sábado, 22 de janeiro de 2011

Crianças são resgatadas de fazenda de fumo

Reproduzo matéria publicado no sítio Ecodebate:

Ação conjunta do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Ministério Público do Trabalho (MPT), Polícias Federal e Militar no município de Rio Negrinho, Planalto Norte catarinense, resgatou 23 pessoas de uma fazenda produtora de fumo onde trabalhavam em condições análogas a de escravo. Dos 23 trabalhadores resgatados, onze são crianças e adolescentes com idades entre 12 e 16 anos.

As causas de tantos desastres ambientais

Reproduzo editorial do jornal Brasil de Fato:

Sofremos mais uma tragédia. Mais de 600 pessoas perderam a vida nos municípios serranos do Rio de Janeiro. Outras dezenas pagaram com a vida em São Paulo, Minas Gerais...

Jornalismo para quem precisa

Reproduzo artigo de Olimpio Cruz Neto, publicado no sítio da Escola Livre de Jornalismo:

A Escola Livre de Jornalismo inicia, em fevereiro, um curso livre de jornalismo solidário com aulas ministradas, voluntariamente, por jornalistas com vivência de redação e experiência de reportagem, voltado prioritariamente para estudantes de jornalismo e profissionais da área.

A vida e a obra de Antônio Gramsci

Nas homenagens aos 120 anos de nascimento de Antônio Gramsci, reproduzo artigo de historiador Augusto Buonicore, publicado numa excelente edição especial da Fundação Maurício Grabois:

Gramsci nasceu em 22 de janeiro de 1891 numa pequena cidade na ilha da Sardenha – uma das regiões mais pobres da Itália. Sua infância foi marcada pelo infortúnio. Logo nos primeiros anos de vida desenvolveu uma deficiência física que o impediu de crescer normalmente.

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Dilma e a política suicida do câmbio

Por Altamiro Borges

Mesmo economistas ortodoxos têm alertado o governo recém-empossado de Dilma Rousseff para os enormes perigos da atual política cambial. A valorização artificial do real, decorrente da guerra cambial deflagrada pelos EUA, já dá sinais evidentes de que reduz o ímpeto das exportações e eleva as importações, afetando a balança comercial e causando transtornos para a indústria nacional. Em vários setores da economia, esta política suicida já começa a causar efeitos negativos na geração de empregos.

Centrais condenam aumento dos juros

Reproduzo notas oficiais da CTB e da Força Sindical:

A CTB (Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil) manifesta sua posição contrária em relação ao aumento da taxa de juros divulgado nesta mesma data pelo Banco Central. A alegação de que essa impopular medida seria necessária para conter a inflação não passa de mera cantilena, advinda dos poderosos setores da sociedade interessados na manutenção da maior taxa de juros real do mundo.

É frustrante que o mandato da presidente Dilma Rousseff se inicie com tal decisão. A CTB entende que o novo governo poderia ter sinalizado o início de uma nova era para o país, na qual a orientação monetária do Banco Central pudesse ter um rumo mais ousado – diferente daquele comandado por Henrique Meirelles durante oito anos.

A presidente Dilma Rousseff certamente tem conhecimento de que a decisão de aumentar a taxa Selic para 11,25% ao ano significa um retrocesso para o país. Tal medida se reflete no crescimento, no desenvolvimento e nos investimentos necessários para que o governo coloque em prática seu principal compromisso: a erradicação da miséria.

A CTB espera que o novo governo decida enfrentar, o quanto antes, o conservadorismo da política financeira que ainda vigora no Brasil. É preciso que a presidente Dilma Rousseff chame para si essa responsabilidade e proponha um novo rumo para a política monetária do país, de modo que o desenvolvimento econômico e social da nação se torne de fato uma realidade, em consonância à expectativa criada por aqueles que a elegeram.

Wagner Gomes - Presidente nacional da CTB

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É incrível, mas parece que o governo que se inicia quer implantar a agenda econômica que foi derrotada nas últimas eleições por privilegiar o capital especulativo. Lamentamos profundamente que a produção, o crescimento e a geração de empregos sejam os grandes perdedores com a decisão do Copom (Comitê de Política Monetária).

Os tecnocratas do governo insistem em colocar um forte freio na economia. Uma camisa de força no setor produtivo. Não há justificativa para manter os juros neste patamar estratosférico, penalizando, dessa forma, o crescimento econômico.

Tivemos uma desnecessária alta dos juros, que seguem em patamar excessivamente elevados. Juros altos que seguem na contramão da produção, do crédito e do consumo. Infelizmente, a decisão do Copom fortalece os obstáculos ao desenvolvimento do País com distribuição de renda.

Paulo Pereira da Silva (Paulinho)- Presidente da Força Sindical.

Participe da entrevista com Assange

Reproduzo comunicado de Natalia Viana, publicado no sítio CartaCapital-Wikileaks:

O fundador do WikiLeaks vai dar uma entrevista exclusiva para o público brasileiro.

A ideia é aumentar a comunicação direta com o Brasil, abrindo espaço para perguntas dos internautas.

Todo mundo pode participar. Basta enviar a sua pergunta como um comentário neste blog, incluindo nome completo e email para contato.

Eu e o pessoal do WikiLeaks vamos selecionar dez perguntas que serão respondidas por Julian.

Vamos selecionar em especial perguntas originais – já que o Julian deu muitas entrevistas ultimamente – e que tenham relevância para o público brasileiro e para o atual momento do WikiLeaks.

Claro, nem todo mundo será contemplado, mas a ideia que a entrevista seja o mais democrática possível.

As perguntas podem ser enviadas até as 18 horas da próxima sexta-feira, dia 21 de janeiro.

Já a entrevista vai ser publicada na próxima semana – somente na internet.

Contamos com a sua participação!

Jornalistas "tomam o poder" na Tunísia

Reproduzo matéria publicada no jornal francês L'Humanité e traduzida por Max Altman:

Os jornalistas tunisinos, silenciados e amordaçados sob o regime do presidente deposto Ben Ali, levam a cabo sua própria "Revolução do Jasmim", assenhoreando-se da linha editorial nas redações, sem, por enquanto, exigir a saída de suas direções.

Fenômeno sem precedente, comitês de redação são formados nos meios de comunicação do Estado, nos jornais privados considerados próximos do antigo regime e até naqueles do ex-partido no poder, a União Constitucional Democrática (RCD por sua sigla em francês), cuja dissolução as massas populares estão a exigir nas ruas.

"Somos nós que vamos decidir doravante a linha editorial", declarou Faouzia Mezzi, jornalista de La Presse, um jornal prestigioso que, sob Ben Ali, havia sido submetido totalmente às ordens de sua camarilha. "Nós constituímos dois comitês de redação, um para o La Presse, em francês, e outro para o Essahafa, cotidiano do mesmo grupo, em árabe, explica a senhora Mezzi, acrescentando que o diretor-geral do grupo está confinado, no momento, ao papel daquele que "assina os cheques" a fim de garantir o andamento da empresa.

O primeiro sinal de mudança nos meios de comunicação surgiu na noite que se seguiu à fuga de Ben Ali, na sexta-feira, 14 de janeiro, com o desaparecimento da tela da televisão pública do logo "Tunis7" em referência ao 7 de novembro de 1987, data em que o ex-presidente tomou o poder.

"Televisão nacional", proclama o novo logotipo, sobre um fundo vermelho e branco, as cores nacionais. O tom mudou completamente no canal público, que dá, a partir de agora, a palavra aos antigos opositores e às pessoas da rua, e, de resto, organizando extensos debates.

