Reproduzo artigo de Washington Araújo, publicado no Observatório da Imprensa:
Os Estados Unidos parece ter embarcado no século XXI sob a égide dos vazamentos. Em fins de abril de 2010 uma maré negra de petróleo atingiu a costa do estado americano de Louisiana e se alastrou por outros quatro estados da costa do Golfo do México, vazando de um poço que despejou no mar de forma contínua durante exatos 87 dias nada menos que 4 milhões de petróleo. Essa catástrofe começou com uma explosão que matou 11 trabalhadores, em 20 de abril. Além da tragédia ambiental, o prejuízo financeiro fez a British Petroleum perder US$ 70 bilhões em seu valor de mercado. No coração do capitalismo mundial esta cifra dá conta dos contornos da desgraça.
Há menos de uma semana alguns dos principais jornais do mundo vêm publicando o mais impressionante acervo de documentos diplomáticos vazados de embaixadas norte-americanas ao redor do mundo. O impressionante estoque de “mal-estar escrito” foi conseguido e vem sendo divulgado pela organização WikiLeaks. São exatos 251.287 itens. Todos com a marca oficial do governo americano. É no mínimo instigante constatar que os jornais que divulgaram os arquivos confidenciais foram simplesmente os maiores do mundo, seja em circulação, seja em tradição, como é o caso do The New York Times, dos Estados Unidos, El País, da Espanha, Le Monde, da França, Der Spiegel, da Alemanha, e The Guardian, da Inglaterra.
No Brasil, o jornal que publica o material é a Folha de S.Paulo. Deste montante, 1.947 foram emitidos pela Embaixada dos EUA em Brasília, 777 de São Paulo, 119 do Rio de Janeiro e 12 do Recife. As relações diplomáticas Brasil/EUA são desnudadas em exatos 2.855 documentos.
Do que já foi divulgado ficamos sabendo que o então embaixador dos EUA no país, Clifford Sobel, informou a Casa Branca, em 2008, que o Brasil disfarça a prisão de terroristas. E que o Itamaraty era referido pelo embaixador americano como uma entidade de inclinação antinorte-americana, como um nicho adversário no Governo brasileiro. O embaixador cuidou de colocar no papel que nosso ministro da Defesa Nelson Jobim deveria ser visto como “um aliado dos Estados Unidos”. Noutro dia o jornal paulista revelou documentos em que a Embaixada dos EUA em Brasília faziam duras críticas à Estratégia Nacional de Defesa, lançada em 2008.
A imprensa tem se limitado a publicar os documentos, se atendo quase que exclusivamente ao seu conteúdo que, por si só, já é suficiente para causar embaraço aos governos e autoridades neles mencionados. Chama atenção o fato que nosso jornalismo tão marcadamente opinativo parece haver decretado férias coletivas. O fato é que os juízos de valor, sempre com tendência para o exagero e a contundência, são de todo escassos.
O leitor já parou para pensar se o protagonista do evento não fosse Washington e em seu lugar estivesse no olho do furacão… Brasília? Com certeza teríamos capas dos grandes jornais mostrando indignação, acusando o governo de total incompetência e amadorismo na condução de sua diplomacia. Não faltariam editoriais lança-chamas pedindo a cabeça do chanceler Amorim e analistas estariam fazendo as mais sombrias reflexões sobre o embuste que é o nosso Itamaraty, dado de barato como tendo sido aparelhado politicamente à enésima potência e por aí vai. Capas das revistas semanais tratariam de colocar uma penca de polvos habitando a piscina da Casa de Rio Branco e as matérias internas trariam entrevistas robustas com o ex-ministro Celso Lafer, textos contundentes e um tanto desfocados do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. No Congresso Nacional a confusão estaria armada com a circulação de listas de assinaturas pedindo assinaturas além dos costumeiros pronunciamentos inflamados contra o ministro Amorim, sendo que o parlamentar oposicionista mais pautado pela calma que nesses momentos se exige, estaria exigindo sua imediata demissão.
Acontece que foi nos Estados Unidos. Onde tudo parece superlativo. País com apenas 5% da população mundial e que é responsável por 32% do consumo global. Trocando em miúdos, se o mundo inteiro consumisse como os americanos, o planeta só suportaria 1,4 bilhões de pessoas. É o país em que o consumo de energia elétrica de um norte-americano equivale ao de quinhentos indianos. E que detêm em suas fronteiras megaempresas que estão na vanguarda da revolução tecnológica como a Apple e a Microsoft. Quando ficamos sabendo do conteúdo dos wikileaks e da forma como são coletadas informações sobre países como o Brasil, a maneira jocosa com que tratam nosso governo e nossas instituições, a importância desmesurada que se concede às pequenas vaidades dos governantes, podemos entender melhor que provavelmente o maior objetivo dos Estados Unidos é conscientizar o consumo dos países pobres para que o consumismo em seu território continue desenfreado e julgam que este processo ocorre, pois necessitam mais das matrizes energéticas e das fontes naturais.
Como um país tão rico, tão senhor de si e tão convencido de que é o umbigo do mundo, não consegue guardar consigo o que ele mesmo classifica como reservado, confidencial e secreto? Um país que não consegue separar a cozinha da sala e esta do quarto apenas demonstra sua fragilidade interior. Porque continua, como sempre fez, a confundir um anão com uma criança de tenra idade. Vive no mundo das aparências e sua métrica é apenas a das aparências. Com embaixadas tão guarnecidas, tão pesadamente prontas para receber os mais letais ataques, ainda assim não consegue conservar consigo o que nesses ambientes se produz por excelência – informação.
Desconhecemos que foi ao longo dos tempos que o ser humano conseguiu conquistar seu espaço privativo e o direito de resguardar sua intimidade? Com as instituições, os governos deve ser diferente? No Brasil, o assunto é encampado em nossa Constituição Federal, com os chamados direitos da personalidade. No art. 5.º, inciso X da Constituição Federal encontramos abrigo ao direito à reserva da intimidade, assim como ao da vida privada. E a intimidade, segundo teóricos do Direito, consiste na faculdade que tem cada indivíduo de obstar a intromissão de estranhos na sua vida privada e familiar, assim como de impedir-lhes o acesso a informações sobre a privacidade de cada um, e também impedir que sejam divulgadas informações sobre esta área da manifestação existencial do ser humano.
As transformações pelas quais perpassa a humanidade nos últimos vinte anos, porém, criaram desafios à eficácia dos direitos da personalidade, notadamente ao direito à privacidade. Além de o indivíduo passar a ser visto não mais isolado de seu contexto, a explosão das comunicações veio trazer à tona novos debates, que chegam tarde dada a velocidade astronômica com que as novidades tecnológicas se incorporaram ao dia-a-dia das pessoas. É fato – e os wikileaks constituem robusta prova – que a Internet permitiu o surgimento de uma nova forma de correspondência, o chamado correio eletrônico. Fácil e eficiente, tornou-se ferramenta essencial. Tanto que parte considerável dos 251.287 documentos diplomáticos conseguidos pela Wikileaks é constituída por mensagens eletrônicas.
Feitas estas observações, considero igualmente importante debater o papel da imprensa em relação aos wikileaks. Será legítimo, constituirá um serviço à sociedade, servir como braço mecânico e prolongado de quem surrupiou informações confidenciais de governos e de suas autoridades para colocá-las ao alcance de todos? Onde é que começa o ato criminoso… e onde termina? O braço mecânico – o ente que divulga – tem vida própria ou segue a lógica inicial de quem acessa documentos privados?
Como estamos conhecendo o conteúdo de apenas duas dezenas desses documentos diplomáticos ainda é cedo para afirmar que muitos desses poderão agravar a instabilidade política no mundo, na medida em que tornam públicos sentimentos que antes existiam apenas em esfera privada. Qual a diferença entre ter minha residência invadida ou meu computador pessoal invadido e assim sem mais nem menos tomar conhecimento de que estranhos acessam facilmente minhas 5.334 mensagens eletrônicas existentes em meu provedor de internet? E se parte dessas mensagens forem parar na Folha de S.Paulo… que prejuízo isso me traria? Quem seria responsabilizado por isso? Apenas o criminoso invasor ou também quem, sabendo se tratar de documentos de natureza particular, portanto confidencial, os difunde? E, se por motivo que desconheço, viesse a ser ‘chantageado’ ou mesmo lesado financeiramente pelo fato de que em um dos 5.334 documentos fossem encontrados dados bancários sensíveis como agência, bancária, senha, três letras etc. etc.?
Átila, rei do Hunos, tinha razão quando em meio às suas conturbadas campanhas militares dizia que as palavras são uma fonte de mal-entendidos. Se a diplomacia estadunidense e, por extensão, toda e qualquer diplomacia como a conhecemos nos dias que correm, tivesse dado ouvidos ao huno não estaria em situação além de embaraçosa, vergonhosa, vexaminosa e, que cômputo geral do estado das coisas, não estaria refém de de seus próprios pensamentos, ações e documentos. E deve estar se preparando para saber que esse vazamento ultrapassará em muitos dias e meses aqueles ora minguados 87 dias de vazamento de petróleo e, os wikileaks terão potencial de despejar sobre a sociedade planetária nada menos que 40.205.920(*) palavras.
O leitor desavisado – ou aquele dado a ler sempre na diagonal – pode pensar que tomei partido por um dos lados: (1) os que recriminam a imprensa pela divulgação; (2) os que aplaudem a imprensa pela divulgação. Em casos de dois lados, como sempre, pode haver um terceiro: é um jornalismo saudável este que acredita que os fins (divulgar ao público documentos confidenciais e não autorizados) justificam os meios (quebrar protocolos de segurança, infringir a privacidade alheia, roubar dados e informações, bisbilhotar o que não lhe é de direito)?
(*)Fui conservador e estimei com base no movimento das nuvens de hoje que cada documento conseguido por Julian Assange contém em média 160 palavras.
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quarta-feira, 8 de dezembro de 2010
PSDB desiste de censurar blog em Jundiaí
Reproduzo excelente notícia de André Lux, publicado no blog "Tudo em cima":
Acabo de ser informado pelo meu advogado, Dr. Erazê Sutti, que o PSDB de Jundiaí desistiu da ação cautelar que tinha como objetivo censurar o meu blog por causa das críticas que faço à lamentável administração pública que os políticos do partido dos tucanos aplicam à cidade há mais de 20 anos.
Os coronéis do PSDB local, que não estão acostumados a serem criticados ou mesmo cobrados pela mídia na cidade (por motivos alheios ao meu conhecimento), já haviam sofrido uma derrota humilhante no início do processo movido contra mim, já que o pedido de cautelar contra meu blog foi sumariamente rejeitado pelo Juiz, que ainda fez questão de afirmar:
"[...]a crítica veiculada não ostenta, a nosso viso, conotação ofensiva, não contrariando o princípio da razoabilidade, não sendo franqueado ao Poder Judiciário censurar a liberdade de expressão e pensamento de qualquer cidadão, que tem o direito, inclusive pela rede mundial de computadores, de criticar os administradores e homens públicos, dentro de certos limites, aqui não transbordados pelos requeridos, conquanto não se negue o tom jocoso da referida crítica[...]"
Como o processo seguiu o encaminhamento normal, fui obrigado a contratar um advogado para me defender. E a defesa que ele fez em meu favor encheu-me de orgulho e emoção, por isso a reproduzo abaixo em sua totalidade. Imagino que, depois de ler essa espetacular defesa da liberdade de expressão, os coronéis do PSDB local acharam por bem enfiar o rabo entre as pernas e desistir de tentar censurar meus direitos constitucionais.
Mas, qualquer que seja o real motivo por trás da desistência, foi apenas mais uma humilhante derrota para os "imperadores" de Jundiaí, que gastaram só este ano a bagatela de 9 milhões de reais em publicidade e propagada para tentar convencer os incautos que a cidade é uma espécie de "ilha da fantasia" de prosperidade e bonança (talvez aí esteja uma dica dos motivos que levem os donos da imprensa local a vetar qualquer crítica à administração do PSDB).
Felizmente, o número de pessoas que acredita nessas mentiras propagadas inclusive em forma de "notícia" pela imprensa local é cada vez menor. Daí advem o desespero deles e, claro, medidas drásticas como essa de tentar censurar o meu humilde blog.
E tem uns bravateiros por aí que acham que é fácil fazer oposição a esse poder que domina Jundiaí há mais de 20 anos. É uma verdadeira luta de "David contra Golias", mas a gente acerta umas pedradas de vez em quando, isso é inegável...
Abaixo a íntegra da defesa feita pelo Dr. Erazê Sutti (com grifos meus). Vale a pena ler até o final, até para atestar o grau de incompetência da petição original feita pelo PSDB, que de forma lamentável usou a Prefeitura de Jundiaí para tentar censurar meu blog - ou seja, os coronéis tucanos desperdiçaram dinheiro público para tentar cercear o meu direito constitucional de expressar a minha opinião, simplesmente porque eles não admitem o contraditório.
Depois eles vem dizer que é a esquerda quem quer "censurar a liberdade de expressão", não é mesmo?
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO
DA VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE JUNDIAÍ/SP.
Processo n° 1378/2010
ANDRÉ AUGUSTO LUX, pelo advogado infra-assinado, nomeado nos termos do instrumento particular de mandato constante nos autos, vem, mui respeitosamente perante V. Exa., nos autos da MEDIDA CAUTELAR INOMINADA proposta pelo MUNICÍPIO JUNDIAÍ, apresentar sua contestação pelos fatos e argumentos a seguir expostos.
A parte autora propôs a presente ação cautelar em face deste réu e de César Tayar, alegando em suma:
1- Jundiaí possui uma longa tradição industrial, com mais de 1.000 indústrias e 46.000 empregados;
2- O réu César Tayar, através de seu blog (“blog do Beduíno” e do blog deste réu, André (“tudo-em-cima”), fez “inverídicas” afirmações e “deturparam por completo o objetivo visado pelo Município”;
3- Em referida matéria, consta uma charge com o letreiro “Incorpora Municipal S.A.” em cima do prédio da Prefeitura, bem como a “inverídica” afirmação: ”a Prefeitura irá gastar R$ 15 milhões na construção do novo distrito, sim, mas quem irá realizar o loteamento industrial, com um lucro previsto de R$ 500 milhões, é um consórcio particular”;
4- Tais informações estariam “indispondo o munícipe em relação à Administração Pública Municipal”, bem como “ferindo a honra dos gestores públicos e questionando indevidamente a lisura de procedimentos administrativos adotados”;
5- Requer que a Justiça determine “a retirada e impeça a veiculação virtual dos conteúdos ofensivos por parte dos responsáveis pelos “blogs” e por terceiros, determinando-se inclusive a identificação dos IP´s dos autores”.
Este réu, apesar de não ter escrito a matéria, faz parte do pólo passivo por veicular referida matéria.
No entanto, este réu, além dos limites cognitivos de sua capacidade intelectual, apesar de não compreender o teor das alegações da “Municipalidade”, refuta qualquer ilegalidade em sua conduta, senão vejamos.
Inépcia da Inicial
Primeiramente, por estar além da capacidade cognitiva humana, trata-se de uma peça processual inepta, haja vista que não relata, nem mesmo, algum “fumus boni iuris”, vez que não contesta, tal como determina a legislação processual, as informações que lhe “prejudicam”. Onde estaria a “verdade” pelo autor diante da “inverdade” dita pelos réus?
Ofício ao Ministério Público
Se tal não bastasse, pelo teor da inicial, trata-se, também, de sério desvio de função do ofício da procuradoria municipal, haja vista que se preocupa, patentemente, mais em defender os “gestores” do que o bem público, vez que, ao alegar “ferindo a honra dos gestores públicos...” está advogando para a pessoa, não para o ente público. Diante disso, requer o réu que seja oficiado ao Ministério Público para que sejam tomadas as providências legais cabíveis.
Mérito
Pelo pouco que se consegue depreender da peça inicial, tentando-se detectar a causa de pedir da Municipalidade, constata-se a vergonhosa intenção de tolher a liberdade de expressão de toda e qualquer pessoa que tenha opinião crítica e diferente dos “gestores públicos”. E mais, trata toda pessoa que manifeste opinião diversa como “inimigo” sob o pretexto deste tentar “indispor” o munícipe com a Prefeitura!
Ou seja, o “munícipe”, sinônimo de idiota, alienado e tapado, segundo as preocupações do autor, deve ser PROTEGIDO de qualquer crítica à Prefeitura, mesmo porque, também segundo a visão do autor, qualquer crítica à Prefeitura, que tem honoráveis gestores públicos, é INVERÍDICA.
Pois bem, por este quadro, a liberdade de expressão, a democracia, bem como todos os demais princípios constitucionais de contraditório, ampla defesa etc, não têm razão para existir, haja vista que QUEM MANDA TEM A RAZÃO e, pasmem, sem necessidade de comprovar suas alegações! Pelo mesmo pensamento oriundo do mais puro CORONELISMO, tal como ocorria com a Monarquia Absoluta, onde o Poder Judiciário também não teria razão para existir – para que julgar o Rei se é o Rei quem sentencia?
Ainda bem que esse quadro é mero fruto da imaginação de ditadores incapazes de derrotar o Estado de Direito e as regras democráticas de uma sociedade livre e em crescente aprendizado nos deveres e direitos de sua cidadania.
Mas exatamente porque almeja destruir os pilares constitucionais deste Estado de Direito, estes pseudo-sabotadores da democracia e da liberdade de expressão devem ser atentamente combatidos pelas Instituições, tal qual o Poder Judiciário.
Ante o exposto, requer que seja julgada improcedente a ação proposta, condenando a ré nas custas e honorários advocatícios, bem como o deferimento da gratuidade de justiça.
Requer provar o alegado por todos os meios em direito admitidos, sem exceção de qualquer, especialmente pela oitiva de testemunhas, juntada de documentos, perícia, etc.
Termos em que,
P. Deferimento.
Jundiaí, 14 de julho de 2010.
ERAZÊ SUTTI
OAB/SP nº 146.298
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Acabo de ser informado pelo meu advogado, Dr. Erazê Sutti, que o PSDB de Jundiaí desistiu da ação cautelar que tinha como objetivo censurar o meu blog por causa das críticas que faço à lamentável administração pública que os políticos do partido dos tucanos aplicam à cidade há mais de 20 anos.
Os coronéis do PSDB local, que não estão acostumados a serem criticados ou mesmo cobrados pela mídia na cidade (por motivos alheios ao meu conhecimento), já haviam sofrido uma derrota humilhante no início do processo movido contra mim, já que o pedido de cautelar contra meu blog foi sumariamente rejeitado pelo Juiz, que ainda fez questão de afirmar:
"[...]a crítica veiculada não ostenta, a nosso viso, conotação ofensiva, não contrariando o princípio da razoabilidade, não sendo franqueado ao Poder Judiciário censurar a liberdade de expressão e pensamento de qualquer cidadão, que tem o direito, inclusive pela rede mundial de computadores, de criticar os administradores e homens públicos, dentro de certos limites, aqui não transbordados pelos requeridos, conquanto não se negue o tom jocoso da referida crítica[...]"
Como o processo seguiu o encaminhamento normal, fui obrigado a contratar um advogado para me defender. E a defesa que ele fez em meu favor encheu-me de orgulho e emoção, por isso a reproduzo abaixo em sua totalidade. Imagino que, depois de ler essa espetacular defesa da liberdade de expressão, os coronéis do PSDB local acharam por bem enfiar o rabo entre as pernas e desistir de tentar censurar meus direitos constitucionais.
Mas, qualquer que seja o real motivo por trás da desistência, foi apenas mais uma humilhante derrota para os "imperadores" de Jundiaí, que gastaram só este ano a bagatela de 9 milhões de reais em publicidade e propagada para tentar convencer os incautos que a cidade é uma espécie de "ilha da fantasia" de prosperidade e bonança (talvez aí esteja uma dica dos motivos que levem os donos da imprensa local a vetar qualquer crítica à administração do PSDB).
Felizmente, o número de pessoas que acredita nessas mentiras propagadas inclusive em forma de "notícia" pela imprensa local é cada vez menor. Daí advem o desespero deles e, claro, medidas drásticas como essa de tentar censurar o meu humilde blog.
E tem uns bravateiros por aí que acham que é fácil fazer oposição a esse poder que domina Jundiaí há mais de 20 anos. É uma verdadeira luta de "David contra Golias", mas a gente acerta umas pedradas de vez em quando, isso é inegável...
Abaixo a íntegra da defesa feita pelo Dr. Erazê Sutti (com grifos meus). Vale a pena ler até o final, até para atestar o grau de incompetência da petição original feita pelo PSDB, que de forma lamentável usou a Prefeitura de Jundiaí para tentar censurar meu blog - ou seja, os coronéis tucanos desperdiçaram dinheiro público para tentar cercear o meu direito constitucional de expressar a minha opinião, simplesmente porque eles não admitem o contraditório.
Depois eles vem dizer que é a esquerda quem quer "censurar a liberdade de expressão", não é mesmo?
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO
DA VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE JUNDIAÍ/SP.
Processo n° 1378/2010
ANDRÉ AUGUSTO LUX, pelo advogado infra-assinado, nomeado nos termos do instrumento particular de mandato constante nos autos, vem, mui respeitosamente perante V. Exa., nos autos da MEDIDA CAUTELAR INOMINADA proposta pelo MUNICÍPIO JUNDIAÍ, apresentar sua contestação pelos fatos e argumentos a seguir expostos.
A parte autora propôs a presente ação cautelar em face deste réu e de César Tayar, alegando em suma:
1- Jundiaí possui uma longa tradição industrial, com mais de 1.000 indústrias e 46.000 empregados;
2- O réu César Tayar, através de seu blog (“blog do Beduíno” e do blog deste réu, André (“tudo-em-cima”), fez “inverídicas” afirmações e “deturparam por completo o objetivo visado pelo Município”;
3- Em referida matéria, consta uma charge com o letreiro “Incorpora Municipal S.A.” em cima do prédio da Prefeitura, bem como a “inverídica” afirmação: ”a Prefeitura irá gastar R$ 15 milhões na construção do novo distrito, sim, mas quem irá realizar o loteamento industrial, com um lucro previsto de R$ 500 milhões, é um consórcio particular”;
4- Tais informações estariam “indispondo o munícipe em relação à Administração Pública Municipal”, bem como “ferindo a honra dos gestores públicos e questionando indevidamente a lisura de procedimentos administrativos adotados”;
5- Requer que a Justiça determine “a retirada e impeça a veiculação virtual dos conteúdos ofensivos por parte dos responsáveis pelos “blogs” e por terceiros, determinando-se inclusive a identificação dos IP´s dos autores”.
Este réu, apesar de não ter escrito a matéria, faz parte do pólo passivo por veicular referida matéria.
