos. Eles devem ser espaços da garantia da multiplicidade.
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Aloysio Biondi e as privatizações tucanas
Reproduzo artigo de Flamarion Maués, publicado no blog Escrevinhador:
Em julho passado completaram-se dez anos da morte de Aloysio Biondi, certamente um dos mais importantes jornalistas que o Brasil teve, atuante dos anos 1960 até 2000, quase sempre na área de economia.
Conheci o Aloysio por conta do livro o "Brasil privatizado: um balanço do desmonte do Estado" – o único que ele publicou em vida. Fui o editor do livro, e vou, nesta coluna, contar um pouco do que lembro dessa experiência e, sem maiores pretensões, prestar minha homenagem ao Aloysio.
Em 1998 estávamos no auge das privatizações no Brasil, com o risco iminente de que a Petrobrás, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal também tivessem este destino. Eu era o coordenador editorial da Editora Fundação Perseu Abramo – ligada ao PT – e nas conversas no conselho editorial e no conselho curador da Fundação havia a convicção de que era importante produzir um livro sobre as privatizações, para denunciar o que estava acontecendo e, ao mesmo tempo, servir como uma fonte de informações para o debate sobre o tema, pois não havia uma sistematização dessas informações para o grande público.
Essa preocupação se ligava à ideia de iniciar uma coleção de livros populares, curtos, com liguagem direta, informativos, de preço baixo. Livros voltados para a militância política do PT e dos demais partidos de esquerda que se opunham às privatizações e ao governo FHC. O livro sobre este tema com certeza faria parte dessa coleção. Um dos diferenciais da coleção, imaginávamos, é que queríamos fazer vendas diretas de livros para sindicatos, pois acreditávamos que os livros poderiam ser úteis a eles no debate político com os trabalhadores que representavam e com a sociedade. E também seria uma forma de a nossa editora conseguir chegar a mais gente, ter tiragens e vendas maiores.
Acho que fui eu que sugeri o nome do Aloysio para fazer o livro – mas, como a memória é enganadora, não dou 100% de certeza sobre isso. Eu lia os artigos que ele escrevia então na Folha de S. Paulo, muitos dos quais tratavam das privatizações, e ficava muito impressionado com as informações e as análises que ele fazia, e também com a clareza do seu texto, simples e didático sem ser simplista nem chato. Ele era dos poucos jornalistas que questionavam de modo consistente os pressupostos e os métodos da privatização.
Nunca tinha falado com o Aloysio antes. Consegui o telefone dele e liguei, isso no final de 1998 ou comecinho de 1999. Apresentei-me, falei da ideia do livro e perguntei se ele topava, se tinha interesse em fazer o livro. Ele foi muito simpático e receptivo, estava disposto a encarar o desafio, disse mesmo que já tinha pensado na ideia de fazer um livro sobre o tema, mas, sabe como é, na correria da vida de jornalista, sempre faltava tempo para pôr o plano em andamento.
Marcamos de conversar pessoalmente. Ele veio à editora, que nessa época já estava instalada numa casa na Vila Mariana. Com o seu ar bonachão e simpático, sempre atencioso, eu fui logo conquistado pelo Aloysio. Era difícil dizer não para ele. O Aloysio gostava de conversar, de bater papo, de contar histórias. Cada reunião se transformava em uma agradável conversa, em que eu podia desfrutar um pouco de toda a sua experiência e de seus conhecimentos.
Ele gostou muito da ideia da coleção – que veio a ser batizada de Brasil Urgente –, pois achava importante que o livro tivesse aquelas características que propúnhamos para a coleção: texto sucinto, linguagem direta, muita informação, preço acessível. Propus que ele fizesse um roteiro inicial do livro para podermos discutir melhor como seria o texto, o que seria destacado, coisas que não podiam faltar, etc. Em pouco tempo, talvez uns dez dias, ele mandou o roteiro, que pouco foi modificado. E logo começou o trabalho de ampliar as pesquisas para o livro e iniciar a redação.
Teria que consultar documentos da editora para poder dizer com exatidão quanto tempo ele levou para concluir o livro, mas não foi muito tempo. Na verdade, as ideias básicas do livro já estavam nos artigos que ele escrevia nos jornais. Mas o Aloysio, junto com o Antonio, seu filho, fez uma extensa e exaustiva pesquisa para levantar novas informações e complementar as já existentes. “Levantamos materiais no BNDES, na Petrobras, nos arquivos dos principais jornais, em várias frentes, enfim, para poder aprofundar os temas”, lembra o Antonio. Com esta massa de informações nas mãos, faltava depurá-las e amarrar os diversos aspectos levantados, o que ele fez com entusiasmo e com a sua grande capacidade de trabalho e análise.
Assim, em dois ou três meses, se não estiver enganado, o livro estava escrito. Claro que a etapa final foi um pouco sofrida, eu cobrando a entrega dos originais e ele sempre pedindo uns dias a mais para ver alguns detalhes – ou seja, algo comum na relação editor–autor. Até que ele começou a enviar os originais, mais ou menos um capítulo a cada dia. E o seu método era todo especial, característico de alguém que já tinha passado dos 60 e ainda não se adaptara bem à novidades do email e da internet (em 1999 isso ainda não era tão disseminado como é hoje).
Ele mandava os capítulos por fax. Só que o Aloysio não tinha fax em casa. Ele ia numa papelaria perto do prédio em que morava e de lá passava o fax. E os capítulos iam chegando, eu mandava digitar e em poucos dias tínhamos o livro completo.
O livro era impactante. São menos de cem laudas de texto, mas é um material riquíssimo em informações e em análises que mostravam o alcance e a gravidade do que estava acontecendo no país, com a entrega de mão beijada de um patrimônio construído pela sociedade brasileira durante décadas. O grande mérito do livro – além da liguagem clara e direta – talvez tenha sido o fato de ter sintetizado e reunido as informações que nos permitiram ter uma visão geral do desmonte a que o Estado brasileiro estava sendo submetido, nas comunicações, no setor bancário, no petróleo, na mineração, etc.
Lembro que a Zilah Abramo, na época vice-presidente da Fundação Perseu Abramo, levou o texto para ler em casa e no dia seguinte estava estupefata: “Li o texto à noite e nem dormi direito. Fiquei chocada! O que está acontecendo é muito grave e a gente não tem noção”, foi mais ou menos o que ela me disse. E assim era com a maior parte das pessoas que liam o texto – a mesma reação que os leitores teriam quando o livro foi lançado.
O Brasil privatizado foi o primeiro volume da coleção Brasil Urgente, lançado em abril de 1999 (o livro está disponível gratuitamente neste link. O projeto gráfico da coleção foi feito pelo Gilberto Maringoni – excelente artista gráfico, ilustrador e quadrinhista, além de historiador e jornalista. Para atender aos objetivos propostos, o livro tinha apenas 48 páginas, em um formato que era um híbrido de livro e revista. E o preço de capa era R$ 5, o que hoje deve equivaler a algo como R$ 10.
O livro foi um grande sucesso, tanto na venda para as livrarias e o público em geral, como na venda para os sindicatos – pois aquela ideia de que os sindicatos comprassem livros e os distribuíssem para seus associados de fato deu certo. Houve sindicatos e federações de trabalhadores que encomendaram 10 mil, até 20 mil exemplares. No total, foram mais de 140 mil exemplares vendidos em menos de um ano – dos quais cerca de 80 mil foram vendas diretas para sindicatos. Nessa parte comercial, a pessoa que carregou o piano a ajudou a que se chegasse a esses números foi a Gizele Santos, na época a gerente comercial da editora.
E posso dizer com tranquilidade que o Aloysio recebeu religiosamente os direitos autorais de todos os exemplares vendidos – durante este período ele teve uma fonte de renda extra. Mas vale lembrar também que no caso das vendas para os sindicatos o percentual de direitos autorais era menor, pois a ideia era vender aos sindicatos ao menor preço possível, para viabilizar grandes tiragens. E o Aloysio concordou inteiramente com isso, pois o interesse principal dele não era lucrar com o livro, mas sim fazer com que a obra chegasse ao maior número de pessoas.
E de fato o livro teve um papel político importante, pois serviu de instrumento de denúncia e de mobilização contra as privatizações. Tornou-se uma espécie de cartilha da luta contra as privatizações do governo FHC. Até hoje é usado para estudar esse processo. Além disso, como me lembrou o Antonio, o livro teve uma edição em espanhol, feita no Paraguai pela Frente Sindical y Social e pela editora Generación.
Durante os meses seguintes à publicação do livro, o Aloysio viajou por todo o país fazendo lançamentos e palestras, sempre a convite de sindicatos, federações, associações de trabalhadores, etc. Foi algo que lhe deu muita satisfação, dava para perceber, ele gostava dessas viagens, dos eventos, de falar para grandes plateias sobre o tema, isso lhe dava ânimo e vigor, apesar de ser cansativo.
E quando já estávamos encaminhando a continuação do livro, um segundo volume, veio a morte do Aloysio, repentina, nos pegando de surpresa. Mesmo assim, e também como uma homenagem ao Aloysio, O Brasil privatizado II saiu um pouco depois, feito com base nos seus artigos para os jornais e organizado pelo Antonio Biondi. Mas essa já é outra história.
Enfim, acho que o lançamento do livro foi um momento importante para o Aloysio, ele que já era um jornalista consagrado, com passagens marcantes pelas revistas Visão, Veja, Bundas, Caros Amigos e Revista dos Bancários, e pelos jornais Gazeta Mercantil, DCI, Folha de S. Paulo e Diário Popular. O livro parecia oferecer a possibilidade de uma nova etapa em sua vida profissional, mas que infelizmente durou muito pouco tempo.
A sua morte foi uma perda enorme. O Aloysio podia estar ainda aqui hoje produzindo plenamente, descobrindo informações que só ele conseguia, analisando criticamente o Brasil, e com certeza teria um olhar crítico para diversas questões do governo Lula – apesar de que ele certamente vibraria com o fato de milhões de pessoas terem tido a possibilidade de uma vida mais digna nestes últimos anos.
E para mim, a edição do livro foi uma grande experiência como editor – além de ter me permitido, ainda que por um período curto, desfrutar da amizade de uma grande figura humana. Os filhos e amigos do Aloysio montaram um site muito bom sobre sua vida e obra. Vale a pena visitar.
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Em julho passado completaram-se dez anos da morte de Aloysio Biondi, certamente um dos mais importantes jornalistas que o Brasil teve, atuante dos anos 1960 até 2000, quase sempre na área de economia.
Conheci o Aloysio por conta do livro o "Brasil privatizado: um balanço do desmonte do Estado" – o único que ele publicou em vida. Fui o editor do livro, e vou, nesta coluna, contar um pouco do que lembro dessa experiência e, sem maiores pretensões, prestar minha homenagem ao Aloysio.