"Não se exerce hoje qualquer censura", indica Karima, uma jornalista do serviço de informações da rádio pública RTCI, porém "nós filtramos as informações tentando comprovar os fatos. A equipe de direção está em seu posto mas ela nos deixa fazer o nosso serviço de jornalistas".

O mesmo ocorre com o grupo de mídia próximo do antigo poder, o Al-Anouar, que possuiu quatro títulos. "Os redatores-chefes desapareceram, mas os jornalistas continuam a trabalhar", informa Chokri Baccouche, redator-chefe adjunto de um dos títulos.

A tomada do poder aconteceu igualmente na Radio Mosaique FM que pertence a pessoas próximas de Ben Ali. "Decidimos tomar em nossas mãos a linha editorial da rádio para que ela possa transmitir a voz dos tunisinos sejam quais forem as suas opiniões e a que agrupamento pertençam", anunciaram num comunicado os novos dirigentes, os jornalistas e os empregados da estação radiofônica.

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Sérgio Amadeu e a liberdade na internet



Reproduzo matéria publicada no Blog Serpro:

Há muito tempo que se debate liberdade na internet, a cada grande evento de tecnologia no Brasil reacende-se a discussão sobre a neutralidade da rede. Iniciativas como ACTA, AI-5 digital e Combating Online Infringement levam a crer que os especialistas que participaram do painel sobre o tema na Campus Party Brasil 2011 têm razão. A internet está sob ataque.

A internet deve ter acesso amplo, com interatividade plural e colaboração estimulada é isso que todos os usuários da rede mundial de computadores deveriam defender, porque ela foi criado justamente para esse fim. Mas, ao contrário disso, muitos acreditam no cerceamento dos direitos individuais no mundo digital e criminalizam a internet.

Para os painelistas, os interesses comerciais de grandes corporações são os principais motivos para esse movimento contra a liberdade individual na rede. Mizukami, pesquisador do Centro de Tecnologia e Sociedade da Fundação Getúlio Vargas (FGV) do Rio, defende que muitas empresas buscam criar uma imagem da internet como um ambiente instável e inseguro para influenciar a opinião da sociedade na validação de mecanismo de controle, o que não é falado é que esse controle não afetará apenas os “infrassores virtuais”, mas sim todos os usuários.

Sérgio Amadeu, professor da Universidade do ABC (UFABC) e ativista do movimento software livre, explica que um IP deixa um rastro de todos os caminhos percorridos na internet e por isso não pode ser vinculado publicamente a uma pessoa. “Isso afeta, inclusive, a privacidade de pensamento do indivíduo, uma vez que esses dados sejam controlados ninguém poderá saber de que forma serão utilizados”.

A iniciativa de criminalizar os usuários da rede já é real em alguns países e toma grande proporções em outros. No Brasil, o governo acredita na neutralidade da rede, mas também não concorda com a afirmação de que a internet é uma terra sem lei. A construção do Marco Civil, de forma participativa, é uma iniciativa do governo em aproximar a sociedade civil para debater e os direitos e deveres dos internautas.

Sérgio Amadeu fala sobre os avanços dessa discussão no país, confira!

América Latina: mídia versus democracia

Reproduzo artigo de Luiz Marques, publicado no sítio Carta Maior:

Sexo não é mais tema tabu, embora José Serra na última campanha tenha procurado englobar em um obscurantismo pautas correlatas: a livre orientação sexual, uma opção individual, e a prática do aborto, um problema de saúde pública. A picardia funcionou para associar a direita nativa às correntes internacionais extremistas do conservadorismo e catalizar o apoio de alas ultra-retrógradas, como a católica Opus Dei. Com o que, a candidatura do “bolinha de papel” atingiu o preocupante patamar de 43% dos votos no segundo turno, tendo por pano de fundo a herança cultural excludente e elitista do país.

Hoje, a censura da mídia patronal não recai sobre “a moral e os bons costumes”, mas sobre os esforços de democratização da América Latina. O bloqueio contumaz esconde os avanços no combate às desigualdades sociais. Os noticiários manipulam o imaginário social e ferem o direito à informação. À indagação do nacional-desenvolvimentista Celso Furtado, “saber se temos um futuro como nação no devir humano”, respondem buscando “interromper o nosso processo histórico de formação de um Estado-Nação”. A tática que adotam é a da omissão altista sobre as conquistas que distanciam-nos do passado colonial e escravagista, em combinação diuturna com as acusações histriônicas e gratuitas à suposta falta de moralidade nos atos das lideranças. A disco toca sempre a mesmíssima faixa.

As classes médias altas, por não sentirem o impacto imediato gerado com as políticas de qualificação dos serviços públicos, distribuição de renda, valorização do salário mínimo e expansão do crédito, mostram-se mais suscetíveis à sabotagem. As camadas empobrecidas, usufruindo no cotidiano os benefícios da inversão de prioridades, possuem uma consciência com maior imunidade ao mal humor dos donos da opinião pública. A situação é agravada pela ausência de uma legislação que proíba a propriedade cruzada, o que implica uma ameaça à veiculação de idéias plurais e uma limitação à capacidade de formulação de juízos independentes pelos indivíduos. Paradoxo que mina as bases da própria democracia liberal!

A midiatização oposicionista, encenada com sensacionalismo e virulência, tem um preço. O jornal argentino de maior circulação, Clarin, perdeu 30 mil leitores diários no ano passado, o que é bastante. Nem assim arrefeceu as baterias contra a Lei dos Meios de Comunicação, a qual estabeleceu que as licenças outorgadas serão divididas alocando 33% de emissoras de rádio e televisão para o Estado, 33% para as emissoras comunitárias e 33% para as empresas privadas.

A medida, que tem repercussão econômica e política, visa desconstituir os monopólios na área, alguns de posse de 60 frequências televisivas regionais. A Agência de Notícias Reuters (Inglaterra) divulgou a informação como um atentado à “liberdade de expressão” (leia-se: “acumulação”), tecendo um juízo de valor. Adicionava que “a aprovação da lei polêmica no Senado deve enfraquecer as grandes empresas jornalísticas críticas ao governo de Cristina Kirchner” (10/10/2009). A nota foi reproduzida em tom de lamento pela imprensa comercial. Seria risível, se não fosse melancólico.

Projetos em disputa

Dois projetos políticos seguem em disputa na AL, o neoliberal e o democrático-participativo. O primeiro detém-se em um conceito de democracia apenas procedimental, com vértice nas eleições, sendo culpado pela decepção espraiada com o rendimento societal pífio dos governos civis nos anos 90. O segundo amplifica a esfera pública, reabre possibilidades para o exercício da cidadania, reconfigura a relação entre os governados e os governantes. A este deve-se: a) a extensão de instâncias decisórias, que socializam o poder político e interferem de maneira propositiva na elaboração de programas e leis abrangentes; b) o reconhecimento das diferenças, que garante o aparecimento de novos sujeitos e; c) a universalização de direitos, que alicerça o incipiente edifício da igualdade republicana.

No discurso, ambos os projetos enaltecem as ações participativas. No governo FHC, por intermédio da “Comunidade Solidária” que tratava os pobres como objeto de filantropia e retirava da administração central qualquer obrigação no combate à pobreza. A questão social apelava à caridade, ao invés de clamar alto e bom som por justiça. O estratagema demotucano, decorrente dos ajustes fiscais inspirados no Consenso de Washington, serviu de paradigma para o Fondo de Solidariedad e Inversión Social (Chile) e a Red de Solidariedad (Colômbia).