No entanto, este réu, além dos limites cognitivos de sua capacidade intelectual, apesar de não compreender o teor das alegações da “Municipalidade”, refuta qualquer ilegalidade em sua conduta, senão vejamos.
Inépcia da Inicial
Primeiramente, por estar além da capacidade cognitiva humana, trata-se de uma peça processual inepta, haja vista que não relata, nem mesmo, algum “fumus boni iuris”, vez que não contesta, tal como determina a legislação processual, as informações que lhe “prejudicam”. Onde estaria a “verdade” pelo autor diante da “inverdade” dita pelos réus?
Ofício ao Ministério Público
Se tal não bastasse, pelo teor da inicial, trata-se, também, de sério desvio de função do ofício da procuradoria municipal, haja vista que se preocupa, patentemente, mais em defender os “gestores” do que o bem público, vez que, ao alegar “ferindo a honra dos gestores públicos...” está advogando para a pessoa, não para o ente público. Diante disso, requer o réu que seja oficiado ao Ministério Público para que sejam tomadas as providências legais cabíveis.
Mérito
Pelo pouco que se consegue depreender da peça inicial, tentando-se detectar a causa de pedir da Municipalidade, constata-se a vergonhosa intenção de tolher a liberdade de expressão de toda e qualquer pessoa que tenha opinião crítica e diferente dos “gestores públicos”. E mais, trata toda pessoa que manifeste opinião diversa como “inimigo” sob o pretexto deste tentar “indispor” o munícipe com a Prefeitura!
Ou seja, o “munícipe”, sinônimo de idiota, alienado e tapado, segundo as preocupações do autor, deve ser PROTEGIDO de qualquer crítica à Prefeitura, mesmo porque, também segundo a visão do autor, qualquer crítica à Prefeitura, que tem honoráveis gestores públicos, é INVERÍDICA.
Pois bem, por este quadro, a liberdade de expressão, a democracia, bem como todos os demais princípios constitucionais de contraditório, ampla defesa etc, não têm razão para existir, haja vista que QUEM MANDA TEM A RAZÃO e, pasmem, sem necessidade de comprovar suas alegações! Pelo mesmo pensamento oriundo do mais puro CORONELISMO, tal como ocorria com a Monarquia Absoluta, onde o Poder Judiciário também não teria razão para existir – para que julgar o Rei se é o Rei quem sentencia?
Ainda bem que esse quadro é mero fruto da imaginação de ditadores incapazes de derrotar o Estado de Direito e as regras democráticas de uma sociedade livre e em crescente aprendizado nos deveres e direitos de sua cidadania.
Mas exatamente porque almeja destruir os pilares constitucionais deste Estado de Direito, estes pseudo-sabotadores da democracia e da liberdade de expressão devem ser atentamente combatidos pelas Instituições, tal qual o Poder Judiciário.
Ante o exposto, requer que seja julgada improcedente a ação proposta, condenando a ré nas custas e honorários advocatícios, bem como o deferimento da gratuidade de justiça.
Requer provar o alegado por todos os meios em direito admitidos, sem exceção de qualquer, especialmente pela oitiva de testemunhas, juntada de documentos, perícia, etc.
Termos em que,
P. Deferimento.
Jundiaí, 14 de julho de 2010.
ERAZÊ SUTTI
OAB/SP nº 146.298
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A revolução dos blogs sujos
Reproduzo artigo de Miguel do Rosário, publicado no blog Gonzum (ex-Óleo do Diabo):
Pensando nos blogueiros que se reuniram em São Paulo em agosto passado, em evento organizado pelo instituto Barão de Itararé, lembro do clássico de Euclides da Cunha, e daí catei o livro para citar um trecho que me servirá de mote para fazer algumas considerações:
“Canudos não se rendeu. Exemplo único em toda a História, resistiu até o esgotamento completo. Expugnado palmo a palmo, na precisão integral do termo, caiu no dia 5, ao entardecer, quando caíram os seus últimos defensores, que todos morreram. Eram quatro apenas: um velho, dois homens feitos e uma criança, na frente dos quais rugiam raivosamente cinco mil soldados.”
Os Sertões, uma das maiores obras-primas de nossa literatura, me fornece várias analogias interessantes ao momento atual do Brasil. Os combativos habitantes de Canudos, na minha imaginação, transformam-se nos blogueiros “progressistas”. Não há um Antônio Conselheiro, mas em todos há um toque de fanatismo cujo objeto é o governo Lula.
Deixe-me explicar melhor.
Esse fanatismo, embora tenha servido para dar um ânimo extraordinário à jagunçada virtual, prestando uma importante ajuda na derrota das forças obscuras e retrógradas que se aglutinaram em torno de José Serra e de alguns órgãos de mídia, pode atrapalhar agora a continuidade da mesma luta.
Uso termos talvez meio exagerados, como fanatismo e jagunço, mas num sentido positivo. Os grandes ideais nos arrastam, nos apaixonam, nos fanatizam. A revolução francesa nunca se tornaria uma realidade sem a legião de fanáticos que lhe sacrificou a vida e o bem estar – e, no entanto, pouco depois, essa mesma espécie de fanatismo quase a destruiu. Naturalmente que a história, ou seja, a passagem do tempo e sua inevitável carga de sabedoria, permite-nos pesar atitudes e ideias e assumir a defesa daquilo que é justo com a serenidade dos fortes.
A tarefa mais difícil não é precisamente a disposição para o combate. Qualquer idiota nazista pode ter coragem, espírito de sacrifício, energia e determinação para luta. Urge, antes de tudo, compreender o processo, ter uma visão abrangente, conhecer o terreno histórico onde se pisa. Muitas vezes, quando se abandona uma linha de ação ou se desiste de levar adiante uma determinada batalha, não se faz por covardia ou omissão, mas por intuir que não há uma compreensão satisfatória das circunstâncias e, portanto, não vale a pena ir em frente.
Essa intuição – dom democrático que não precisa, necessariamente, de nenhum tipo de instrução formal para se desenvolver – é a principal ferramenta política do indivíduo, e quando as pessoas se desinteressam por alguma causa social não se deve acusá-las de alienação ou coisa parecida – em alguns casos, a sua atitude é uma opção mais inteligente do que outras.
Quando as pessoas desistem, por exemplo, de participar das articulações da “blogosfera progressista”, fazem-no porque intimamente julgam que o momento não está maduro.
No entanto, assim como aqueles quatro estropiados que tombaram por último em Canudos, assim também haverá, entre nós, aqueles que lutarão até o fim.
Mas lutarão porque mesmo? Para quê?
Eu sempre torci pelos fanáticos de Antônio Conselheiro. Pelos jagunços. Eles venceram três grandes expedições militares.
No entanto, pensando melhor, eles se engajaram numa guerra desde o início suicida e maluca. Se o governo da época foi truculento e assassino, os rebeldes de Canudos foram ingênuos e arrogantes.
Digo isso porque me sinto como se fizesse parte de um grupo restrito de “sobreviventes” da blogosfera progressista, diante dos quais rugem cinco mil jornalistas, publicitários e executivos da grande mídia. Aliás, tenho uma comparação ainda mais direta: (sem querer superestimar a importância da blogosfera, mas só pelo valor da imagem) assim como os jagunços de Canudos esmagaram o exército em três oportunidades, nós vencemos três grandes eleições presidenciais contra forças infinitamente mais poderosas. Eles lutavam contra o latifúndio e seus tentáculos. Nós lutamos contra outra forma de opressão, o latifúndio midiático.
Não podemos, todavia, nos esquecer do destino trágico dos canudenses. Não podemos ser fanáticos.
Ao mesmo tempo, sabemos que a importância política concreta da blogosfera progressista será fazer o contraponto a grande mídia no que se refere (como diria Dilma) à crítica ao governo.
É um grande desafio. Como exercer a crítica sem repetir um modelo ultraesquerdista muitas vezes forçado, artificial? Sem fazer uma crítica tola?
Alguns companheiros já estão tentando fazer isso, mas é complicado.
O Rogério do Conexão Brasília Maranhão escreveu um post criticando o apoio incondicional de Lula à família Sarney. Eu o li com atenção e impressionaram-me os rodeios que o blogueiro se sentiu obrigado a fazer antes de emitir sua opinião. Não o critico pelos rodeios, ao contrário, acho que ele foi inteligente ao esclarecer que, apesar de apoiar Lula no contexto maior das lutas sociais, não entende e critica fortemente um ponto da política do presidente.
Um outro companheiro nosso, o Raphael Tsavkko, do blog Angry Brazilian, anda sempre se metendo em brigas com gente da própria blogosfera progressista por conta de seu desejo de criticar o governo Lula e pela recepção ácida, às vezes inclusive truculenta, que encontra em nosso meio para suas opiniões.
E aí podemos falar de um grande amigo nosso, o Azenha, um dos fundadores da “blogosfera progressista” como a entendemos. Observei que ele ficou atônito (como qualquer um no lugar dele ficaria) diante da força meio anárquica meio monstruosa que ele viu emergir após o Encontro de Blogueiros Progressistas. A vida é assim: as iniciativas criam vida própria, tomam rumos inesperados, crescem subitamente.
Todos estão atônitos agora porque a própria presidência da república reconheceu a importância do movimento como força política da esquerda, maior, mais leal, mais combativa, e muito mais eficaz, do que as mídias de esquerda tradicional: Caros Amigos, Brasil de Fato, etc, que ainda recendem a uma esquerda meio acadêmica, meio ranzinza e impedida por várias razões a se engajar de frente na guerra da comunicação; atingem um público reduzido e específico e não tem o poder da blogosfera para criar debates e provocar fissuras nos consensos midiáticos.
O mais surpreendente foi que a tal blogosfera progressista assumiu, desde o início, ares de um partido político! E não digo isso como crítica. Ao contrário, vejo isso sob um ângulo divertido. É legal, é novo, é histórico e inscreve-se numa sequência lógica: se a grande mídia tornou-se uma espécie de partido conservador, nada mais natural que uma parte da blogosfera, que é também uma grande mídia, desponte como um partido progressista!
Mas essa partidarização também afasta aqueles que desejavam ver a blogosfera como um contraponto puramente jornalístico, pessoas como o Azenha, que não se sentem bem no papel de “liderança política” de que ele se viu investido à sua revelia. A blogosfera cria situações estranhas, inusitadas, com as quais ainda não aprendemos a lidar.
E por ter, espontaneamente, sem que os próprios participantes tenham se dado conta, assumido a forma de um partido, ainda livre de qualquer amarra burocrática, seus membros fazem debates às vezes duros mas que visam a criação de um consenso e de uma agenda únicos. Afinal, por mais que seja democrático, para um partido, abrigar várias tendências e correntes de opinião, a sua eficácia e força será sempre maior quanto mais unidos e coesos forem seus objetivos e propostas.
Tudo ainda está muito verde. Esse tipo de iniciativa pode levar anos para amadurecer e pode inclusive nem ir muito longe. Mas temos que atentar para alguns pontos importantes: primeiro, não adianta negar isso. No Encontro de São Paulo e nas listas, muitas vezes notou-se, no início, a tentativa de coibir as manifestações políticas ou partidárias, como se elas não fossem “adequadas”. Acho bobagem negar essa liberdade às pessoas, e são esses debates justamente os que mais empolgam os participantes. Eles integram o escopo principal de nossa “organização”, que é promover o debate partidário e político que não vemos nos próprios partidos e que é impossível na grande imprensa. Eu já vi o Jornal Globo abrir espaço para que leitores combinassem (na seção impressa de Cartas ao Leitor!) encontros e protestos. Uma amiga que trabalhou muitos anos no Estadão, contou-me que sua colega ligava para o celular de senadores para lembrá-los de não faltar sessões de CPIs antigoverno. Esta amiga me contava que o engajamento de alguns jornalistas em campanhas antiLula era notoriamente partidário, e não me refiro ao PSDB, refiro-me ao PIG mesmo.
Repito: se a mídia virou um partido, a blogosfera, num movimento de força dialético e natural, também virou um, e assim como a mídia tem suas instâncias proto-partidárias, como a ANJ e seus institutos de debate, como o Millenium, a blogosfera anseia por ter as suas instituições.
Assim não esperaríamos, como temos feito, irritados e sempre um pouco frustrados, as decisões de um dirigente partidário. Tomaríamos uma atitude diretamente! Quando houvesse uma conferência nacional de comunicação, nossos representantes estariam lá!
Mais importante: os camaradas da blogosfera progressista sentir-se-iam com muito mais liberdade para criticar pontualmente um governo também progressista, tranquilizados pela consciência de que, nas grandes questões, a sua entidade saberia muito bem de que lado ficar. Não teríamos esse medo de fazer uma crítica, por exemplo, ao Lula, e sermos rapidamente instrumentalizados pela oposição mais conservadora, como fizeram uma vez com um conhecido meu aqui do Rio, um escritor, que fez uma crítica ao abraço de Lula em Collor e virou primeira página do Globo, com direito a uma foto tamanho gigante na página três, como se ele fosse um grande herói na luta contra o diabo barbudo. E isso porque o cara é de esquerda e vota no PT…
Enfim, não podemos nos esquecer que estamos diante de grandes transformações tecnológicas, cujos efeitos políticos e culturais devemos nos esforçar para que sejam revertidos a nosso favor, digo, da blogosfera enquanto plataforma de comunicação.
Por que ler matérias de jornalistas sobre medicina, em geral furadas e tendenciosas, se pudemos lermos o blog de um médico prestigiado, com livros publicados e prêmios internacionais, ou mesmo de um estudante de medicina particularmente talentoso e criativo? Porque ler as furadas resenhas literárias, mistura de exercício de vaidade acadêmica com propaganda comercial, se pudemos ler os próprios escritores discutindo sua obra?
Naturalmente, para que a blogosfera se torne uma realidade, será preciso criar instrumentos que a financiem. As empresas tradicionais de mídia recebem cerca de 5 bilhões de reais por ano do Estado, incluindo aí prefeituras, estados, União e estatais. Só do governo federal, são 1,5 bilhão e meio.
Olhando para o panorama absolutamente miserável da blogosfera brasileira, se governo pingasse apenas 0,1% do que investe na mídia tradicional, já teríamos uma revolução! Mas para que pensar pequeno? Se a blogosfera é muito mais democrática que a grande imprensa e se nossos ideais são mesmo democráticos, o Estado deveria investir os 5 bilhões na blogosfera e mandar a mídia procurar a autosustentabilidade! Com dinheiro, obviamente a blogosfera iria se profissionalizar, com surgimento de blogueiros investigativos de primeiríssima linha, que iriam fazer um trabalho infinitamente melhor do que os almofadinhas da Veja!
E não venham com histórias de “chapa-branca”. Com uma boa legislação e com financiamentos, os blogueiros não perdoariam ninguém, até porque haveria grande pluralidade ideológica. A mídia vem com seu papinho de que, não fosse ela, não seriam descobertos os escândalos tais e quais… Balela, a mídia até descobre, quando põe aí um esforço quase desesperado, uns escândalos por contra própria, mas são raros – a maioria dos falcatruas consistentes chegam às mãos da mídia por órgãos do próprio Estado. As denúncias vazias, sensacionalizadas, ou mesmo falsas, vem de iniciativa própria da mídia. Invistam dinheiro numa blogosfera independente e vejam o resultado fantástico que terão! Os blogueiros de cada cidade investigarão os governos locais, cobrarão consertos nas ruas, melhora no ensino. Somente a capilaridade da blogosfera pode dar conta da complexidade e multiplicidade de demandas da sociedade brasileira, com suas mais de 5 mil cidades. De lambuja lutaremos contra a construção do homem-massa, esse indivíduo protofascista cuja mentalidade é formada justamente por essa padronização emburrecedora exigida dos grandes meios de comunicação, um processo denunciado por Hanna Arendt como princípio do surgimento de uma cultura totalitária.
Para finalizar com algo mais prático, comunico que estamos organizando o Encontro Regional dos Blogueiros Progressistas do Rio de Janeiro. Ainda estamos no início da organização. Quem quiser nos ajudar em alguma coisa, entre em contato pelo email.
Há também uma proposta de realizar o Encontro Nacional aqui no Rio… mas falamos disso depois.
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Pensando nos blogueiros que se reuniram em São Paulo em agosto passado, em evento organizado pelo instituto Barão de Itararé, lembro do clássico de Euclides da Cunha, e daí catei o livro para citar um trecho que me servirá de mote para fazer algumas considerações:
“Canudos não se rendeu. Exemplo único em toda a História, resistiu até o esgotamento completo. Expugnado palmo a palmo, na precisão integral do termo, caiu no dia 5, ao entardecer, quando caíram os seus últimos defensores, que todos morreram. Eram quatro apenas: um velho, dois homens feitos e uma criança, na frente dos quais rugiam raivosamente cinco mil soldados.”
Os Sertões, uma das maiores obras-primas de nossa literatura, me fornece várias analogias interessantes ao momento atual do Brasil. Os combativos habitantes de Canudos, na minha imaginação, transformam-se nos blogueiros “progressistas”. Não há um Antônio Conselheiro, mas em todos há um toque de fanatismo cujo objeto é o governo Lula.
Deixe-me explicar melhor.
Esse fanatismo, embora tenha servido para dar um ânimo extraordinário à jagunçada virtual, prestando uma importante ajuda na derrota das forças obscuras e retrógradas que se aglutinaram em torno de José Serra e de alguns órgãos de mídia, pode atrapalhar agora a continuidade da mesma luta.
Uso termos talvez meio exagerados, como fanatismo e jagunço, mas num sentido positivo. Os grandes ideais nos arrastam, nos apaixonam, nos fanatizam. A revolução francesa nunca se tornaria uma realidade sem a legião de fanáticos que lhe sacrificou a vida e o bem estar – e, no entanto, pouco depois, essa mesma espécie de fanatismo quase a destruiu. Naturalmente que a história, ou seja, a passagem do tempo e sua inevitável carga de sabedoria, permite-nos pesar atitudes e ideias e assumir a defesa daquilo que é justo com a serenidade dos fortes.
A tarefa mais difícil não é precisamente a disposição para o combate. Qualquer idiota nazista pode ter coragem, espírito de sacrifício, energia e determinação para luta. Urge, antes de tudo, compreender o processo, ter uma visão abrangente, conhecer o terreno histórico onde se pisa. Muitas vezes, quando se abandona uma linha de ação ou se desiste de levar adiante uma determinada batalha, não se faz por covardia ou omissão, mas por intuir que não há uma compreensão satisfatória das circunstâncias e, portanto, não vale a pena ir em frente.
Essa intuição – dom democrático que não precisa, necessariamente, de nenhum tipo de instrução formal para se desenvolver – é a principal ferramenta política do indivíduo, e quando as pessoas se desinteressam por alguma causa social não se deve acusá-las de alienação ou coisa parecida – em alguns casos, a sua atitude é uma opção mais inteligente do que outras.
Quando as pessoas desistem, por exemplo, de participar das articulações da “blogosfera progressista”, fazem-no porque intimamente julgam que o momento não está maduro.
No entanto, assim como aqueles quatro estropiados que tombaram por último em Canudos, assim também haverá, entre nós, aqueles que lutarão até o fim.
Mas lutarão porque mesmo? Para quê?
Eu sempre torci pelos fanáticos de Antônio Conselheiro. Pelos jagunços. Eles venceram três grandes expedições militares.
No entanto, pensando melhor, eles se engajaram numa guerra desde o início suicida e maluca. Se o governo da época foi truculento e assassino, os rebeldes de Canudos foram ingênuos e arrogantes.
Digo isso porque me sinto como se fizesse parte de um grupo restrito de “sobreviventes” da blogosfera progressista, diante dos quais rugem cinco mil jornalistas, publicitários e executivos da grande mídia. Aliás, tenho uma comparação ainda mais direta: (sem querer superestimar a importância da blogosfera, mas só pelo valor da imagem) assim como os jagunços de Canudos esmagaram o exército em três oportunidades, nós vencemos três grandes eleições presidenciais contra forças infinitamente mais poderosas. Eles lutavam contra o latifúndio e seus tentáculos. Nós lutamos contra outra forma de opressão, o latifúndio midiático.
Não podemos, todavia, nos esquecer do destino trágico dos canudenses. Não podemos ser fanáticos.
Ao mesmo tempo, sabemos que a importância política concreta da blogosfera progressista será fazer o contraponto a grande mídia no que se refere (como diria Dilma) à crítica ao governo.
É um grande desafio. Como exercer a crítica sem repetir um modelo ultraesquerdista muitas vezes forçado, artificial? Sem fazer uma crítica tola?
Alguns companheiros já estão tentando fazer isso, mas é complicado.
O Rogério do Conexão Brasília Maranhão escreveu um post criticando o apoio incondicional de Lula à família Sarney. Eu o li com atenção e impressionaram-me os rodeios que o blogueiro se sentiu obrigado a fazer antes de emitir sua opinião. Não o critico pelos rodeios, ao contrário, acho que ele foi inteligente ao esclarecer que, apesar de apoiar Lula no contexto maior das lutas sociais, não entende e critica fortemente um ponto da política do presidente.
Um outro companheiro nosso, o Raphael Tsavkko, do blog Angry Brazilian, anda sempre se metendo em brigas com gente da própria blogosfera progressista por conta de seu desejo de criticar o governo Lula e pela recepção ácida, às vezes inclusive truculenta, que encontra em nosso meio para suas opiniões.
E aí podemos falar de um grande amigo nosso, o Azenha, um dos fundadores da “blogosfera progressista” como a entendemos. Observei que ele ficou atônito (como qualquer um no lugar dele ficaria) diante da força meio anárquica meio monstruosa que ele viu emergir após o Encontro de Blogueiros Progressistas. A vida é assim: as iniciativas criam vida própria, tomam rumos inesperados, crescem subitamente.
Todos estão atônitos agora porque a própria presidência da república reconheceu a importância do movimento como força política da esquerda, maior, mais leal, mais combativa, e muito mais eficaz, do que as mídias de esquerda tradicional: Caros Amigos, Brasil de Fato, etc, que ainda recendem a uma esquerda meio acadêmica, meio ranzinza e impedida por várias razões a se engajar de frente na guerra da comunicação; atingem um público reduzido e específico e não tem o poder da blogosfera para criar debates e provocar fissuras nos consensos midiáticos.
O mais surpreendente foi que a tal blogosfera progressista assumiu, desde o início, ares de um partido político! E não digo isso como crítica. Ao contrário, vejo isso sob um ângulo divertido. É legal, é novo, é histórico e inscreve-se numa sequência lógica: se a grande mídia tornou-se uma espécie de partido conservador, nada mais natural que uma parte da blogosfera, que é também uma grande mídia, desponte como um partido progressista!
Mas essa partidarização também afasta aqueles que desejavam ver a blogosfera como um contraponto puramente jornalístico, pessoas como o Azenha, que não se sentem bem no papel de “liderança política” de que ele se viu investido à sua revelia. A blogosfera cria situações estranhas, inusitadas, com as quais ainda não aprendemos a lidar.
