Por Paulo Moreira Leite, em seu blog:
Num país onde omissões graves e abusos tremendos costumam inspirar nostalgias perigosas, nunca é tarde demais para reconhecer a importância da proclamação da República, no célebre 15 de novembro de 1889.
O país assistiu bestializado à proclamação da República, escreveu Aristides Lobo, observador da época. Correto. Não foi um movimento popular, mas um golpe de Estado, destinado a impedir o que se chamava de Terceiro Reinado.
Mas seria ainda mais absurdo deixar de reconhecer a superioridade de um regime que avança em direção a igualdade entre todos os homens e mulheres em comparação com um sistema político onde o poder se define de forma hereditária e a hierarquia entre nobres e plebeus governa a vida de todas as pessoas.
Uma boa amostra do que seria uma alternativa monarquista - é disso que estamos falando na data - foi oferecida há pouco mais de um mês.
Luiz Phillipe de Orleans e Bragança, descendente direto de Pedro II e um dos fundadores do movimento Acorda Brasil, um dos mais ativos nos protestos que derrubaram Dilma Rousseff, resumiu o que seria um projeto político para tirar o país da crise. Nada diferente das ideias da pinguela em vigor no Planalto de nossos dias. Só um pouco pior.
Enquanto o governo Michel Temer fala em reforma da Previdência, Luiz Phillipe defendeu sua extinção. Radicalizando a política de exclusão do ministro Ricardo Barros, da Saúde, também defende a extinção do SUS. Para alegria do mercado financeiro, o tataraneto do Imperador é favorável a fechar as portas, também, do BNDES, sem o qual é impossível contar a história de nosso parque industrial - cuja importância a família imperial jamais reconheceu no devido momento histórico (Entrevista a Celso Masson, revista IstoÉ, 6/10/2017).
A postura é coerente. Numa história onde a política republicana reserva tragédias periódicas - chamas Michel Temer, Fernando Collor, José Sarney e assim por diante - é bom não esquecer a herança real da monarquia e seu impacto sobre as instituições brasileiras.
Dona absoluta poder de Estado entre 1822 e 1889, a dinastia Orleans e Bragança submeteu o país a única monarquia nascida ao longo das lutas pela independência da América do Sul. Era um sistema de poder atrasado não só em relação ao pensamento do nosso início do século XXI, o que seria inevitável, mas em comparação com aquilo que se sabia na época no início do XIX. Num período histórico no qual o absolutismo imperial era já questionado na Europa e na América, no Brasil só os ricos tinham direito a voto.
O Imperador nomeava os ministros, subordinava a Igreja e não respondia por seus atos na Justiça. Apesar da imagem geralmente benigna deixada pela história dos vencedores, o regime se consolidou a partir da violência mais brutal. Se a Metrópole defendeu a Colônia pela repressão brutal à Inconfidência Mineira de Tiradentes e à Confederação do Equador de Frei Caneca, as revoltas internas ocorridas após uma independência de pai para filho -- literalmente -- foram vencidas da mesma maneira.
A Cabanada, no Pará, encerrou-se com o massacre de um terço da população local. A revolução Praieira em 1848, que queria a república, o voto livre e direto, a reforma do judiciário, encerrou-se com rendição e anistia do patamar de cima da pirâmide e a execução sumária das lideranças do patamar debaixo. No Sul a revolução Farroupilha, que proclamou a republica, prolongou-se por dez anos, encerrando-se em 1845 com 47.829 mortos reconhecidos oficialmente. O balanço social resume-se a um dado.
Ao longo de 65 dos 66 anos do Império do Brasil o país abrigou e protegeu a mais duradoura escravidão do planeta, um escândalo internacional com poucos equivalentes no mundo, encontrando-se no cativeiro a origem de uma brutalidade que deixou traços essenciais de uma dominação social e política até hoje. A monarquia também instituiu um Poder Moderador, pelo qual a Espada do Imperador estava acima do Executivo, do Legislativo e do Judiciário. Construiu-se a a partir daí um sistema de poderes autoritários que, após mudanças e transformações, sobrevive até hoje na Republica, como se viu em 1954, 1964 e 2016, para ficar nos casos mais exemplares.
Num período em que a república apresenta um chefe de governo que atinge 97% de repulsa popular, é bom não esquecer o lugar da monarquia e seus herdeiros. Em 1993, num plebiscito onde a República consultou os brasileiros sobre a forma de governo de sua preferência, a Monarquia recebeu 6,8 milhões de votos, contra 44,2 milhões favoráveis à Republica.