As palavras mágicas ouvidas então eram “responsabilidade social”, “terceiro setor” e “voluntariado”, com os cidadãos reduzidos à condição de “consumidores” e a sociedade civil dissolvida nas “fundações empresariais”. Nada a ver com a noção de participação ilustrada nas “Conferências Nacionais” realizadas pelo governo Lula: mais de 70, abrangendo da pesca à saúde, passando pelos serviços de telecomunicações e radiodifusão. Todas atentas aos ideais simbólicos de um Estado de bem-estar social que aumente consideravelmente o PIF, isto é, o Produto Interno de Felicidade.

A utilização de um mesmo conceito para designar conteúdos distintos é o que certos autores classificam de confluência perversa de significados. “A perversidade se localizaria no fato de que, apontando em direções opostas e até antagônicas, os dois conjuntos de projetos utilizam um discurso comum” (Evelina Danigno, Alberto Olvera, Aldo Panfichi, A disputa pela construção democrática na AL, 2006). Os neoliberais embaralham os sentidos para apropriarem-se da demanda de participação dos movimentos sociais, sobretudo em conjunturas de refluxo das lutas populares. No lusco-fusco, ocultam as intenções privatistas para reverberar a semântica pega de empréstimo de outra ideologia. Pura malandragem.

A participação social, que os peregrinos do caminho da servidão querem privatizar, reatualiza a inserção dos trabalhadores nos processos políticos, organizando os coletivos para intervirem nas estruturas (que não são homogêneas) do Estado. A democracia participativa designa um “modo de vida” voltado para o desfrute pleno dos direitos civis, políticos e sociais. A democracia representativa, assentada na formalidade das regras do jogo, resume-se a um regime político. A coabitação, no caso, aperfeiçoa as engrenagens da representação política e relativiza o peso do clientelismo e do personalismo. “O legado de Lula é ter tornado a participação no governo federal efetiva. O desafio agora é transformar as decisões das conferências em políticas, e articular melhor as formas de participação com a produção legislativa no Congresso Nacional”, resumiu em entrevista o professor Leonardo Avritzer. Dessa articulação resultará um sistema político híbrido mais adequado.

Novos atores políticos

Assiste-se na AL à erupção de novos atores políticos e temáticas no espaço público, que deixa de ser uma trincheira de resistência ao despotismo estatal, como no ciclo ditatorial, para se converter em um laboratório de práticas associativas capazes de levantar propostas vinculantes à ordem estabelecida. “O Brasil não falava de extrativistas, de varzeteiros, de ribeirinhos, de pescadores ou de quilombolas”, declarou o ex-ministro Guilherme Cassel no balanço de sua gestão no Ministério do Desenvolvimento Agrário. Esse contingente estava excluído dos arranjos políticos. O fenômeno repete-se por toda parte, onde os grupos étnicos e as mobilizações indígenas ganham visibilidade social. Impossível desconsiderar tais segmentos ao prospectar o futuro da democracia.

A complexidade do real opõe-se aos esquemas reducionistas das vanguardas dogmáticas, que importavam fórmulas redentoras do hemisfério Norte ao invés de debruçarem-se sobre as circunstâncias do Sul. Nunca foi tão atual a observação do intelectual peruano José Carlos Mariátegui (1894-1930) para “evitar a imitação européia e situar a ação revolucionária em uma apreciação exata de nossa própria realidade”. A onda democrática pós-neoliberal não teria acontecido com a esquerda ainda submetida a um eurocentrismo, o que experiências como o Foro de São Paulo ajudaram a corrigir. Mas há muito por fazer para a elaboração de um pensamento anticapitalista autóctone, que se nutra da perspectiva internacionalista conquanto sem submissão ou obediência.

A geração de militantes formada sob os governos eleitos pelo voto direto aprendeu a dizer “não” às imposições, pois cresceu com autonomia para fazer escolhas. Pela formação societária, rejeita os ditames burocráticos. Ao contrário dos velhos comunistas diante das cúpulas dirigentes de antanho, substitui o argumento da autoridade pela autoridade do argumento. Ou seja, à heterogeneidade dos atores políticos, soma-se uma juventude crítica que cultua o empenho dialógico, recusa os sistemas organizacionais verticais, está familiarizada com as modernas tecnologias e ciente do direito a ter direitos. A tradição se reinventa. E, em um contexto de institucionalização das divergências, traduz uma vocação democrática e participativa que pode ser condensada na expressão “reformismo revolucionário”. A luta armada quedou na memória, à espera de esclarecimentos, a menos que surjam graves crises não equacionáveis dentro do Estado democrático de Direito.

A longa noite do autoritarismo provocou o surgimento de uma sociedade civil conservadora que, na sequência, conferiu uma sustentação política ao neoliberalismo. Contudo, o que se observa no período recente é o amanhecer de um tempo progressista com apoio nas maiorias, em especial nas camadas de baixa renda. O individualismo cede a vez ao solidarismo institucional por via da recuperação das funções clássicas do Estado. “No plano social, a inclusão só será plenamente alcançada com a universalização e a qualificação dos serviços essenciais. Este é um passo, decisivo e irrevogável, para consolidar e ampliar as grandes conquistas obtidas pelo nosso povo... E este é o sonho que vou perseguir”, reiterou com determinação a presidenta Dilma Rousseff durante a posse em 1° de janeiro.

Politizar os conflitos

A hostilidade aos protagonistas dessas mudanças alvissareiras não se coaduna com a razão e a vontade geral. A mídia dos patrões que comportam-se como senhores de escravos, ao vociferar para a metamorfose sócio-econômica que percorre as nações latino-americanas, faz-se auto-referente, ladra em frente ao espelho. Lembrando o poeta João Cabral de Melo Neto, é como se recitasse: “Falo somente com o que falo: / com as mesmas vinte palavras / girando ao redor do sol”. Aquela vocaliza o ódio, a intolerância, as calúnias da reação em face da emancipação da senzala, sintetizada nos grotões brasileiros de sotaque nordestino. Sua credibilidade desce a ladeira. Sua cólera sobe em igual proporção, celeremente.

O projeto encarnado pelos mass (em inglês, massa) media (em latim, meios) move-se por uma intencionalidade. Desqualificar o trabalho dos que defendem a coisa pública para, no lugar, pôr em relevo a iniciativa privada e a lógica do mercado, entendida como o eixo primaz da economia e das relações sociais. Escaldados, receiam que os países que promovem reformas exerçam um efeito demonstrativo sobre os demais. Acostumados aos privilégios, apostam na despolitização dos conflitos e na restrição da arena política, sem hesitar em criminalizar os movimentos sociais por exprimirem um “viés político”. Não espanta. “Na AL, a história dos meios de comunicação é a história de como se constituíram as oligarquias locais e regionais... é essencialmente uma história política, de favorecimentos a classes ou setores de classes em detrimento de outras”, escreveu o jornalista Gilberto Maringoni no Panorama das Comunicações e das Telecomunicações no Brasil (Ipea, 2011).

Na contramão, desenvolvem-se orçamentos participativos, conselhos gestores de políticas públicas, mesas de concertação, mecanismos de prestação de contas para os quais reserva-se o termo accountability. Formas alternativas e criativas de política irrompem no palco da luta de classes, a sociedade civil, acompanhadas de princípios éticos que travam um embate com a gramática da mercantilização. A discussão pública transcende a preocupação gerencial com a governabilidade e a eficácia administrativa, trazendo a incerteza para o horizonte das elites convencionais e, a civilização, para o presente da população. A democracia contém uma definição de “boa sociedade” que, se generaliza oportunidades e resultados, potencializa o controle público sobre o Estado e aponta para o autogoverno, finaliza no socialismo. Com nuances e ritmos diferenciados, as transformações estruturais dinamizadas pelo projeto democrático-participativo têm como tarefa concluir duas revoluções inacabadas, a burguesa e a socialista: haciendo camino al andar.