E por ter, espontaneamente, sem que os próprios participantes tenham se dado conta, assumido a forma de um partido, ainda livre de qualquer amarra burocrática, seus membros fazem debates às vezes duros mas que visam a criação de um consenso e de uma agenda únicos. Afinal, por mais que seja democrático, para um partido, abrigar várias tendências e correntes de opinião, a sua eficácia e força será sempre maior quanto mais unidos e coesos forem seus objetivos e propostas.
Tudo ainda está muito verde. Esse tipo de iniciativa pode levar anos para amadurecer e pode inclusive nem ir muito longe. Mas temos que atentar para alguns pontos importantes: primeiro, não adianta negar isso. No Encontro de São Paulo e nas listas, muitas vezes notou-se, no início, a tentativa de coibir as manifestações políticas ou partidárias, como se elas não fossem “adequadas”. Acho bobagem negar essa liberdade às pessoas, e são esses debates justamente os que mais empolgam os participantes. Eles integram o escopo principal de nossa “organização”, que é promover o debate partidário e político que não vemos nos próprios partidos e que é impossível na grande imprensa. Eu já vi o Jornal Globo abrir espaço para que leitores combinassem (na seção impressa de Cartas ao Leitor!) encontros e protestos. Uma amiga que trabalhou muitos anos no Estadão, contou-me que sua colega ligava para o celular de senadores para lembrá-los de não faltar sessões de CPIs antigoverno. Esta amiga me contava que o engajamento de alguns jornalistas em campanhas antiLula era notoriamente partidário, e não me refiro ao PSDB, refiro-me ao PIG mesmo.
Repito: se a mídia virou um partido, a blogosfera, num movimento de força dialético e natural, também virou um, e assim como a mídia tem suas instâncias proto-partidárias, como a ANJ e seus institutos de debate, como o Millenium, a blogosfera anseia por ter as suas instituições.
Assim não esperaríamos, como temos feito, irritados e sempre um pouco frustrados, as decisões de um dirigente partidário. Tomaríamos uma atitude diretamente! Quando houvesse uma conferência nacional de comunicação, nossos representantes estariam lá!
Mais importante: os camaradas da blogosfera progressista sentir-se-iam com muito mais liberdade para criticar pontualmente um governo também progressista, tranquilizados pela consciência de que, nas grandes questões, a sua entidade saberia muito bem de que lado ficar. Não teríamos esse medo de fazer uma crítica, por exemplo, ao Lula, e sermos rapidamente instrumentalizados pela oposição mais conservadora, como fizeram uma vez com um conhecido meu aqui do Rio, um escritor, que fez uma crítica ao abraço de Lula em Collor e virou primeira página do Globo, com direito a uma foto tamanho gigante na página três, como se ele fosse um grande herói na luta contra o diabo barbudo. E isso porque o cara é de esquerda e vota no PT…
Enfim, não podemos nos esquecer que estamos diante de grandes transformações tecnológicas, cujos efeitos políticos e culturais devemos nos esforçar para que sejam revertidos a nosso favor, digo, da blogosfera enquanto plataforma de comunicação.
Por que ler matérias de jornalistas sobre medicina, em geral furadas e tendenciosas, se pudemos lermos o blog de um médico prestigiado, com livros publicados e prêmios internacionais, ou mesmo de um estudante de medicina particularmente talentoso e criativo? Porque ler as furadas resenhas literárias, mistura de exercício de vaidade acadêmica com propaganda comercial, se pudemos ler os próprios escritores discutindo sua obra?
Naturalmente, para que a blogosfera se torne uma realidade, será preciso criar instrumentos que a financiem. As empresas tradicionais de mídia recebem cerca de 5 bilhões de reais por ano do Estado, incluindo aí prefeituras, estados, União e estatais. Só do governo federal, são 1,5 bilhão e meio.
Olhando para o panorama absolutamente miserável da blogosfera brasileira, se governo pingasse apenas 0,1% do que investe na mídia tradicional, já teríamos uma revolução! Mas para que pensar pequeno? Se a blogosfera é muito mais democrática que a grande imprensa e se nossos ideais são mesmo democráticos, o Estado deveria investir os 5 bilhões na blogosfera e mandar a mídia procurar a autosustentabilidade! Com dinheiro, obviamente a blogosfera iria se profissionalizar, com surgimento de blogueiros investigativos de primeiríssima linha, que iriam fazer um trabalho infinitamente melhor do que os almofadinhas da Veja!
E não venham com histórias de “chapa-branca”. Com uma boa legislação e com financiamentos, os blogueiros não perdoariam ninguém, até porque haveria grande pluralidade ideológica. A mídia vem com seu papinho de que, não fosse ela, não seriam descobertos os escândalos tais e quais… Balela, a mídia até descobre, quando põe aí um esforço quase desesperado, uns escândalos por contra própria, mas são raros – a maioria dos falcatruas consistentes chegam às mãos da mídia por órgãos do próprio Estado. As denúncias vazias, sensacionalizadas, ou mesmo falsas, vem de iniciativa própria da mídia. Invistam dinheiro numa blogosfera independente e vejam o resultado fantástico que terão! Os blogueiros de cada cidade investigarão os governos locais, cobrarão consertos nas ruas, melhora no ensino. Somente a capilaridade da blogosfera pode dar conta da complexidade e multiplicidade de demandas da sociedade brasileira, com suas mais de 5 mil cidades. De lambuja lutaremos contra a construção do homem-massa, esse indivíduo protofascista cuja mentalidade é formada justamente por essa padronização emburrecedora exigida dos grandes meios de comunicação, um processo denunciado por Hanna Arendt como princípio do surgimento de uma cultura totalitária.
Para finalizar com algo mais prático, comunico que estamos organizando o Encontro Regional dos Blogueiros Progressistas do Rio de Janeiro. Ainda estamos no início da organização. Quem quiser nos ajudar em alguma coisa, entre em contato pelo email.
Há também uma proposta de realizar o Encontro Nacional aqui no Rio… mas falamos disso depois.
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terça-feira, 7 de dezembro de 2010
A revolução será digitalizada
Reproduzo artigo de Heether Brooke, publicado no jornal britânico The Guardian e traduzido pelo sítio Outras Palavras:
A diplomacia sempre incluiu jantares com as elites dominantes, acertos de bastidores e encontros clandestinos. Agora, na era digital, os relatos de todas estas festas e diálogos aristocráticos pode ser reunido numa enorme base de dados. Uma vez recolhidos em formato digital, é muito fácil compartilhá-los.
Na verdade, é para isso que a base de dados Siprnet, de onde os segredos diplomáticos norte- americanos são vazados, foi criada. A comissão governamental criada nos EUA para avaliar a segurança nacional após o 11 de Setembro fez uma descoberta notável: não era o compartilhamento de informações que ameaçava os EUA, mas o não-compartilhamento. A falta de cooperação entre agências governamentais e a retenção de informações por burocratas desperdiçaram muitas oportunidade para bloquear os ataques contra as Torres Gêmeas. Em resposta, a comissão ordenou uma restruturação dos serviços do governo e da inteligência, para que se adaptassem à própria web. A nova prática era de colaboração e compartilhamento de informações. Mas, ao contrário de milhões de membros do governo e empresas terceirizadas, o público não tinha acesso à Siprnet.
Porém, os dados têm o hábito de se espalhar. Eles escorregam entre a segurança militar e também podem vazar pelo Wikileaks, o meio pelo qual eu obtive as informações. Eles violaram até os prazos de fechamento do Guardian e de outros jornais envolvidos na divulgação da história, quando um cópia clandestina do semanário alemão Der Spiegel acidentalmente chegou às bancas em Basle, na Suíça, domingo passado. Alguém a comprou, entendeu o que ela continha e começou a escanear as páginas, traduzindo-as do alemão para o inglês e postando no Twitter. Parece que os dados digitalizados não respeitam autoridade alguma, esteja ela no Pentágono, no Wikilieaks ou num editor de jornais.
Cada um de nós já viveu, pessoalmente, as enormes mudanças que vêm com a digitalização. Fatos ou informação que considerávamos efêmeros e privados agora são permanetes, públicos e agregáveis. Se o volume dos atuais vazamentos parece grande, pense nos 500 milhões de usuários do Facebook, ou nos milhões de registros mantidos pelo Google. Os governos mantêm nossos dados pessoais em enormes bases. Era caro obter e distribuir informação. Agora, é caro retê-la.
Mas quando os devassa de dados atinge o público, os governantes parecem não se importar muito. Nossa privacidade é disponível. Não surpreende que a reação aos novos vazamentos seja, agora, diferente. O que transformou, num sentido revolucionário, a dinâmica do poder não é a escala das revelações – mas o fato de que indivíduos podem tornar pública uma cópia de documentos do Estado. Em papel, estes vazamentos equivalem, segundo estimativas do Guardian, a 213.969 paginas A4, que teriam, empilhadas, a altura de 43 quilômetros. Algo impossível de vazar com segurança, na era do papel.
Para alguns, a novidade significa uma crise. Para outros, uma oportunidade. A tecnologia está rompendo as barreiras tradicionais de classe, poder, riqueza e geografia – e substituindo-as por um ethos de colaboração e transparência.
Um ex-embaixador dos Estados Unidos na Rússia, James Collins, disse à CNN que a revelação dos registros pelo Wikileaks “impedirá que as coisas seja feitas de forma normal e civilizada”. Muito frequentemente, “normal” e “civilizado” significa, na linguagem diplomática, fazer vistas grossas para injustiças sociais flagrantes, corrupção e abuso de poder. Depois de ler centenas de documentos, constato que muito dos “danos” que eles provocam é revelação embaraçosa e constrangedora de verdades inconvenientes. Em nome da segurança de uma base militar num dado país, nossos líderes aceitam um ditador brutal que oprime seu povo. Isso pode ser conveniente a curto prazo para os políticos, mas as consequências a longo prazo para os cidadãos do planeta podem ser catastróficas.
Os vazamentos não são o problema, apenas o sintoma. Revelam a desconexão entre aquilo que as pessoas desejam e precisam e o que realmente fazem. Quanto maior o segredo, mais prováveis os vazamentos. O caminho para superá-los é assegurar um mecanismos robustos para acesso público a informação relevante.
Graças à internet, esperamos um nível muito maior de conhecimento e participação, em muitos aspectos de nossas vidas. Mas os políticos resistem resolutamente aos novos tempos. Vêem-se como tutores de um público infantil – que não merece nem a verdade, nem o poder real que o conhecimento oferece.
Muito da revolta governamental sobre os vazamentos não tem a ver com o conteúdo do que é revelado, mas com a audácia de quem rompe o que eram fortalezas invioláveis da autoridade. No passado, confiávamos nas autoridades. Se um governante nos dissesse que algo poderia prejudicar a segurança nacional, tomávamos a afirmação como verdade. Agora,os dados crus por trás desta crença estão se tornando públicos. O que percebemos de vazamentos sobre as despesas de parlamentares, ou a cumplicidade de governos com a tortura, é que quando os políticos falam sobre uma ameaça à “segurança nacional”, referem-se frequentemente à defesa de sua própria posição ameaçada.
Estamos num momento crucial, em que alguns visionários, na vanguarda de uma era digital, enfrentam quem tenta, desesperadamente, controlar o que sabemos. O Wikileaks é o front de guerrilha, num movimento global por maior transparência e participação. Projetos como o Ushahidi usam redes sociais para criar mapas onde os cidadãos podem relatar violências e desafiar a versão oficial dos fatos. Há ativistas empenhados em liberar dados oficiais, para que as pessoas possam ver, por exemplo, os orçamentos públicos em detalhe.
Por ironia, o Departamento de Estado dos EUA foi um dos grandes incentivadores da inovação técnica, como meio para levar a democracia a países como o Irã e a China. O presidente Obama exortou regimes repressores a deixar de censurar a internet. No entanto, uma lei que tramita no Congresso permite ao Procurador-Geral em Washington criar uma “lista suja” de websites. É possível acreditar numa democracia forte apenas para assuntos externos?
Os governantes costumavam controlar os cidadãos por meio do fluxo restrito de informações. Agora, está se tornando impossível vigiar o que a sociedade lê, vê e ouve. A tecnologia permite desafiar coletivamente a autoridade. Os poderosos vigiaram por muito tempo as sociedades, para controlá-las. Agora, os cidadãos estão lançando um olhar coletivo sobre o poder.
É uma revolução, e todas as revoluções geram medos e incertezas. Caminhamos para um Novo Iluminismo da Informação? Ou a revanche daqueles quer querem manter controle a qualquer custo nos levará a um novo totalitarismo? O que ocorrer nos próximos cinco anos definirá o futuro da democracia no próximo século. Por isso, seria ótimo que os nossos líderes respondessem aos desafios de hoje com um olhar sobre o futuro.
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A diplomacia sempre incluiu jantares com as elites dominantes, acertos de bastidores e encontros clandestinos. Agora, na era digital, os relatos de todas estas festas e diálogos aristocráticos pode ser reunido numa enorme base de dados. Uma vez recolhidos em formato digital, é muito fácil compartilhá-los.
Na verdade, é para isso que a base de dados Siprnet, de onde os segredos diplomáticos norte- americanos são vazados, foi criada. A comissão governamental criada nos EUA para avaliar a segurança nacional após o 11 de Setembro fez uma descoberta notável: não era o compartilhamento de informações que ameaçava os EUA, mas o não-compartilhamento. A falta de cooperação entre agências governamentais e a retenção de informações por burocratas desperdiçaram muitas oportunidade para bloquear os ataques contra as Torres Gêmeas. Em resposta, a comissão ordenou uma restruturação dos serviços do governo e da inteligência, para que se adaptassem à própria web. A nova prática era de colaboração e compartilhamento de informações. Mas, ao contrário de milhões de membros do governo e empresas terceirizadas, o público não tinha acesso à Siprnet.
Porém, os dados têm o hábito de se espalhar. Eles escorregam entre a segurança militar e também podem vazar pelo Wikileaks, o meio pelo qual eu obtive as informações. Eles violaram até os prazos de fechamento do Guardian e de outros jornais envolvidos na divulgação da história, quando um cópia clandestina do semanário alemão Der Spiegel acidentalmente chegou às bancas em Basle, na Suíça, domingo passado. Alguém a comprou, entendeu o que ela continha e começou a escanear as páginas, traduzindo-as do alemão para o inglês e postando no Twitter. Parece que os dados digitalizados não respeitam autoridade alguma, esteja ela no Pentágono, no Wikilieaks ou num editor de jornais.
Cada um de nós já viveu, pessoalmente, as enormes mudanças que vêm com a digitalização. Fatos ou informação que considerávamos efêmeros e privados agora são permanetes, públicos e agregáveis. Se o volume dos atuais vazamentos parece grande, pense nos 500 milhões de usuários do Facebook, ou nos milhões de registros mantidos pelo Google. Os governos mantêm nossos dados pessoais em enormes bases. Era caro obter e distribuir informação. Agora, é caro retê-la.
Mas quando os devassa de dados atinge o público, os governantes parecem não se importar muito. Nossa privacidade é disponível. Não surpreende que a reação aos novos vazamentos seja, agora, diferente. O que transformou, num sentido revolucionário, a dinâmica do poder não é a escala das revelações – mas o fato de que indivíduos podem tornar pública uma cópia de documentos do Estado. Em papel, estes vazamentos equivalem, segundo estimativas do Guardian, a 213.969 paginas A4, que teriam, empilhadas, a altura de 43 quilômetros. Algo impossível de vazar com segurança, na era do papel.
Para alguns, a novidade significa uma crise. Para outros, uma oportunidade. A tecnologia está rompendo as barreiras tradicionais de classe, poder, riqueza e geografia – e substituindo-as por um ethos de colaboração e transparência.
Um ex-embaixador dos Estados Unidos na Rússia, James Collins, disse à CNN que a revelação dos registros pelo Wikileaks “impedirá que as coisas seja feitas de forma normal e civilizada”. Muito frequentemente, “normal” e “civilizado” significa, na linguagem diplomática, fazer vistas grossas para injustiças sociais flagrantes, corrupção e abuso de poder. Depois de ler centenas de documentos, constato que muito dos “danos” que eles provocam é revelação embaraçosa e constrangedora de verdades inconvenientes. Em nome da segurança de uma base militar num dado país, nossos líderes aceitam um ditador brutal que oprime seu povo. Isso pode ser conveniente a curto prazo para os políticos, mas as consequências a longo prazo para os cidadãos do planeta podem ser catastróficas.
Os vazamentos não são o problema, apenas o sintoma. Revelam a desconexão entre aquilo que as pessoas desejam e precisam e o que realmente fazem. Quanto maior o segredo, mais prováveis os vazamentos. O caminho para superá-los é assegurar um mecanismos robustos para acesso público a informação relevante.
Graças à internet, esperamos um nível muito maior de conhecimento e participação, em muitos aspectos de nossas vidas. Mas os políticos resistem resolutamente aos novos tempos. Vêem-se como tutores de um público infantil – que não merece nem a verdade, nem o poder real que o conhecimento oferece.
Muito da revolta governamental sobre os vazamentos não tem a ver com o conteúdo do que é revelado, mas com a audácia de quem rompe o que eram fortalezas invioláveis da autoridade. No passado, confiávamos nas autoridades. Se um governante nos dissesse que algo poderia prejudicar a segurança nacional, tomávamos a afirmação como verdade. Agora,os dados crus por trás desta crença estão se tornando públicos. O que percebemos de vazamentos sobre as despesas de parlamentares, ou a cumplicidade de governos com a tortura, é que quando os políticos falam sobre uma ameaça à “segurança nacional”, referem-se frequentemente à defesa de sua própria posição ameaçada.
Estamos num momento crucial, em que alguns visionários, na vanguarda de uma era digital, enfrentam quem tenta, desesperadamente, controlar o que sabemos. O Wikileaks é o front de guerrilha, num movimento global por maior transparência e participação. Projetos como o Ushahidi usam redes sociais para criar mapas onde os cidadãos podem relatar violências e desafiar a versão oficial dos fatos. Há ativistas empenhados em liberar dados oficiais, para que as pessoas possam ver, por exemplo, os orçamentos públicos em detalhe.
Por ironia, o Departamento de Estado dos EUA foi um dos grandes incentivadores da inovação técnica, como meio para levar a democracia a países como o Irã e a China. O presidente Obama exortou regimes repressores a deixar de censurar a internet. No entanto, uma lei que tramita no Congresso permite ao Procurador-Geral em Washington criar uma “lista suja” de websites. É possível acreditar numa democracia forte apenas para assuntos externos?
Os governantes costumavam controlar os cidadãos por meio do fluxo restrito de informações. Agora, está se tornando impossível vigiar o que a sociedade lê, vê e ouve. A tecnologia permite desafiar coletivamente a autoridade. Os poderosos vigiaram por muito tempo as sociedades, para controlá-las. Agora, os cidadãos estão lançando um olhar coletivo sobre o poder.
É uma revolução, e todas as revoluções geram medos e incertezas. Caminhamos para um Novo Iluminismo da Informação? Ou a revanche daqueles quer querem manter controle a qualquer custo nos levará a um novo totalitarismo? O que ocorrer nos próximos cinco anos definirá o futuro da democracia no próximo século. Por isso, seria ótimo que os nossos líderes respondessem aos desafios de hoje com um olhar sobre o futuro.
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A mídia independente depois das eleições
Reproduzo artigo de Tadeu Breda, publicado no sítio Latitude Sul:
Foi bastante compreensiva, para não dizer providencial, a postura combativa dos meios de comunicação alternativos durante o segundo turno das eleições presidenciais brasileiras. Muitas revistas e jornais de pequena circulação, blogues e iniciativas digitais, como o 48hdemocracia, simplesmente não titubearam em vestir a camisa de Dilma Rousseff. O objetivo era claro: defender a candidata do PT contra as investidas da campanha de José Serra e as manipulações da chamada grande imprensa – para muitos, favorável ao tucano.
Pudera. Menos de um mês depois da apuração, virou clichê dizer que o processo eleitoral de 2010 ficará marcado como um dos mais pobres em discussões e ideias desde a redemocratização. A disputa pela sucessão de Luiz Inácio Lula da Silva talvez tenha sido o ponto álgido do marketing político e do oportunismo eleitoreiro. Nunca se viu marqueteiros tão poderosos a ponto de dobrar convicções ideológicas e apequená-las diante da sanha pelo poder e da caça indiscriminada de votos. Até quem nunca tinha ido à igreja ajoelhou-se e rezou para os padroeiros da opinião pública.
Na tevê, no rádio e sobretudo na internet, a campanha demo-tucana e seus apoiadores (voluntários ou não) preferiram apelar para os mais profundos preconceitos da sociedade brasileira como estratégia para angariar, através do medo, um apoio popular que nunca tiveram e reverter, pela pobreza do discurso moralista, o resultado das pesquisas, que vinham anunciando mais uma vitória do petismo.
A tática foi bastante parecida com a estratégia derrotada de 2002. Faltou apenas colocar uma estrela de novela confessando seu temor eleitoral diante das câmeras. Desta vez, porém, o PSDB resolveu ir mais fundo em seu conservadorismo e pedir socorro aos representantes de Jesus Cristo na Terra.
Todos nos lembraremos – e não devemos nos esquecer jamais – que José Serra convocou para a batalha das urnas o apoio dos setores mais retrógrados do país e pactuou com as alas extremistas tanto da igreja católica como das evangélicas. Apesar de autoelogiar seu desempenho como ministro da Saúde, o candidato aliou-se com gente que desconsidera a epidemia de aids que paira pelo mundo, a importância social do planejamento familiar e que, ainda hoje, se presta a fazer campanha contra o uso de preservativos.
José Serra praticou deliberadamente o obscurantismo em torno de temas tão polêmicos quanto importantes para o bem-estar da população, como é o caso do aborto e da união civil de homossexuais, aferrando-se ao medievalismo cristão para angariar votos entre os poucos fiéis que ainda fazem o que o padre diz. Também manipulou o papel histórico desempenhado pela resistência armada durante a ditadura militar. Sua guerrilha digital vestiu Dilma Rousseff de verde oliva e impôs-lhe um charutão a la Fidel Castro entre os dentes.
No auge da empulhação, o tucano simulou uma agressão física que nunca existiu. Tanto que sua calva seguiu lustrosa e radiante durante toda a passeata que realizou no Rio de Janeiro. A bolinha de papel pode ter doído no brio, mas não lhe feriu a cabeça.
Por fim, é digno de nota – e despreço – o renascimento da xenofobia no Brasil. Desta vez o bairrismo paulista e o ódio contra nordestinos transcendeu os ambientes privados e escapou pelo twitter. É certo que a onda de manifestações preconceituosas foi desencadeada pelas declarações de José Serra e seus asseclas, que endossaram a tese de que as eleições dividiram o país entre indivíduos pobres e incapacitados, que moram no Nordeste e votam em Dilma, versus cidadãos conscientes, que habitam as regiões mais prósperas e apertaram 45 para presidente.