Em 1998 estávamos no auge das privatizações no Brasil, com o risco iminente de que a Petrobrás, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal também tivessem este destino. Eu era o coordenador editorial da Editora Fundação Perseu Abramo – ligada ao PT – e nas conversas no conselho editorial e no conselho curador da Fundação havia a convicção de que era importante produzir um livro sobre as privatizações, para denunciar o que estava acontecendo e, ao mesmo tempo, servir como uma fonte de informações para o debate sobre o tema, pois não havia uma sistematização dessas informações para o grande público.
Essa preocupação se ligava à ideia de iniciar uma coleção de livros populares, curtos, com liguagem direta, informativos, de preço baixo. Livros voltados para a militância política do PT e dos demais partidos de esquerda que se opunham às privatizações e ao governo FHC. O livro sobre este tema com certeza faria parte dessa coleção. Um dos diferenciais da coleção, imaginávamos, é que queríamos fazer vendas diretas de livros para sindicatos, pois acreditávamos que os livros poderiam ser úteis a eles no debate político com os trabalhadores que representavam e com a sociedade. E também seria uma forma de a nossa editora conseguir chegar a mais gente, ter tiragens e vendas maiores.
Acho que fui eu que sugeri o nome do Aloysio para fazer o livro – mas, como a memória é enganadora, não dou 100% de certeza sobre isso. Eu lia os artigos que ele escrevia então na Folha de S. Paulo, muitos dos quais tratavam das privatizações, e ficava muito impressionado com as informações e as análises que ele fazia, e também com a clareza do seu texto, simples e didático sem ser simplista nem chato. Ele era dos poucos jornalistas que questionavam de modo consistente os pressupostos e os métodos da privatização.
Nunca tinha falado com o Aloysio antes. Consegui o telefone dele e liguei, isso no final de 1998 ou comecinho de 1999. Apresentei-me, falei da ideia do livro e perguntei se ele topava, se tinha interesse em fazer o livro. Ele foi muito simpático e receptivo, estava disposto a encarar o desafio, disse mesmo que já tinha pensado na ideia de fazer um livro sobre o tema, mas, sabe como é, na correria da vida de jornalista, sempre faltava tempo para pôr o plano em andamento.
Marcamos de conversar pessoalmente. Ele veio à editora, que nessa época já estava instalada numa casa na Vila Mariana. Com o seu ar bonachão e simpático, sempre atencioso, eu fui logo conquistado pelo Aloysio. Era difícil dizer não para ele. O Aloysio gostava de conversar, de bater papo, de contar histórias. Cada reunião se transformava em uma agradável conversa, em que eu podia desfrutar um pouco de toda a sua experiência e de seus conhecimentos.
Ele gostou muito da ideia da coleção – que veio a ser batizada de Brasil Urgente –, pois achava importante que o livro tivesse aquelas características que propúnhamos para a coleção: texto sucinto, linguagem direta, muita informação, preço acessível. Propus que ele fizesse um roteiro inicial do livro para podermos discutir melhor como seria o texto, o que seria destacado, coisas que não podiam faltar, etc. Em pouco tempo, talvez uns dez dias, ele mandou o roteiro, que pouco foi modificado. E logo começou o trabalho de ampliar as pesquisas para o livro e iniciar a redação.
Teria que consultar documentos da editora para poder dizer com exatidão quanto tempo ele levou para concluir o livro, mas não foi muito tempo. Na verdade, as ideias básicas do livro já estavam nos artigos que ele escrevia nos jornais. Mas o Aloysio, junto com o Antonio, seu filho, fez uma extensa e exaustiva pesquisa para levantar novas informações e complementar as já existentes. “Levantamos materiais no BNDES, na Petrobras, nos arquivos dos principais jornais, em várias frentes, enfim, para poder aprofundar os temas”, lembra o Antonio. Com esta massa de informações nas mãos, faltava depurá-las e amarrar os diversos aspectos levantados, o que ele fez com entusiasmo e com a sua grande capacidade de trabalho e análise.
Assim, em dois ou três meses, se não estiver enganado, o livro estava escrito. Claro que a etapa final foi um pouco sofrida, eu cobrando a entrega dos originais e ele sempre pedindo uns dias a mais para ver alguns detalhes – ou seja, algo comum na relação editor–autor. Até que ele começou a enviar os originais, mais ou menos um capítulo a cada dia. E o seu método era todo especial, característico de alguém que já tinha passado dos 60 e ainda não se adaptara bem à novidades do email e da internet (em 1999 isso ainda não era tão disseminado como é hoje).
Ele mandava os capítulos por fax. Só que o Aloysio não tinha fax em casa. Ele ia numa papelaria perto do prédio em que morava e de lá passava o fax. E os capítulos iam chegando, eu mandava digitar e em poucos dias tínhamos o livro completo.
O livro era impactante. São menos de cem laudas de texto, mas é um material riquíssimo em informações e em análises que mostravam o alcance e a gravidade do que estava acontecendo no país, com a entrega de mão beijada de um patrimônio construído pela sociedade brasileira durante décadas. O grande mérito do livro – além da liguagem clara e direta – talvez tenha sido o fato de ter sintetizado e reunido as informações que nos permitiram ter uma visão geral do desmonte a que o Estado brasileiro estava sendo submetido, nas comunicações, no setor bancário, no petróleo, na mineração, etc.
Lembro que a Zilah Abramo, na época vice-presidente da Fundação Perseu Abramo, levou o texto para ler em casa e no dia seguinte estava estupefata: “Li o texto à noite e nem dormi direito. Fiquei chocada! O que está acontecendo é muito grave e a gente não tem noção”, foi mais ou menos o que ela me disse. E assim era com a maior parte das pessoas que liam o texto – a mesma reação que os leitores teriam quando o livro foi lançado.
O Brasil privatizado foi o primeiro volume da coleção Brasil Urgente, lançado em abril de 1999 (o livro está disponível gratuitamente neste link. O projeto gráfico da coleção foi feito pelo Gilberto Maringoni – excelente artista gráfico, ilustrador e quadrinhista, além de historiador e jornalista. Para atender aos objetivos propostos, o livro tinha apenas 48 páginas, em um formato que era um híbrido de livro e revista. E o preço de capa era R$ 5, o que hoje deve equivaler a algo como R$ 10.
O livro foi um grande sucesso, tanto na venda para as livrarias e o público em geral, como na venda para os sindicatos – pois aquela ideia de que os sindicatos comprassem livros e os distribuíssem para seus associados de fato deu certo. Houve sindicatos e federações de trabalhadores que encomendaram 10 mil, até 20 mil exemplares. No total, foram mais de 140 mil exemplares vendidos em menos de um ano – dos quais cerca de 80 mil foram vendas diretas para sindicatos. Nessa parte comercial, a pessoa que carregou o piano a ajudou a que se chegasse a esses números foi a Gizele Santos, na época a gerente comercial da editora.
E posso dizer com tranquilidade que o Aloysio recebeu religiosamente os direitos autorais de todos os exemplares vendidos – durante este período ele teve uma fonte de renda extra. Mas vale lembrar também que no caso das vendas para os sindicatos o percentual de direitos autorais era menor, pois a ideia era vender aos sindicatos ao menor preço possível, para viabilizar grandes tiragens. E o Aloysio concordou inteiramente com isso, pois o interesse principal dele não era lucrar com o livro, mas sim fazer com que a obra chegasse ao maior número de pessoas.
E de fato o livro teve um papel político importante, pois serviu de instrumento de denúncia e de mobilização contra as privatizações. Tornou-se uma espécie de cartilha da luta contra as privatizações do governo FHC. Até hoje é usado para estudar esse processo. Além disso, como me lembrou o Antonio, o livro teve uma edição em espanhol, feita no Paraguai pela Frente Sindical y Social e pela editora Generación.
Durante os meses seguintes à publicação do livro, o Aloysio viajou por todo o país fazendo lançamentos e palestras, sempre a convite de sindicatos, federações, associações de trabalhadores, etc. Foi algo que lhe deu muita satisfação, dava para perceber, ele gostava dessas viagens, dos eventos, de falar para grandes plateias sobre o tema, isso lhe dava ânimo e vigor, apesar de ser cansativo.
E quando já estávamos encaminhando a continuação do livro, um segundo volume, veio a morte do Aloysio, repentina, nos pegando de surpresa. Mesmo assim, e também como uma homenagem ao Aloysio, O Brasil privatizado II saiu um pouco depois, feito com base nos seus artigos para os jornais e organizado pelo Antonio Biondi. Mas essa já é outra história.
Enfim, acho que o lançamento do livro foi um momento importante para o Aloysio, ele que já era um jornalista consagrado, com passagens marcantes pelas revistas Visão, Veja, Bundas, Caros Amigos e Revista dos Bancários, e pelos jornais Gazeta Mercantil, DCI, Folha de S. Paulo e Diário Popular. O livro parecia oferecer a possibilidade de uma nova etapa em sua vida profissional, mas que infelizmente durou muito pouco tempo.
A sua morte foi uma perda enorme. O Aloysio podia estar ainda aqui hoje produzindo plenamente, descobrindo informações que só ele conseguia, analisando criticamente o Brasil, e com certeza teria um olhar crítico para diversas questões do governo Lula – apesar de que ele certamente vibraria com o fato de milhões de pessoas terem tido a possibilidade de uma vida mais digna nestes últimos anos.
E para mim, a edição do livro foi uma grande experiência como editor – além de ter me permitido, ainda que por um período curto, desfrutar da amizade de uma grande figura humana. Os filhos e amigos do Aloysio montaram um site muito bom sobre sua vida e obra. Vale a pena visitar.
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Carta das Mães de Maio aos blogueiros
Reproduzo a carta enviada pelo blog "Mães de Maio", que teve destacada participação no encontro dos blogueiros, nos dias 20, 21 e 22 de agosto:
Nós, Mães de Maio, escrevemos esta mensagem de agradecimento e reflexão sobre o I Encontro Nacional de Blogueiros Progressistas.
Em primeiro lugar, com muito respeito e humildade que é o nosso proceder, agradecemos a confiança pelo convite e a calorosa recepção que tivemos de todas e todos os participantes do encontro. Estamos ainda engatinhando nessa ferramenta que é a blogosfera, a qual acreditamos ser bastante importante para os movimentos sociais e para as comunidades pobres de todo o país. Com ela, já conseguimos romper uma série de barreiras que sempre nos foram colocadas pelos poderosos e pelos detentores do monopólio da comunicação, esta minoria rica e geralmente branca que sempre bloqueou as nossas falas e as nossas idéias de circularem na esfera pública. Porém, há muito o quê avançar...