É preciso inserir na agenda das organizações sociais (sindicatos, associações, redes, etc) a denúncia contra o papel deletério cumprido pelos veículos informativos. O boicote e o vilipêndio são momentos táticos de uma estratégia mais ampla para barrar a democratização em curso no território demarcado pela utopia de Simon Bolívar e João Cândido. Trata-se de uma convocação permanente ao golpismo, frustrado na Venezuela (2002) e no Equador (2010), bem sucedido em Honduras (2009). Para esconjurar as tendências golpistas há que introduzir a democracia participativa também nos mass media: “Um sistema de comunicação social de fato democrático envolveria a participação do povo em larga escala, refletindo tanto os interesses públicos como valores autênticos – a verdade, a integridade, a descoberta” (Noam Chomsky, Segredos, mentiras e democracia, 1999). Outro mundo é possível. Outra comunicação, idem. Com a condição de que os conflitos sejam politizados.

* Luiz Marques é professor de Ciência Política da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Desastre revela urgência da reforma urbana

Reproduzo artigo de Marcelo Semer, publicado no sítio Adital:

Membros das Forças Armadas e do Corpo de Bombeiros fazem buscas por desaparecidos em Nova Friburgo nesta terça-feira (18)

Depois da tragédia, o Rio tem sido inundado de solidariedade, mas também de desculpas esfarrapadas e atribuição de culpas para todos os lados. A chuva, o povo, e, principalmente, os outros, são sempre estes que deixaram tudo isso acontecer.

O país foi capaz de elaborar uma lei de responsabilidade fiscal, mas ainda não uma de responsabilidade social.

Com fundo na política neoliberal de redução do Estado, pune-se o governante que gasta muito - mas não o que gasta pouco ou o que gasta mal.


O abandono progressivo do Estado é visível no liberalismo que toma conta da fiscalização da ocupação imobiliária. Parte significativa das regras existe justamente para ser burlada ou contornada, às vezes com a própria anuência ou estímulo do poder público.

Não faz tempo, em São Paulo, criou-se a figura da operação urbana, permitindo um acréscimo a ser pago pelo construtor para ultrapassar o limite legal da edificação. Resumindo: pagando bem, que mal tem?

E o desvario do esvaziamento do Estado estava prestes a ser aprovado no Congresso Nacional com o pomposo nome de Código Florestal, reduzindo a tutela pública sobre a ocupação do solo.

Supõe-se que a idéia tenha naufragado com as enchentes. Quem se atreveria hoje a anistiar ocupações irregulares, pela simples existência de um "fato consumado", ou aumentar as áreas de construção em encostas, depois do desastre?

Quer se pense nas culpas, quer se pense nas soluções, o que falta é mais Estado e não menos. Mais regulação e não menos. Mais gasto público e não menos. Tal como as crises econômicas que têm se reproduzido mundo afora, as catástrofes demonstram que a ausência do Estado é, disparado, o maior dos riscos sociais.

É essa a tragédia anunciada: quando o Estado se retira, se omite ou se vende, a atividade predatória das especulações e o desespero dos excluídos fulmina a natureza, o bom-senso e, principalmente, a prudência.

A inserção do Estado na solução dos problemas não pode se dar apenas no auxílio à reparação dos danos, pois ainda que a conta possa demorar para chegar, remediar é sempre mais dolorido e dispendioso do que prevenir.

Mas para prevenir, não adianta só firmar a impossibilidade de se construir ou morar em certos lugares perigosos. É certo criticar quem mora onde não pode. Mas quem não pode, mora onde?

O país abriu mão de fazer, décadas atrás, sua reforma agrária. Consolidou gigantescos latifúndios e expandiu como nunca a população das cidades, com o êxodo rural que a concentração da propriedade gerou. E agora, imprensado contra o muro das cidades superpovoadas e da habitação inacessível, vai se negar também a tocar a reforma urbana?

As cidades estão coalhadas de privilégios a quem deles não necessita. Clubes privados construídos sobre terrenos públicos, obras particulares com recursos do Estado, grandes áreas desabitadas e tantas outras cortesias com os chapéus do povo.

Mas para a habitação popular, os recursos sempre minguam, nunca são suficientes. Não estranha que os mais pobres acabem por morar em localidades irregulares, em morros, em encostas, em represas, em mananciais, e até junto a linhas de trem.

A excessiva valorização dos terrenos nas cidades vai, paulatinamente, expulsando os moradores de baixa renda para lugares inóspitos e insalubres. Ou o entulhar de milhões de pessoas nos morros cariocas é algo que se deve achar normal? Se a tragédia atingiu a região serrana, imagina-se o que aconteceria se se reproduzisse na capital?

O Estado deve intervir urgentemente na urbanização das cidades, principalmente privilegiando a habitação popular. Urbanizar moradias da população carente, gigantesca nesse país, é muito mais importante do que construir estádios ou abrir grandes avenidas.

Que as desgraças que sofremos neste começo de ano, não sirvam apenas para por à prova a incúria das autoridades ou a imensa solidariedade do povo.

Que as águas levem junto com elas, a equivocada proposta de reformar o Código Florestal, fragilizando a proteção da natureza, de acordo com os interesses da especulação rural. E que tragam de volta a idéia de reforma urbana, sempre cercada de preconceitos por todos os lados.

A reforma urbana é delicada, difícil, demorada e custosa. Mas sem ela, vamos continuar assistindo a conseqüências devastadoras, que não poderão ser atribuídas apenas ao mau humor do tempo.

A dimensão das perdas humanas no terremoto do ano passado no Haiti, já deveria ter nos advertido: a natureza castiga, mas a desigualdade castiga muito mais.

* Juiz de Direito em São Paulo e ex-presidente da Associação Juízes para a Democracia.

EUA criam projeto para grampear internet

Por Altamiro Borges

Na edição de dezembro último, a revista Superinteressante trouxe uma notícia que deve preocupar os defensores da liberdade na internet. Ela reforça o temor de que está em curso uma ofensiva mundial para controlar e restringir o uso da rede. Esta onda tende a ganhar maior impulso devido ao impacto dos vazamentos pelo Wikileaks de memorados da diplomacia estadunidense.

“Um novo projeto de lei, que será apresentado ao Congresso dos EUA nas próximas semanas, pode representar o mais duro golpe já visto contra a liberdade na internet. Proposta pelo governo Obama, a lei determina que todas as empresas de internet sejam obrigadas a instalar sistemas de grampo para capturar os dados enviados e recebidos por seus usuários”, descreve a revista.

Genocídio na Colômbia não é manchete

Ilustração: Areito
Por Altamiro Borges

É assustador o quadro de violência na Colômbia. Mas a mídia colonizada não dá manchetes nem aciona os seus “calunistas” para criticarem os governantes do país vizinho, que aplicam caninamente as orientações da política externa expansionista e belicista dos EUA na América Latina. A mídia venal só faz alarde contra os “inimigos” do império, como Cuba e Venezuela.

Segundo relatório enviado na semana passada à Organização dos Estados Americanos (OEA) por várias entidades de defesa dos direitos humanos, a barbárie impera na militarizada Colômbia. O estudo, fartamente documentado, reuniu dados de 2005 até 1º de dezembro de 2010. E as cifras são alarmantes: 173.183 homicídios, 1.597 chacinas e 34.467 desaparecidos.