Lá como cá
Muitas análises compararam a postura anti-argumentativa e preconceituosa da Coligação Brasil Pode Mais (PSDB, DEM, PPS) ao discurso revisionista do Tea Party, a grande sensação política do momento nos Estados Unidos. Nitidamente, a principal semelhança entre um e outro é a opção por fugir do debate sério e aprofundado, livre de lugares-comuns, sobre as questões mais prementes para o futuro do país.
O movimento Tea Party surgiu na esteira da vitória de Barack Hussein Obama, em 2008. A musa do movimento, Sarah Palin, foi então candidata a vice na chapa derrotada, encabeçada por John McCain. Ambos pertencem ao Partido Republicano, e foi exatamente entre seus membros que se acomodou o Tea Party. No seio conservador da América, não precisou de muito esforço para crescer. Afinal, um objetivo comum unificou os interesses da direita ianque: derrocar o primeiro negro a assumir a Casa Branca, que, não bastasse a cor da pele, ainda tem sobrenome árabe.
Na mesma semana em que o Brasil escolhia seu próximo chefe-de-estado, os estadunidenses eram chamados a definir a composição da Câmara e do Senado para os próximos quatro anos. E as eleições legislativas impuseram uma profunda derrota ao governo democrata. Mais que um mero fracasso político de Barack Obama, o evento significou o maior fiasco de um presidente em influenciar a composição do parlamento desde 1938. Os democratas perderam a maioria entre os deputados, que haviam conseguido durante a administração George W. Bush, e viram sua vantagem minguar a um empate técnico entre os senadores.
A estratégia dos republicanos, capitaneados pelo Tea Party, foi bastante clara. Acusaram o presidente de ser um marxista empedernido, de praticar secretamente o Islã, de querer aumentar o poder e a influência do estado na vida dos cidadãos e de internalizar valores tribais herdados de seus antepassados quenianos. Para a direita, Barack Obama não está imbuído dos princípios americanos.
O Tea Party abominou a reforma democrata no sistema de saúde e rechaçou o pacote econômico lançado pela Casa Branca para aliviar os efeitos da crise no país. Aliás, num enorme esforço de desinformação, a ala mais conservadora dos conservadores estadunidenses atribuiu ao presidente toda a responsabilidade pela recessão – senão pelas suas causas, pelo fracasso em paliar suas consequências.
Na terra do Tio Sam, portanto, o Tea Party já conseguiu colher expressivos resultados eleitorais e ninguém duvida que sua retórica tresloucada imporá novas derrotas políticas ao governo democrata. Com a guinada republicana e a ascensão dos radicais de direita, Barack Obama ficou engessado na presidência.
A reforma no sistema de saúde corre o risco de morrer de inanição pelo boicote anunciado à assignação de recursos. E a política externa obamista, que tem buscado mais diálogo do que Washington estava acostumado e que rendeu ao presidente um prematuro prêmio Nobel da Paz, pode voltar a adotar o bordão “nós ganhamos, eles perdem”.
O esperançoso bordão Yes We Can, que uniu forças progressistas em torno da figura de Obama e de suas promessas de mudança, fatalmente se transformará num lema inócuo quando encontrar a barreira montada pela oposição no Congresso.
Risco de retrocesso
O caso dos Estados Unidos demonstra que as táticas de manipulação e preconceito político sim podem influenciar no resultado das eleições e destruir, do dia para a noite, projetos nacionais que levaram décadas para serem postos em prática.
No Brasil ainda não existe um movimento conservador com tanto apelo popular, mas o PSDB se aproximou perigosamente da baixaria do Tea Party neste segundo turno. Basta lembrar que José Serra saiu por aí frequentando missas, beijando santos, lendo a Bíblia e distribuindo panfletos com os dizeres “Jesus é a verdade e a justiça”. Enquanto encarnava o papel de missionário, dava sermões sobre seu papel de redentor das liberdades civis no país, sobretudo da liberdade de imprensa, que estaria em risco no caso de mais uma vitória do PT.
Entre seus cabos eleitorais, estava o bispo de Guarulhos, dom Luiz Bergonzini. Por intermédio de um militante da causa monarquista, o religioso mandou imprimir folhetos com o logo da CNBB condenando o aborto e sugerindo o voto no tucano. O papa Bento 16, às vésperas do pleito e com ampla cobertura dos meios de comunicação, também deu um empurrãozinho na candidatura do PSDB. No flanco evangélico, o apóstolo Renê Terra Nova não poupou esforços para viajar o Brasil com seu jatinho semeando a palavra de deus travestida de propaganda serrista.
O segundo turno forjou um cenário eleitoral em que os avanços sociais e democráticos alcançados durante o governo Lula foram repentinamente lançados à berlinda das urnas. Dois caminhos estavam à disposição dos brasileiros. Com Dilma, poderíamos seguir uma rota semelhante à trilhada nos últimos 8 anos e, por ventura, aprofundar as mudanças. Com Serra, o retrocesso batia à porta, exposto pelas alianças costuradas pelo PSDB na tentativa de vencer a qualquer custo.
Foi então que a imprensa alternativa reagiu prontamente. Cada ataque da campanha de José Serra ou do noticiário tucanófilo era acompanhado de uma enxurrada de contrapontos, argumentos, fatos e imagens, veiculados pela internet, por jornais ou revistas de esquerda. Talvez o maior exemplo da capacidade de resposta dos meios alternativos tenha sido a determinação dos blogues em destruir a farsa montada pela Rede Globo ao redor da bolinha de papel.
Houve vítimas pelo caminho, claro. A psicoanalista Maria Rita Kehl, que até o segundo turno escreveu para o jornal O Estado de S. Paulo, foi demitida após defender o Bolsa-Família e criticar as correntes anti-nordestinas que pipocavam nas caixas de e-mail pelo Brasil afora. O semanário CartaCapital foi chamado a explicar perante a Justiça os contratos de publicidade que mantém com o governo federal. A Revista do Brasil foi censurada pelo TSE após estampar o rosto de Dilma Rousseff na capa de sua edição de outubro, publicada uma semana depois do primeiro turno.
A polarização era tanta que teve jornalista demitido até no Ceará. Seu pecado foi publicar um caderno especial sobre o intelectual franco-brasileiro Michael Löwy e dois livros de sua autoria: Revoluções e Aviso de Incêndio. Também houve repórteres hostilizados durante o exercício da profissão. Foi com um raivoso “pelego filho da puta” que Aloysio Nunes Ferreira, senador eleito por São Paulo, recebeu um trabalhador da imprensa alternativa por demais insolente ao ponto de querer entrevistá-lo.
Depois da militância
A mídia alternativa desempenhou um duplo papel durante as eleições: não só cumpriu com suas obrigações jornalísticas ao desfazer manipulações, combater preconceitos e oferecer diferentes pontos de vista sobre os fatos, como também atuou política e partidariamente com o objetivo de garantir a vitória de uma candidatura que, a seu juízo – e o segundo turno deixou poucas dúvidas disso –, representava a melhor opção para governar o país. Na maioria das vezes, foi feliz e matou estes dois coelhos com uma cajadada só.
Contudo, passado o susto de uma ressaca conservadora que não aconteceu, talvez seja o momento de jornalistas independentes e meios de comunicação alternativos reavaliarem seu posicionamento no teatro do bem e do mal da política brasileira. Afinal, qual é a linha que separa o chapa-branquismo da defesa do interesse público?
No segundo turno de polarizações eleitorais, criticar as vicissitudes do governo Lula ou as deficiências de Dilma Rousseff era dar munição à violenta campanha montada pela oposição. Por isso, às vésperas do pleito, a corrida presidencial ganhou ares de jogo de futebol. Se os brasileiros deixamos de ser cidadãos e fomos transformados em torcida organizada, o jornalismo seguiu o mesmo rumo: era PT ou PSDB, Gaviões da Fiel ou Mancha Verde, sem meio termo.
Qualquer desconfiança quanto à própria escolha significava ceder à “superioridade” do adversário. A política deu lugar à paixão. E, entre apaixonados, no esporte ou nas eleições, não há diálogo nem entendimento. Tampouco autocrítica: afinal, não se critica o próprio time na final de um campeonato. O atacante pode estar fora de forma e o técnico, ser um energúmeno. O que importa é ganhar.
Dilma ganhou e, felizmente, a peleja chegou ao fim. Como sempre, depois de um processo eleitoral, agora há um país a construir e que tem que dar certo para a maioria. Em tempos de paz, talvez não seja papel do jornalismo – nem do tradicional nem do alternativo – vestir a camisa deste ou daquele partido. Isso não quer dizer que temos de ressuscitar os mitos enterrados da imparcialidade. Tomar partido em épocas de polarização, como vimos, é saudável. Porém, submeter-se aos ditames de um grupo político a tempo completo pode ser danoso.
Em última análise, não há qualquer mal intrínseco em transformar-se no porta-voz de um projeto de poder. Nas democracias mais maduras, as forças partidárias estão bem representadas na imprensa. Na Espanha, o El País mantém relações com o PSOE. Nos Estados Unidos, os democratas estão mais presentes no New York Times. O Il Manifesto, da Itália, não esconde sua preferência comunista. Esta é uma opção legítima para externar à sociedade como uma agremiação política vê o mundo e interpreta a realidade. Da mesma maneira que, no Brasil, os grandes meios de comunicação se identificam com as pautas liberais e com as candidaturas mais conservadoras, como as do PSDB, é saudável que o PT e todos os demais partidos, à medida que ganhem força, também tenham aliados na trincheira midiática.
Entretanto, já passou da hora de jornalistas e meios de comunicação independentes (ou pelo menos os que desejem denominar-se como tais) assumirem papel protagônico no cenário informativo brasileiro. Entre blogueiros e profissionais que ganham a vida fora do eixo tradicional, há capacidade de sobra em braços e cabeças para elaborar uma cobertura livre das amarras mercadológicas e da estreiteza temática da opinião pública.
A internet oferece milhões de possibilidades para a criação de novos paradigmas informativos em áudio, texto, vídeo e imagens, ou na fusão simultânea de todas as mídias, tudo a baixo custo. E há pautas suficientes para preencher um novo noticiário permanente que consiga abarcar, com qualidade técnica e estética, os temas de maior interesse à sociedade nacional e internacional – sobretudo os que não estão ou não encontram na imprensa de massa o espaço que merecem.
Não há razões, portanto, para que os jornalistas independentes se restrinjam ao papel subalterno de combater as infinitas distorções da grande mídia. Estar atento para o que acontece no main stream sempre foi e continuará sendo importante. Afinal, é através do Jornal Nacional, da Veja e dos jornalões que se constrói o senso comum no país. E, ao desconstruir a visão de mundo que diariamente penetra nos lares brasileiros, o jornalismo alternativo oferece novas maneiras de enxergar os fatos, as fotos e as declarações.
Continuar nesta trilha, porém, é ficar à reboque da pauta tradicional – ainda que seja um reboque às avessas. Assim, os veículos da imprensa alternativa correm o risco de se transformar em observatórios de mídia: darão um passo para fora do jornalismo e assumirão funções de críticos, o que já é feito há muito tempo por alguns acadêmicos e, claro, pelo Observatório da Imprensa.
O salto da reportagem
Chegamos ao limite da crítica. O jornalismo alternativo precisa mudar de patamar se quiser continuar existindo de maneira independente e cercar-se de legitimidade social. Porque o melhor combate à grande imprensa se dá oferecendo ao público um conteúdo melhor, que traz em cada manchete o ideal que se revela nas entrelinhas da crítica: opiniões menos superficiais, matérias mais completas, pautas que problematizem a realidade ao invés de simplesmente reproduzi-la ou contrapô-la pelo automatismo cotidiano.
O grande filão do jornalismo independente é a reportagem, que hoje em dia foi colocada em segundo plano pela imensa maioria dos meios de comunicação tradicionais. E por um motivo bastante simples: realizar investigações jornalísticas é muito caro e traz pouco resultado comercial. Aliás, uma boa reportagem muitas vezes atenta contra o mercado publicitário, pois tem a nobre vocação de chafurdar fundo nas mazelas sociais que via de regra põem em xeque o interesse de empresas, instituições ou governos — enfim, os anunciantes em potencial. A reportagem precisa de dinheiro tanto quanto tem o potencial de repeli-lo. Eis a grande sinuca de bico do jornalismo independente hoje.
Assumir uma postura governista durante a gestão do PT pode dar sobrevida econômica aos meios de comunicação alternativos. Não foi à toa que, durante o governo Lula, o Brasil assistiu à diversificação política da imprensa. Antes dominado por conglomerados empresariais, hoje o noticiário brasileiro é mais plural. Os últimos 8 anos ampliaram a liberdade de comunicação e expressão no país, o que é motivo de comemoração, mas ainda estamos longe do ideal.
Nenhum cidadão ficará satisfeito com a divisão da comunicação social entre veículos pró-PT, pró-PSDB ou pró-qualquer-coisa. O jornalismo independente é um serviço público e deve advogar em causa própria. E a causa da imprensa livre foi e sempre será o interesse da maioria da população — ou da fatia social que ela se diz representar. Direitos humanos, justiça social, preservação do meio-ambiente, bem-estar coletivo e liberdades civis são alguns dos valores que podem nortear o ofício de informar.
É a partir deles – e, eventualmente, de sua ampliação e radicalização – que o jornalismo pode escolher criticar ou elogiar governos e desgovernos pelo mundo afora. Elogiar, porém, me parece bastante complicado, já que sempre é possível para a administração pública fazer mais e melhor. Talvez seja a sina do jornalista independente estar permanentemente na oposição, não porque desprecie tudo o que existe ou não seja capaz de reconhecer avanços, mas porque não deve descansar enquanto houver qualquer rastro de injustiça e desigualdade no planeta. É longo o trabalho que tem pela frente: revelar o que está escondido, trazer à tona o que foi submerso pela indiferença cotidiana, discutir o que normalmente não se discute.
Felizmente, a internet está aí para servir-nos. O grande desafio, quem sabe, seja saber como podemos remunerar e possibilitar vida digna aos jornalistas capazes e dispostos a serem independentes. Afinal, por mais autônomo que consiga ser, ninguém escapa da ditadura das contas.
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Foi bastante compreensiva, para não dizer providencial, a postura combativa dos meios de comunicação alternativos durante o segundo turno das eleições presidenciais brasileiras. Muitas revistas e jornais de pequena circulação, blogues e iniciativas digitais, como o 48hdemocracia, simplesmente não titubearam em vestir a camisa de Dilma Rousseff. O objetivo era claro: defender a candidata do PT contra as investidas da campanha de José Serra e as manipulações da chamada grande imprensa – para muitos, favorável ao tucano.
Pudera. Menos de um mês depois da apuração, virou clichê dizer que o processo eleitoral de 2010 ficará marcado como um dos mais pobres em discussões e ideias desde a redemocratização. A disputa pela sucessão de Luiz Inácio Lula da Silva talvez tenha sido o ponto álgido do marketing político e do oportunismo eleitoreiro. Nunca se viu marqueteiros tão poderosos a ponto de dobrar convicções ideológicas e apequená-las diante da sanha pelo poder e da caça indiscriminada de votos. Até quem nunca tinha ido à igreja ajoelhou-se e rezou para os padroeiros da opinião pública.
Na tevê, no rádio e sobretudo na internet, a campanha demo-tucana e seus apoiadores (voluntários ou não) preferiram apelar para os mais profundos preconceitos da sociedade brasileira como estratégia para angariar, através do medo, um apoio popular que nunca tiveram e reverter, pela pobreza do discurso moralista, o resultado das pesquisas, que vinham anunciando mais uma vitória do petismo.
A tática foi bastante parecida com a estratégia derrotada de 2002. Faltou apenas colocar uma estrela de novela confessando seu temor eleitoral diante das câmeras. Desta vez, porém, o PSDB resolveu ir mais fundo em seu conservadorismo e pedir socorro aos representantes de Jesus Cristo na Terra.
Todos nos lembraremos – e não devemos nos esquecer jamais – que José Serra convocou para a batalha das urnas o apoio dos setores mais retrógrados do país e pactuou com as alas extremistas tanto da igreja católica como das evangélicas. Apesar de autoelogiar seu desempenho como ministro da Saúde, o candidato aliou-se com gente que desconsidera a epidemia de aids que paira pelo mundo, a importância social do planejamento familiar e que, ainda hoje, se presta a fazer campanha contra o uso de preservativos.
José Serra praticou deliberadamente o obscurantismo em torno de temas tão polêmicos quanto importantes para o bem-estar da população, como é o caso do aborto e da união civil de homossexuais, aferrando-se ao medievalismo cristão para angariar votos entre os poucos fiéis que ainda fazem o que o padre diz. Também manipulou o papel histórico desempenhado pela resistência armada durante a ditadura militar. Sua guerrilha digital vestiu Dilma Rousseff de verde oliva e impôs-lhe um charutão a la Fidel Castro entre os dentes.
No auge da empulhação, o tucano simulou uma agressão física que nunca existiu. Tanto que sua calva seguiu lustrosa e radiante durante toda a passeata que realizou no Rio de Janeiro. A bolinha de papel pode ter doído no brio, mas não lhe feriu a cabeça.
Por fim, é digno de nota – e despreço – o renascimento da xenofobia no Brasil. Desta vez o bairrismo paulista e o ódio contra nordestinos transcendeu os ambientes privados e escapou pelo twitter. É certo que a onda de manifestações preconceituosas foi desencadeada pelas declarações de José Serra e seus asseclas, que endossaram a tese de que as eleições dividiram o país entre indivíduos pobres e incapacitados, que moram no Nordeste e votam em Dilma, versus cidadãos conscientes, que habitam as regiões mais prósperas e apertaram 45 para presidente.
Lá como cá
Muitas análises compararam a postura anti-argumentativa e preconceituosa da Coligação Brasil Pode Mais (PSDB, DEM, PPS) ao discurso revisionista do Tea Party, a grande sensação política do momento nos Estados Unidos. Nitidamente, a principal semelhança entre um e outro é a opção por fugir do debate sério e aprofundado, livre de lugares-comuns, sobre as questões mais prementes para o futuro do país.
O movimento Tea Party surgiu na esteira da vitória de Barack Hussein Obama, em 2008. A musa do movimento, Sarah Palin, foi então candidata a vice na chapa derrotada, encabeçada por John McCain. Ambos pertencem ao Partido Republicano, e foi exatamente entre seus membros que se acomodou o Tea Party. No seio conservador da América, não precisou de muito esforço para crescer. Afinal, um objetivo comum unificou os interesses da direita ianque: derrocar o primeiro negro a assumir a Casa Branca, que, não bastasse a cor da pele, ainda tem sobrenome árabe.
Na mesma semana em que o Brasil escolhia seu próximo chefe-de-estado, os estadunidenses eram chamados a definir a composição da Câmara e do Senado para os próximos quatro anos. E as eleições legislativas impuseram uma profunda derrota ao governo democrata. Mais que um mero fracasso político de Barack Obama, o evento significou o maior fiasco de um presidente em influenciar a composição do parlamento desde 1938. Os democratas perderam a maioria entre os deputados, que haviam conseguido durante a administração George W. Bush, e viram sua vantagem minguar a um empate técnico entre os senadores.
A estratégia dos republicanos, capitaneados pelo Tea Party, foi bastante clara. Acusaram o presidente de ser um marxista empedernido, de praticar secretamente o Islã, de querer aumentar o poder e a influência do estado na vida dos cidadãos e de internalizar valores tribais herdados de seus antepassados quenianos. Para a direita, Barack Obama não está imbuído dos princípios americanos.
O Tea Party abominou a reforma democrata no sistema de saúde e rechaçou o pacote econômico lançado pela Casa Branca para aliviar os efeitos da crise no país. Aliás, num enorme esforço de desinformação, a ala mais conservadora dos conservadores estadunidenses atribuiu ao presidente toda a responsabilidade pela recessão – senão pelas suas causas, pelo fracasso em paliar suas consequências.
Na terra do Tio Sam, portanto, o Tea Party já conseguiu colher expressivos resultados eleitorais e ninguém duvida que sua retórica tresloucada imporá novas derrotas políticas ao governo democrata. Com a guinada republicana e a ascensão dos radicais de direita, Barack Obama ficou engessado na presidência.
A reforma no sistema de saúde corre o risco de morrer de inanição pelo boicote anunciado à assignação de recursos. E a política externa obamista, que tem buscado mais diálogo do que Washington estava acostumado e que rendeu ao presidente um prematuro prêmio Nobel da Paz, pode voltar a adotar o bordão “nós ganhamos, eles perdem”.
O esperançoso bordão Yes We Can, que uniu forças progressistas em torno da figura de Obama e de suas promessas de mudança, fatalmente se transformará num lema inócuo quando encontrar a barreira montada pela oposição no Congresso.
Risco de retrocesso
O caso dos Estados Unidos demonstra que as táticas de manipulação e preconceito político sim podem influenciar no resultado das eleições e destruir, do dia para a noite, projetos nacionais que levaram décadas para serem postos em prática.
No Brasil ainda não existe um movimento conservador com tanto apelo popular, mas o PSDB se aproximou perigosamente da baixaria do Tea Party neste segundo turno. Basta lembrar que José Serra saiu por aí frequentando missas, beijando santos, lendo a Bíblia e distribuindo panfletos com os dizeres “Jesus é a verdade e a justiça”. Enquanto encarnava o papel de missionário, dava sermões sobre seu papel de redentor das liberdades civis no país, sobretudo da liberdade de imprensa, que estaria em risco no caso de mais uma vitória do PT.
Entre seus cabos eleitorais, estava o bispo de Guarulhos, dom Luiz Bergonzini. Por intermédio de um militante da causa monarquista, o religioso mandou imprimir folhetos com o logo da CNBB condenando o aborto e sugerindo o voto no tucano. O papa Bento 16, às vésperas do pleito e com ampla cobertura dos meios de comunicação, também deu um empurrãozinho na candidatura do PSDB. No flanco evangélico, o apóstolo Renê Terra Nova não poupou esforços para viajar o Brasil com seu jatinho semeando a palavra de deus travestida de propaganda serrista.
O segundo turno forjou um cenário eleitoral em que os avanços sociais e democráticos alcançados durante o governo Lula foram repentinamente lançados à berlinda das urnas. Dois caminhos estavam à disposição dos brasileiros. Com Dilma, poderíamos seguir uma rota semelhante à trilhada nos últimos 8 anos e, por ventura, aprofundar as mudanças. Com Serra, o retrocesso batia à porta, exposto pelas alianças costuradas pelo PSDB na tentativa de vencer a qualquer custo.
