Por Paulo Moreira Leite, em seu blog:
Ao aprovar uma nova regra para a eleição direta para Presidente da República, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado tomou uma providência que não pode ser diminuída nem exagerada num país que enfrenta uma situação duas vezes sufocante.
Se Michel Temer até pode ser derrubado em função da rejeição absoluta da uma maioria de brasileiros e brasileiros, num universo de desastres que soma denúncias da JBS, a pior crise econômica da nossa história e uma mobilização popular crescente, a manter-se a legislação atual a troca de presidentes pode representar um golpe dentro do golpe. Isso porque o artigo 81 da Constituição prevê eleições indiretas para substituir um presidente afastado na segunda metade do mandato.
A permuta seria descarada e sem anestesia: entrega-se um presidente mas mantém-se um programa de reformas que destrói o país.
Com todas as distâncias guardadas, pode-se assistir, 195 depois, a uma nova demonstração de astúcia de nossa classe dominante, uma repetição do teatro da história brasileira desde a Independência, no distante 1822, quando dom João VI deu o seguinte conselho a dom Pedro: "põe a coroa sobre tua cabeça antes que um aventureiro dela lance mão."
Ao aprovar uma nova regra para a eleição direta para Presidente da República, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado tomou uma providência que não pode ser diminuída nem exagerada num país que enfrenta uma situação duas vezes sufocante.
Se Michel Temer até pode ser derrubado em função da rejeição absoluta da uma maioria de brasileiros e brasileiros, num universo de desastres que soma denúncias da JBS, a pior crise econômica da nossa história e uma mobilização popular crescente, a manter-se a legislação atual a troca de presidentes pode representar um golpe dentro do golpe. Isso porque o artigo 81 da Constituição prevê eleições indiretas para substituir um presidente afastado na segunda metade do mandato.
A permuta seria descarada e sem anestesia: entrega-se um presidente mas mantém-se um programa de reformas que destrói o país.
Com todas as distâncias guardadas, pode-se assistir, 195 depois, a uma nova demonstração de astúcia de nossa classe dominante, uma repetição do teatro da história brasileira desde a Independência, no distante 1822, quando dom João VI deu o seguinte conselho a dom Pedro: "põe a coroa sobre tua cabeça antes que um aventureiro dela lance mão."
Como uma pequena luz no fim do túnel, a votação da CCJ pode abrir uma brecha institucional para se resolver essa situação. Numa decisão que ainda precisa ser aprovada pelo plenário do Senado -- por maioria de três quintos, em duas votações -- e ainda precisará atravessar o mesmo ritual, na Câmara de Deputados, aprovou-se que ocorrem eleições diretas para presidentes afastados até o final do terceiro ano de mandato. Ainda que todas essas votações venham a se realizar, atingindo esse placar sempre difícil, é preciso prestar atenção num prazo curto. Conforme a Constituição, uma mudança nas regras eleitorais precisa ser aprovada com um ano de antecedência para entrar em vigor.
Baseada num projeto do Senador José Reguffe, do Distrito Federal, relatado por Lindberg Farias, a proposta foi aprovada por unanimidade na Comissão, contagem que representa um duplo sinal político.
A decisão, por um lado, confirma a dificuldade de nossos políticos -- mesmo aqueles que ainda carregam Michel Temer nas costas -- em colocar-se abertamente como adversários de uma proposta que protege os direitos democráticos dos brasileiros. Do ponto de vista da bancada alinhada com Temer, foi uma demagogia de baixo risco, porém. Seus integrantes jogaram para a plateia mas poderão sabotar o projeto mais tarde, quando e se for levado a plenário. A mensagem principal foi registrada, porém.
Alargou-se o caminho que reforça a mobilização popular pelo fim do governo Temer e pelas Diretas-Já. Toda pessoa que já participou de atos públicos nas últimas semanas entendeu o retrato da situação. Está claro, acima de qualquer dúvida razoável, que uma imensa maioria dos brasileiros quer o fim do governo Temer e quer diretas -- mas não enxerga um caminho para chegar lá. A constatação de que a eleição não está prevista na Constituição a partir da segunda metade do mandato tem sido usada como principal argumento para se criar o desânimo e a falta de perspectiva. A proposta aprovada -- em comissão, é sempre bom lembrar -- desata um primeiro nó, o que explica a comemoração de Lindberg: "foi uma vitória espetacular."
Na defensiva, receosa da reação dos eleitores, a bancada governista deu uma prova de que a resistência enfrenta dificuldades do lado de lá e decidiu baixar a guarda -- pelo menos na hora de tirar fotografia. Não foi, de qualquer modo, um ponto fora do gráfico, mas uma decisão coerente com a paisagem mais ampla de colapso do governo Temer.