Os obstáculos à regulação da mídia

Reproduzo artigo de Cristiano Aguiar Lopes, publicado no Observatório da Imprensa:

O Estado de S.Paulo, em mais um atropelo que faz a notícia chegar antes do fato, divulgou sem qualquer cerimônia, em 8 de janeiro: "Bernardo enterra plano de regulação da mídia". Trata-se de um obituário inédito, no qual é anunciada a morte de alguém que nem nasceu. Até agora, não foi divulgado sequer um anteprojeto, e nada indica que o governo desistiu de enviar uma proposta de nova regulação da mídia ao Congresso Nacional.

Mas, ainda que por vias tortas, o Estadão terminou chamando a atenção para um aspecto importante de um futuro projeto de lei para regular as comunicações: as chances de criação de um natimorto, que jamais será aprovado pelo Congresso Nacional, são gigantescas. Devido à numerosa bancada da radiodifusão; devido ao temor generalizado dos parlamentares de contrariarem os interesses da mídia; devido ao poder de lobby dos meios de comunicação; e devido a uma questão muito mais pragmática, mas que não foi abordada pela matéria: a Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI) da Câmara dos Deputados, órgão fundamental para a eventual aprovação de uma proposição que estabeleça uma nova regulamentação para a mídia, muito provavelmente será dominada por representantes dos radiodifusores na próxima legislatura.

Um passo à frente, dois passos atrás

A CCTCI viu surgir, nos últimos anos, algumas fortes lideranças capazes de se contraporem à bancada da radiodifusão. Lideranças que tornaram possível, pela primeira vez, a rejeição de processos de outorga e de renovação de outorga de radiodifusão na Comissão. Ou a criação de uma Subcomissão Especial para a investigação desses processos de outorga. Essas mesmas lideranças também aprovaram o Ato Normativo nº 1, de 2007, que aumentou as exigências para outorgas e renovações de outorgas de radiodifusão e tornou esses processos mais transparentes. O trabalho coordenado dessas lideranças na CCTCI seria essencial para uma eventual aprovação de uma nova regulação para a mídia.

Mas o que demorou muitos anos para ser construído foi esfacelado em um piscar de olhos e a maioria dos principais expoentes do grupo antagônico à bancada da mídia estarão longe da Câmara dos Deputados em 2011.

Julio Semeghini (PSDB-SP) é agora secretário de Gestão Pública do governo Geraldo Alckmin; Bilac Pinto (PR-MG) assumiu a Secretaria de Desenvolvimento Regional e Política Urbana de Minas Gerais; Jorge Bittar (PT-RJ) tornou-se secretário municipal de Habitação do Rio de Janeiro; Walter Pinheiro (PT-BA) e Rodrigo Rollemberg (PSB-DF) foram eleitos senadores; Gustavo Fruet (PSDB-PR) perdeu a eleição para o Senado e ficará sem mandato. Também sem mandato deverá estar Paulo Henrique Lustosa (PMDB-CE), a não ser que consiga uma vaga como suplente.

Futuro nada auspicioso

Esse espaço vazio será, com quase toda a certeza, ocupado por representantes da bancada da radiodifusão, tornando a CCTCI uma máquina de rejeição de projetos contrários aos interesses corporativos das empresas de mídia. Isso fará com que o governo, caso apresente um projeto de lei de regulação das comunicações, tenha de adotar uma estratégia diferente, que possa de certa forma driblar a CCTCI.

Uma opção é um acordo com o futuro presidente da Câmara dos Deputados para a distribuição da matéria a mais de três comissões de mérito. Uma outra é a apresentação de um projeto na forma de código. Ambas as opções forçariam a criação de uma Comissão Especial para a análise do projeto, em substituição às comissões permanentes.

Mas, mesmo assim, pelo menos metade dos membros titulares da comissão especial seria oriunda das comissões permanentes que deveriam apreciar o projeto – portanto lá estaria, ainda que com importância reduzida, a tropa de choque da radiodifusão, que deve controlar com mão de ferro a CCTCI na próxima legislatura.

Logo, o futuro não parece nada auspicioso à aprovação de uma nova regulamentação para a radiodifusão. Se o governo não decidir adotar o projeto como prioridade, nele investindo um volumoso capital político, a manchete apressada do Estadão corre grande risco de deixar de ser exagero para se tornar vaticínio.

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UNE debate a democratização da mídia


Reproduzo matéria publicada no sítio da União Nacional dos Estudantes (UNE):

Enfrentar os monopólios de comunicação, avançar na integração e aprofundar o debate acerca das alternativas midiáticas brasileiras foram os eixos que orientaram mais um debate promovido pelo 13º Conselho Nacional das Entidades de Base (13º CONEB) nesse domingo. “Democratização dos meios de comunicação e marco regulatório da mídia no Brasil” foi a mesa que atraiu estudantes de todo o Brasil presentes no auditório da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Para sustentar o debate, foi convidado um dos personagens centrais dessa luta, o ex-ministro da Secretaria de Comunicação Social, Franklin Martins. Com ele estavam o jornalista do jornal A Hora do Povo, Carlos Lopes; o jornalista da revista Retratos do Brasil, Raimundo Pereira; a secretária geral do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, Renata Mielli; e a coordenadora-executiva do Instituto Overmundo, Oona Castro.

Pela exposição dos participantes, foi possível analisar que há uma sinergia muito grande entre as aspirações e metas da luta pela democratização da comunicação. A ausência de espaços democráticos de mídias ainda é muito presente no Brasil.

Entre os desafios apontados está o de fazer com que os movimentos sociais assumam essa pauta como estratégica e desenvolvam uma série de ações políticas para que o tema se espraie por toda sociedade. “Sem mobilização popular para levantar a bandeira da comunicação como um direito humano será difícil alcançar vitórias nessa luta”, explicou Oona Castro durante sua fala.

“Muitas vezes as discussões sobre comunicação ficam restritas a círculos de especialistas em razão dos aspectos técnicos, mas a discussão sobre o acesso à banda larga e o direito à comunicação, por exemplo, são antes de tudo debates políticos e que interessam e atingem a todos”, analisou Renata Mielli.

Por outro lado, como apontou Raimundo Pereira, somente a mobilização social não é suficiente. Para garantir a liberdade de expressão para todas as pessoas, assegurando a diversidade e a pluralidade, o Estado precisa agir no sentido de garantir espaços para que estas vozes sejam ouvidas. “É imprescindível que os governos assumam a agenda da democratização da comunicação como parte indispensável das políticas para aprofundar o assunto na sociedade”, analisou.

Franklin Martins também ressaltou a importância do Estado na democratização dos meios e apontou uma nova mudança nos paradigmas relacionados a esse assunto. “Há 20 anos entrava governo, saía governo e tudo continuava no mesmo status quo. Pela primeira vez, neste governo, as políticas em relação a este assunto começaram a mudar. Isso porque o povo conquistou espaços de participaçãoe conquistou direitos na era Lula”, disse.

Por fim, o presidente da UNE Augusto Chagas refletiu sobre a importância do movimento estudantil se organizar e se mobilizar para a construção de um sistema democrático e amplo no País. “Esta mesa é uma das mais importantes do CONEB. Esse é um debate que vai persistir por todas as atividades da UNE e em suas lutas no próximo período”, afirmou.

Livro denuncia bloqueio midiático a Cuba

Reproduzo entrevista concedida ao jornalista Rogério Lessa, publicada no sítio Monitor Mercantil:

Apoiado em cifras oficiais, o jornalista Mário Augusto Jakobskind afirma que o bloqueio imposto pelos Estados Unidos por meio século ao regime socialista cubano já causou prejuízo superior a US$ 82 bilhões à população do país:

"É muito dinheiro para uma ilha pobre, com poucos recursos naturais. Cuba não é o paraíso, nem o inferno que certos setores tentam passar. Mas, certamente, sem o bloqueio o país poderia estar em situação bem melhor, o que permitiria uma análise mais realista do regime", pondera Jakobskind, que lançou no Brasil seu livro "Cuba, apesar do bloqueio, 50 anos de revolução" (Booklink).