Foi então que a imprensa alternativa reagiu prontamente. Cada ataque da campanha de José Serra ou do noticiário tucanófilo era acompanhado de uma enxurrada de contrapontos, argumentos, fatos e imagens, veiculados pela internet, por jornais ou revistas de esquerda. Talvez o maior exemplo da capacidade de resposta dos meios alternativos tenha sido a determinação dos blogues em destruir a farsa montada pela Rede Globo ao redor da bolinha de papel.
Houve vítimas pelo caminho, claro. A psicoanalista Maria Rita Kehl, que até o segundo turno escreveu para o jornal O Estado de S. Paulo, foi demitida após defender o Bolsa-Família e criticar as correntes anti-nordestinas que pipocavam nas caixas de e-mail pelo Brasil afora. O semanário CartaCapital foi chamado a explicar perante a Justiça os contratos de publicidade que mantém com o governo federal. A Revista do Brasil foi censurada pelo TSE após estampar o rosto de Dilma Rousseff na capa de sua edição de outubro, publicada uma semana depois do primeiro turno.
A polarização era tanta que teve jornalista demitido até no Ceará. Seu pecado foi publicar um caderno especial sobre o intelectual franco-brasileiro Michael Löwy e dois livros de sua autoria: Revoluções e Aviso de Incêndio. Também houve repórteres hostilizados durante o exercício da profissão. Foi com um raivoso “pelego filho da puta” que Aloysio Nunes Ferreira, senador eleito por São Paulo, recebeu um trabalhador da imprensa alternativa por demais insolente ao ponto de querer entrevistá-lo.
Depois da militância
A mídia alternativa desempenhou um duplo papel durante as eleições: não só cumpriu com suas obrigações jornalísticas ao desfazer manipulações, combater preconceitos e oferecer diferentes pontos de vista sobre os fatos, como também atuou política e partidariamente com o objetivo de garantir a vitória de uma candidatura que, a seu juízo – e o segundo turno deixou poucas dúvidas disso –, representava a melhor opção para governar o país. Na maioria das vezes, foi feliz e matou estes dois coelhos com uma cajadada só.
Contudo, passado o susto de uma ressaca conservadora que não aconteceu, talvez seja o momento de jornalistas independentes e meios de comunicação alternativos reavaliarem seu posicionamento no teatro do bem e do mal da política brasileira. Afinal, qual é a linha que separa o chapa-branquismo da defesa do interesse público?
No segundo turno de polarizações eleitorais, criticar as vicissitudes do governo Lula ou as deficiências de Dilma Rousseff era dar munição à violenta campanha montada pela oposição. Por isso, às vésperas do pleito, a corrida presidencial ganhou ares de jogo de futebol. Se os brasileiros deixamos de ser cidadãos e fomos transformados em torcida organizada, o jornalismo seguiu o mesmo rumo: era PT ou PSDB, Gaviões da Fiel ou Mancha Verde, sem meio termo.
Qualquer desconfiança quanto à própria escolha significava ceder à “superioridade” do adversário. A política deu lugar à paixão. E, entre apaixonados, no esporte ou nas eleições, não há diálogo nem entendimento. Tampouco autocrítica: afinal, não se critica o próprio time na final de um campeonato. O atacante pode estar fora de forma e o técnico, ser um energúmeno. O que importa é ganhar.
Dilma ganhou e, felizmente, a peleja chegou ao fim. Como sempre, depois de um processo eleitoral, agora há um país a construir e que tem que dar certo para a maioria. Em tempos de paz, talvez não seja papel do jornalismo – nem do tradicional nem do alternativo – vestir a camisa deste ou daquele partido. Isso não quer dizer que temos de ressuscitar os mitos enterrados da imparcialidade. Tomar partido em épocas de polarização, como vimos, é saudável. Porém, submeter-se aos ditames de um grupo político a tempo completo pode ser danoso.
Em última análise, não há qualquer mal intrínseco em transformar-se no porta-voz de um projeto de poder. Nas democracias mais maduras, as forças partidárias estão bem representadas na imprensa. Na Espanha, o El País mantém relações com o PSOE. Nos Estados Unidos, os democratas estão mais presentes no New York Times. O Il Manifesto, da Itália, não esconde sua preferência comunista. Esta é uma opção legítima para externar à sociedade como uma agremiação política vê o mundo e interpreta a realidade. Da mesma maneira que, no Brasil, os grandes meios de comunicação se identificam com as pautas liberais e com as candidaturas mais conservadoras, como as do PSDB, é saudável que o PT e todos os demais partidos, à medida que ganhem força, também tenham aliados na trincheira midiática.
Entretanto, já passou da hora de jornalistas e meios de comunicação independentes (ou pelo menos os que desejem denominar-se como tais) assumirem papel protagônico no cenário informativo brasileiro. Entre blogueiros e profissionais que ganham a vida fora do eixo tradicional, há capacidade de sobra em braços e cabeças para elaborar uma cobertura livre das amarras mercadológicas e da estreiteza temática da opinião pública.
A internet oferece milhões de possibilidades para a criação de novos paradigmas informativos em áudio, texto, vídeo e imagens, ou na fusão simultânea de todas as mídias, tudo a baixo custo. E há pautas suficientes para preencher um novo noticiário permanente que consiga abarcar, com qualidade técnica e estética, os temas de maior interesse à sociedade nacional e internacional – sobretudo os que não estão ou não encontram na imprensa de massa o espaço que merecem.
Não há razões, portanto, para que os jornalistas independentes se restrinjam ao papel subalterno de combater as infinitas distorções da grande mídia. Estar atento para o que acontece no main stream sempre foi e continuará sendo importante. Afinal, é através do Jornal Nacional, da Veja e dos jornalões que se constrói o senso comum no país. E, ao desconstruir a visão de mundo que diariamente penetra nos lares brasileiros, o jornalismo alternativo oferece novas maneiras de enxergar os fatos, as fotos e as declarações.
Continuar nesta trilha, porém, é ficar à reboque da pauta tradicional – ainda que seja um reboque às avessas. Assim, os veículos da imprensa alternativa correm o risco de se transformar em observatórios de mídia: darão um passo para fora do jornalismo e assumirão funções de críticos, o que já é feito há muito tempo por alguns acadêmicos e, claro, pelo Observatório da Imprensa.
O salto da reportagem
Chegamos ao limite da crítica. O jornalismo alternativo precisa mudar de patamar se quiser continuar existindo de maneira independente e cercar-se de legitimidade social. Porque o melhor combate à grande imprensa se dá oferecendo ao público um conteúdo melhor, que traz em cada manchete o ideal que se revela nas entrelinhas da crítica: opiniões menos superficiais, matérias mais completas, pautas que problematizem a realidade ao invés de simplesmente reproduzi-la ou contrapô-la pelo automatismo cotidiano.
O grande filão do jornalismo independente é a reportagem, que hoje em dia foi colocada em segundo plano pela imensa maioria dos meios de comunicação tradicionais. E por um motivo bastante simples: realizar investigações jornalísticas é muito caro e traz pouco resultado comercial. Aliás, uma boa reportagem muitas vezes atenta contra o mercado publicitário, pois tem a nobre vocação de chafurdar fundo nas mazelas sociais que via de regra põem em xeque o interesse de empresas, instituições ou governos — enfim, os anunciantes em potencial. A reportagem precisa de dinheiro tanto quanto tem o potencial de repeli-lo. Eis a grande sinuca de bico do jornalismo independente hoje.
Assumir uma postura governista durante a gestão do PT pode dar sobrevida econômica aos meios de comunicação alternativos. Não foi à toa que, durante o governo Lula, o Brasil assistiu à diversificação política da imprensa. Antes dominado por conglomerados empresariais, hoje o noticiário brasileiro é mais plural. Os últimos 8 anos ampliaram a liberdade de comunicação e expressão no país, o que é motivo de comemoração, mas ainda estamos longe do ideal.
Nenhum cidadão ficará satisfeito com a divisão da comunicação social entre veículos pró-PT, pró-PSDB ou pró-qualquer-coisa. O jornalismo independente é um serviço público e deve advogar em causa própria. E a causa da imprensa livre foi e sempre será o interesse da maioria da população — ou da fatia social que ela se diz representar. Direitos humanos, justiça social, preservação do meio-ambiente, bem-estar coletivo e liberdades civis são alguns dos valores que podem nortear o ofício de informar.
É a partir deles – e, eventualmente, de sua ampliação e radicalização – que o jornalismo pode escolher criticar ou elogiar governos e desgovernos pelo mundo afora. Elogiar, porém, me parece bastante complicado, já que sempre é possível para a administração pública fazer mais e melhor. Talvez seja a sina do jornalista independente estar permanentemente na oposição, não porque desprecie tudo o que existe ou não seja capaz de reconhecer avanços, mas porque não deve descansar enquanto houver qualquer rastro de injustiça e desigualdade no planeta. É longo o trabalho que tem pela frente: revelar o que está escondido, trazer à tona o que foi submerso pela indiferença cotidiana, discutir o que normalmente não se discute.
Felizmente, a internet está aí para servir-nos. O grande desafio, quem sabe, seja saber como podemos remunerar e possibilitar vida digna aos jornalistas capazes e dispostos a serem independentes. Afinal, por mais autônomo que consiga ser, ninguém escapa da ditadura das contas.
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Um passo corajoso na direção da paz
Reproduzo artigo enviado pelo amigo internacionalista Max Altman:
Em resposta a um pedido feito pelo presidente da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, o Brasil anunciou o reconhecimento de um Estado palestino nas fronteiras existentes antes da Guerra dos Seis Dias de junho de 1967. Trata-se da concretização da legítima aspiração do povo palestino a um Estado coeso, seguro, democrático e economicamente viável, coexistindo em paz com Israel.
A iniciativa do governo Lula abre caminho e favorece as imprescindíveis negociações entre Israel e os palestinos a fim de que se alcance concessões mútuas sobre outras questões centrais do conflito. O reconhecimento do estado da Palestina é a melhor maneira de tirar do estancamento as negociações de paz, buscar a estabilidade na região e aliviar a crise humanitária por que passa boa parte do povo palestino. Ao mesmo tempo Brasília condena quaisquer atos terroristas, praticados sob qualquer pretexto.
Com uma vitória militar arrasadora na Guerra dos Seis Dias, Israel ampliou seu território, muito além do estabelecido pela Partilha da Palestina, em 1948. Já em novembro de 1967, o Conselho de Segurança da ONU votou a célebre resolução 242 que determina que a efetivação dos princípios da Carta das Nações Unidas requer o estabelecimento de uma paz justa e duradoura no Oriente Médio que inclua a aplicação dos dois seguintes princípios:
1. Evacuação das forças armadas israelenses dos territórios ocupados no conflito recente;
2. Encerramento de todas as reivindicações ou estados de beligerância e respeito pelo reconhecimento da soberania, integridade territorial e independência política de cada Estado da região e de seu direito a viver em paz dentro das fronteiras seguras e reconhecidas, livres de ameaças ou de atos de força.
Afirma ainda a necessidade de: a- Garantia de liberdade de navegação através das águas internacionais da área; b- Conseguir um acordo justo para o problema dos refugiados; c- Garantir a inviolabilidade territorial e independência política de cada Estado da região, através de medidas que incluam a criação de zonas desmilitarizadas.
Esta resolução jamais foi respeitada por Israel sempre contando com o apoio de Washington. Levantaram-se questões semânticas - o texto não dizia evacuação de todos os territórios ocupados - e depois infindáveis obstáculos geoestratégicos e de diversas outras ordens.
Israel argumenta agora que o reconhecimento do Brasil viola o chamadoAcordo de Oslo 2, firmado entre o israelense Itzhak Rabin e o palestino Yasser Arafat em 28 de setembro de 1995, que prevê que o status final da Cisjordânia só poderá ser definido por meio de negociações diretas, portanto qualquer ação unilateral estaria vedada. Contudo, a história registra que poucas semanas depois da assinatura desse acordo em 4 de novembro de 1995, Rabin foi assassinado. Líderes de partidos de direita, incluído muitos membros do Knesset (Parlamento), foram acusados de incitação selvagem que levaram ao acontecimento.
As eleições de 1996 deram vitória ao partido de direita Likud, e Benjamin Netanyahu assumiu como primeiro-ministro, propondo-se a torpedear o Acordo de Oslo. O resultado do pleito trouxe de volta ao poder governantes que não estavam dispostos a continuar fazendo concessões em nome da paz. Em agosto de 1996, o governo anulou o decreto que proibia a expansão dos assentamentos judaicos na Cisjordânia.
A ocupação dos territórios palestinos já leva 43 anos. Só para citar um exemplo histórico, a Alemanha, responsável pela hecatombe da Segunda Guerra Mundial que vitimou dezenas de milhões de soldados e civis, que provocou no Holocausto o extermínio de 6 milhões de judeus, ocupada, após a sua capitulação pelas forças dos países Aliados, recuperou sua independência e integridade territorial 4 anos depois, em maio de 1949 - República Federal Alemã -, e em outubro de 1949 - República Democrática Alemã. Já em 1990, após a que do Muro de Berlim houve a reunificação.
Muitos países que mantêm relações intensas com Israel reconhecem a Palestina bem como a esmagadora maioria dos países representados na OBU. A iniciativa brasileira é consentânea com a postura histórica e a disposição inalterada de contribuir com o processo de paz, estando em consonância com as resoluções das Nações Unidas que exigem o fim da ocupação dos territórios palestinos e a construção de um Estado independente dentro de fronteiras reconhecidas, aquelas anteriores à Guerra dos Seis Dias. É a defesa do princípio de Dois Estados.
Posição histórica nesse sentido também é a do Partido dos Trabalhadores. Em meados dos anos 1990, membro do coletivo da Secretaria de Relações Internacionais, respeitando criteriosamente as teses defendidas pelo Partido, ajudamos a fundar, organizar e dirigir o Movimento Shalom Salam Paz. Esse movimento congregava brasileiros de ascendência judaica, sionistas e não sionistas, de esquerda e centro-esquerda, brasileiros de ascendência árabe, moderados e menos moderados, os de ascendência palestina e todos aqueles dispostos a lutar por uma paz justa e duradoura no Oriente Médio e em particular, entre Israel e os palestinos.
Foi extremamente difícil conciliar as posições, houve pressão das Federações judaica e árabe e do consulado de Israel, porém conseguiu-se aprovar os pontos básicos: desocupação dos territórios palestinos ocupados com a Guerra de 1967; respeito à Resolução 242 das Nações Unidas com o reconhecimento pelos palestinos do Estado de Israel com fronteiras demarcadas, reconhecidas internacionalmente, seguras e definitivas; criação do Estado palestino, laico e viável; estabelecimento de Jerusalém leste e oeste como capital de ambas as nações; reconhecimento do direito de retorno dentro de limites a serem acordados; direito de acesso à água definidos em acordo binacional; facilidade do direito de ir e vir e do comércio binacional.
Forças internacionais sob a égide da ONU garantiriam o cumprimento das decisões. O Shalom Salam Paz levou essas idéias a dezenas de faculdades e colégios, a diversas instituições, deu dezenas de entrevistas a jornais, rádios e televisões, participou de debates, esteve presente nos Fóruns Sociais Mundiais. O Partido dos Trabalhadores tem relações de camaradagem com partidos e organizações de esquerda, de centro-esquerda e progressistas de todo o mundo, inclusive de Israel. As pontes que deseja construir e manter devem ser alicerçadas em princípios comuns, de soberania, de auto-determinação dos povos, de relações fraternais entre povos e nações, de solução pacífica e justa para os confrontos internacionais.
Uma diabólica espiral de sangue e dor, com raros interregnos, tomou conta da região nas últimas décadas. Guerras convencionais, ações terroristas e retaliações terroristas sem fim e com teor cada vez mais cruel e aterrador atingindo pessoas inocentes, governos árabes massacrando palestinos, assassinato de Rabin, negociações de paz torpedeadas ao sabor de interesses estratégicos e de poder, massacre de Munique e chacina de Jenin, intifada um e dois.
Desde 1948, os palestinos estão condenados a viver submetidos a uma revoltante humilhação. Perderam suas terras, perderam a liberdade e nunca puderam formar e organizar seu Estado. Hoje o cerco se estreitou e se tornou cruel. Sem permissão, não têm acesso à agua, a alimentos, a medicamentos. Não têm empregos nem vida econômica normal. Não podem ir de Gaza à Cisjordania, seus dois pedaços de terra. Não lhes permitem circular extra-muros sem passar por vexaminosos controles. Gaza se transformou numa prisão quando seus habitantes votaram em quem seus vizinhos acharam que não deveriam ter votado.
A Palestina hoje é muito menor que a que sobrou da Guerra dos Seis Dias. Colônias são assentadas em suas terras e atrás vêm os soldados corrigindo a fronteira. Se os assentamentos não são suficientes, que se erga um muro comendo mais pedaços de terra. Se olharmos comparativamente os mapas vemos que pouca Palestina restou.
Sabemos que a atual composição do eleitorado israelense levou ao governo líderes que abraçam a solução de confronto e não reconhecimento deDois Estados laicos e democráticos. Se de um lado, moralmente, não pode um povo que ao longo da história sofreu o que sofreu impor a outro povo sofrimentos que tem de sofrer, de outro, só a pressão dos povos e da comunidade internacional poderá levar as partes a uma séria mesa de negociações. Geograficamente - e isto é ineludível - Israel é território do Oriente Médio, tendo como vizinhos em todas as direções países árabes. Não é possível sentar-se o tempo todo sobre a ponta da baioneta, ao preço de transformar a nação numa simples fortaleza. Inexoravelmente, vai ter de conviver no futuro, e pacificamente, com seus vizinhos.
Contudo, a comunidade internacional deve abandonar os discursos vazios, as declarações ardilosas, a indiferença, as manifestações altissonantes, comportamentos ambíguos que servem de amparo à impunidade. Que os países árabes deixem de lavar as mãos. Que países europeus, que durante séculos costumavam praticar a caça aos judeus e há décadas passaram a cobrar essa dívida histórica dos palestinos, ponham de lado a hipocrisia de derramar umas tantas lágrimas enquanto celebram secretamente outro lance de mestre. E que os Estados Unidos deixem a parcialidade e ajudem a construir a paz justa entre Israel e palestinos, que seguramente servirá para estendê-la a outros rincões da mesma região.
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Em resposta a um pedido feito pelo presidente da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, o Brasil anunciou o reconhecimento de um Estado palestino nas fronteiras existentes antes da Guerra dos Seis Dias de junho de 1967. Trata-se da concretização da legítima aspiração do povo palestino a um Estado coeso, seguro, democrático e economicamente viável, coexistindo em paz com Israel.
A iniciativa do governo Lula abre caminho e favorece as imprescindíveis negociações entre Israel e os palestinos a fim de que se alcance concessões mútuas sobre outras questões centrais do conflito. O reconhecimento do estado da Palestina é a melhor maneira de tirar do estancamento as negociações de paz, buscar a estabilidade na região e aliviar a crise humanitária por que passa boa parte do povo palestino. Ao mesmo tempo Brasília condena quaisquer atos terroristas, praticados sob qualquer pretexto.
Com uma vitória militar arrasadora na Guerra dos Seis Dias, Israel ampliou seu território, muito além do estabelecido pela Partilha da Palestina, em 1948. Já em novembro de 1967, o Conselho de Segurança da ONU votou a célebre resolução 242 que determina que a efetivação dos princípios da Carta das Nações Unidas requer o estabelecimento de uma paz justa e duradoura no Oriente Médio que inclua a aplicação dos dois seguintes princípios:
1. Evacuação das forças armadas israelenses dos territórios ocupados no conflito recente;
2. Encerramento de todas as reivindicações ou estados de beligerância e respeito pelo reconhecimento da soberania, integridade territorial e independência política de cada Estado da região e de seu direito a viver em paz dentro das fronteiras seguras e reconhecidas, livres de ameaças ou de atos de força.
Afirma ainda a necessidade de: a- Garantia de liberdade de navegação através das águas internacionais da área; b- Conseguir um acordo justo para o problema dos refugiados; c- Garantir a inviolabilidade territorial e independência política de cada Estado da região, através de medidas que incluam a criação de zonas desmilitarizadas.
Esta resolução jamais foi respeitada por Israel sempre contando com o apoio de Washington. Levantaram-se questões semânticas - o texto não dizia evacuação de todos os territórios ocupados - e depois infindáveis obstáculos geoestratégicos e de diversas outras ordens.
Israel argumenta agora que o reconhecimento do Brasil viola o chamadoAcordo de Oslo 2, firmado entre o israelense Itzhak Rabin e o palestino Yasser Arafat em 28 de setembro de 1995, que prevê que o status final da Cisjordânia só poderá ser definido por meio de negociações diretas, portanto qualquer ação unilateral estaria vedada. Contudo, a história registra que poucas semanas depois da assinatura desse acordo em 4 de novembro de 1995, Rabin foi assassinado. Líderes de partidos de direita, incluído muitos membros do Knesset (Parlamento), foram acusados de incitação selvagem que levaram ao acontecimento.
As eleições de 1996 deram vitória ao partido de direita Likud, e Benjamin Netanyahu assumiu como primeiro-ministro, propondo-se a torpedear o Acordo de Oslo. O resultado do pleito trouxe de volta ao poder governantes que não estavam dispostos a continuar fazendo concessões em nome da paz. Em agosto de 1996, o governo anulou o decreto que proibia a expansão dos assentamentos judaicos na Cisjordânia.
A ocupação dos territórios palestinos já leva 43 anos. Só para citar um exemplo histórico, a Alemanha, responsável pela hecatombe da Segunda Guerra Mundial que vitimou dezenas de milhões de soldados e civis, que provocou no Holocausto o extermínio de 6 milhões de judeus, ocupada, após a sua capitulação pelas forças dos países Aliados, recuperou sua independência e integridade territorial 4 anos depois, em maio de 1949 - República Federal Alemã -, e em outubro de 1949 - República Democrática Alemã. Já em 1990, após a que do Muro de Berlim houve a reunificação.
Muitos países que mantêm relações intensas com Israel reconhecem a Palestina bem como a esmagadora maioria dos países representados na OBU. A iniciativa brasileira é consentânea com a postura histórica e a disposição inalterada de contribuir com o processo de paz, estando em consonância com as resoluções das Nações Unidas que exigem o fim da ocupação dos territórios palestinos e a construção de um Estado independente dentro de fronteiras reconhecidas, aquelas anteriores à Guerra dos Seis Dias. É a defesa do princípio de Dois Estados.
Posição histórica nesse sentido também é a do Partido dos Trabalhadores. Em meados dos anos 1990, membro do coletivo da Secretaria de Relações Internacionais, respeitando criteriosamente as teses defendidas pelo Partido, ajudamos a fundar, organizar e dirigir o Movimento Shalom Salam Paz. Esse movimento congregava brasileiros de ascendência judaica, sionistas e não sionistas, de esquerda e centro-esquerda, brasileiros de ascendência árabe, moderados e menos moderados, os de ascendência palestina e todos aqueles dispostos a lutar por uma paz justa e duradoura no Oriente Médio e em particular, entre Israel e os palestinos.