Nosso cotidiano, que é o cotidiano da maioria da população, é marcado pelo massacre que o capitalismo sempre fez contra nós: desde as senzalas onde nossos irmãos negros, negras e indígenas eram explorados até a morte; até os tempos modernos, quando a chibata se transformou na ditadura do dinheiro e na farda da polícia. Sempre nos foram renegados todos os direitos fundamentais que qualquer ser humano deveria ter assegurado: a começar pelo direito à vida, o direito de ir e vir, o direito à saúde, à moradia, à educação, à cultura e à comunicação livre.
Nós lutamos por igualdade de oportunidades, por justiça e, sobretudo, pelo direito de pensar e viver em liberdade. Sabemos que a democracia que nós vivemos é uma verdadeira farsa, e nós apenas exigimos que ela seja ralizada plenamente.
Sabemos que temos um longo caminho para construir todas as transformações que o povo pobre e negro das periferias tanto precisam. Mesmo na blogosfera, há muito o quê se avançar no sentido de garantir o pleno acesso à internet e a todas as ferramentas que ela possibilita, visando fortalecer verdadeiros canais de comunicação da periferia com a sociedade como um todo, no país e no mundo. Sem o poder de voz, de ação e de decisão da maioria, não haverá nunca uma transformação igualitária e justa, inspirada pela liberdade.
Como propostas imediatas, três das nossas principais bandeiras em relação à blogosfera são:
- Acesso: A garantia do acesso gratuito à internet e à banda larga para toda a população brasileira, principalmente a população pobre.
- Formação: A estruturação de uma rede de oficinas e de formação, crítica e gratuita, que possa efetivamente democratizar a utilização dessas ferramentas (como blogs, sites etc). Orientando também sobre todos os perigos que a mesma blogosfera pode significar.
- Solidariedade: Por fim, apoiamos a criação de uma verdadeira rede de blogs, sites, de apoio jurídico gratuito e de apoio material solidário para os efetivos defensores da democracia e da liberdade, visando nos proteger a todos – principalmente quem se encontra mais ameaçado - frente a criminalização dos trabalhadores pobres e dos movimentos sociais. Se a classe trabalhadora não formos solidários entre nós mesmos, ninguém será por nós!
Apesar de todo o significado do encontro de blogueiros e de várias de seuas propostas, sabemos que todas estas medidas necessárias e urgentes não podem criar a impressão e a euforia de que a blogosfera vá substituir a organização popular e a presença cotidiana nas ruas. Sabemos que uma das principais táticas dos poderosos é incentivar que as pessoas fiquem cada vez mais isoladas entre si, dentro de suas casas, reféns do medo do contato direto nas ruas, onde a vida realmente acontece.
Este esvaziamento de algumas pessoas das ruas (enquanto elas seguem sendo tomadas por pessoas pobre como nós, descartadas pelo capitalismo, e sem qualquer perspectiva de vida digna), por maiores que sejam as ações virtuais, gera a reprodução das desigualdades, das injustiças e da falta de liberdade efetiva no cotidano. Para nós da periferia, isso significa a ampliação da estigmatização, do terror e da impunidade perpetuada contra nós ao longo de todo a história. As ruas passam a ser apenas espaços de passagem, de compras e da violência contra nós que as ocupamos.
Por fim, continuamos repudiando as políticas e práticas de segurança pública no Estado de São Paulo. O troféu “O Corvo”, que foi dado à Judith Brito como uma das principais representantes da “ditadura da mídia” em nosso país, deveria ser dado também a todos Os Corvos que foram e são os responsáveis diretos pelos crimes de maio de 2006 e pelos massacres cotidianos nas periferias de todo o país.
De nossa parte, convocamos a todas e todos os blogueiros que participaram do encontro, que se somem na blogosfera e nas ruas, na luta pela verdade e por justiça referente aos crimes de maio de 2006 e a todos os crimes similares que representam uma verdadeira “ditadura continuada” em plena era da democracia brasileira. Sem pressão popular não haverá os desarquivamentos, os julgamentos e as devidas punições de todos os agentes de estado responsáveis pelas matanças de ontem e de hoje!
Seguiremos lutando cotidianamente, nas ruas, na internet e aonde for, para que o amanhã seja livre! Muito obrigada a todas e todos pelo respeito, pelo carinho e pelo fortalecimento de nossa Luta! Esperamos que, cada vez mais, ela seja uma Luta de todos nós! Seguiremos atentas, conectadas e prontas para lutar. Viva a pressão popular!
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Nós, Mães de Maio, escrevemos esta mensagem de agradecimento e reflexão sobre o I Encontro Nacional de Blogueiros Progressistas.
Em primeiro lugar, com muito respeito e humildade que é o nosso proceder, agradecemos a confiança pelo convite e a calorosa recepção que tivemos de todas e todos os participantes do encontro. Estamos ainda engatinhando nessa ferramenta que é a blogosfera, a qual acreditamos ser bastante importante para os movimentos sociais e para as comunidades pobres de todo o país. Com ela, já conseguimos romper uma série de barreiras que sempre nos foram colocadas pelos poderosos e pelos detentores do monopólio da comunicação, esta minoria rica e geralmente branca que sempre bloqueou as nossas falas e as nossas idéias de circularem na esfera pública. Porém, há muito o quê avançar...
Nosso cotidiano, que é o cotidiano da maioria da população, é marcado pelo massacre que o capitalismo sempre fez contra nós: desde as senzalas onde nossos irmãos negros, negras e indígenas eram explorados até a morte; até os tempos modernos, quando a chibata se transformou na ditadura do dinheiro e na farda da polícia. Sempre nos foram renegados todos os direitos fundamentais que qualquer ser humano deveria ter assegurado: a começar pelo direito à vida, o direito de ir e vir, o direito à saúde, à moradia, à educação, à cultura e à comunicação livre.
Nós lutamos por igualdade de oportunidades, por justiça e, sobretudo, pelo direito de pensar e viver em liberdade. Sabemos que a democracia que nós vivemos é uma verdadeira farsa, e nós apenas exigimos que ela seja ralizada plenamente.
Sabemos que temos um longo caminho para construir todas as transformações que o povo pobre e negro das periferias tanto precisam. Mesmo na blogosfera, há muito o quê se avançar no sentido de garantir o pleno acesso à internet e a todas as ferramentas que ela possibilita, visando fortalecer verdadeiros canais de comunicação da periferia com a sociedade como um todo, no país e no mundo. Sem o poder de voz, de ação e de decisão da maioria, não haverá nunca uma transformação igualitária e justa, inspirada pela liberdade.
Como propostas imediatas, três das nossas principais bandeiras em relação à blogosfera são:
- Acesso: A garantia do acesso gratuito à internet e à banda larga para toda a população brasileira, principalmente a população pobre.
- Formação: A estruturação de uma rede de oficinas e de formação, crítica e gratuita, que possa efetivamente democratizar a utilização dessas ferramentas (como blogs, sites etc). Orientando também sobre todos os perigos que a mesma blogosfera pode significar.
- Solidariedade: Por fim, apoiamos a criação de uma verdadeira rede de blogs, sites, de apoio jurídico gratuito e de apoio material solidário para os efetivos defensores da democracia e da liberdade, visando nos proteger a todos – principalmente quem se encontra mais ameaçado - frente a criminalização dos trabalhadores pobres e dos movimentos sociais. Se a classe trabalhadora não formos solidários entre nós mesmos, ninguém será por nós!
Apesar de todo o significado do encontro de blogueiros e de várias de seuas propostas, sabemos que todas estas medidas necessárias e urgentes não podem criar a impressão e a euforia de que a blogosfera vá substituir a organização popular e a presença cotidiana nas ruas. Sabemos que uma das principais táticas dos poderosos é incentivar que as pessoas fiquem cada vez mais isoladas entre si, dentro de suas casas, reféns do medo do contato direto nas ruas, onde a vida realmente acontece.
Este esvaziamento de algumas pessoas das ruas (enquanto elas seguem sendo tomadas por pessoas pobre como nós, descartadas pelo capitalismo, e sem qualquer perspectiva de vida digna), por maiores que sejam as ações virtuais, gera a reprodução das desigualdades, das injustiças e da falta de liberdade efetiva no cotidano. Para nós da periferia, isso significa a ampliação da estigmatização, do terror e da impunidade perpetuada contra nós ao longo de todo a história. As ruas passam a ser apenas espaços de passagem, de compras e da violência contra nós que as ocupamos.
Por fim, continuamos repudiando as políticas e práticas de segurança pública no Estado de São Paulo. O troféu “O Corvo”, que foi dado à Judith Brito como uma das principais representantes da “ditadura da mídia” em nosso país, deveria ser dado também a todos Os Corvos que foram e são os responsáveis diretos pelos crimes de maio de 2006 e pelos massacres cotidianos nas periferias de todo o país.
De nossa parte, convocamos a todas e todos os blogueiros que participaram do encontro, que se somem na blogosfera e nas ruas, na luta pela verdade e por justiça referente aos crimes de maio de 2006 e a todos os crimes similares que representam uma verdadeira “ditadura continuada” em plena era da democracia brasileira. Sem pressão popular não haverá os desarquivamentos, os julgamentos e as devidas punições de todos os agentes de estado responsáveis pelas matanças de ontem e de hoje!
Seguiremos lutando cotidianamente, nas ruas, na internet e aonde for, para que o amanhã seja livre! Muito obrigada a todas e todos pelo respeito, pelo carinho e pelo fortalecimento de nossa Luta! Esperamos que, cada vez mais, ela seja uma Luta de todos nós! Seguiremos atentas, conectadas e prontas para lutar. Viva a pressão popular!
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José Serra precisa dormir
Por Altamiro Borges
É conhecida a fama de notívago do grão-tucano José Serra. No twitter, suas notinhas de até 140 toques são postadas na madrugada. Num exagero de servilismo, Gilberto Kassab, o prefeito da capital paulista, chegou a dizer que “durmo de paletó para atender às ligações do governador”. Muitos aspones já reclamaram, em tom de brincadeira (será?), que eram acionados as altas horas pelo mandatário centralizador. É desta fama e de suas olheiras que surgiu o apelido de vampiro.
Talvez isto explique porque o presidenciável anda tão atordoado, confuso, errático. Num dia, ele afirma que “não sou oposição nem situação” e que pretende ser o “continuador de Lula”. Noutro dia, ele assume o figurino fascistóide de George Bush ou Álvaro Uribe e faz discursos irritadiços contra o atual governo. Prova desta crise existencial foi quando ele tentou associar a sua imagem à de Lula em plena propaganda eleitoral na televisão. Muitos pensaram: Serra enlouqueceu de vez!