Indignado com o bloqueio midiático que também cerca a ilha do Caribe, o jornalista já fizera uma edição do livro na passagem dos 25 anos da revolução, com prefácio de Henfil e pósfácio de João Saldanha. Jakobskind decidiu atualizar a publicação neste momento em que aumenta a pressão por mudanças e muitos apostam no fim do regime.

O que o levou a escrever, há 25 anos, a primeira edição de Cuba, apesar do bloqueio, e atualizar o livro agora?

É um livro-reportagem. A idéia de escrevê-lo - e atualizá-lo um quarto de século depois - deve-se, sobretudo, à tentativa de analisar o cerco midiático que Cuba sofre desde o início de sua revolução, antes mesmo da declaração em que o país optou pelo socialismo.

Acompanhando os noticiários diários dos principais jornais do eixo Rio/São Paulo, Cuba só aparece como uma ditadura, como se o povo não tivesse o direito de escolher os seus dirigentes. Alguns veículos de imprensa chegam a se referir a Cuba como o país da "ditadura dos Castros", em referência a Fidel e Raul. Em termos jornalísticos, há quase um total desconhecimento sobre o que acontece por lá, para não falar em preconceito e o noticiário de um modo geral basear-se em fontes que não têm interesse em mostrar os fatos como realmente são.

Com o fim da URSS, muitos pensaram que o regime cubano ia desmoronar. Agora a aposta é a mesma. Não fosse o bloqueio, o país estaria em dificuldades?

Dados oficiais indicam que 50 anos de bloqueio, que foi aumentado gradativamente, resultaram em perdas de US$ 82 bilhões. É muito dinheiro para uma ilha pobre, com poucos recursos naturais, praticamente apenas níquel.

Esse bloqueio atinge as raias do absurdo. Certa vez um menino cubano ganhou um concurso mundial de pinturas de uma multinacional fabricante de máquinas fotográficas e os EUA pressionaram até evitar a entrega de um prêmio, uma máquina fotográfica digital. Esse é um exemplo grotesco, mas o bloqueio se estende a remédios fabricados por empresas norte-americanas. Barak Obama tentou flexibilizar, mas a colônia cubana em Miami tem grande poder de pressão.

Há censura à Internet em Cuba?

Não há censura, mas uma questão técnica. Hoje o bloqueio impede que Cuba tenha acesso à fibra ótica, o que precarizou muito a Internet, cujo acesso se dá por telefone. É muito demorado. Agora, a partir deste ano, a Venezuela dará grande impulso para romper o bloqueio, inclusive via satélite.

Cuba está inserida no contexto latino-americano e mundial. É a mesma cultura que a brasileira. É muito difícil apartar o povo desse contexto cultural. O morador de ilha tem uma cultura diferente. Absorvem muito o que vem de fora. Sonham também. Alguns acham que vão encontrar o paraíso em outros países. Mas têm saúde e educação. Se querem mais é algo natural do ser humano.

Fidel recentemente escreveu contra a tortura, mas parte da mídia passa a imagem que passa de que boa parte da população vive sob tortura.

Qualquer jornalista que chega a Cuba tem de se credenciar. A partir daí é livre para falar com qualquer um. Há um cerco midiático, além do econômico e financeiro. Tudo o que acontece é interpretado de maneira a queimar a imagem do país e seus dirigentes. Volta e meia as televisões se referem à "ditadura dos irmãos Castro", como se não houvesse uma legislação chancelando os dirigentes. Depois de Raul, não será outro irmão de Fidel que assumirá o poder.

Alguns cubanos reclamam por não terem acesso a locais turísticos. A opção pelo turismo foi uma necessidade imposta pelo bloqueio? As mudanças em curso também poderão criar outra anomalia, com cubanos desempregados?

Dependerá da forma como essas mudanças serão conduzidas. Muitas coisas já deveriam ter sido feitas. Quem determina que no socialismo o pequeno comércio precisa ser do Estado?

Em 1989, antes do período especial, quem fosse para o interior, muitas vezes não tinha como comprar uma garrafa de água. Isso acontecia por causa da burocracia. Agora várias profissões foram regulamentadas. Por que uma barbearia tem de ficar na mão do Estado? Quando Cuba criou seu próprio modelo, acertou. Quando seguiu a URSS errou. Che Guevara frisava que o país tinha de cuidar da própria industrialização, para não ficar dependente dos russos.

Outra característica do modelo cubano é a liberdade religiosa, com Estado laico. É uma vantagem?

Sim. A única restrição é às Testemunhas de Jeová, pela proibição de transfusão de sangue. Mas encontrei gente do candomblé que é integrante do Partido Comunista. Não pode é existir uma teocracia, como no Irã ou em Israel. São coisas que a mídia não discute.

As últimas entrevistas de Fidel Castro o surpreenderam?

Fidel, no fundo, é um grande jornalista, de grande lucidez. Em 2001 houve um encontro de jornalistas latino-americanos dos mais variados setores e opiniões. As intervenções dele eram no momento exato, sem forçar a barra, e muito pertinentes.

Antes do assalto ao Quartel de Moncada, ele era advogado e também escrevia em jornais. Portanto, tem feito reflexões. O leitor concorda ou não. Uma das últimas preocupações de Fidel é com uma possível guerra nuclear. É um assunto polêmico. A possibilidade é muito remota, mas existe.

A partir do ataque a um barco sul-coreano, no qual morreram 46 pessoas, ele identificou o dedo da CIA e chamou a atenção também para o conflito entre as Coréias, pouco alardeado, mas que levou o Japão a recuar da decisão de abrir mão da "proteção" da base norte-americana...

O problema da mídia é muito sério. Onde estão as entidades que defendem a liberdade de expressão diante da perseguição ao Wikileaks? Imagine se um governo que não compactuasse com os EUA tomasse essa iniciativa? Coisas assim mostram como a mídia de mercado atua como aparelho ideológico. E aqui no Brasil isto está cada vez mais visível e concreto. E Cuba sofre esse mesmo bloqueio midiático, que influi no juízo de valor. O país não é um paraíso nem o inferno.

No final de 2010, foi anunciado que cerca de 500 mil cubanos deixarão de ser trabalhadores do Estado. Será o fim do pleno emprego?

Deixarão de ser trabalhadores do Estado mas terão emprego garantido. Já existia isso em alguns setores, como nos Paladares (pequenos restaurantes, inspirados na personagem de uma novela brasileira).

O fato de algumas pessoas de esquerda acharem que haverá desemprego está ligado à leitura mecânica do marxismo, que os leva, no fundo, a deixarem de ser marxistas.

Garcia Linera, vice-presidente da Bolívia, lembra que os mecanicistas interpretem os fatos a partir de seus dogmas. Há até partidos que se dizem de esquerda que entendem que Cuba é uma ditadura capitalista. Cada um tem o direito de interpretar da forma que quiser, mas estão utilizando mal o marxismo.

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Centrais prometem “acampar em Brasília”

Reproduzo artigo de Luana Bonone, publicado no sítio Vermelho:

As cores da democracia assumiram tonalidade de pressão social nesta terça-feira (18). As seis centrais sindicais realizaram um ato unificado em frente ao prédio da Justiça Federal em São Paulo. A diversidade de cores de camisas e bandeiras apenas reforçava a unidade das três reivindicações: salário mínimo de R$ 580; aumento real de salário para os aposentados e correção da tabela do Imposto de Renda.

