quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Washington ameaça o sítio Wikileaks

Reproduzo artigo de David Brooks, publicado no jornal mexicano La Jornada e traduzido pela Adital:

O governo dos Estados Unidos ameaça fiscalizar judicialmente a Wikileaks enquanto tenta superar a crise diplomática provocada pela divulgação de mais de 250 mil mensagens de suas 274 embaixadas e consulados e se intensifica o debate sobre as implicações da filtração. Noam Chomsky considerou que isso revela "o profundo ódio" dos governantes à democracia.

Enquanto a secretária de Estado, Hillary Clinton, reuniu-se com contrapartes na Ásia Central -muitos deles mencionados nas mensagens eletrônicas- para tentar minorar o golpe e resgatar seu prestígio, o Procurador Geral, Eric Holder e o Pentágono reiteraram que estão sendo realizadas investigações "criminais" acerca das filtrações de Wikileaks.

Algumas versões jornalísticas assinalaram que as autoridades consideram aplicar a Lei de Espionagem contra Julián Assange, o fundador e diretor de Wikileaks. O porta voz da Casa Branca, Robert Gibbs, declarou que "obviamente, existe uma investigação criminal sobre o roubo e difusão de informação sensível e classificada". Explicou que estão sendo avaliadas uma gama de opções para castigar os responsáveis.

Minimizam a filtração

Outros funcionários do governo de Barack Obama continuaram minimizando o assunto. O secretário de Defesa, Robert Gates, declarou a repórteres no Pentágono que a divulgação foi um assunto "embaraçoso"; porém, que as consequências para a política exterior estadunidense são limitadas. "O fato é que os governos estabelecem relações com os Estados Unidos porque é de seu interesse, não porque gostam de nós, não porque confiam em nós e não porque acreditam que podemos manter segredos".

Hillary Clinton reiterou no Cazaquistão que "foi um ato muito irresponsável" que "colocou em risco as vidas de pessoas inocentes em todo o mundo, sem ter consideração para com os mais vulneráveis, incluindo jornalistas".

Insistiu em defender a liberdade de expressão e criticou aos governos que reprimem os jornalistas. Na era da Internet, é difícil balancear a liberdade e a responsabilidade. "Temos que apoiar e proteger a liberdade de expressão, seja de um indivíduo ou de um jornalista. Porém, também tem que haver algumas regras ou algum sentido de responsabilidade que deve ser inculcado".

O Departamento de Estado desconectou o acesso aos arquivos da rede cibernética classificada do governo e reduziu o número de empregados que podem ver mensagens diplomáticas. A medida é temporária, indicou o porta voz P. J. Crowley, enquanto são reparadas "debilidades no sistema, que ficaram evidentes nessa filtração".

Ao mesmo tempo, o Departamento de Estado tentou desmentir que os diplomatas estadunidenses são espiões. A mensagem divulgada por Wikileaks assinada por Clinton, que inclui instruções a funcionários estadunidenses para buscar informações até de DNA, escaneamento oculares e biométricos de representantes de outros governos e dos mais altos funcionários da Organização das Nações Unidas, provocou críticas em várias partes sobre se os diplomatas estavam espionando.

Um alto funcionário do Departamento de Estado -não identificado- que declarou que as solicitações para obter essa informação pessoal foram enviadas por "administradores da comunidade de inteligência", e que os diplomatas estadunidenses não tinham obrigação de atender a esses pedidos, informou a agência AP. O porta voz Crowley sublinhou que "nossos diplomatas são diplomatas, não bens de inteligência".

O caso detonou um crescente debate aqui sobre o impacto e o significado da filtração massiva de documentos classificados -a maior na história, "Talvez a revelação mais dramática (...) é o ódio amargo à democracia que é revelado pelo governo dos Estados Unidos -Hillary Clinton e outros- e também pelo serviço diplomático", considerou Noam Chomsky, em entrevista com Amy Goodman, em Democracy Now. "Devemos entender (...) que uma das principais razões dos segredos governamentais é para proteger ao governo de sua própria população".

Tomou como exemplo o dito ontem por Clinton acerca de que as mensagens "confirmam o fato de que o Irã representa uma ameaça muito séria ante os olhos de muitos de seus vizinhos", já que os documentos revelam que líderes árabes instaram a Washington a atacar o Irã. Chomsky assinalou que "as pesquisas mais recentes (realizadas por Brookings Institution) reportam que 80% da opinião pública árabe vê a Israel como a principal ameaça na região; a segunda são os Estados Unidos, com 77%; e o Irã, com 10%. Isso não se informa nos jornais; porém, é muito familiar para os governos de Israel e dos Estados Unidos e seus embaixadores" e. portanto, o que as mensagens revelam não é a posição dos povos da região, mas a dos ditadores árabes e dos governos ocidentais.

Assim, "o significado principal das mensagens divulgadas até agora é o que nos dizem da liderança ocidental", assinalou Chomsky. Ao omitir-se a opinião pública do mundo árabe, como em outros aspectos que abordam essas mensagens, isso "revela o ódio profundo à democracia pro parte de nossas lideranças políticas e (nesse caso) da liderança política israelita".

Isso apenas está começando

Os quatro diários e a revista que difundiram o vasto acervo de mensagens eletrônicas diplomáticas informam que continuarão publicando mais durante pelo menos uma semana. Alguns editores afirmaram que isso apenas está começando.