O atestado de óbito da Folha
Até a Folha, que nunca escondeu a torcida pelo candidato, desistiu de entender sua esquizofrenia. Em editorial de 21 de agosto, o jornal jogou a toalha e decretou que “a campanha de Serra parece ter recebido o seu atestado de óbito”. A famíglia Frias, que preferia um candidato direitista sem máscara, não engoliu o “parasitismo político” do jingle da campanha serrista que diz “tira a mão do trabalho do Lula/ tá pegando mal/... Tudo que é coisa do Lula/ a Dilma diz/ é meu, é meu”.
Indignada com a “sem-cerimônia dessa apropriação que extravasa os limites da mistificação marqueteira”, a Folha já anunciou que pulou fora do barco do candidato, que “agora se apresenta como ‘Zé’, no improvável intento de redefinir sua imagem pública... Não é do feitio deste jornal tripudiar sobre quem vê, agora, o peso dos próprios erros, e colhe o que merece. Intolerável, entretanto, é o significado mais profundo desse desesperado espasmo da campanha serrista”.
“A desconstrução já começou”
Pouco a pouco, José Serra vai definhando. O valentão Arthur Virgílio, o jagunço Sérgio Guerra, o riquinho Tasso Jereissati e vários outros “aliados” o abandonam para evitar a contaminação nas suas bases. A própria mídia, seu último bastião, já dá sinais de fadiga diante de uma “candidatura nati-morta”, como aponta o blogueiro Luis Nassif. “Muitas vezes previ que a velha mídia procederia à desconstrução da própria imagem que criou de Serra. E o faria com gana, sentindo-se ludibriada por ter apostado em um cavalo manco. Errei o prazo. A desconstrução já começou”.
Pouco a pouco, o bloco neoliberal-conservador desloca sua atenção para as disputas de governos estaduais e de mandatos legislativos. Serra pode virar mais um caso grotesco de “cristianização”. Caso não ocorra erro grave de campanha, Dilma Rousseff caminha para ser a primeira mulher presidenta do Brasil, dando continuidade ao ciclo progressista aberto por Lula. Ela precisará de sólida base de sustentação nos estados, no Senado e na Câmara Federal. A direita parece que já rifou Serra, que “precisa dormir”, mas já cava suas trincheiras para infernizar o futuro governo.
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É conhecida a fama de notívago do grão-tucano José Serra. No twitter, suas notinhas de até 140 toques são postadas na madrugada. Num exagero de servilismo, Gilberto Kassab, o prefeito da capital paulista, chegou a dizer que “durmo de paletó para atender às ligações do governador”. Muitos aspones já reclamaram, em tom de brincadeira (será?), que eram acionados as altas horas pelo mandatário centralizador. É desta fama e de suas olheiras que surgiu o apelido de vampiro.
Talvez isto explique porque o presidenciável anda tão atordoado, confuso, errático. Num dia, ele afirma que “não sou oposição nem situação” e que pretende ser o “continuador de Lula”. Noutro dia, ele assume o figurino fascistóide de George Bush ou Álvaro Uribe e faz discursos irritadiços contra o atual governo. Prova desta crise existencial foi quando ele tentou associar a sua imagem à de Lula em plena propaganda eleitoral na televisão. Muitos pensaram: Serra enlouqueceu de vez!
O atestado de óbito da Folha
Até a Folha, que nunca escondeu a torcida pelo candidato, desistiu de entender sua esquizofrenia. Em editorial de 21 de agosto, o jornal jogou a toalha e decretou que “a campanha de Serra parece ter recebido o seu atestado de óbito”. A famíglia Frias, que preferia um candidato direitista sem máscara, não engoliu o “parasitismo político” do jingle da campanha serrista que diz “tira a mão do trabalho do Lula/ tá pegando mal/... Tudo que é coisa do Lula/ a Dilma diz/ é meu, é meu”.
Indignada com a “sem-cerimônia dessa apropriação que extravasa os limites da mistificação marqueteira”, a Folha já anunciou que pulou fora do barco do candidato, que “agora se apresenta como ‘Zé’, no improvável intento de redefinir sua imagem pública... Não é do feitio deste jornal tripudiar sobre quem vê, agora, o peso dos próprios erros, e colhe o que merece. Intolerável, entretanto, é o significado mais profundo desse desesperado espasmo da campanha serrista”.
“A desconstrução já começou”
Pouco a pouco, José Serra vai definhando. O valentão Arthur Virgílio, o jagunço Sérgio Guerra, o riquinho Tasso Jereissati e vários outros “aliados” o abandonam para evitar a contaminação nas suas bases. A própria mídia, seu último bastião, já dá sinais de fadiga diante de uma “candidatura nati-morta”, como aponta o blogueiro Luis Nassif. “Muitas vezes previ que a velha mídia procederia à desconstrução da própria imagem que criou de Serra. E o faria com gana, sentindo-se ludibriada por ter apostado em um cavalo manco. Errei o prazo. A desconstrução já começou”.
Pouco a pouco, o bloco neoliberal-conservador desloca sua atenção para as disputas de governos estaduais e de mandatos legislativos. Serra pode virar mais um caso grotesco de “cristianização”. Caso não ocorra erro grave de campanha, Dilma Rousseff caminha para ser a primeira mulher presidenta do Brasil, dando continuidade ao ciclo progressista aberto por Lula. Ela precisará de sólida base de sustentação nos estados, no Senado e na Câmara Federal. A direita parece que já rifou Serra, que “precisa dormir”, mas já cava suas trincheiras para infernizar o futuro governo.
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José Serra: “Que repouse em paz”
Por Altamiro Borges
As últimas pesquisas confirmam que Dilma Rousseff pode vencer a eleição presidencial já no primeiro turno, em 3 de outubro. Até os dois institutos mais alinhados ao tucanato, o Ibope e o Datafolha – que o blogueiro Paulo Henrique Amorim apelidou de Globope e Datafraude – já jogaram a toalha e confessaram a difícil situação de José Serra. O horário eleitoral na rádio e TV, apontado como tábua de salvação do demotucano, acabou afundando ainda mais o candidato.
O ridículo do Globope e do Datafraude
No caso do Ibope, a pesquisa aponta que Dilma Rousseff abriu 24 pontos de vantagem e obrigou o presidente do instituto, Carlos Augusto Montenegro, a fazer autocrítica das suas bravatas. Em entrevista à revista Veja, em agosto de 2009, ele garantiu que “Lula não fará seu sucessor” e que sua candidata não ultrapassaria os 20% dos votos. Agora, na entrevista desta semana da revista IstoÉ, ele admite o “erro” e decreta: “O Brasil já tem um presidente. É Dilma Rousseff”.
Já o Datafolha, numa inusitada virada que mereceria estudo acadêmico e rigorosa averiguação da Justiça Eleitoral, informa que Dilma Rousseff abriu 20 pontos de vantagem sobre seu adversário. O instituto tucano também confirma que ela passou a liderar as sondagens em todas as regiões, inclusive no Sul e Sudeste, e que o José Serra só está crescendo em rejeição. A única capital em que o tucano surge na frente, Curitiba, é motivo de questionamentos sobre o método da pesquisa.
Mídia é o último bastião de Serra
Muita água ainda vai rolar até o dia da eleição. Estrategistas tucanos da mídia venal orientam o candidato a baixar de vez o nível da campanha, assumindo o discurso raivoso da ultradireita. Já o comando demotucano confessa que a mídia é o último bastião de José Serra. A batalha não está decidida e qualquer salto alto pode ser fatal. Apesar da cautela, as pesquisas indicam que o povo não aceita o retrocesso e aposta na continuidade do ciclo progressista aberto pelo governo Lula.
Elas não são um simples atestado de “incompetência” do ex-governador paulista – que está sem discurso, não conseguiu montar palanques estaduais fortes, escolheu um vice “indiota”, e que é arrogante e autoritário. O que as pesquisas revelam é que os brasileiros rejeitam a experiência neoliberal, imposta por FHC e por seu pupilo, Serra, que resultou na explosão de desemprego, na precarizaçao do trabalho, no desmonte do Estado e na humilhação da nação brasileira.
O colapso da “terceira via” neoliberal
A dimensão histórica do desastre demotucano foi bem sintetizada pelo professor José Luis Fiori, no artigo “Requiescat in pace”, publicado no sítio Carta Maior. Para ele, “o que mais chama a atenção não é a derrota em si mesma, é a anorexia ideológica dos últimos herdeiros da ‘terceira via’. Não se trata de incompetência pessoal, nem de um problema de imagem, se trata do colapso final de um projeto político-ideológico eclético e anódino que acabou de maneira inglória: o projeto do neoliberalismo social-democrata. Que repouse em paz!”.
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As últimas pesquisas confirmam que Dilma Rousseff pode vencer a eleição presidencial já no primeiro turno, em 3 de outubro. Até os dois institutos mais alinhados ao tucanato, o Ibope e o Datafolha – que o blogueiro Paulo Henrique Amorim apelidou de Globope e Datafraude – já jogaram a toalha e confessaram a difícil situação de José Serra. O horário eleitoral na rádio e TV, apontado como tábua de salvação do demotucano, acabou afundando ainda mais o candidato.
O ridículo do Globope e do Datafraude
No caso do Ibope, a pesquisa aponta que Dilma Rousseff abriu 24 pontos de vantagem e obrigou o presidente do instituto, Carlos Augusto Montenegro, a fazer autocrítica das suas bravatas. Em entrevista à revista Veja, em agosto de 2009, ele garantiu que “Lula não fará seu sucessor” e que sua candidata não ultrapassaria os 20% dos votos. Agora, na entrevista desta semana da revista IstoÉ, ele admite o “erro” e decreta: “O Brasil já tem um presidente. É Dilma Rousseff”.
Já o Datafolha, numa inusitada virada que mereceria estudo acadêmico e rigorosa averiguação da Justiça Eleitoral, informa que Dilma Rousseff abriu 20 pontos de vantagem sobre seu adversário. O instituto tucano também confirma que ela passou a liderar as sondagens em todas as regiões, inclusive no Sul e Sudeste, e que o José Serra só está crescendo em rejeição. A única capital em que o tucano surge na frente, Curitiba, é motivo de questionamentos sobre o método da pesquisa.
Mídia é o último bastião de Serra
Muita água ainda vai rolar até o dia da eleição. Estrategistas tucanos da mídia venal orientam o candidato a baixar de vez o nível da campanha, assumindo o discurso raivoso da ultradireita. Já o comando demotucano confessa que a mídia é o último bastião de José Serra. A batalha não está decidida e qualquer salto alto pode ser fatal. Apesar da cautela, as pesquisas indicam que o povo não aceita o retrocesso e aposta na continuidade do ciclo progressista aberto pelo governo Lula.