Não foi por acaso que o ato de hoje foi realizado em frente à Justiça Federal. Na terça-feira passada (11), o presidente da Força Sindical, Paulo Pereira da Silva, havia dito que "se o governo não começar a negociar até segunda-feira, na terça-feira vamos entrar na Justiça com milhares de ações". Após a mobilização que reuniu cerca de mil pessoas, os presidentes das centrais protocolaram uma ação pela correção de 6,47% na tabela do Imposto de Renda (IR) que, defasada desde 1995, vem causando graves prejuízos financeiros aos trabalhadores.

O representante da União Geral dos Trabalhadores (UGT) no ato, Candidé Pegado, explica que “salário não é renda... renda têm os empresários. Salário é para garantir alimentação, habitação e transporte para o trabalhador”.

As centrais pautam também a garantia de aumento real das aposentadorias. A bandeira é que o reajuste seja 80% do reajuste do salário mínimo. Quanto a este, as centrais não arredam o pé: tem que ser R$ 580. “Se não mudar o valor do salário mínimo, a partir de fevereiro nós vamos acampar em Brasília”, convoca o presidente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Wagner Gomes.

Reunião com Dilma

Para pressionar pelas pautas, as centrais reivindicam uma reunião com a presidente da República: “quem ajudou a eleger, ajuda a mobilizar para garantir os direitos dos trabalhadores” , lembra Wagner, que em seguida chama os percussionistas presentes à passeata a “esquentar os tamborins”, afinal, esta é apenas a primeira passeata do ano.

A Força Sindical também reclamou da dificuldade das centrais em conseguir uma conversa com o novo governo. “Se a presidente Dilma ficar ouvindo seus burocratas, terá muito trabalho com os trabalhadores”, alertou Paulinho, reafirmando que as centrais não aceitarão o reajuste de 6,45% para os aposentados nem a Medida Provisória que apresenta um salário mínimo de R$ 545, o que seria apenas a reposição da inflação, segundo o sindicalista.

O presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Artur Henrique, lembrou que “os únicos que estão saindo prejudicados com a crise são os trabalhadores”. O cutista argumenta que os empresários foram beneficiados com políticas de crédito e que a resposta que deve ser dada aos trabalhadores é a valorização do salário mínimo, com garantia de aumento real.

Quem concorda com esta linha de defesa é o Luiz Gonçalves, presidente estadual da Nova Central Sindical de Trabalhadores (NCST): “cansamos de enfiar dinheiro nos cofres públicos para salvar a imprensa e os banqueiros”, bradou o líder da Nova Central.

Artur Henrique apresentou, ainda, o salário mínimo como o “principal instrumento” que o governo Dilma deve utilizar no combate à miséria.

Unidade dos trabalhadores

O consenso do êxito que a unidade das centrais representa foi sintetizado pelo presidente da Central Geral dos Trabalhadores do Brasil (CGTB), Antônio Neto: “essa unidade fez o salário mínimo ter 54% de aumento real, venceu o atraso nas últimas eleições, e vai fazer o Brasil crescer, se desenvolver com salário digno para todos os brasileiros”. Neto ressaltou ainda, que a decisão da presidente Dilma não é econômica, mas política.

Wagner Gomes, que integrou a comissão que entrou no prédio da Justiça Federal para protocolar a ação judicial movida pelas centrais pela correção da tabela do Imposto de Renda, disse que se a presidente Dilma não receber as centrais até o dia 1º de fevereiro, para retomar a negociação sobre o valor do salário mínimo com as centrais sindicais, os trabalhadores recepcionarão a abertura do Congresso Nacional com uma grande mobilização e pretendem ficar acampados em Brasília até que as negociações obtenham êxito.

Este foi apenas o primeiro ato unificado das centrais em 2011. No fim-de-semana, a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) aprovou a bandeira de 10% do PIB para a Educação. Na segunda-feira (17), o presidente da UNE disse que os estudantes farão pressão pelas suas bandeiras, com mobilizações já marcadas para março. E o MST já iniciou ocupações de terras em São Paulo. O mês de janeiro tem sido agitado. E, pelo visto, 2011 promete.

Tucson: o que a mídia tem a ver com isso?

Reproduzo artigo do professor Venício A. de Lima, publicado no Observatório da Imprensa:

Já foram muitas as análises e os comentários publicados neste Observatório e em outros veículos sobre os eventos ocorridos em Tucson, Arizona, no sábado, dia 8 de janeiro.

Apesar do enorme desastre da região serrana do Rio de Janeiro – que nos afeta a todos, muito mais de perto – é imperativo que se faça pelo menos um registro em relação aos trágicos eventos nos Estados Unidos por envolverem diretamente o objeto principal de nossa observação semanal: a mídia.

Intolerância em nome da democracia

Em recente balanço que fiz sobre as políticas públicas de comunicações ao longo dos oito anos de governo Lula (ver, neste OI, "O balanço dos governos Lula") mencionei o que acredito tenha sido uma das características do período, isto é, o recrudescimento da posição radical dos grupos privados de mídia em relação a qualquer proposta de regulação das comunicações, oriunda ou não do governo.

Como exemplos citei a partidarização da grande mídia e as inacreditáveis reações provocadas pela aprovação do Projeto de Indicação nº 72.10, pela unanimidade da Assembléia Legislativa do Ceará (depois vetado pelo governador Cid Gomes). Em Brasília, o advogado e editor do suplemento "Direito & Justiça" do Correio Braziliense, referindo-se às propostas aprovadas pela 1ª Conferência Nacional de Comunicação, escreveu que "Goebbels, encarregado por Hitler da difusão da propaganda nazista e de eliminar adversários do regime, não teria feito melhor".

Terminava, então, o referido balanço afirmando que "considerando a radicalização e a intolerância que têm marcado a relação entre os principais atores do campo nos últimos anos, o futuro próximo certamente reserva imensos desafios para a democratização das comunicações no Brasil".

Quão distante de nós ainda está o tipo de intolerância radical que se transforma em violência criminosa e que já se tornou uma triste rotina nos Estados Unidos?

Intolerância radical na mídia americana

Em novembro de 2010, em comentário que não constava do texto escrito preparado para a audiência pública da qual participava, o senador Jay Rockefeller (democrata da Virgínia do Oeste), presidente da Comissão de Comércio, manifestou sua irritação contra a radicalização política na mídia dos EUA. Referindo-se diretamente aos principais executivos das redes de TV a cabo, disse ele:

"Tem um pequeno ‘bug’ dentro de mim que quer a FCC [Federal Communications Commission] dizendo à FOX e à MSNBC: ‘Fora. Desligue. Chega. Adeus’. Isso faria um enorme favor ao discurso político; à nossa habilidade de fazer nosso trabalho aqui no Congresso; e ao povo americano, para que todos fossem capazes de conversar uns com os outros e ter alguma fé em seu governo e, mais importante, em seu futuro"

No texto escrito ele também afirmou:

"Quando se trata de produzir conteúdo, nossa máquina de entretenimento está, muito frequentemente, numa corrida para baixo. Ainda pior, nossos noticiários se entregaram totalmente às forças do entretenimento. Ao invés do fiscal que exerce um controle sobre os excessos do governo e dos negócios, temos o latido interminável de um ciclo noticioso de 24 horas [the endless barking of a 24-hour news cycle]. Nós temos um jornalismo que está sempre ávido pelo próximo rumor, mas insuficientemente interessado pelos fatos que podem nutrir nossa democracia. Como cidadãos, estamos pagando o preço" (ver aqui nota do New York Times sobre o assunto).