Foi extremamente difícil conciliar as posições, houve pressão das Federações judaica e árabe e do consulado de Israel, porém conseguiu-se aprovar os pontos básicos: desocupação dos territórios palestinos ocupados com a Guerra de 1967; respeito à Resolução 242 das Nações Unidas com o reconhecimento pelos palestinos do Estado de Israel com fronteiras demarcadas, reconhecidas internacionalmente, seguras e definitivas; criação do Estado palestino, laico e viável; estabelecimento de Jerusalém leste e oeste como capital de ambas as nações; reconhecimento do direito de retorno dentro de limites a serem acordados; direito de acesso à água definidos em acordo binacional; facilidade do direito de ir e vir e do comércio binacional.
Forças internacionais sob a égide da ONU garantiriam o cumprimento das decisões. O Shalom Salam Paz levou essas idéias a dezenas de faculdades e colégios, a diversas instituições, deu dezenas de entrevistas a jornais, rádios e televisões, participou de debates, esteve presente nos Fóruns Sociais Mundiais. O Partido dos Trabalhadores tem relações de camaradagem com partidos e organizações de esquerda, de centro-esquerda e progressistas de todo o mundo, inclusive de Israel. As pontes que deseja construir e manter devem ser alicerçadas em princípios comuns, de soberania, de auto-determinação dos povos, de relações fraternais entre povos e nações, de solução pacífica e justa para os confrontos internacionais.
Uma diabólica espiral de sangue e dor, com raros interregnos, tomou conta da região nas últimas décadas. Guerras convencionais, ações terroristas e retaliações terroristas sem fim e com teor cada vez mais cruel e aterrador atingindo pessoas inocentes, governos árabes massacrando palestinos, assassinato de Rabin, negociações de paz torpedeadas ao sabor de interesses estratégicos e de poder, massacre de Munique e chacina de Jenin, intifada um e dois.
Desde 1948, os palestinos estão condenados a viver submetidos a uma revoltante humilhação. Perderam suas terras, perderam a liberdade e nunca puderam formar e organizar seu Estado. Hoje o cerco se estreitou e se tornou cruel. Sem permissão, não têm acesso à agua, a alimentos, a medicamentos. Não têm empregos nem vida econômica normal. Não podem ir de Gaza à Cisjordania, seus dois pedaços de terra. Não lhes permitem circular extra-muros sem passar por vexaminosos controles. Gaza se transformou numa prisão quando seus habitantes votaram em quem seus vizinhos acharam que não deveriam ter votado.
A Palestina hoje é muito menor que a que sobrou da Guerra dos Seis Dias. Colônias são assentadas em suas terras e atrás vêm os soldados corrigindo a fronteira. Se os assentamentos não são suficientes, que se erga um muro comendo mais pedaços de terra. Se olharmos comparativamente os mapas vemos que pouca Palestina restou.
Sabemos que a atual composição do eleitorado israelense levou ao governo líderes que abraçam a solução de confronto e não reconhecimento deDois Estados laicos e democráticos. Se de um lado, moralmente, não pode um povo que ao longo da história sofreu o que sofreu impor a outro povo sofrimentos que tem de sofrer, de outro, só a pressão dos povos e da comunidade internacional poderá levar as partes a uma séria mesa de negociações. Geograficamente - e isto é ineludível - Israel é território do Oriente Médio, tendo como vizinhos em todas as direções países árabes. Não é possível sentar-se o tempo todo sobre a ponta da baioneta, ao preço de transformar a nação numa simples fortaleza. Inexoravelmente, vai ter de conviver no futuro, e pacificamente, com seus vizinhos.
Contudo, a comunidade internacional deve abandonar os discursos vazios, as declarações ardilosas, a indiferença, as manifestações altissonantes, comportamentos ambíguos que servem de amparo à impunidade. Que os países árabes deixem de lavar as mãos. Que países europeus, que durante séculos costumavam praticar a caça aos judeus e há décadas passaram a cobrar essa dívida histórica dos palestinos, ponham de lado a hipocrisia de derramar umas tantas lágrimas enquanto celebram secretamente outro lance de mestre. E que os Estados Unidos deixem a parcialidade e ajudem a construir a paz justa entre Israel e palestinos, que seguramente servirá para estendê-la a outros rincões da mesma região.
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Prisão de Assange fere a democracia
Por Altamiro Borges
Satanizado pelos EUA e furiosamente perseguido pela Interpol, o australiano Julian Assange, criador do sítio Wikileaks, decidiu se entregar à polícia do Reino Unido na manhã desta terça-feira (7). A prisão representa um duro golpe contra a liberdade de expressão, principalmente contra a liberdade na internet. Não é para menos que os barões da mídia, no Brasil e no mundo, evitam fazer alarde. Se um blogueiro fosse detido na China, Irã ou Cuba, a gritaria seria infernal.
A desculpa para justificar a caçada a Assange é a denúncia da Justiça sueca de que ele teria cometido crimes de estupro, assédio sexual e coerção ilegal contra duas mulheres, em agosto passado. A sentença é bastante confusa, levando-se em conta que no país a prática de sexo desprotegido, sem o uso de preservativo, é considerada uma categoria leve de estupro. Assange nega as acusações e garante que a perseguição é uma retaliação ao Wikileaks pelo vazamento de documentos das embaixadas dos EUA.
Cresce o apoio ao Wikileaks
Apesar da cumplicidade da mídia ianque e das suas sucursais colonizadas, a prisão de Assange não deverá cair no silêncio. Desde que os EUA deflagraram a caçada mundial ao Wikileaks, exigindo sua retirada do ar e a prisão do seu criador, cresce o apoio ao sítio. Através do Twitter foi lançado na semana passada o movimento "imwikileaks" ("eu sou Wikileaks"). Em apenas dois dias, mais de 500 sítios na web clonaram o seu conteúdo para "tornar impossível que o Wikileaks seja retirado totalmente do ar".
Também está em curso uma jornada internacional de boicote à Amazon Web Server (AWS), empresa que hospedava o sítio, mas que se sujeitou à censura imposta pelo governo de Barack Obama. O portal está agora hospedado num servidor do Partido Pirata suiço e oferece instruções para que qualquer sítio use o seu conteúdo. No mundo da internet, pelo menos por enquanto, o poder imperial dos EUA mostra-se vulnerável. Eric Holder, censor dos EUA, já admitiu que Washington tem dificuldade para silenciar o Wikileaks.
A prisão de Julian Assange é um grave atentado à democracia, à verdadeira liberdade de expressão. Merece repúdio imediato. Uma das formas de solidariedade é continuar difundindo os textos "sigilosos" que comprovam que a diplomacia ianque é um antro de espionagem e terrorismo. Ela serve aos interesses do império - uma obviedade, mas que deve ser repetida para muitos que achavam que o imperialismo já não existia.
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Satanizado pelos EUA e furiosamente perseguido pela Interpol, o australiano Julian Assange, criador do sítio Wikileaks, decidiu se entregar à polícia do Reino Unido na manhã desta terça-feira (7). A prisão representa um duro golpe contra a liberdade de expressão, principalmente contra a liberdade na internet. Não é para menos que os barões da mídia, no Brasil e no mundo, evitam fazer alarde. Se um blogueiro fosse detido na China, Irã ou Cuba, a gritaria seria infernal.
A desculpa para justificar a caçada a Assange é a denúncia da Justiça sueca de que ele teria cometido crimes de estupro, assédio sexual e coerção ilegal contra duas mulheres, em agosto passado. A sentença é bastante confusa, levando-se em conta que no país a prática de sexo desprotegido, sem o uso de preservativo, é considerada uma categoria leve de estupro. Assange nega as acusações e garante que a perseguição é uma retaliação ao Wikileaks pelo vazamento de documentos das embaixadas dos EUA.
Cresce o apoio ao Wikileaks
Apesar da cumplicidade da mídia ianque e das suas sucursais colonizadas, a prisão de Assange não deverá cair no silêncio. Desde que os EUA deflagraram a caçada mundial ao Wikileaks, exigindo sua retirada do ar e a prisão do seu criador, cresce o apoio ao sítio. Através do Twitter foi lançado na semana passada o movimento "imwikileaks" ("eu sou Wikileaks"). Em apenas dois dias, mais de 500 sítios na web clonaram o seu conteúdo para "tornar impossível que o Wikileaks seja retirado totalmente do ar".
Também está em curso uma jornada internacional de boicote à Amazon Web Server (AWS), empresa que hospedava o sítio, mas que se sujeitou à censura imposta pelo governo de Barack Obama. O portal está agora hospedado num servidor do Partido Pirata suiço e oferece instruções para que qualquer sítio use o seu conteúdo. No mundo da internet, pelo menos por enquanto, o poder imperial dos EUA mostra-se vulnerável. Eric Holder, censor dos EUA, já admitiu que Washington tem dificuldade para silenciar o Wikileaks.
A prisão de Julian Assange é um grave atentado à democracia, à verdadeira liberdade de expressão. Merece repúdio imediato. Uma das formas de solidariedade é continuar difundindo os textos "sigilosos" que comprovam que a diplomacia ianque é um antro de espionagem e terrorismo. Ela serve aos interesses do império - uma obviedade, mas que deve ser repetida para muitos que achavam que o imperialismo já não existia.
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segunda-feira, 6 de dezembro de 2010
Tereza Cruvinel: Legados da era Lula
Reproduzo artigo de Tereza Cruvinel, jornalista e presidente da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), publicado no jornal Correio Braziliense:
Neste último artigo do ano aqui no Correio, não tenho como não falar dos oito anos trepidantes, em todos os sentidos, que estão chegando ao fim. Os anos Lula não apenas mudaram para sempre o Brasil. Mudaram também nossa forma de sentir e pensar nosso país.
Sob Lula, aprendemos a enxergar a pobreza, a importância de combatê-la e, mais recentemente, a celebrar sua redução. Vimos um presidente chegar ao poder contrariando tudo o que sempre nos pareceu natural: sem berço, sem diplomas, sem o apoio das elites econômicas e pensantes. Vimo-lo depois quebrar todas as convenções ao exercer o poder: falando a linguagem desabrida do povo, cometendo metáforas rasas e gafes frequentes, quebrando a liturgia do cargo, trocando o serviço à francesa do Itamaraty por um buffet self-service, tomando café com os catadores de papel e exercitando uma aguerrida diplomacia presidencial sem falar outra língua. Não haverá outro Lula, pois o Brasil que o gerou não haverá mais. E isso é bom.
Neste período, 28 milhões de brasileiros cruzaram a linha da pobreza e outros 20 milhões ascenderam à classe C. Mais extraordinário é que esse feito tenha acontecido sem a quebra de um só cristal. Ou seja, Lula não tomou uma só agulha dos mais ricos para dar aos mais pobres. Não privou os banqueiros de seus lucros para estender o crédito ao andar de baixo. Não reduziu as exportações do agrobusiness para dar mais comida ao povo. Não garfou a poupança da classe média para criar o Bolsa Família. Tudo fez harmonizando interesses e moderando conflitos. Todos ganharam, embora os mais pobres tenham começado a tirar a diferença. Em 2009, apesar da crise, a renda média dos 40% mais pobres cresceu 3,15% e dos 10% mais ricos apenas 1,09%. E isso é bom para todos, inclusive para os ricos. Este ano, os números serão mais eloquentes.
O crescimento da economia, que pode chegar aos 8% em 2010, será o maior em 24 anos. Desta vez foi crescimento sem inflação e com distribuição de renda. No final do período Lula, terão sido gerados 15 milhões de empregos. Este ano, a nova classe C vai gastar R$ 500 bilhões em 2010, superando o consumo das classes A e B. Isso é mudança.
Sob Lula, a percepção do Brasil mudou também lá fora. Agora o país é player, é líder no G-20, é um dos Brics, vai sediar a Copa do Mundo em 2014 e as Olimpíadas em 2016. Vamos perdendo o velho complexo de vira-latas.
Nem tudo foi resolvido, nem tudo foi feito e não faltaram as decepções. Sobretudo as políticas, com os casos de corrupção intermitentes. Mas o saldo a favor de Lula foi bem maior e levou-o ao píncaro da popularidade. Mesmo assim, ele continua sendo um presidente intragável para uma minoria. Talvez para aqueles 4% ou 5% que, nas pesquisas frequentes, consideram seu governo péssimo, contra os 80% que o consideram ótimo ou bom.
As relações com a mídia serão um capítulo na história a ser escrita. Vivi a minha pequena parte. Colunista política de O Globo, nunca apontei, nos seis governos e sete legislaturas que cobri, apenas o bem ou o mal. Assim erigi minha credibilidade de analista político. A partir de 2003, divergi do pensamento único que passou a vigir na mídia, não engrossando a cruzada anti-Lula. Na elite do jornalismo político, muito poucos, além de mim e de Franklin Martins, fugiram ao padrão monopólico e demonizador.
Houve preço. Em 2005, veio o maccarthismo e com ele os cães raivosos e o espírito de delação. Um deles espumou, em 2005, que Lula só não caíra ainda porque uma lista de jornalistas lulistas, aberta com meu nome, havia aparelhado a imprensa! Por algum tempo sustentei o apedrejamento, mas, já tendo sofrido uma ditadura, rejeitei a escolha entre autoimolação e sujeição. No final de 2007, aceitei o convite para dirigir a TV Pública que seria criada, cumprindo a Constituição Federal. Pouco vi o presidente depois disso. Tenho trabalhado com absoluta liberdade e os resultados estão aí. Nunca recebi queixas ou bilhetinhos de ministros.
Não tenho a menor importância na história maior que se encerra agora. Conto isso aqui porque esses detalhes fazem parte do ambiente venenoso, eivado de intolerância, elitismo e ódio de classe em que Lula governou e construiu o legado que deixa ao país.
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Neste último artigo do ano aqui no Correio, não tenho como não falar dos oito anos trepidantes, em todos os sentidos, que estão chegando ao fim. Os anos Lula não apenas mudaram para sempre o Brasil. Mudaram também nossa forma de sentir e pensar nosso país.
Sob Lula, aprendemos a enxergar a pobreza, a importância de combatê-la e, mais recentemente, a celebrar sua redução. Vimos um presidente chegar ao poder contrariando tudo o que sempre nos pareceu natural: sem berço, sem diplomas, sem o apoio das elites econômicas e pensantes. Vimo-lo depois quebrar todas as convenções ao exercer o poder: falando a linguagem desabrida do povo, cometendo metáforas rasas e gafes frequentes, quebrando a liturgia do cargo, trocando o serviço à francesa do Itamaraty por um buffet self-service, tomando café com os catadores de papel e exercitando uma aguerrida diplomacia presidencial sem falar outra língua. Não haverá outro Lula, pois o Brasil que o gerou não haverá mais. E isso é bom.
Neste período, 28 milhões de brasileiros cruzaram a linha da pobreza e outros 20 milhões ascenderam à classe C. Mais extraordinário é que esse feito tenha acontecido sem a quebra de um só cristal. Ou seja, Lula não tomou uma só agulha dos mais ricos para dar aos mais pobres. Não privou os banqueiros de seus lucros para estender o crédito ao andar de baixo. Não reduziu as exportações do agrobusiness para dar mais comida ao povo. Não garfou a poupança da classe média para criar o Bolsa Família. Tudo fez harmonizando interesses e moderando conflitos. Todos ganharam, embora os mais pobres tenham começado a tirar a diferença. Em 2009, apesar da crise, a renda média dos 40% mais pobres cresceu 3,15% e dos 10% mais ricos apenas 1,09%. E isso é bom para todos, inclusive para os ricos. Este ano, os números serão mais eloquentes.
O crescimento da economia, que pode chegar aos 8% em 2010, será o maior em 24 anos. Desta vez foi crescimento sem inflação e com distribuição de renda. No final do período Lula, terão sido gerados 15 milhões de empregos. Este ano, a nova classe C vai gastar R$ 500 bilhões em 2010, superando o consumo das classes A e B. Isso é mudança.
Sob Lula, a percepção do Brasil mudou também lá fora. Agora o país é player, é líder no G-20, é um dos Brics, vai sediar a Copa do Mundo em 2014 e as Olimpíadas em 2016. Vamos perdendo o velho complexo de vira-latas.
Nem tudo foi resolvido, nem tudo foi feito e não faltaram as decepções. Sobretudo as políticas, com os casos de corrupção intermitentes. Mas o saldo a favor de Lula foi bem maior e levou-o ao píncaro da popularidade. Mesmo assim, ele continua sendo um presidente intragável para uma minoria. Talvez para aqueles 4% ou 5% que, nas pesquisas frequentes, consideram seu governo péssimo, contra os 80% que o consideram ótimo ou bom.
As relações com a mídia serão um capítulo na história a ser escrita. Vivi a minha pequena parte. Colunista política de O Globo, nunca apontei, nos seis governos e sete legislaturas que cobri, apenas o bem ou o mal. Assim erigi minha credibilidade de analista político. A partir de 2003, divergi do pensamento único que passou a vigir na mídia, não engrossando a cruzada anti-Lula. Na elite do jornalismo político, muito poucos, além de mim e de Franklin Martins, fugiram ao padrão monopólico e demonizador.
Houve preço. Em 2005, veio o maccarthismo e com ele os cães raivosos e o espírito de delação. Um deles espumou, em 2005, que Lula só não caíra ainda porque uma lista de jornalistas lulistas, aberta com meu nome, havia aparelhado a imprensa! Por algum tempo sustentei o apedrejamento, mas, já tendo sofrido uma ditadura, rejeitei a escolha entre autoimolação e sujeição. No final de 2007, aceitei o convite para dirigir a TV Pública que seria criada, cumprindo a Constituição Federal. Pouco vi o presidente depois disso. Tenho trabalhado com absoluta liberdade e os resultados estão aí. Nunca recebi queixas ou bilhetinhos de ministros.
Não tenho a menor importância na história maior que se encerra agora. Conto isso aqui porque esses detalhes fazem parte do ambiente venenoso, eivado de intolerância, elitismo e ódio de classe em que Lula governou e construiu o legado que deixa ao país.
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Semana de homenagem a Noel Rosa
No dia 11 de dezembro serão comemorados os 100 anos do nascimento de Noel Rosa, um dos maiores compositores da música popular brasileira. Em sua homenagem, reproduzo algumas de suas poesias em forma de canção.
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Assange: Vivo ou morto!
Reproduzo dois textos de Marco Aurélio Mello, publicados no blog DoLaDoDeLá:
A vida do novo inimigo número um da "América" não será fácil. Todos os países signatários da Interpol podem prendê-lo a qualquer momento. Ao todo são 188, incluindo o Afeganistão e o Zimbábue. A Austrália, seu país natal, a Suécia, onde responde pelo crime de abuso sexual e estupro contra duas mulheres, sim eu disse duas, simultaneamente. Estranho, não? Ou a Islândia e a Suiça, onde cogitou viver, mas pode encontrar embaraços, agora que é caçado em troca de grande recompensa pelo Governo mais rico e influente do planeta.
Por enquanto, seus planos são se comunicar com a imprensa virtualmente, ou por vídeos gravados previamente (à la Osama Bin Landen) ou ainda por telefones celulares, via Skype. Diz a lenda que Assange é tão paranóico (confesso que eu também seria), que troca de celulares em intervalos menores do que uma hora. O repórter do New York Times que o entrevistou em outubro, John F. Burns, disse que Assange usa dinheiro em vez de cartões de crédito e fica hospedado com amigos, ou em hotéis, com nome falso.
Em abril deste ano Assange foi para Washington mostrar, no Clube Nacional de Imprensa, um vídeo de um helicóptero militar dos EUA matando doze pessoas em Bagdá, em dois mil e sete, sendo dois jornalistas entre eles. Em julho, seu site colaborativo, o Wikileaks, vazou 77 mil documentos militares dos EUA sobre o Afeganistão, e em outubro, cerca de 400 mil documentos secretos sobre a guerra do Iraque. Os EUA vão tentar processar Assange por espionagem. Sugiro uma caverna no Afeganistão. Lá ninguém o encontra. Aliás, onde mesmo está Bin Laden?
Vão tentar transformá-lo em Bin Laden
Ao abrir a Caixa de Pandora com os fantasmas do Serviço de Inteligência e Departamento de Estado da "América", Julian Assange e sua equipe de hackers e colaboradores iniciam um combate contra a concentração na produção do noticiário – na maioria das vezes, e no Brasil, em particular, apenas atendendo a interesses das grandes agências – levando a um fenômeno que o Secretário Nacional de Comunicação, Franklin Martins, apelidou de "efeito pedra no lago" (quando ondas concêntricas se formam num determinado ponto e se expandem em direção à margem).
Por isso, Assange diz que documentos, como os que foram vazados nos últimos dias pelo Wikileaks: “São a coisa mais importante que eu já vi”. Senhoras e senhores, estamos diante do fato mais relevante da história contemporânea, e que deve ser determinante para o fim da hegemonia política do Império Estadunidense. Um processo irreversível de transparência, graças ao poder e alcançe da rede mundial de computadores. É um atalho importante entre notícia e versão, maior dilema do jornalismo quando em busca da "verdade". Preparem-se amigos, porque nos próximos anos nosso planeta viverá fortes emoções! Isto é, se antes não botarem as "mãos sujas de sangue" em Assange e sua turma.
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A vida do novo inimigo número um da "América" não será fácil. Todos os países signatários da Interpol podem prendê-lo a qualquer momento. Ao todo são 188, incluindo o Afeganistão e o Zimbábue. A Austrália, seu país natal, a Suécia, onde responde pelo crime de abuso sexual e estupro contra duas mulheres, sim eu disse duas, simultaneamente. Estranho, não? Ou a Islândia e a Suiça, onde cogitou viver, mas pode encontrar embaraços, agora que é caçado em troca de grande recompensa pelo Governo mais rico e influente do planeta.
Por enquanto, seus planos são se comunicar com a imprensa virtualmente, ou por vídeos gravados previamente (à la Osama Bin Landen) ou ainda por telefones celulares, via Skype. Diz a lenda que Assange é tão paranóico (confesso que eu também seria), que troca de celulares em intervalos menores do que uma hora. O repórter do New York Times que o entrevistou em outubro, John F. Burns, disse que Assange usa dinheiro em vez de cartões de crédito e fica hospedado com amigos, ou em hotéis, com nome falso.
Em abril deste ano Assange foi para Washington mostrar, no Clube Nacional de Imprensa, um vídeo de um helicóptero militar dos EUA matando doze pessoas em Bagdá, em dois mil e sete, sendo dois jornalistas entre eles. Em julho, seu site colaborativo, o Wikileaks, vazou 77 mil documentos militares dos EUA sobre o Afeganistão, e em outubro, cerca de 400 mil documentos secretos sobre a guerra do Iraque. Os EUA vão tentar processar Assange por espionagem. Sugiro uma caverna no Afeganistão. Lá ninguém o encontra. Aliás, onde mesmo está Bin Laden?