Elas não são um simples atestado de “incompetência” do ex-governador paulista – que está sem discurso, não conseguiu montar palanques estaduais fortes, escolheu um vice “indiota”, e que é arrogante e autoritário. O que as pesquisas revelam é que os brasileiros rejeitam a experiência neoliberal, imposta por FHC e por seu pupilo, Serra, que resultou na explosão de desemprego, na precarizaçao do trabalho, no desmonte do Estado e na humilhação da nação brasileira.
O colapso da “terceira via” neoliberal
A dimensão histórica do desastre demotucano foi bem sintetizada pelo professor José Luis Fiori, no artigo “Requiescat in pace”, publicado no sítio Carta Maior. Para ele, “o que mais chama a atenção não é a derrota em si mesma, é a anorexia ideológica dos últimos herdeiros da ‘terceira via’. Não se trata de incompetência pessoal, nem de um problema de imagem, se trata do colapso final de um projeto político-ideológico eclético e anódino que acabou de maneira inglória: o projeto do neoliberalismo social-democrata. Que repouse em paz!”.
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domingo, 29 de agosto de 2010
Falta futuro para os barões da mídia
Reproduzo excelente artigo de Maurício Thuswohl, publicado no sítio Carta Maior:
Realizado nos dias 19 e 20 de agosto, o 8º Congresso Brasileiro de Jornais foi revelador do momento pelo qual passam os principais conglomerados de comunicação no Brasil. A começar pelo próprio tema, “Jornalismo e Democracia na Era Digital”, o evento organizado pela Associação Nacional de Jornais (ANJ) no Rio de Janeiro foi uma prova viva de que as poucas famílias que controlam os principais jornais do país vêm tendo muitos motivos para se preocupar desde que as novas mídias eletrônicas entraram em cena.
O principal tema de discussão entre os cerca de 700 empresários e profissionais do setor foi a gratuidade do conteúdo jornalístico na internet, curiosamente considerada por muitos dos presentes como “um entrave à democracia”. A própria ANJ, no texto de abertura do congresso, já antecipava sua posição a esse respeito: “O bom jornalismo, que difunde as informações de credibilidade e as opiniões que os cidadãos necessitam para fazer as suas escolhas, resulta de investimentos e deve ser adequadamente remunerado”.
Não é à toa que, este ano, a maior estrela do congresso organizado pelos donos da mídia no Brasil foi o jornalista Robert Thomsom, editor do Wall Street Journal. O jornal dos Estados Unidos se tornou o case de maior sucesso em termos de venda de conteúdo pago via internet. Durante sua palestra, o “guru” não decepcionou: “Precisamos urgentemente voltar ao que era antes. Voltar ao básico, em que as pessoas apreciam o conteúdo jornalístico o suficiente para pagar por ele”, disse.
Outras questões debatidas no congresso foram o fim da Lei de Imprensa e o fim da obrigatoriedade do diploma universitário para o exercício da função de jornalista, destacados como “importantes avanços” pela presidente da ANJ, Judith Brito, que também é diretora-superintendente do Grupo Folha.
Única novidade do congresso, a ANJ apresentou um plano de autorregulamentação do setor, a partir da criação de um conselho dentro da própria associação. A idéia, no entanto, não conta com o entusiasmo sequer do vice-presidente da ANJ, e também vice-presidente das Organizações Globo, João Roberto Marinho: “A autorregulamentação é um princípio muito bom, mas a atividade jornalística é carregada de subjetividades”, disse.
“Perigo na AL”
O grande momento do congresso, no entanto, foi o painel “O Futuro da Democracia e o Jornalismo”, que reuniu o diretor de redação da Folha de SP, Otávio Frias Filho, e o sociólogo e professor da USP Demétrio Magnoli, um daqueles intelectuais que, segundo a ANJ, “difunde as opiniões que os cidadãos necessitam”. Neste debate, a sociedade brasileira foi alertada para o perigo que constitui “a formação de joint-ventures entre companhias de telecomunicação e governos populistas” para controlar a difusão de informações: “Tal perigo ronda, em especial, a América Latina”, afirmou Magnoli.
O sábio neoliberal disse mais: “Vem sendo difundida a teoria de que os jornais são como partidos que fazem parte de um jogo político. Ela surge numa época em que volta a idéia de que o Estado deve falar diretamente às pessoas, evitando a mediação. Essa teoria política dá base a um projeto de jornalismo estatal em curso na América Latina, buscando criar uma imprensa alternativa, principalmente nos meios eletrônicos”.
Frias, por sua vez, estendeu a outros continentes o leque de culpados pela “guinada antidemocrática” no jornalismo mundial: “Vladimir Putin, Ahmadinejad, Chávez, Rafael Corrêa e Evo Morales representam uma erupção de governantes autoritários e populistas que, embora mantendo a aparência de democracia, manietam os poderes Judiciário e Legislativo, além de buscar controlar a imprensa”, disse.
“Conferencismo”
Os candidatos à Presidência Dilma Rousseff (PT), José Serra (PSDB) e Marina Silva (PV) passaram, em momentos diferentes, pelo 8º Congresso Brasileiro de Jornais. Os três presidenciáveis ratificaram a Declaração de Chapultepec, documento firmado em 1994 no México durante uma conferência hemisférica sobre liberdade de imprensa organizada pelos grandes empresários do setor.
Curiosamente, no mesmo dia em que passou pelo congresso da ANJ, Serra deu declarações públicas acusando o governo Lula: “Nos últimos anos, têm havido diversas tentativas de cercear a liberdade de imprensa no Brasil”, disse o tucano, que também fez críticas à 1ª Conferência Nacional de Comunicação, classificada como “parte de um processo de conferencismo pago com o dinheiro público”.
Em resposta a Serra, o ministro Franklin Martins divulgou uma nota pública na qual afirmou que o tucano “faz uma acusação grave e descabida” ao governo: “A imprensa no Brasil é livre. Ela apura - e deixa de apurar - o que quer e publica - e deixa de publicar - o que deseja. Opina - e deixa de opinar - sobre o que bem entende. Todos os brasileiros sabem disso. Diariamente, lêem jornais, ouvem noticiários de rádio e assistem a telejornais que divulgam críticas, procedentes ou não, ao governo. Jornalistas e veículos de imprensa jamais foram incomodados por qualquer tipo de repressão ou represália”, diz a nota.
Orquestra
Os ataques orquestrados ao governo e aos “inimigos da liberdade de imprensa” continuaram nestes últimos dias nos maiores jornais do país com a cobertura do XVI Encontro do Foro de São Paulo, evento do qual participam 54 organizações políticas de esquerda da América Latina e do Caribe. Fazendo referência ao documento final do encontro, que pede a democratização dos meio de comunicação, o jornal O Globo publicou matéria com o singelo título “PT e grupo da AL apóiam controle da mídia”.
Percebe-se pela postura adotada, seja nas páginas de seus veículos ou no congresso da ANJ, que os barões da mídia no Brasil, acossados em seu próprio domínio, começam a atirar para todos os lados em uma clara demonstração de que não sabem mais para onde ir. Qualquer semelhança com a campanha do candidato a presidente por eles apoiado não é mera coincidência. E pensar que, logo após o congresso da ANJ, foi realizado em São Paulo o 1º Encontro Nacional de Blogueiros Progressistas, que reuniu cerca de 300 blogueiros em defesa da liberdade de expressão, da democratização da comunicação e da universalização da banda larga no Brasil. Como se vê, apesar das preocupações conservadoras, ninguém pode deter o futuro.
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Realizado nos dias 19 e 20 de agosto, o 8º Congresso Brasileiro de Jornais foi revelador do momento pelo qual passam os principais conglomerados de comunicação no Brasil. A começar pelo próprio tema, “Jornalismo e Democracia na Era Digital”, o evento organizado pela Associação Nacional de Jornais (ANJ) no Rio de Janeiro foi uma prova viva de que as poucas famílias que controlam os principais jornais do país vêm tendo muitos motivos para se preocupar desde que as novas mídias eletrônicas entraram em cena.
O principal tema de discussão entre os cerca de 700 empresários e profissionais do setor foi a gratuidade do conteúdo jornalístico na internet, curiosamente considerada por muitos dos presentes como “um entrave à democracia”. A própria ANJ, no texto de abertura do congresso, já antecipava sua posição a esse respeito: “O bom jornalismo, que difunde as informações de credibilidade e as opiniões que os cidadãos necessitam para fazer as suas escolhas, resulta de investimentos e deve ser adequadamente remunerado”.
Não é à toa que, este ano, a maior estrela do congresso organizado pelos donos da mídia no Brasil foi o jornalista Robert Thomsom, editor do Wall Street Journal. O jornal dos Estados Unidos se tornou o case de maior sucesso em termos de venda de conteúdo pago via internet. Durante sua palestra, o “guru” não decepcionou: “Precisamos urgentemente voltar ao que era antes. Voltar ao básico, em que as pessoas apreciam o conteúdo jornalístico o suficiente para pagar por ele”, disse.
Outras questões debatidas no congresso foram o fim da Lei de Imprensa e o fim da obrigatoriedade do diploma universitário para o exercício da função de jornalista, destacados como “importantes avanços” pela presidente da ANJ, Judith Brito, que também é diretora-superintendente do Grupo Folha.
Única novidade do congresso, a ANJ apresentou um plano de autorregulamentação do setor, a partir da criação de um conselho dentro da própria associação. A idéia, no entanto, não conta com o entusiasmo sequer do vice-presidente da ANJ, e também vice-presidente das Organizações Globo, João Roberto Marinho: “A autorregulamentação é um princípio muito bom, mas a atividade jornalística é carregada de subjetividades”, disse.
“Perigo na AL”
O grande momento do congresso, no entanto, foi o painel “O Futuro da Democracia e o Jornalismo”, que reuniu o diretor de redação da Folha de SP, Otávio Frias Filho, e o sociólogo e professor da USP Demétrio Magnoli, um daqueles intelectuais que, segundo a ANJ, “difunde as opiniões que os cidadãos necessitam”. Neste debate, a sociedade brasileira foi alertada para o perigo que constitui “a formação de joint-ventures entre companhias de telecomunicação e governos populistas” para controlar a difusão de informações: “Tal perigo ronda, em especial, a América Latina”, afirmou Magnoli.
O sábio neoliberal disse mais: “Vem sendo difundida a teoria de que os jornais são como partidos que fazem parte de um jogo político. Ela surge numa época em que volta a idéia de que o Estado deve falar diretamente às pessoas, evitando a mediação. Essa teoria política dá base a um projeto de jornalismo estatal em curso na América Latina, buscando criar uma imprensa alternativa, principalmente nos meios eletrônicos”.
Frias, por sua vez, estendeu a outros continentes o leque de culpados pela “guinada antidemocrática” no jornalismo mundial: “Vladimir Putin, Ahmadinejad, Chávez, Rafael Corrêa e Evo Morales representam uma erupção de governantes autoritários e populistas que, embora mantendo a aparência de democracia, manietam os poderes Judiciário e Legislativo, além de buscar controlar a imprensa”, disse.