A polêmica posição do senador Rockefeller foi, por óbvio, bombardeada pela grande mídia nos EUA como uma ameaça à liberdade de imprensa. Sua lembrança, no entanto, serve para mostrar como não escapava a empresários/políticos como ele o papel de instigadora da intolerância que a mídia americana vem desempenhando no país, sobretudo após a eleição e posse de Barack Obama.

Que se saiba, as declarações de Jay Rockefeller não mereceram maiores comentários na grande mídia brasileira. O fato é apenas mais um a confirmar as imensas dificuldades que a mídia tem de lidar criticamente com o papel que ela própria joga na construção democrática, para além da retórica da defesa da liberdade de expressão associada a seus interesses comerciais.

Por outro lado, não é fácil para um jornalista setorial, imerso no cumprimento de uma pauta e no atendimento ao "enquadramento" esperado por seu editor/patrão, avaliar qual a "representação" da sociedade está ajudando a construir cotidianamente.

Some-se a tudo isso a preocupante característica da internet que parece facilitar a radicalização de opiniões. Perry Hewitt, da Universidade de Harvard, afirmou recentemente:

"A internet pode ser uma força positiva para criar laços sociais, mas negativa no que diz respeito à violação das liberdades civis e no aumento da polarização de opiniões" [ver aqui].

EUA vs. Brasil

Não temos entre nós o que tem sido chamado de "cultura do ódio" e, menos ainda, a tradição de acesso e uso indiscriminado de armas de fogo que existe nos EUA.

Apesar disso, não deixa de ser assustador que nossa oposição política e eleitoral, não só já se utilize de técnicas e estratégias importadas dos radicais de direita americanos (ver "Guerra suja na campanha eleitoral"), como sua retórica discursiva muitas vezes resvale para a irresponsabilidade de acusações e comparações históricas infundadas e descabidas.

Estaria sendo construído aqui um rastro de intolerância política radical que, de certa forma, tem se manifestado nos embates sobre a regulação da mídia?

Oxalá minha análise esteja equivocada.

Mídia descobre a ditadura da Tunísia

Reproduzo artigo de Igor Fuser, publicado no jornal Brasil de Fato:

Quando eu ingressei como redator na editoria de assuntos internacionais da Folha de S.Paulo, um colega veterano me ensinou como se fazia para definir quais, entre as centenas de notícias que recebíamos diariamente, seriam merecedoras de destaque no jornal do dia seguinte. "É só olhar os telegramas das agências e ver o que elas acham mais importante", sentenciou.

Pragmático, ele adotava esse método como um meio seguro de evitar que o noticiário da Folha destoasse dos jornais concorrentes, os quais, por sua vez, se comportavam do mesmo modo. Na realidade, portanto, quem pautava a cobertura internacional da imprensa brasileira era um restrito grupo de três agência noticiosas - Reuters, Associated Press e United Press International, todas afinadíssimas com as prioridades geopolíticas dos Estados Unidos.

Passadas mais de duas décadas, a cobertura internacional da mídia brasileira ainda se orienta por diretrizes estrangeiras. A única diferença é que agora as agências enfrentam a competição de outros fornecedores de informação, como a CNN e os serviços de empresas como a BBC e o New York Times, oferecidos pela internet. Mas o conteúdo é o mesmo. O resultado é que as informações internacionais que circulam pelo planeta, reproduzidas com mínimas variações em todos os continentes, são quase sempre aquelas que correspondem aos interesses de Washingon.

Quem confia nessa agenda está condenado uma visão parcial e distorcida, uma ignorância que só se revela quando ocorrem "surpresas" como a rebelião popular que derrubou o governo da Tunísia. De repente, o mundo tomou conhecimento de que a Tunísia - um país totalmente integrado à ordem neoliberal e um dos destinos favoritos dos turistas europeus - era governada há 23 anos por um ditador corrupto, odiado pelo seu povo. Como é que ninguém sabia disso?

A mídia silenciou sobre o despotismo na Tunísia porque se tratava de um regime servil aos interesses políticos e econômicos dos EUA. O ditador Ben Ali nunca foi repreendido por violações aos direitos humanos e, mesmo quando ordenou que suas forças repressivas abrissem fogo contra manifestantes desarmados, matando dezenas de jovens, o presidente estadunidense Barack Obama e sua secretária de Estado, Hillary Clinton, permaneceram em silêncio. Não abriram a boca nem mesmo para tentar conter o massacre. Só se manifestaram depois que Ben Ali fugiu do país, como um rato, carregando na bagagem mais de uma tonelada de ouro.

O caso da Tunísia não é o único na região. No vizinho Egito, outro regime vassalo dos EUA, Hosni Mubarak governa ditatorialmente desde 1981. Suas prisões estão lotadas de opositores políticos e as eleições ocorrem em meio à fraude e à violência, o que garante ao governo quase todas as cadeiras parlamentares. Mas o que importa, para o "Ocidente", é o apoio da ditadura egípcia às posições estadunidenses no Oriente Médio, em especial sua conivência com o expansionismo israelense.

Por isso, a ausência de democracia em países como a Tunísia e o Egito nunca recebe a atenção da mídia convencional, ao contrário da condenação sistemática de regimes autoritários não-alinhados com os EUA, como o Irã e o Zimbábue. É sempre assim: dois pesos, duas medidas.

Ministério Público de olho no BBB-11

Reproduzo matéria de Juliana Sada, publicada no blog Escrevinhador:

No dia 20 de dezembro, a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão do Ministério Público Federal (PFDC/MPF) enviou um documento à Rede Globo pedindo atenção aos direitos constitucionais e da pessoa humana na 11ª edição do reality show “Big Brother Brasil” – BBB11.

A ação foi motivada pelo alto número de denúncias que a última edição do programa recebeu. De acordo com a campanha “Ética na TV – Quem financia a Baixaria é Contra a Cidadania”, o BBB10 foi o campeão de reclamações no período entre agosto de 2009 e abril de 2010. Foram 227 denúncias que relatavam desrespeito à dignidade humana, nudez, exposição de pessoas ao ridículo e apelo sexual. De acordo com a PFDC ainda há problemas de homofobia, incitação à violência e inadequação no horário de exibição.

A Recomendação enviada à Rede Globo também adverte à emissora que observe a sua própria autorregulamentação, na qual o grupo assumiu “a missão de exibir conteúdos de qualidade que atendam às finalidades artística, cultural, informativa, educativa e que contribuam para o desenvolvimento da sociedade”. A emissora deve também tomar as medidas necessárias para evitar as violações de direitos humanos, além de veicular o programa no horário adequado, atentando para as diferenças de fusos horários e também para o horário de verão.

Violência liberada

Apesar da Recomendação enviada pelo Ministério Público, a Rede Globo não deu indícios de mudança no comportamento. Aliás, fez o contrário. Recentemente, o diretor do programa, José Bonifácio de Oliveira, conhecido como Boninho, declarou que decidiu “liberar a porrada” nesta edição de “Big Brother”.

A decisão do diretor causou protestos por parte de diversos grupos feministas que se preocupam com a banalização da violência, como foi relatado aqui.

Prazo e sanções

A Procuradoria deu à Rede Globo o prazo de 30 dias para se manifestar quanto à adoção das recomendações feitas no documento. Até o momento a emissora não se manifestou quanto à Recomendação, e o prazo expira nesta semana. O documento em si não gera nenhum tipo de sanção à Rede Globo, cumprindo a função de uma advertência. A penalização ocorrerá se algum direito ou lei for desrespeitada pelo BBB11.

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