Num país onde omissões graves e abusos tremendos costumam inspirar nostalgias perigosas, nunca é tarde demais para reconhecer a importância da proclamação da República, no célebre 15 de novembro de 1889.
O país assistiu bestializado à proclamação da República, escreveu Aristides Lobo, observador da época. Correto. Não foi um movimento popular, mas um golpe de Estado, destinado a impedir o que se chamava de Terceiro Reinado.
Mas seria ainda mais absurdo deixar de reconhecer a superioridade de um regime que avança em direção a igualdade entre todos os homens e mulheres em comparação com um sistema político onde o poder se define de forma hereditária e a hierarquia entre nobres e plebeus governa a vida de todas as pessoas.
Uma boa amostra do que seria uma alternativa monarquista - é disso que estamos falando na data - foi oferecida há pouco mais de um mês.
Luiz Phillipe de Orleans e Bragança, descendente direto de Pedro II e um dos fundadores do movimento Acorda Brasil, um dos mais ativos nos protestos que derrubaram Dilma Rousseff, resumiu o que seria um projeto político para tirar o país da crise. Nada diferente das ideias da pinguela em vigor no Planalto de nossos dias. Só um pouco pior.
Enquanto o governo Michel Temer fala em reforma da Previdência, Luiz Phillipe defendeu sua extinção. Radicalizando a política de exclusão do ministro Ricardo Barros, da Saúde, também defende a extinção do SUS. Para alegria do mercado financeiro, o tataraneto do Imperador é favorável a fechar as portas, também, do BNDES, sem o qual é impossível contar a história de nosso parque industrial - cuja importância a família imperial jamais reconheceu no devido momento histórico (Entrevista a Celso Masson, revista IstoÉ, 6/10/2017).
A postura é coerente. Numa história onde a política republicana reserva tragédias periódicas - chamas Michel Temer, Fernando Collor, José Sarney e assim por diante - é bom não esquecer a herança real da monarquia e seu impacto sobre as instituições brasileiras.
Dona absoluta poder de Estado entre 1822 e 1889, a dinastia Orleans e Bragança submeteu o país a única monarquia nascida ao longo das lutas pela independência da América do Sul. Era um sistema de poder atrasado não só em relação ao pensamento do nosso início do século XXI, o que seria inevitável, mas em comparação com aquilo que se sabia na época no início do XIX. Num período histórico no qual o absolutismo imperial era já questionado na Europa e na América, no Brasil só os ricos tinham direito a voto.
O Imperador nomeava os ministros, subordinava a Igreja e não respondia por seus atos na Justiça. Apesar da imagem geralmente benigna deixada pela história dos vencedores, o regime se consolidou a partir da violência mais brutal. Se a Metrópole defendeu a Colônia pela repressão brutal à Inconfidência Mineira de Tiradentes e à Confederação do Equador de Frei Caneca, as revoltas internas ocorridas após uma independência de pai para filho -- literalmente -- foram vencidas da mesma maneira.
A Cabanada, no Pará, encerrou-se com o massacre de um terço da população local. A revolução Praieira em 1848, que queria a república, o voto livre e direto, a reforma do judiciário, encerrou-se com rendição e anistia do patamar de cima da pirâmide e a execução sumária das lideranças do patamar debaixo. No Sul a revolução Farroupilha, que proclamou a republica, prolongou-se por dez anos, encerrando-se em 1845 com 47.829 mortos reconhecidos oficialmente. O balanço social resume-se a um dado.
Ao longo de 65 dos 66 anos do Império do Brasil o país abrigou e protegeu a mais duradoura escravidão do planeta, um escândalo internacional com poucos equivalentes no mundo, encontrando-se no cativeiro a origem de uma brutalidade que deixou traços essenciais de uma dominação social e política até hoje. A monarquia também instituiu um Poder Moderador, pelo qual a Espada do Imperador estava acima do Executivo, do Legislativo e do Judiciário. Construiu-se a a partir daí um sistema de poderes autoritários que, após mudanças e transformações, sobrevive até hoje na Republica, como se viu em 1954, 1964 e 2016, para ficar nos casos mais exemplares.
Num período em que a república apresenta um chefe de governo que atinge 97% de repulsa popular, é bom não esquecer o lugar da monarquia e seus herdeiros. Em 1993, num plebiscito onde a República consultou os brasileiros sobre a forma de governo de sua preferência, a Monarquia recebeu 6,8 milhões de votos, contra 44,2 milhões favoráveis à Republica.
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