“Conferencismo”
Os candidatos à Presidência Dilma Rousseff (PT), José Serra (PSDB) e Marina Silva (PV) passaram, em momentos diferentes, pelo 8º Congresso Brasileiro de Jornais. Os três presidenciáveis ratificaram a Declaração de Chapultepec, documento firmado em 1994 no México durante uma conferência hemisférica sobre liberdade de imprensa organizada pelos grandes empresários do setor.
Curiosamente, no mesmo dia em que passou pelo congresso da ANJ, Serra deu declarações públicas acusando o governo Lula: “Nos últimos anos, têm havido diversas tentativas de cercear a liberdade de imprensa no Brasil”, disse o tucano, que também fez críticas à 1ª Conferência Nacional de Comunicação, classificada como “parte de um processo de conferencismo pago com o dinheiro público”.
Em resposta a Serra, o ministro Franklin Martins divulgou uma nota pública na qual afirmou que o tucano “faz uma acusação grave e descabida” ao governo: “A imprensa no Brasil é livre. Ela apura - e deixa de apurar - o que quer e publica - e deixa de publicar - o que deseja. Opina - e deixa de opinar - sobre o que bem entende. Todos os brasileiros sabem disso. Diariamente, lêem jornais, ouvem noticiários de rádio e assistem a telejornais que divulgam críticas, procedentes ou não, ao governo. Jornalistas e veículos de imprensa jamais foram incomodados por qualquer tipo de repressão ou represália”, diz a nota.
Orquestra
Os ataques orquestrados ao governo e aos “inimigos da liberdade de imprensa” continuaram nestes últimos dias nos maiores jornais do país com a cobertura do XVI Encontro do Foro de São Paulo, evento do qual participam 54 organizações políticas de esquerda da América Latina e do Caribe. Fazendo referência ao documento final do encontro, que pede a democratização dos meio de comunicação, o jornal O Globo publicou matéria com o singelo título “PT e grupo da AL apóiam controle da mídia”.
Percebe-se pela postura adotada, seja nas páginas de seus veículos ou no congresso da ANJ, que os barões da mídia no Brasil, acossados em seu próprio domínio, começam a atirar para todos os lados em uma clara demonstração de que não sabem mais para onde ir. Qualquer semelhança com a campanha do candidato a presidente por eles apoiado não é mera coincidência. E pensar que, logo após o congresso da ANJ, foi realizado em São Paulo o 1º Encontro Nacional de Blogueiros Progressistas, que reuniu cerca de 300 blogueiros em defesa da liberdade de expressão, da democratização da comunicação e da universalização da banda larga no Brasil. Como se vê, apesar das preocupações conservadoras, ninguém pode deter o futuro.
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A mídia é o prato do restaurante canibal
Reproduzo artigo de Breno Altman, publicado no sítio Opera Mundi:
O trabalho eficaz de dois jornalistas, Pedro Aguiar e Laisa Beatris, profissionais da redação de Opera Mundi, trouxe ontem (26/08) a público caso vergonhoso de colonialismo cultural e abuso da boa-fé dos leitores. A história, que pode ser lida no artigo “Mídia internacional ignora indícios de fraude e publica notícia sobre restaurante canibal”, revela o estado de indigência que afeta parte da imprensa mundial.
Tudo começou quando um político alemão denunciou, ao diário sensacionalista Bild, a existência de restaurante brasileiro, chamado Flimé, no estado de Rondônia, que oferecia carne humana e estaria planejando abrir filial em Berlim. O vereador Michael Braun, dirigente local da União Cristão-Democrática, alegando ter recebido informação de eleitores, protestou contra as intenções do famigerado estabelecimento.
A origem primária das denúncias, logo se soube, estaria em vídeo e página divulgados pela internet. Os autores, provavelmente de nacionalidade portuguesa, talvez na intenção de se vingar das piadas contra seus patrícios, resolveram armar pegadinha contra os brasileiros. No jargão da rede, chama-se essa informação forjada de hoax.
O mais incrível é que a existência do restaurante canibal imediatamente se espalhou entre diversas agências e veículos do planeta. O inglês The Guardian, a espanhola Efe, a italiana Ansa, a alemã Der Spiegel e o português Expresso estão entre as publicações que caíram no engodo. Também comprou gato por lebre a brasileira Folha.com. A reportagem de Opera Mundi provou que não há canibalismo nem restaurante algum.
Aparentemente nenhuma das redações enroladas pelo conto dos portugueses se deu ao trabalho de apurar história tão escabrosa. O restaurante não foi checado. Não se analisou com rigor a gravação que circulou no You Tube. A página web que anunciava as estranhas iguarias tampouco recebeu o devido escrutínio.
Não é a primeira vez que importantes meios de comunicação metem o pé na jaca. A revista Veja, em abril de 1983, publicou matéria anunciando a fusão da carne de boi com o tomate, depois de cair em uma brincadeira da revista inglesa New Science, preparada para celebrar o dia da mentira. O caso Boimate, como é conhecido, entrou para a mitologia jornalística como a maior “barriga” (notícia inverídica) de todos os tempos. O affair Flimé tem grandes chances de roubar-lhe o lugar no pódio.
O problema não é apenas a preguiça dos jornalistas que deram ares de verdade à denúncia fajuta. A substituição da informação pelo espetáculo, de fato, tem poder tóxico sobre a inteligência da imprensa e contamina sua disposição de pegar no batente. Mas, é evidente, nesta situação também jogou peso decisivo a arrogância colonial dos brancos de olhos azuis. Canibalismo no Brasil? Terceiro Mundo? Terra de índios, negros e mulatos? Pau na maquina, que se não for verdadeiro, ao menos está bem contado.
A barrigada, que deveria provocar indignação da mídia brasileira e resposta à altura do governo, porque difama a imagem internacional do país, diz muito a respeito de como funcionam os monopólios mundiais da comunicação. Seus donos e operadores, de tão imbuídos do papel de vanguarda cultural do colonialismo, não perdem sequer uma história da carochinha para demonstrar a suposta primazia civilizatória das nações ricas sobre os povos do sul.
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O trabalho eficaz de dois jornalistas, Pedro Aguiar e Laisa Beatris, profissionais da redação de Opera Mundi, trouxe ontem (26/08) a público caso vergonhoso de colonialismo cultural e abuso da boa-fé dos leitores. A história, que pode ser lida no artigo “Mídia internacional ignora indícios de fraude e publica notícia sobre restaurante canibal”, revela o estado de indigência que afeta parte da imprensa mundial.
Tudo começou quando um político alemão denunciou, ao diário sensacionalista Bild, a existência de restaurante brasileiro, chamado Flimé, no estado de Rondônia, que oferecia carne humana e estaria planejando abrir filial em Berlim. O vereador Michael Braun, dirigente local da União Cristão-Democrática, alegando ter recebido informação de eleitores, protestou contra as intenções do famigerado estabelecimento.
A origem primária das denúncias, logo se soube, estaria em vídeo e página divulgados pela internet. Os autores, provavelmente de nacionalidade portuguesa, talvez na intenção de se vingar das piadas contra seus patrícios, resolveram armar pegadinha contra os brasileiros. No jargão da rede, chama-se essa informação forjada de hoax.
O mais incrível é que a existência do restaurante canibal imediatamente se espalhou entre diversas agências e veículos do planeta. O inglês The Guardian, a espanhola Efe, a italiana Ansa, a alemã Der Spiegel e o português Expresso estão entre as publicações que caíram no engodo. Também comprou gato por lebre a brasileira Folha.com. A reportagem de Opera Mundi provou que não há canibalismo nem restaurante algum.
Aparentemente nenhuma das redações enroladas pelo conto dos portugueses se deu ao trabalho de apurar história tão escabrosa. O restaurante não foi checado. Não se analisou com rigor a gravação que circulou no You Tube. A página web que anunciava as estranhas iguarias tampouco recebeu o devido escrutínio.
Não é a primeira vez que importantes meios de comunicação metem o pé na jaca. A revista Veja, em abril de 1983, publicou matéria anunciando a fusão da carne de boi com o tomate, depois de cair em uma brincadeira da revista inglesa New Science, preparada para celebrar o dia da mentira. O caso Boimate, como é conhecido, entrou para a mitologia jornalística como a maior “barriga” (notícia inverídica) de todos os tempos. O affair Flimé tem grandes chances de roubar-lhe o lugar no pódio.
O problema não é apenas a preguiça dos jornalistas que deram ares de verdade à denúncia fajuta. A substituição da informação pelo espetáculo, de fato, tem poder tóxico sobre a inteligência da imprensa e contamina sua disposição de pegar no batente. Mas, é evidente, nesta situação também jogou peso decisivo a arrogância colonial dos brancos de olhos azuis. Canibalismo no Brasil? Terceiro Mundo? Terra de índios, negros e mulatos? Pau na maquina, que se não for verdadeiro, ao menos está bem contado.
A barrigada, que deveria provocar indignação da mídia brasileira e resposta à altura do governo, porque difama a imagem internacional do país, diz muito a respeito de como funcionam os monopólios mundiais da comunicação. Seus donos e operadores, de tão imbuídos do papel de vanguarda cultural do colonialismo, não perdem sequer uma história da carochinha para demonstrar a suposta primazia civilizatória das nações ricas sobre os povos do sul.
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Blogues assumem a contra-informação
Reproduzo entrevista de Rodrigo Vianna concedida à Radioagência Notícias do Planalto:
323 jornalistas e comunicadores se juntaram para discutir o poder e o alcance dos blogues e debater a comunicação – de maneira geral – em São Paulo (SP), durante o 1º Encontro Nacional de Blogueiros Progressistas. O encontro ocorrido entre os dias 20 e 22 de agosto aproximou uma rede em expansão na internet de blogueiros conhecidos por fazerem o contraponto jornalístico dos fatos e opiniões da grande mídia.
Os jornalistas se classificam como independentes e ativistas dos movimentos sociais. O uso do blog foi a maneira que encontraram para driblar o bloqueio midiático a determinados assuntos e combater a concentração dos veículos de comunicação no Brasil.
A Radioagência NP conversou sobre o Encontro de Blogueiros com um dos organizadores do evento, o jornalista Rodrigo Vianna. Rodrigo também é diretor de Comunicação do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, que articulou o fórum:
Rodrigo, a partir do encontro, os blogueiros se dispuseram a fazer reuniões em pelo menos 19 estados brasileiros. Você considera que esse primeiro encontro foi um marco da comunicação social no Brasil?