Vão tentar transformá-lo em Bin Laden
Ao abrir a Caixa de Pandora com os fantasmas do Serviço de Inteligência e Departamento de Estado da "América", Julian Assange e sua equipe de hackers e colaboradores iniciam um combate contra a concentração na produção do noticiário – na maioria das vezes, e no Brasil, em particular, apenas atendendo a interesses das grandes agências – levando a um fenômeno que o Secretário Nacional de Comunicação, Franklin Martins, apelidou de "efeito pedra no lago" (quando ondas concêntricas se formam num determinado ponto e se expandem em direção à margem).
Por isso, Assange diz que documentos, como os que foram vazados nos últimos dias pelo Wikileaks: “São a coisa mais importante que eu já vi”. Senhoras e senhores, estamos diante do fato mais relevante da história contemporânea, e que deve ser determinante para o fim da hegemonia política do Império Estadunidense. Um processo irreversível de transparência, graças ao poder e alcançe da rede mundial de computadores. É um atalho importante entre notícia e versão, maior dilema do jornalismo quando em busca da "verdade". Preparem-se amigos, porque nos próximos anos nosso planeta viverá fortes emoções! Isto é, se antes não botarem as "mãos sujas de sangue" em Assange e sua turma.
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Conselho de comunicação avança no RJ
A criação de uma Comissão Especial para discutir a criação do Conselho Estadual de Comunicação do Estado foi a proposta levantada na audiência pública realizada nesta segunda-feira (06/12) pela Comissão de Trabalho, Legislação e Seguridade Social da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj). A criação do Conselho é objeto do projeto de lei 3323/10, de autoria do presidente da comissão, o deputado Paulo Ramos (PDT).
Durante a reunião, foram debatidas a necessidade da regulação do setor e da participação de toda a sociedade no debate, para garantir a pluralidade do Conselho. “Um projeto que tem esta natureza não pode tramitar sem ter transparência e uma publicidade muito grande”, destacou o deputado.
Durante a reunião, o parlamentar apresentou um levantamento feito acerca da legislação de países como Estados Unidos, França, Itália, Inglaterra , Portugal e Espanha, que têm agências reguladoras e conselhos destinados a regulamentar a comunicação. “Todos os países democráticos têm regulação, têm espaços definidos para a proteção da cultura local, por exemplo”, pontuou Ramos.
“O que existe hoje não é liberdade, é o monopólio, a censura por parte do poder econômico”, acrescentou. O deputado citou, ainda, os exemplos de outros conselhos em funcionamento, como o Conselho Estadual de Educação, e o estado do Ceará, que aprovou recentemente um projeto semelhante ao que está em tramitação na Alerj.
A criação do conselho foi defendida pelo procurador Cristiano Taveira, que é doutor em Direito Constitucional pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro e fez um estudo, em sua tese de doutorado, sobre a necessidade da regulamentação da comunicação no Brasil. “O projeto é constitucional e necessário, pois a liberdade de expressão deve ser ampla”, ponderou Taveira.
Segundo o procurador, a Constituição prevê uma série de obrigações, por parte dos meios de radiodifusão, que não são cumpridas. “Há princípios constitucionais como o pluralismo, o princípio democrático, o acesso à informação e a proibição do monopólio, entre outros. O que estamos defendendo é o pluralismo na mídia, e não a censura” destacou Taveira, que comparou a atual polêmica a que precedeu a criação do Conselho Nacional de Justiça, tido hoje como um grande sucesso no Judiciário.
Para a representante da campanha “Ética na TV”, Claudia Abreu, é preciso que haja uma política pública para os meios de comunicação, com o objetivo de assegurar a liberdade de expressão. “O fim da censura foi uma conquista muito importante, mas ela não pode ser um cheque em branco para os radiodifusores”, defendeu. Este aspecto também foi destacado por Paulo Ramos.
“Eu vejo com muita preocupação a inexistência de uma regulação para o setor, o que faz com que alguns poucos poderosos se apropriem de uma liberdade que é de toda a sociedade”, destacou. O parlamentar garantiu que outras reuniões como essa vão acontecer com todas as partes interessadas, para acolher sugestões de modificações no texto do projeto.
A audiência contou com a presença de representantes da Associação Brasileira de Imprensa (ABI); de emissoras de TV comunitárias do Estado; do Coletivo Brasil de Comunicação (Intervozes); do Sindicato dos Petroleiros (Sindipetro) e da Associação Brasileira de Rádios Comunitárias (Abraço), que declararam apoio ao projeto.
Também manifestaram apoio à proposta durante a audiência o diretor do curso de Jornalismo da Pontifícia Universidade Católica (PUC-Rio) e da Federação Nacional de Professores de Jornalismo (FNPJ), Leonel Aguiar; o presidente da Associação de Diretores de Jornais do interior do estado; Álvaro Britto, do Sinjor-RJ, e representantes dos Diretórios Centrais dos Estudantes (DCEs) da Universidade Federal Fluminense (UFF) e das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha).
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Durante a reunião, foram debatidas a necessidade da regulação do setor e da participação de toda a sociedade no debate, para garantir a pluralidade do Conselho. “Um projeto que tem esta natureza não pode tramitar sem ter transparência e uma publicidade muito grande”, destacou o deputado.
Durante a reunião, o parlamentar apresentou um levantamento feito acerca da legislação de países como Estados Unidos, França, Itália, Inglaterra , Portugal e Espanha, que têm agências reguladoras e conselhos destinados a regulamentar a comunicação. “Todos os países democráticos têm regulação, têm espaços definidos para a proteção da cultura local, por exemplo”, pontuou Ramos.
“O que existe hoje não é liberdade, é o monopólio, a censura por parte do poder econômico”, acrescentou. O deputado citou, ainda, os exemplos de outros conselhos em funcionamento, como o Conselho Estadual de Educação, e o estado do Ceará, que aprovou recentemente um projeto semelhante ao que está em tramitação na Alerj.
A criação do conselho foi defendida pelo procurador Cristiano Taveira, que é doutor em Direito Constitucional pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro e fez um estudo, em sua tese de doutorado, sobre a necessidade da regulamentação da comunicação no Brasil. “O projeto é constitucional e necessário, pois a liberdade de expressão deve ser ampla”, ponderou Taveira.
Segundo o procurador, a Constituição prevê uma série de obrigações, por parte dos meios de radiodifusão, que não são cumpridas. “Há princípios constitucionais como o pluralismo, o princípio democrático, o acesso à informação e a proibição do monopólio, entre outros. O que estamos defendendo é o pluralismo na mídia, e não a censura” destacou Taveira, que comparou a atual polêmica a que precedeu a criação do Conselho Nacional de Justiça, tido hoje como um grande sucesso no Judiciário.
Para a representante da campanha “Ética na TV”, Claudia Abreu, é preciso que haja uma política pública para os meios de comunicação, com o objetivo de assegurar a liberdade de expressão. “O fim da censura foi uma conquista muito importante, mas ela não pode ser um cheque em branco para os radiodifusores”, defendeu. Este aspecto também foi destacado por Paulo Ramos.
“Eu vejo com muita preocupação a inexistência de uma regulação para o setor, o que faz com que alguns poucos poderosos se apropriem de uma liberdade que é de toda a sociedade”, destacou. O parlamentar garantiu que outras reuniões como essa vão acontecer com todas as partes interessadas, para acolher sugestões de modificações no texto do projeto.
A audiência contou com a presença de representantes da Associação Brasileira de Imprensa (ABI); de emissoras de TV comunitárias do Estado; do Coletivo Brasil de Comunicação (Intervozes); do Sindicato dos Petroleiros (Sindipetro) e da Associação Brasileira de Rádios Comunitárias (Abraço), que declararam apoio ao projeto.
Também manifestaram apoio à proposta durante a audiência o diretor do curso de Jornalismo da Pontifícia Universidade Católica (PUC-Rio) e da Federação Nacional de Professores de Jornalismo (FNPJ), Leonel Aguiar; o presidente da Associação de Diretores de Jornais do interior do estado; Álvaro Britto, do Sinjor-RJ, e representantes dos Diretórios Centrais dos Estudantes (DCEs) da Universidade Federal Fluminense (UFF) e das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha).
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SP debate conselho de comunicação
Reproduzo release do evento:
O deputado Antonio Mentor, líder da Bancada do PT, realiza na próxima quarta-feira (08/12) a audiência pública para debater o seu Projeto de Resolução, que propõe a criação do Conselho Parlamentar de Comunicação.
Entre os convidados, o representante da Rede Bandeirantes, Walter Ceneviva, e o presidente da Comissão de Imprensa da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção São Paulo, Sérgio Azevedo Redó.
A regulamentação do setor de comunicações têm sido alvo de inúmeros debates e polêmicas. O projeto que será discutido na audiência pública propõe um Conselho de Comunicação com atribuições de fiscalizar, avaliar e propor políticas estaduais de comunicação e promoção dos direitos humanos.
“Ao contrário do que tentam fazer crer alguns setores da imprensa, o projeto não tem qualquer pretensão de servir como mecanismo de censura, nem interferir no conteúdo veiculado pela mídia", explica Mentor.
Confira a programação da Audiência Pública:
- Abertura às 14h00, com o deputado Antonio Mentor
- Eixo 1: A propositura à luz da Constitucionalidade e da Legalidade
Debatedores: Igor Tamasauskas - Advogado, com atuação em consultoria de diagnóstico e modelagem jurídica da prestação do serviço público de radiodifusão
Sérgio Azevedo Redó - Presidente da Comissão de Imprensa da Ordem dos Advogados do Brasil - Seção São Paulo
- Eixo II: Ameaça à Liberdade de Imprensa ou Exercício de Cidadania?
Debatedores: Bia Barbosa - Coletivo Intervozes
Sérgio Milleto - Representante da Associação Brasileira de Empresas e Empreendedores da Comunicação - (Altercom)
Carlos Alberto Buzano Balladas - Presidente da Associação dos Jornais do Interior do Estado de São Paulo (ADJORI/SP)
Wilson Marini - Representante da Associação Paulista dos Jornais (APJ)
Amilcare Dallevo Neto - Presidente da Associação Brasileira de Radiodifusores (ABRA)
Walter Ceneviva - Representante da Rede Bandeirantes
Edilberto de Paula Ribeiro - Presidente da Associação de Emissoras de Rádio e Televisão do Estado de São Paulo (AESP/ABERT)
PARTICIPE: Audiência Pública Conselho de Comunicação
08 de dezembro, a partir das 14h00
Auditório Franco Montoro - Andar Monumental da Assembleia Legislativa
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O deputado Antonio Mentor, líder da Bancada do PT, realiza na próxima quarta-feira (08/12) a audiência pública para debater o seu Projeto de Resolução, que propõe a criação do Conselho Parlamentar de Comunicação.
Entre os convidados, o representante da Rede Bandeirantes, Walter Ceneviva, e o presidente da Comissão de Imprensa da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção São Paulo, Sérgio Azevedo Redó.
A regulamentação do setor de comunicações têm sido alvo de inúmeros debates e polêmicas. O projeto que será discutido na audiência pública propõe um Conselho de Comunicação com atribuições de fiscalizar, avaliar e propor políticas estaduais de comunicação e promoção dos direitos humanos.
“Ao contrário do que tentam fazer crer alguns setores da imprensa, o projeto não tem qualquer pretensão de servir como mecanismo de censura, nem interferir no conteúdo veiculado pela mídia", explica Mentor.
Confira a programação da Audiência Pública:
- Abertura às 14h00, com o deputado Antonio Mentor
- Eixo 1: A propositura à luz da Constitucionalidade e da Legalidade
Debatedores: Igor Tamasauskas - Advogado, com atuação em consultoria de diagnóstico e modelagem jurídica da prestação do serviço público de radiodifusão
Sérgio Azevedo Redó - Presidente da Comissão de Imprensa da Ordem dos Advogados do Brasil - Seção São Paulo
- Eixo II: Ameaça à Liberdade de Imprensa ou Exercício de Cidadania?
Debatedores: Bia Barbosa - Coletivo Intervozes
Sérgio Milleto - Representante da Associação Brasileira de Empresas e Empreendedores da Comunicação - (Altercom)
Carlos Alberto Buzano Balladas - Presidente da Associação dos Jornais do Interior do Estado de São Paulo (ADJORI/SP)
Wilson Marini - Representante da Associação Paulista dos Jornais (APJ)
Amilcare Dallevo Neto - Presidente da Associação Brasileira de Radiodifusores (ABRA)
Walter Ceneviva - Representante da Rede Bandeirantes
Edilberto de Paula Ribeiro - Presidente da Associação de Emissoras de Rádio e Televisão do Estado de São Paulo (AESP/ABERT)
PARTICIPE: Audiência Pública Conselho de Comunicação
08 de dezembro, a partir das 14h00
Auditório Franco Montoro - Andar Monumental da Assembleia Legislativa
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WikiLeaks sacode embaixadas dos EUA
Reproduzo artigo de Guy Adams e Kim Sengupta, The Independent, publicado no blog Viomundo:
Atacado por escândalo que a cada dia parece gerar nova fornada de embaraços e incômodos, o governo dos EUA está sendo forçado a empreender ampla reforma em todos os seus cargos diplomáticos, pessoal militar e agentes de inteligência, cujo trabalho afinal está exposto aos olhos do mundo, depois dos vazamentos, pela página WikiLeaks, dos telegramas diplomáticos dos EUA.
Ontem, o governo Obama enfrentava grave crise em seu serviço diplomático, entre ondas sucessivas de provas de que a continuada publicação de comunicados pressupostos confidenciais e protegidos tornará impossível – se não perigoso – o trabalho diplomático como feito até aqui por funcionários do Departamento de Estado em todo o mundo.
Apenas 1.100 dos cerca de 250 mil documentos sigilosos que WikiLeaks recebeu e divulgou já foram publicados. Portanto, aumenta o medo de que prosseguirá, nos próximos meses, a divulgação de revelações que podem desestabilizar as relações dos EUA com praticamente todos os seus aliados-chave, inflamando as tensões com governos já hostis no Oriente Médio, no Extremo Oriente e em outras regiões.
“No curto prazo, já estamos paralisados, sem poder dar um passo” – disse à Agência Reuters um diplomata sênior dos EUA. Para a mesma fonte, serão necessários no mínimo cinco anos para reconstruir relações de confiança em todo o mundo.
“A situação está péssima. Dificilmente poderia estar pior. Não há exagero algum no que lhe digo. Falando claramente, ninguém quer falar conosco. (…) Há gente que continua obrigada a falar conosco, sobretudo governos e representantes oficiais. Mas mesmo esses perguntam antes de qualquer contato: “Vocês vão escrever sobre o que discutirmos aqui?”
Há informes de que o Pentágono, a CIA e o Departamento de Estado estão listando todos os funcionários do serviço diplomático que assinaram os telegramas mais comprometedores e que mais problemas criaram, dentre os que já foram publicados por WikiLeaks. Todos esses terão de ser removidos dos postos em que estão, em todos os casos os postos mais estrategicamente importantes da diplomacia norte-americana.
Dentre os diplomatas cujas opiniões privadas foram divulgadas para o mundo, para grande embaraço dos EUA, está Gene Cretz – embaixador dos EUA na Líbia, que, em 2009, escreveu o hoje já famosíssimo telegrama no qual informa ao governo dos EUA que Muammar Gaddafi não viaja sem a companhia de “uma voluptuosa loura”, sua enfermeira ucraniana.
O atual enviado dos EUA à ONU também tem sido criticado, depois da revelação de que Hillary Clinton instruiu-o a coletar números de cartões de crédito, de passes para viagens aéreas, números de telefones celulares, endereços de e-mails, senhas e outros dados de diplomatas estrangeiros e altos funcionários da ONU, inclusive do secretário-geral Ban Ki-moon.
A dificuldade para o serviço diplomático dos EUA é que os autores de vários dos mais importantes telegramas divulgados pela organização WikiLeaks são os mais experientes do corpo diplomático norte-americano, e será difícil, se não impossível, substituí-los. Até agora, nenhum dos países afetados pelos vazamentos solicitou a remoção de qualquer diplomata ou funcionário do serviço diplomático dos EUA.
“Essa é outra face dessa tragédia”, disse alto funcionário da segurança nacional ao Blog The Daily Beast [http://www.thedailybeast.com/blogs-and-stories/2010-12-04/wikileaks-cable-disaster-spurs-obama-plan-to-shake-up-key-personnel/full/full/] que, na 6ª.-feira, detalhou a extensão da crise nas embaixadas dos EUA e noticiou que a realocação dos diplomatas afetados já está planejada e acontecerá ao longo dos próximos meses.
“Teremos de deslocar alguns dos nossos melhores servidores, que sempre representaram muito bem os EUA, capazes das melhores análises –, só porque se atreveram a escrever a verdade sobre países nos quais servem.” Dentre governos estrangeiros que já se manifestaram ofendidos pelo conteúdo de um ou outro dos telegramas divulgados estão supostos aliados como França, Itália e Turquia, cujo primeiro-ministro Recep Tayyip Erdogan ameaçou processar o ex-embaixador dos EUA Eric Edelman por telegrama no qual o embaixador sugere que Erdogan teria dinheiro em bancos suíços.
Velhos inimigos dos EUA também estão gravemente incomodados. O presidente Dmitry Medvedev, da Rússia, é descrito num dos telegramas como “o Robin do Batman [primeiro-ministro da Rússia Vladimir] Putin”. Cuba e Venezuela são reunidas num “Eixo da Falsidade” em documento divulgado no fim de semana. Quando os primeiros telegramas foram divulgados, a Casa Branca condenou a divulgação, sob o argumento de que “poria em risco nossos diplomatas, profissionais de segurança e todos que, em todo o mundo, aproximam-se dos EUA para promover a democracia e governos mais transparentes”.
Apesar de até agora nenhum país ter requerido a expulsão dos diplomatas responsáveis pelos telegramas que mais incômodos provocaram, espera-se que comece em breve um movimento de declará-los “Persona Non Grata” – os governos declaram que um ou outro funcionário estrangeiro não é bem-vindo a um ou outro país; é ação que, na prática, leva à remoção.
“Pela nossa avaliação, é só questão de tempo”, disse um funcionário do Departamento de Estado ao Blog The Daily Beast. Fontes diplomáticas disseram ao The Independent que não há planos para remover pessoal diplomático, porque a remoção sugeriria que tivessem cometido algum erro e comprometeria a carreira dos diplomatas.
Tensões com os Estados árabes
Um dos telegramas recentemente divulgados revela que Hillary Clinton criticou o governo saudita, dizendo que o país é a principal fonte de financiamento para grupos militantes islâmicos, e que os políticos sauditas não se decidem a interromper o fluxo de dinheiro.
Em telegrama de dezembro de 2009, a secretária de Estado diz a diplomatas norte-americanos que “a ação de Riad tem sido limitada” [para interromper os fluxos de dinheiro para os Talibãs e outros grupos que atacam no Afeganistão, no Paquistão e na Índia]. E acrescentou que o Hamás conseguiu milhões na Arábia Saudita, sobretudo de peregrinos que vêm para o Hajj e o Ramadã.
A nota também fala de Qatar, Kuwait e Emirados Árabes Unidos como fonte de dinheiro para os militantes; com destaque para o Qatar – “o pior da região” –, por não cooperar com o Washington.
Traduzido pelo Coletivo Vila Vudu
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Atacado por escândalo que a cada dia parece gerar nova fornada de embaraços e incômodos, o governo dos EUA está sendo forçado a empreender ampla reforma em todos os seus cargos diplomáticos, pessoal militar e agentes de inteligência, cujo trabalho afinal está exposto aos olhos do mundo, depois dos vazamentos, pela página WikiLeaks, dos telegramas diplomáticos dos EUA.
Ontem, o governo Obama enfrentava grave crise em seu serviço diplomático, entre ondas sucessivas de provas de que a continuada publicação de comunicados pressupostos confidenciais e protegidos tornará impossível – se não perigoso – o trabalho diplomático como feito até aqui por funcionários do Departamento de Estado em todo o mundo.
Apenas 1.100 dos cerca de 250 mil documentos sigilosos que WikiLeaks recebeu e divulgou já foram publicados. Portanto, aumenta o medo de que prosseguirá, nos próximos meses, a divulgação de revelações que podem desestabilizar as relações dos EUA com praticamente todos os seus aliados-chave, inflamando as tensões com governos já hostis no Oriente Médio, no Extremo Oriente e em outras regiões.
“No curto prazo, já estamos paralisados, sem poder dar um passo” – disse à Agência Reuters um diplomata sênior dos EUA. Para a mesma fonte, serão necessários no mínimo cinco anos para reconstruir relações de confiança em todo o mundo.
“A situação está péssima. Dificilmente poderia estar pior. Não há exagero algum no que lhe digo. Falando claramente, ninguém quer falar conosco. (…) Há gente que continua obrigada a falar conosco, sobretudo governos e representantes oficiais. Mas mesmo esses perguntam antes de qualquer contato: “Vocês vão escrever sobre o que discutirmos aqui?”
Há informes de que o Pentágono, a CIA e o Departamento de Estado estão listando todos os funcionários do serviço diplomático que assinaram os telegramas mais comprometedores e que mais problemas criaram, dentre os que já foram publicados por WikiLeaks. Todos esses terão de ser removidos dos postos em que estão, em todos os casos os postos mais estrategicamente importantes da diplomacia norte-americana.
Dentre os diplomatas cujas opiniões privadas foram divulgadas para o mundo, para grande embaraço dos EUA, está Gene Cretz – embaixador dos EUA na Líbia, que, em 2009, escreveu o hoje já famosíssimo telegrama no qual informa ao governo dos EUA que Muammar Gaddafi não viaja sem a companhia de “uma voluptuosa loura”, sua enfermeira ucraniana.
O atual enviado dos EUA à ONU também tem sido criticado, depois da revelação de que Hillary Clinton instruiu-o a coletar números de cartões de crédito, de passes para viagens aéreas, números de telefones celulares, endereços de e-mails, senhas e outros dados de diplomatas estrangeiros e altos funcionários da ONU, inclusive do secretário-geral Ban Ki-moon.
A dificuldade para o serviço diplomático dos EUA é que os autores de vários dos mais importantes telegramas divulgados pela organização WikiLeaks são os mais experientes do corpo diplomático norte-americano, e será difícil, se não impossível, substituí-los. Até agora, nenhum dos países afetados pelos vazamentos solicitou a remoção de qualquer diplomata ou funcionário do serviço diplomático dos EUA.