A votação na CCJ ocorreu 24 horas depois que o Planalto foi obrigado a encarar um vexame junto ao grande empresariado do país, aquele que, desde as eleições de 2014 mostrou-se como a principal força de sustentação conspiração que empossou Temer após um golpe sem crime de responsabilidade demonstrado.
Previsto para funcionar como a clássica "virada de jogo" que os estrategistas de marketing gostam de vender em horas de extrema dificuldade, um jantar de Michel Temer e da equipe econômica para grandes empresários, num grande hotel de São Paulo, encerrou-se num vexame típico daquelas horas em que os viajantes perceberam que o Titanic pode afundar. O jantar "chamou a atenção pela baixa adesão de representantes de empresas nacionais e a ausência de banqueiros de peso," informa o Valor Econômico.
Não é uma ausência qualquer. Envolve os donos do dinheiro grosso que montaram a bancada milionária de Eduardo Cunha e Michel Temer, passando por quem mais você puder imaginar, inclusive Aécio Neves, que agora corre para não ir para a cadeia depois de tentar impugnar a vitória de Dilma com ajuda da Lava Jato e denúncias de corrupção eleitoral.
Começa a ser montado, assim, o cenário de uma mudança política que faz parte das tradições brasileiras desde 1822, de fazer arranjos às costas do povo. É um cuidado ideal, quando se trata de reforçar uma posição colonial, que sempre pode ser ameaçada pela mobilização dos nativos.
Quase dois séculos depois, a indireta tem a mão de dom João VI.
Alguma dúvida?
Baseada num projeto do Senador José Reguffe, do Distrito Federal, relatado por Lindberg Farias, a proposta foi aprovada por unanimidade na Comissão, contagem que representa um duplo sinal político.
A decisão, por um lado, confirma a dificuldade de nossos políticos -- mesmo aqueles que ainda carregam Michel Temer nas costas -- em colocar-se abertamente como adversários de uma proposta que protege os direitos democráticos dos brasileiros. Do ponto de vista da bancada alinhada com Temer, foi uma demagogia de baixo risco, porém. Seus integrantes jogaram para a plateia mas poderão sabotar o projeto mais tarde, quando e se for levado a plenário. A mensagem principal foi registrada, porém.
Alargou-se o caminho que reforça a mobilização popular pelo fim do governo Temer e pelas Diretas-Já. Toda pessoa que já participou de atos públicos nas últimas semanas entendeu o retrato da situação. Está claro, acima de qualquer dúvida razoável, que uma imensa maioria dos brasileiros quer o fim do governo Temer e quer diretas -- mas não enxerga um caminho para chegar lá. A constatação de que a eleição não está prevista na Constituição a partir da segunda metade do mandato tem sido usada como principal argumento para se criar o desânimo e a falta de perspectiva. A proposta aprovada -- em comissão, é sempre bom lembrar -- desata um primeiro nó, o que explica a comemoração de Lindberg: "foi uma vitória espetacular."
Na defensiva, receosa da reação dos eleitores, a bancada governista deu uma prova de que a resistência enfrenta dificuldades do lado de lá e decidiu baixar a guarda -- pelo menos na hora de tirar fotografia. Não foi, de qualquer modo, um ponto fora do gráfico, mas uma decisão coerente com a paisagem mais ampla de colapso do governo Temer.
A votação na CCJ ocorreu 24 horas depois que o Planalto foi obrigado a encarar um vexame junto ao grande empresariado do país, aquele que, desde as eleições de 2014 mostrou-se como a principal força de sustentação conspiração que empossou Temer após um golpe sem crime de responsabilidade demonstrado.
Previsto para funcionar como a clássica "virada de jogo" que os estrategistas de marketing gostam de vender em horas de extrema dificuldade, um jantar de Michel Temer e da equipe econômica para grandes empresários, num grande hotel de São Paulo, encerrou-se num vexame típico daquelas horas em que os viajantes perceberam que o Titanic pode afundar. O jantar "chamou a atenção pela baixa adesão de representantes de empresas nacionais e a ausência de banqueiros de peso," informa o Valor Econômico.
Não é uma ausência qualquer. Envolve os donos do dinheiro grosso que montaram a bancada milionária de Eduardo Cunha e Michel Temer, passando por quem mais você puder imaginar, inclusive Aécio Neves, que agora corre para não ir para a cadeia depois de tentar impugnar a vitória de Dilma com ajuda da Lava Jato e denúncias de corrupção eleitoral.
Começa a ser montado, assim, o cenário de uma mudança política que faz parte das tradições brasileiras desde 1822, de fazer arranjos às costas do povo. É um cuidado ideal, quando se trata de reforçar uma posição colonial, que sempre pode ser ameaçada pela mobilização dos nativos.
Quase dois séculos depois, a indireta tem a mão de dom João VI.
Alguma dúvida?
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