Sim, foi um marco da comunicação no Brasil, inclusive isso acabou entrando até na agenda da campanha eleitoral. Um dos candidatos que está meio nervoso nas últimas semanas chegou a fazer uma declaração desqualificando os blogues. Mas, na verdade, passou um recibo da importância relativa que os blogues já tem no debate em comunicação no Brasil. Em muitas cidades há dezenas de blogueiros que conseguem ser um contraponto à imprensa escrita tradicional, ou seja, a velha imprensa brasileira que é controlada por meia dúzia de famílias. Então é um marco porque ele colocou frente a frente as pessoas que estão fazendo esse contraponto e essa rede dos blogueiros, que já é forte, vai ficar mais forte ainda a partir do Encontro.
O que seria o Partido da Imprensa Golpista (PIG)?
Olha esse termo PIG, que é um termo bem-humorado para se referir a esse Partido da Imprensa Golpista, surgiu a partir de um discurso de um deputado federal Fernando Ferro (PT/PE). Ele estava fazendo justamente a análise da grande imprensa brasileira, no momento específico de 2005 e 2006, e isso criou uma onda que aparentemente queria derrubar o governo federal. E a partir disso o jornalista Paulo Henrique Amorim cunhou esse termo PIG e a gente usa esse termo nos blogues para se referir a essa velha imprensa, que tem tido um papel no mínimo complicado nos últimos anos no Brasil.
Como a afirmação de Serra sobre os “blogues sujos” foi recebido pelos Blogueiros Progressistas?
Foi tratado na base da galhofa que é como merece ser tratado um candidato se referir dessa maneira aos blogues, ele que tem uma relação tão próxima com a velha imprensa. Ele na verdade fez o porta-voz da velha imprensa. A gente já não sabe mais se a imprensa que é porta-voz desse candidato ou se ele é porta-voz da velha imprensa. Então foi tratado assim na base da galhofa porque não dá pra levar a sério um negócio desse.
O blog Cloaca News vai pedir explicações de Serra na Justiça sobre o que seria "os blogues", é isso?
É, vai pedir que ele nomeie, pois ele fez uma referência genérica. Aí o Cloaca News - que é um blog que mistura investigação com bom humor - disse que vai interpelar o Serra judicialmente, para que o candidato diga quem são esses blogues que ele considera “blogues sujos”. E o Paulo Henrique Amorim, durante o Encontro de Blogueiros, propôs que a gente desse um prêmio ao Serra de twittero cascão por disseminar sujeiras em certos momentos pela rede de computadores.
Como você avalia o papel dos blogues nesta eleição?
Aquilo que a gente faz é um contraponto, eles já não falam sozinhos. De 2005 para cá, os jornais e as revistas - que eu chamo de velha imprensa - caminharam de um lado só. Todos passaram a fazer oposição ao governo federal. Não que o governo não mereça críticas, há muitos temas em que a crítica deve ser feita e quando há corrupção o jornalista tem que mostrar, mas foi uma coisa unilateral. A tal ponto que a presidenta da Associação Nacional dos Jornais (ANJ), Judith Brito, que é também diretora da Folha de S. Paulo, disse que dada a fragilidade da oposição partidária a imprensa passava a fazer o papel de oposição. Eles dizem que são isentos, mas não existe essa história de isenção completa na imprensa. Eu acho que a pessoa pode ter um lado, mas deve se prender a verdade factual. Por isso que os blogues crescem tanto, por culpa também do péssimo serviço de informação que a velha imprensa brasileira faz em nosso país.
Durante o encontro vocês também deixaram claro o apoio à Ação Direta de Inscontitucionalidade (Adin), que o jurista Fábio Konder Comparato entrou no Supremo Tribunal Federal. Essa ADIN é para regulamentar artigos da Constituição sobre comunicação?
O professor Fábio Konder Comparato vai ingressar, ele ainda não ingressou. Ele vai ingressar em nome de entidades na área de comunicação, com apoio de centrais sindicais e sindicatos e dos blogueiros do Encontro Nacional dos Blogueiros. É uma ação pedindo que o Estado faça cumprir o que está na Constituição. Há vários artigos da área de comunicação que não são cumpridos, por exemplo, o que diz que não pode existir oligopólio e propriedade cruzada dos meios de comunicação. [Hoje] uma única família é dona do rádio, da televisão, do jornal, da internet, da TV a cabo. Não dá. É muito poder concentrado e a Constituição veda isso. Mas o Brasil não coloca isso em prática por causa do poder dessas famílias. Então o Brasil tem que questionar o poder dessa meia dúzia de famílias que ainda mandam na comunicação brasileira.
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323 jornalistas e comunicadores se juntaram para discutir o poder e o alcance dos blogues e debater a comunicação – de maneira geral – em São Paulo (SP), durante o 1º Encontro Nacional de Blogueiros Progressistas. O encontro ocorrido entre os dias 20 e 22 de agosto aproximou uma rede em expansão na internet de blogueiros conhecidos por fazerem o contraponto jornalístico dos fatos e opiniões da grande mídia.
Os jornalistas se classificam como independentes e ativistas dos movimentos sociais. O uso do blog foi a maneira que encontraram para driblar o bloqueio midiático a determinados assuntos e combater a concentração dos veículos de comunicação no Brasil.
A Radioagência NP conversou sobre o Encontro de Blogueiros com um dos organizadores do evento, o jornalista Rodrigo Vianna. Rodrigo também é diretor de Comunicação do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, que articulou o fórum:
Rodrigo, a partir do encontro, os blogueiros se dispuseram a fazer reuniões em pelo menos 19 estados brasileiros. Você considera que esse primeiro encontro foi um marco da comunicação social no Brasil?
Sim, foi um marco da comunicação no Brasil, inclusive isso acabou entrando até na agenda da campanha eleitoral. Um dos candidatos que está meio nervoso nas últimas semanas chegou a fazer uma declaração desqualificando os blogues. Mas, na verdade, passou um recibo da importância relativa que os blogues já tem no debate em comunicação no Brasil. Em muitas cidades há dezenas de blogueiros que conseguem ser um contraponto à imprensa escrita tradicional, ou seja, a velha imprensa brasileira que é controlada por meia dúzia de famílias. Então é um marco porque ele colocou frente a frente as pessoas que estão fazendo esse contraponto e essa rede dos blogueiros, que já é forte, vai ficar mais forte ainda a partir do Encontro.
O que seria o Partido da Imprensa Golpista (PIG)?
Olha esse termo PIG, que é um termo bem-humorado para se referir a esse Partido da Imprensa Golpista, surgiu a partir de um discurso de um deputado federal Fernando Ferro (PT/PE). Ele estava fazendo justamente a análise da grande imprensa brasileira, no momento específico de 2005 e 2006, e isso criou uma onda que aparentemente queria derrubar o governo federal. E a partir disso o jornalista Paulo Henrique Amorim cunhou esse termo PIG e a gente usa esse termo nos blogues para se referir a essa velha imprensa, que tem tido um papel no mínimo complicado nos últimos anos no Brasil.
Como a afirmação de Serra sobre os “blogues sujos” foi recebido pelos Blogueiros Progressistas?
Foi tratado na base da galhofa que é como merece ser tratado um candidato se referir dessa maneira aos blogues, ele que tem uma relação tão próxima com a velha imprensa. Ele na verdade fez o porta-voz da velha imprensa. A gente já não sabe mais se a imprensa que é porta-voz desse candidato ou se ele é porta-voz da velha imprensa. Então foi tratado assim na base da galhofa porque não dá pra levar a sério um negócio desse.
O blog Cloaca News vai pedir explicações de Serra na Justiça sobre o que seria "os blogues", é isso?
É, vai pedir que ele nomeie, pois ele fez uma referência genérica. Aí o Cloaca News - que é um blog que mistura investigação com bom humor - disse que vai interpelar o Serra judicialmente, para que o candidato diga quem são esses blogues que ele considera “blogues sujos”. E o Paulo Henrique Amorim, durante o Encontro de Blogueiros, propôs que a gente desse um prêmio ao Serra de twittero cascão por disseminar sujeiras em certos momentos pela rede de computadores.
Como você avalia o papel dos blogues nesta eleição?
Aquilo que a gente faz é um contraponto, eles já não falam sozinhos. De 2005 para cá, os jornais e as revistas - que eu chamo de velha imprensa - caminharam de um lado só. Todos passaram a fazer oposição ao governo federal. Não que o governo não mereça críticas, há muitos temas em que a crítica deve ser feita e quando há corrupção o jornalista tem que mostrar, mas foi uma coisa unilateral. A tal ponto que a presidenta da Associação Nacional dos Jornais (ANJ), Judith Brito, que é também diretora da Folha de S. Paulo, disse que dada a fragilidade da oposição partidária a imprensa passava a fazer o papel de oposição. Eles dizem que são isentos, mas não existe essa história de isenção completa na imprensa. Eu acho que a pessoa pode ter um lado, mas deve se prender a verdade factual. Por isso que os blogues crescem tanto, por culpa também do péssimo serviço de informação que a velha imprensa brasileira faz em nosso país.
Durante o encontro vocês também deixaram claro o apoio à Ação Direta de Inscontitucionalidade (Adin), que o jurista Fábio Konder Comparato entrou no Supremo Tribunal Federal. Essa ADIN é para regulamentar artigos da Constituição sobre comunicação?
O professor Fábio Konder Comparato vai ingressar, ele ainda não ingressou. Ele vai ingressar em nome de entidades na área de comunicação, com apoio de centrais sindicais e sindicatos e dos blogueiros do Encontro Nacional dos Blogueiros. É uma ação pedindo que o Estado faça cumprir o que está na Constituição. Há vários artigos da área de comunicação que não são cumpridos, por exemplo, o que diz que não pode existir oligopólio e propriedade cruzada dos meios de comunicação. [Hoje] uma única família é dona do rádio, da televisão, do jornal, da internet, da TV a cabo. Não dá. É muito poder concentrado e a Constituição veda isso. Mas o Brasil não coloca isso em prática por causa do poder dessas famílias. Então o Brasil tem que questionar o poder dessa meia dúzia de famílias que ainda mandam na comunicação brasileira.
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Um belo vídeo do encontro dos blogueiros
Reproduzo vídeo e texto postados no blog "optremdastreze":
Eu nunca tive uma moto. Até já pensei em ter uma mas não pude.Quem é amante deste tipo de transporte diz que não há nada mais próximo da sensação de plenitude da liberdade do que estar em uma dessas. Seja lá guiando ou mesmo na garupa (sai fora Serra! Aqui na minha não!). Diz-se que com uma moto se vai longe no espaço, se perde no tempo e se realiza nos sonhos da nossa vida e olhe que são duas rodas só!