“Essa é outra face dessa tragédia”, disse alto funcionário da segurança nacional ao Blog The Daily Beast [http://www.thedailybeast.com/blogs-and-stories/2010-12-04/wikileaks-cable-disaster-spurs-obama-plan-to-shake-up-key-personnel/full/full/] que, na 6ª.-feira, detalhou a extensão da crise nas embaixadas dos EUA e noticiou que a realocação dos diplomatas afetados já está planejada e acontecerá ao longo dos próximos meses.
“Teremos de deslocar alguns dos nossos melhores servidores, que sempre representaram muito bem os EUA, capazes das melhores análises –, só porque se atreveram a escrever a verdade sobre países nos quais servem.” Dentre governos estrangeiros que já se manifestaram ofendidos pelo conteúdo de um ou outro dos telegramas divulgados estão supostos aliados como França, Itália e Turquia, cujo primeiro-ministro Recep Tayyip Erdogan ameaçou processar o ex-embaixador dos EUA Eric Edelman por telegrama no qual o embaixador sugere que Erdogan teria dinheiro em bancos suíços.
Velhos inimigos dos EUA também estão gravemente incomodados. O presidente Dmitry Medvedev, da Rússia, é descrito num dos telegramas como “o Robin do Batman [primeiro-ministro da Rússia Vladimir] Putin”. Cuba e Venezuela são reunidas num “Eixo da Falsidade” em documento divulgado no fim de semana. Quando os primeiros telegramas foram divulgados, a Casa Branca condenou a divulgação, sob o argumento de que “poria em risco nossos diplomatas, profissionais de segurança e todos que, em todo o mundo, aproximam-se dos EUA para promover a democracia e governos mais transparentes”.
Apesar de até agora nenhum país ter requerido a expulsão dos diplomatas responsáveis pelos telegramas que mais incômodos provocaram, espera-se que comece em breve um movimento de declará-los “Persona Non Grata” – os governos declaram que um ou outro funcionário estrangeiro não é bem-vindo a um ou outro país; é ação que, na prática, leva à remoção.
“Pela nossa avaliação, é só questão de tempo”, disse um funcionário do Departamento de Estado ao Blog The Daily Beast. Fontes diplomáticas disseram ao The Independent que não há planos para remover pessoal diplomático, porque a remoção sugeriria que tivessem cometido algum erro e comprometeria a carreira dos diplomatas.
Tensões com os Estados árabes
Um dos telegramas recentemente divulgados revela que Hillary Clinton criticou o governo saudita, dizendo que o país é a principal fonte de financiamento para grupos militantes islâmicos, e que os políticos sauditas não se decidem a interromper o fluxo de dinheiro.
Em telegrama de dezembro de 2009, a secretária de Estado diz a diplomatas norte-americanos que “a ação de Riad tem sido limitada” [para interromper os fluxos de dinheiro para os Talibãs e outros grupos que atacam no Afeganistão, no Paquistão e na Índia]. E acrescentou que o Hamás conseguiu milhões na Arábia Saudita, sobretudo de peregrinos que vêm para o Hajj e o Ramadã.
A nota também fala de Qatar, Kuwait e Emirados Árabes Unidos como fonte de dinheiro para os militantes; com destaque para o Qatar – “o pior da região” –, por não cooperar com o Washington.
Traduzido pelo Coletivo Vila Vudu
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Uma nota sobre o cretinismo “internético”
Reproduzo artigo de Atilio Boron, publicado no sítio Cubadebate:
Tornou-se comum acreditar que a Internet é, por excelência, o espaço da liberdade de nosso tempo. Muitas pessoas, e não poucos teóricos, sustentam que se trata de um espaço libertário, onde as antigas restrições que o papel impresso impunha à produção e circulação das ideias estão definitivamente superadas. Basta ler algumas passagens do livro de Hardt e Negri, “Imperio”, ou os três volumes de Manuel Castells, “La Edad de la Información: Economía, Sociedad y Cultura” para apreciar a profundidade e ramificações desta crença.
Os primeiros dizem, em uma passagem memorável de sua obra – e não precisamente por ter acertado –, que “a rede democrática é um modelo completamente horizontal e desterritorializado. Internet... é o principal exemplo desta estrutura em rede... Um número indeterminado e potencialmente ilimitado de módulos interconectados que se comunicam entre si, sem que haja um ponto central de controle... Este modelo democrático é o que Deleuxe e Guattari chamaram rizoma (raiz), uma estrutura em rede não hierárquica e sem um centro” (pp. 277-278).
O livro de Castellis se ergue fielmente sobre esta superstição. Mas, ao contrário do que assegura a charlatanice pós-moderna, a Internet nem é horizontal, descentralizada ou desterritorializada. O que estes autores se empenham em negar é que a Internet é uma estrutura que tem centro de monitoramento e controle, e onde certos tipos de comunicações estão bloqueados, quase todas vigiadas e algumas são censuradas. Só espíritos muito ingênuos podem supor outra coisa.
Também pode ocorrer que um diagnóstico tão desastrado responda a incessante busca de originalidade e singularidade que caracteriza o trabalho de muitos intelectuais – a “ambição de novidades”, cujas perniciosas conseqüências já haviam sido notadas por Platão? – que afetados por uma fenomenal sobrevalorização da importância de si mesmos e de suas idéias se obstinam em formular refinadas teses sobre nossa época, mas abstendo-se de falar do capitalismo e do imperialismo. Do ponto de vista da ciência social, isto é tão absurdo como o intento de um astrônomo que quer prescindir o curso dos planetas depreciando por completo levar em conta o sol.
Em termos de pensamento crítico, uma operação deste tipo constitui uma lamentável capitulação, mas não se pode negar que permite um banho de respeitabilidade a quem promover semelhantes disparates, desarmam ideologicamente milhões de vítimas do sistema que, por outra parte, retribui generosamente os serviços dos que predicam tais fantasias. Uma das teses mais importantes deste tempo é, precisamente, exaltar a Internet como o reino da liberdade, convertendo-a num dos princípios da ideologia dominante em uma verdade supostamente irrefutável.
As evidencias que destroem este mito são nebulosas. Por exemplo, muitas das mensagens emitidas nestes últimos dias sobre o PLED, anunciando uma pane sobre o papel da Colômbia na geopolítica imperial, padeceram de suspeitosas dificuldades. Recebemos informações de amigos e companheiros que queriam difundir a notícia, mas ao colocar “Colômbia” no assunto ou no corpo da mensagem, esta simplesmente desaparecia ou ia direto para o cesto (spam ou para a lixeira). Também estamos com dificuldades em receber adesões para nossa campanha de solidariedade a Cuba, e são vários os que apelaram às chamadas telefônicas para informar as dificuldades em registrar a assinatura e enviar uma mensagem para a direção sobre a sua adesão.
São muitas as experiências que contradizem o caráter democrático e libertário da rede. Sem ir mais adiante, quem quer utilizar o Skype em Cuba não pode fazê-lo e, muito menos, socorrer-se ao Google Earth porque, em tal caso, aparecerá um aviso dizendo que “a localização em que você se encontra neste momento não pode ter acesso a este programa”. O mesmo ocorre com muitos outros programas. Quem tiver dúvida a respeito, basta enviar mensagens incorporando ao corpo do texto certas palavras supostamente vinculadas a atividades terroristas e verá o que ocorre.
Talvez Hardt, Negri ou Castells considerem estas coisas como anomalias transitórias, mas não é assim. No funcionamento “normal” da rede, que perturba o pensamento daqueles autores, existem centros que a controlam e dominam. A nota do dia 19 de abril do fechamento do Página/12 agrega nova evidência a favor destas teses. Ele informava que “uma página aberta em 25 de março (e que descrevia o seu dono como o “príncipe dos mujaidines”) havia alcançado mais de 1000 seguidores. O Facebook admitiu que não tivesse como determinar se o titular era verdadeiro ou apócrifo, mas anunciou que o sítio ficou desativado: desde ontem. Osama Bin Laden já não tem lugar na rede social da internet.”
Em uma passagem brilhante de seu 18 Brumário de Luís Bonaparte, Marx definia o cretinismo parlamentar como “uma enfermidade que aprisiona como por encantamento aos contagiados em um mundo imaginário, privando-lhes de todo sentido, de toda memória, de toda compreensão do bruto mundo exterior.” Uma enfermidade que agora reaparece e se apodera de alguns teóricos de nosso tempo, que os confinam em um mundo imaginário, no qual a Internet é o reino da liberdade e da democracia.
Reino edificado, com certeza, sobre uma sociedade capitalista que a cada passo demonstra sua incompatibilidade cada vez mais irreconciliável com a liberdade e a democracia, mas que, graças ao cretinismo “internético”, anseia renovar sua deteriorada legitimidade. Este cretinismo é muito mais nocivo que o identificado por Marx e deverá ser combatido com muita inteligência e muita militância nos marcos da batalha das ideias. A luta contra a ideologia dominante e os oligopólios mediáticos precisará livrar-se da Internet.
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Tornou-se comum acreditar que a Internet é, por excelência, o espaço da liberdade de nosso tempo. Muitas pessoas, e não poucos teóricos, sustentam que se trata de um espaço libertário, onde as antigas restrições que o papel impresso impunha à produção e circulação das ideias estão definitivamente superadas. Basta ler algumas passagens do livro de Hardt e Negri, “Imperio”, ou os três volumes de Manuel Castells, “La Edad de la Información: Economía, Sociedad y Cultura” para apreciar a profundidade e ramificações desta crença.
Os primeiros dizem, em uma passagem memorável de sua obra – e não precisamente por ter acertado –, que “a rede democrática é um modelo completamente horizontal e desterritorializado. Internet... é o principal exemplo desta estrutura em rede... Um número indeterminado e potencialmente ilimitado de módulos interconectados que se comunicam entre si, sem que haja um ponto central de controle... Este modelo democrático é o que Deleuxe e Guattari chamaram rizoma (raiz), uma estrutura em rede não hierárquica e sem um centro” (pp. 277-278).
O livro de Castellis se ergue fielmente sobre esta superstição. Mas, ao contrário do que assegura a charlatanice pós-moderna, a Internet nem é horizontal, descentralizada ou desterritorializada. O que estes autores se empenham em negar é que a Internet é uma estrutura que tem centro de monitoramento e controle, e onde certos tipos de comunicações estão bloqueados, quase todas vigiadas e algumas são censuradas. Só espíritos muito ingênuos podem supor outra coisa.
Também pode ocorrer que um diagnóstico tão desastrado responda a incessante busca de originalidade e singularidade que caracteriza o trabalho de muitos intelectuais – a “ambição de novidades”, cujas perniciosas conseqüências já haviam sido notadas por Platão? – que afetados por uma fenomenal sobrevalorização da importância de si mesmos e de suas idéias se obstinam em formular refinadas teses sobre nossa época, mas abstendo-se de falar do capitalismo e do imperialismo. Do ponto de vista da ciência social, isto é tão absurdo como o intento de um astrônomo que quer prescindir o curso dos planetas depreciando por completo levar em conta o sol.
Em termos de pensamento crítico, uma operação deste tipo constitui uma lamentável capitulação, mas não se pode negar que permite um banho de respeitabilidade a quem promover semelhantes disparates, desarmam ideologicamente milhões de vítimas do sistema que, por outra parte, retribui generosamente os serviços dos que predicam tais fantasias. Uma das teses mais importantes deste tempo é, precisamente, exaltar a Internet como o reino da liberdade, convertendo-a num dos princípios da ideologia dominante em uma verdade supostamente irrefutável.
As evidencias que destroem este mito são nebulosas. Por exemplo, muitas das mensagens emitidas nestes últimos dias sobre o PLED, anunciando uma pane sobre o papel da Colômbia na geopolítica imperial, padeceram de suspeitosas dificuldades. Recebemos informações de amigos e companheiros que queriam difundir a notícia, mas ao colocar “Colômbia” no assunto ou no corpo da mensagem, esta simplesmente desaparecia ou ia direto para o cesto (spam ou para a lixeira). Também estamos com dificuldades em receber adesões para nossa campanha de solidariedade a Cuba, e são vários os que apelaram às chamadas telefônicas para informar as dificuldades em registrar a assinatura e enviar uma mensagem para a direção sobre a sua adesão.
São muitas as experiências que contradizem o caráter democrático e libertário da rede. Sem ir mais adiante, quem quer utilizar o Skype em Cuba não pode fazê-lo e, muito menos, socorrer-se ao Google Earth porque, em tal caso, aparecerá um aviso dizendo que “a localização em que você se encontra neste momento não pode ter acesso a este programa”. O mesmo ocorre com muitos outros programas. Quem tiver dúvida a respeito, basta enviar mensagens incorporando ao corpo do texto certas palavras supostamente vinculadas a atividades terroristas e verá o que ocorre.
Talvez Hardt, Negri ou Castells considerem estas coisas como anomalias transitórias, mas não é assim. No funcionamento “normal” da rede, que perturba o pensamento daqueles autores, existem centros que a controlam e dominam. A nota do dia 19 de abril do fechamento do Página/12 agrega nova evidência a favor destas teses. Ele informava que “uma página aberta em 25 de março (e que descrevia o seu dono como o “príncipe dos mujaidines”) havia alcançado mais de 1000 seguidores. O Facebook admitiu que não tivesse como determinar se o titular era verdadeiro ou apócrifo, mas anunciou que o sítio ficou desativado: desde ontem. Osama Bin Laden já não tem lugar na rede social da internet.”
Em uma passagem brilhante de seu 18 Brumário de Luís Bonaparte, Marx definia o cretinismo parlamentar como “uma enfermidade que aprisiona como por encantamento aos contagiados em um mundo imaginário, privando-lhes de todo sentido, de toda memória, de toda compreensão do bruto mundo exterior.” Uma enfermidade que agora reaparece e se apodera de alguns teóricos de nosso tempo, que os confinam em um mundo imaginário, no qual a Internet é o reino da liberdade e da democracia.
Reino edificado, com certeza, sobre uma sociedade capitalista que a cada passo demonstra sua incompatibilidade cada vez mais irreconciliável com a liberdade e a democracia, mas que, graças ao cretinismo “internético”, anseia renovar sua deteriorada legitimidade. Este cretinismo é muito mais nocivo que o identificado por Marx e deverá ser combatido com muita inteligência e muita militância nos marcos da batalha das ideias. A luta contra a ideologia dominante e os oligopólios mediáticos precisará livrar-se da Internet.
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“Ley de Medios” e a inveja dos argentinos
Reproduzo artigo de Eduardo Guimarães, publicado no Blog da Cidadania:
Imagine poder discutir o semi monopólio da Globo com o motorista de taxi, com o porteiro do prédio, com a faxineira ou mesmo com um colega de trabalho. Ou ouvir até de empresários que realmente não é aceitável que um único grupo empresarial detenha metade da audiência da televisão aberta e o segundo jornal e a segunda revista semanal de maior tiragem.
De domingo – quando cheguei a Buenos Aires – até agora, não ouvi uma só pessoa responder que a “Ley de Medios” é um despropósito. A sociedade argentina está convencida de que é preciso democratizar a comunicação. E o que é melhor: as pessoas sabem o que é democratizar a comunicação.
Claro que esse pode ser um fenômeno dos centros urbanos. Contudo, tente, em São Paulo, no Rio, em Belo Horizonte, em Curitiba, em Porto Alegre, em Salvador ou em Recife, entre outros, discutir o oligopólio das comunicações. A quase totalidade das pessoas não lhe dará atenção por mais do que alguns segundos antes de mudar de assunto ou de inventar uma desculpa para interromper a conversa.
Note-se que não me refiro aos politizados – sejam de direita ou de esquerda, que, no Brasil, são raros. Refiro-me a essa maioria que pode conversar por horas sobre futebol ou sobre novelas, mas que não tem paciência de gastar cinco minutos com política.
O Brasil é uma ilha de alienação em meio a uma América Latina significativamente politizada. Venho batendo nesta tecla há muito tempo devido à minha atividade profissional, que me obriga a viajar pela região.
O que estou vendo na Argentina é ainda mais interessante do que vi em países como a Venezuela, por exemplo – país em que o mais humilde cidadão é capaz de discutir a constituição do país e a política partidária.
A grande diferença do Brasil continua sendo a nossa histórica bonomia em relação ao jogo do poder e a nossa aversão a conflitos de qualquer tipo, mesmo quando o conflito é inevitável e necessário.
Ciente da natureza de seu povo, Lula desperdiçou os últimos oito anos no que diz respeito à democratização da comunicação. Apenas no fim de seu segundo mandato é que ousou convocar uma conferência para discutir o assunto. Mas acabou relativizando sua importância quando a mídia começou com o mesmo trololó sobre “censura” que o grupo Clarín, aqui na Argentina, recita para as paredes.
O discurso do PIG argentino sobre supostos ímpetos censores do governo é exatamente o mesmo que o do PIG tupiniquim. Mas neste país é um discurso já quase envergonhado e que está morrendo a cada dia.
O grupo Clarín, a bem da verdade, tem um monopólio ainda maior do que o da Globo – alguma coisa perto de 80% do bolo da comunicação. Mas terá que se desfazer desse império. Será pago condignamente pelo que vender, mas não poderá manter o controle sobre tantas mídias e muito menos conseguirá vender seus meios de comunicação para testas-de-ferro.
Os dois governos Kirchner conseguiram explicar perfeitamente à sociedade os malefícios da concentração de meios de comunicação. A sociedade quer a diversidade de opiniões e de opções. É irreversível.
Enquanto esse sonho dourado dos democratas se materializa por aqui, no Brasil estamos completamente alheios ao que está acontecendo neste país. Deveríamos estar discutindo intensamente o processo em curso na Argentina. Ao menos na blogosfera. Mas a discussão ainda é insipiente. Não estamos avançando nesse debate.
Diga, leitor, uma só proposta concreta para acabar com o oligopólio nas comunicações no Brasil. Nem um órgão para normatizar as comunicações conseguimos discutir nacionalmente. Globo, Folha, Estadão e Veja conseguiram interditar o debate porque o governo teme meramente tocar no assunto.
E o pior é que temos condições muito melhores para propor essa discussão. Não temos os problemas que têm os argentinos na economia, por exemplo, e o apoio popular ao governo brasileiro é muito maior do que ao governo argentino.
Aliás, nada que seja polêmico nós conseguimos discutir. Os crimes da ditadura, por exemplo. Os criminosos do regime militar argentino estão sendo julgados e até presos. Enquanto isso, os criminosos que torturaram e assassinaram pouco mais do que crianças durante a nossa ditadura zombam de suas vítimas e ainda se dão ao desfrute de fazer ataques a elas.
Os argentinos estão nos goleando sem parar no que diz respeito à democratização real de seu país. Que inveja.
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Imagine poder discutir o semi monopólio da Globo com o motorista de taxi, com o porteiro do prédio, com a faxineira ou mesmo com um colega de trabalho. Ou ouvir até de empresários que realmente não é aceitável que um único grupo empresarial detenha metade da audiência da televisão aberta e o segundo jornal e a segunda revista semanal de maior tiragem.
De domingo – quando cheguei a Buenos Aires – até agora, não ouvi uma só pessoa responder que a “Ley de Medios” é um despropósito. A sociedade argentina está convencida de que é preciso democratizar a comunicação. E o que é melhor: as pessoas sabem o que é democratizar a comunicação.
Claro que esse pode ser um fenômeno dos centros urbanos. Contudo, tente, em São Paulo, no Rio, em Belo Horizonte, em Curitiba, em Porto Alegre, em Salvador ou em Recife, entre outros, discutir o oligopólio das comunicações. A quase totalidade das pessoas não lhe dará atenção por mais do que alguns segundos antes de mudar de assunto ou de inventar uma desculpa para interromper a conversa.
Note-se que não me refiro aos politizados – sejam de direita ou de esquerda, que, no Brasil, são raros. Refiro-me a essa maioria que pode conversar por horas sobre futebol ou sobre novelas, mas que não tem paciência de gastar cinco minutos com política.
O Brasil é uma ilha de alienação em meio a uma América Latina significativamente politizada. Venho batendo nesta tecla há muito tempo devido à minha atividade profissional, que me obriga a viajar pela região.
O que estou vendo na Argentina é ainda mais interessante do que vi em países como a Venezuela, por exemplo – país em que o mais humilde cidadão é capaz de discutir a constituição do país e a política partidária.
A grande diferença do Brasil continua sendo a nossa histórica bonomia em relação ao jogo do poder e a nossa aversão a conflitos de qualquer tipo, mesmo quando o conflito é inevitável e necessário.
Ciente da natureza de seu povo, Lula desperdiçou os últimos oito anos no que diz respeito à democratização da comunicação. Apenas no fim de seu segundo mandato é que ousou convocar uma conferência para discutir o assunto. Mas acabou relativizando sua importância quando a mídia começou com o mesmo trololó sobre “censura” que o grupo Clarín, aqui na Argentina, recita para as paredes.
O discurso do PIG argentino sobre supostos ímpetos censores do governo é exatamente o mesmo que o do PIG tupiniquim. Mas neste país é um discurso já quase envergonhado e que está morrendo a cada dia.
O grupo Clarín, a bem da verdade, tem um monopólio ainda maior do que o da Globo – alguma coisa perto de 80% do bolo da comunicação. Mas terá que se desfazer desse império. Será pago condignamente pelo que vender, mas não poderá manter o controle sobre tantas mídias e muito menos conseguirá vender seus meios de comunicação para testas-de-ferro.
Os dois governos Kirchner conseguiram explicar perfeitamente à sociedade os malefícios da concentração de meios de comunicação. A sociedade quer a diversidade de opiniões e de opções. É irreversível.
Enquanto esse sonho dourado dos democratas se materializa por aqui, no Brasil estamos completamente alheios ao que está acontecendo neste país. Deveríamos estar discutindo intensamente o processo em curso na Argentina. Ao menos na blogosfera. Mas a discussão ainda é insipiente. Não estamos avançando nesse debate.
Diga, leitor, uma só proposta concreta para acabar com o oligopólio nas comunicações no Brasil. Nem um órgão para normatizar as comunicações conseguimos discutir nacionalmente. Globo, Folha, Estadão e Veja conseguiram interditar o debate porque o governo teme meramente tocar no assunto.
E o pior é que temos condições muito melhores para propor essa discussão. Não temos os problemas que têm os argentinos na economia, por exemplo, e o apoio popular ao governo brasileiro é muito maior do que ao governo argentino.
Aliás, nada que seja polêmico nós conseguimos discutir. Os crimes da ditadura, por exemplo. Os criminosos do regime militar argentino estão sendo julgados e até presos. Enquanto isso, os criminosos que torturaram e assassinaram pouco mais do que crianças durante a nossa ditadura zombam de suas vítimas e ainda se dão ao desfrute de fazer ataques a elas.
Os argentinos estão nos goleando sem parar no que diz respeito à democratização real de seu país. Que inveja.
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