Bem... Eu então estou duplamente liberto pois vivo sobre quatro rodinhas, bem pequenas, mas o fato é que me sinto hoje mais livre do que nunca fui! Vou aonde quero, escolho os destinos, os endereços, me exprimo, me expresso, me exponho, escrevo, leio tudo, opino, concordo, discordo e convivo com o mundo e o que nele há de importante: Eu convivo com gente! Mesmo que virtualmente, eu sei bem que estão lá!
E não é que o virtual deu de virar "carne e osso"?
Foi o que aconteceu no 1° Encontro Nacional de Blogueiros Progressistas. Acho que os demais participantes já disseram muito ou quase tudo sobre o que deveria ser dito do evento, porém eu prefiro falar das pessoas. Pessoa, palavra bendita que além de nome de poeta tem no poeta Gonzaguinha o seu maior "publischer" (óia só!). Ele colocava a palavra pessoa praticamente em todas as suas canções, podem procurar e verão! Pra quem mal sai de casa e de dois anos pra cá resolveu escrever para ver o mundo, esse Encontro de Pessoas Blogueiras foi para esse "ralezento maquinista de trem" uma catárse! Eu resumiria tudo na frase que ouvi do "Esquerdopata":
- Pô meu! Quanta gente me conhece! Eu que não sou conhecido por ninguém nem na minha rua! Fiquei surpreso e abismado!
Eu também senti isso, e pude constatar mais uma vez e pessoalmente que a minha velha tese não falha: Nós somos aquilo que escrevemos! A cada abraço, a cada conversa, a cada olhar, a cada sorriso provamos isso todos e a cada um de nós mesmos. Percebemos docemente da magia do toque, o toque de tocar e de ser tocado. Eu fui tocado profundamente no coração por cada um dos que lá estavam e foi lindo! Tanta demonstração de carinho! Tanta gentileza! Tanta dedicação! Tanta emoção! Doação! Tanto... amor! Foi um compartilhar!
E ainda ousam dizer de que somos "sujos"! Sujos? Quem é que é sujo aqui no lado de cá desse rio que chamamos de a Blogosfera?
Por acaso algum dia escrevemos nos nossos Blogs que o político do qual não gostamos seria um estuprador? um pedófilo tarado? Por acaso algum dia escrevemos nos nossos blogs de que mulheres das quais não gostamos poderiam serem "vadias" e "vagabundas"? Por acaso algum dia publicamos nos nossos blogs alguma "ficha falsa"? As "fichas corridas" que aqui divulgamos vieram exatamente da mídia que lhes é amiga e afaga as tais pústulas! Só fazemos espalhar, já que com os seus... aqueles são tão brandos. A "dita" aqui é dura! Só eu durante a "chumbada" puxei quatro canas! O que dirão os outros... Tá bom assim ou queriam mais? Sobrevivi pra contar e eles não contavam com isso! Mas eu conto! É pra isso que eu tenho um blog!
Mas agora descubro que eu não sou apenas eu, somos muitos, somos outros, somos trezentos, somos quinhentos, somos mil e seremos milhões! Será no dia em que cada pessoa for um Blog! Uma mídia!
Aí quero ver o que farão para nos enfrentar! Não farão! Mesmo ainda sendo tão poucos diante do poderio patronal e capitalista daquelas "entidades" de pouca luz, a blogosfera depois desse Encontro os derrotou de uma vez! Foram ao chão as tais bestas do apocalipse midiático esquizofrênico, sem cura, golpista e venal. E sabem por que?
Porque somos gente, porque temos alma, porque temos vida!
A blogosfera é viva!
A blogosfera é livre!
Tem o cheiro, o som, o brilho, o toque e o gosto da nossa gente!
Tem "pessoas"!
Eu vivi pra provar desse doce!
Não vou aqui dizer nomes pois cada um é fantástico, cada um, "uma estrela", então agradeço esse povo de coração e de alma lavada com esse singelo vídeo dos meus imaginários Diários de Blogocicleta Suja!
Vrum!... Vrum!
"Desafasta" que estamos passando!
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Manuela D’Ávila e o humor na rede
Em seu blog, a jornalista Hildegard Angel criticou a passeata dos humoristas contra as restrições às piadas nos períodos eleitorais, realizada na Praia de Copacabana na semana passada. Disse que, apesar da causa ser nobre, a passeata serviu para atacar o governo Lula, reforçando a falsa tese da direita de que há censura no Brasil.
O texto, porém, cometeu uma grave injustiça, ao afirmar que as restrições ao humor decorrem de uma emenda apresentada pela deputada Manuela D'Ávila à lei eleitoral. Num tom respeitoso, a parlamentar, conhecida por atuação em defesa da liberdade da expressão e da democratização da comunicação, divulgou nota de esclarecimento:
Cara Hildegard Angel
Tentei manter contato com você de diversas formas. Resolvi escrever e postar em seu blog, talvez a modernidade nos imponha essa forma de contato. Não nos conhecemos mas acredito que compartilhamos – com alguns milhares de brasileiros – o sonho de um Brasil democrático e justo. Sonho de gerações de meu partido (o PCdoB) e de sua família.
Vivo dias dignos de Kafka, a partir de uma coluna assinada por você. Aliás, a coluna aborda o tema do humor na política de maneira bem próxima aquilo que penso. Mas existe um porém. Você usou uma fonte com equívocos e cita o meu nome.
Depois de tentar esclarecer pelo telefone com sua equipe, resolvi colocar no papel.
A lei eleitoral é de 1997. Ela não aborda apenas o humor na política. Ela aborda todas as regras das eleições. Muros, faixas, tamanhos, CNPJ, fotos, contas, tudo aquilo que diz respeito ao processo eleitoral. No ano passado fizemos alguns ajustes a essa lei. Como deputada, o procedimento legislativo deve ser que, qualquer tema relacionada ao processo eleitoral passa por emendas ou alterações a essa lei já existente. Apresentamos emendas supressivas ou aditivas. Coube a mim, como deputada que sempre lutou pela liberdade de expressão e, precisamente na internet, tentar liberar o uso dessa importante ferramenta nas eleições.
Assim o fiz. E conseguimos. Diferente do processo eleitoral de 2008, no qual sites, vídeos, comunidades em redes socais, foram retirados no ar pela Justiça Eleitoral, nessas eleições todos usam abertamente a internet. Nessa emenda, proibimos a trucagem e a montagem em sites de candidatos. Apenas em sites de candidatos. Qual o objetivo? Candidatos usavam montagens falsas a seu favor. Apenas isso.
Esse foi o meu papel em todo o processo da mini-reforma. Nada, absolutamente nada relacionado à censura. Muito menos a censura aos humoristas, a quem fui solidária diante da interpretação do Poder Judiciário.
Tua voz é muito mais forte do que a minha. Tua coluna é lida por milhares de pessoas que, de imediato, passaram a me acusar de ser autora de uma lei de 1997. Repare: em 1997 eu tinha 16 anos. Não votava! Estava no ensino médio!
Tua coluna passou a ser usada por todos aqueles que disputam eleições contra mim. Usada de maneira baixa, é verdade, por que infelizmente muitos fazem política assim, na direita e na esquerda.
Disse que vivo dias dignos de Kakfa por não ter mais o que fazer. É como provar que não há relação extraconjugal. Se não há fatos, não há provas. Peço que corrijas essa informação. Sei que não agiste de má fé e reitero, gostei muito de tua posição no artigo. Mas o fato se tornou muito grave para mim. O mal entendido, a falta da informação correta, virou uma bola de neve. Contra a pessoa errada, que nada tem com isso.
Abraço solidário, Manuela D'Ávila - Deputada Federal do PCdoB/RS
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O texto, porém, cometeu uma grave injustiça, ao afirmar que as restrições ao humor decorrem de uma emenda apresentada pela deputada Manuela D'Ávila à lei eleitoral. Num tom respeitoso, a parlamentar, conhecida por atuação em defesa da liberdade da expressão e da democratização da comunicação, divulgou nota de esclarecimento:
Cara Hildegard Angel
Tentei manter contato com você de diversas formas. Resolvi escrever e postar em seu blog, talvez a modernidade nos imponha essa forma de contato. Não nos conhecemos mas acredito que compartilhamos – com alguns milhares de brasileiros – o sonho de um Brasil democrático e justo. Sonho de gerações de meu partido (o PCdoB) e de sua família.
Vivo dias dignos de Kafka, a partir de uma coluna assinada por você. Aliás, a coluna aborda o tema do humor na política de maneira bem próxima aquilo que penso. Mas existe um porém. Você usou uma fonte com equívocos e cita o meu nome.
Depois de tentar esclarecer pelo telefone com sua equipe, resolvi colocar no papel.
A lei eleitoral é de 1997. Ela não aborda apenas o humor na política. Ela aborda todas as regras das eleições. Muros, faixas, tamanhos, CNPJ, fotos, contas, tudo aquilo que diz respeito ao processo eleitoral. No ano passado fizemos alguns ajustes a essa lei. Como deputada, o procedimento legislativo deve ser que, qualquer tema relacionada ao processo eleitoral passa por emendas ou alterações a essa lei já existente. Apresentamos emendas supressivas ou aditivas. Coube a mim, como deputada que sempre lutou pela liberdade de expressão e, precisamente na internet, tentar liberar o uso dessa importante ferramenta nas eleições.
Assim o fiz. E conseguimos. Diferente do processo eleitoral de 2008, no qual sites, vídeos, comunidades em redes socais, foram retirados no ar pela Justiça Eleitoral, nessas eleições todos usam abertamente a internet. Nessa emenda, proibimos a trucagem e a montagem em sites de candidatos. Apenas em sites de candidatos. Qual o objetivo? Candidatos usavam montagens falsas a seu favor. Apenas isso.
Esse foi o meu papel em todo o processo da mini-reforma. Nada, absolutamente nada relacionado à censura. Muito menos a censura aos humoristas, a quem fui solidária diante da interpretação do Poder Judiciário.
Tua voz é muito mais forte do que a minha. Tua coluna é lida por milhares de pessoas que, de imediato, passaram a me acusar de ser autora de uma lei de 1997. Repare: em 1997 eu tinha 16 anos. Não votava! Estava no ensino médio!
Tua coluna passou a ser usada por todos aqueles que disputam eleições contra mim. Usada de maneira baixa, é verdade, por que infelizmente muitos fazem política assim, na direita e na esquerda.
Disse que vivo dias dignos de Kakfa por não ter mais o que fazer. É como provar que não há relação extraconjugal. Se não há fatos, não há provas. Peço que corrijas essa informação. Sei que não agiste de má fé e reitero, gostei muito de tua posição no artigo. Mas o fato se tornou muito grave para mim. O mal entendido, a falta da informação correta, virou uma bola de neve. Contra a pessoa errada, que nada tem com isso.
Abraço solidário, Manuela D'Ávila - Deputada Federal do PCdoB/RS
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