Parece que tudo começou quando um analista de inteligência militar estadunidense de 22 anos de idade, que, aparentando estar escutando a Lady Gaga -cantando e movendo-se- estava "baixando" mais de um quarto de milhão de documentos diplomáticos que, após entregá-los em uma minimemória portátil a Wikileaks, sacudiram a vários governos do mundo.

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quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

WikiLeaks: 2.855 documentos sobre o Brasil

Reproduzo artigo de Natália Viana, publicado no sítio Opera Mundi:

Fui convidada por Julian Assange e sua equipe para trazer ao público brasileiro os documentos que interessam ao nosso país. Para esse fim, o Wikileaks decidiu elaborar conteúdo próprio também em português. Todos os dias haverá no site matérias fresquinhas sobre os documentos da embaixada e consulados norte-americanos no Brasil.

Por trás dessa nova experiência está a vontade de democratizar ainda mais o acesso à informação. O Wikileaks quer ter um canal direto de comunicação com os internautas brasileiros, um dos maiores grupos do mundo, e com os ativistas no Brasil que lutam pela liberdade de imprensa e de informação. Nada mais apropriado para um ano em que a liberdade de informação dominou boa parte da pauta da campanha eleitoral.

Buscando jornalistas independentes, Assange busca furar o cerco de imprensa internacional e da maneira como ela acabada dominando a interpretação que o público vai dar aos documentos. Por isso, além dos cinco grandes jornais estrangeiros, somou-se ao projeto um grupo de jornalistas independentes. Numa próxima etapa, o Wikileaks vai começar a distribuir os documentos para veículos de imprensa e mídia nas mais diversas partes do mundo.

Assange e seu grupo perceberam que a maneira concentrada como as notícias são geradas – no nosso caso, a maior parte das vezes, apenas traduzindo o que as grandes agências escrevem – leva um determinado ângulo a ser reproduzido ao infinito. Não é assim que esses documentos merecem ser tratados: “São a coisa mais importante que eu já vi”, disse ele.

Não foi fácil. O Wikileaks já é conhecido por misturar técnicas de hackers para manter o anonimato das fontes, preservar a segurança das informações e se defender dos inevitáveis ataques virtuais de agências de segurança do mundo todo.

Assange e sua equipe precisam usar mensagens criptografadas e fazer ligações redirecionados para diferentes países que evitam o rastreamento. Os documentos são tão preciosos que qualquer um que tem acesso a eles tem de passar por um rígido controle de segurança. Além disso, Assange está sendo investigado por dois governos e tem um mandado de segurança internacional contra si por crimes sexuais na Suécia. Isso significou que Assange e sua equipe precisam ficar isolados enquanto lidam com o material. Uma verdadeira operação secreta.

Documentos sobre Brasil

No caso brasileiro, os documentos são riquíssimos. São 2.855 no total, sendo 1.947 da embaixada em Brasília, 12 do Consulado em Recife, 119 no Rio de Janeiro e 777 em São Paulo.

Nas próximas semanas, eles vão mostrar ao público brasileiro histórias pouco conhecidas de negociações do governo por debaixo do pano, informantes que costumam visitar a embaixada norte-americana, propostas de acordo contra vizinhos, o trabalho de lobby na venda dos caças para a Força Aérea Brasileira e de empresas de segurança e petróleo.

O Wikileaks vai publicar muitas dessas histórias a partir do seu próprio julgamento editorial. Também vai se aliar a veículos nacionais para conseguir seu objetivo – espalhar ao máximo essa informação. Assim, o público brasileiro vai ter uma oportunidade única: vai poder ver ao mesmo tempo como a mesma história exclusiva é relatada por um grande jornal e pelo Wikileaks. Além disso, todos os dias os documentos serão liberados no site do Wikileaks. Isso significa que todos os outros veículos e os próprios internautas, bloggers, jornalistas independentes vão poder fazer suas próprias reportagens. Democracia radical – também no jornalismo.

Impressões

A reação desesperada da Casa Branca ao vazamento mostra que os Estados Unidos erraram na sua política mundial – e sabem disso. Hillary Clinton ligou pessoalmente para diversos governos, inclusive o chinês, para pedir desculpas antecipadamente pelo que viria. Para muitos, não explicou direto do que se tratava, para outros narrou as histórias mais cabeludas que podiam constar nos 251 mil telegramas de embaixadas.

Ainda assim, não conseguiu frear o impacto do vazamento. O conteúdo dos telegramas é tão importante que nem o gerenciamento de crise de Washington nem a condenação do lançamento por regimes em todo o mundo – da Austrália ao Irã – vai conseguir reduzir o choque.

Como disse um internauta, Wikileaks é o que acontece quando a superpotência mundial é obrigada a passar por uma revista completa dessas de aeroporto. O que mais surpreende é que se trata de material de rotina, corriqueiro, do leva-e-traz da diplomacia dos EUA. Como diz Assange, eles mostram “como o mundo funciona”.

O Wikileaks tem causado tanto furor porque defende uma ideia simples: toda informação relevante deve ser distribuída. Talvez por isso os governos e poderes atuais não saibam direito como lidar com ele. Assange já foi taxado de espião, terrorista, criminoso. Outro dia, foi chamado até de pedófilo.

Wikileaks e o grupo e colaboradores que se reuniu para essa empreitada acreditam que injustiça em qualquer lugar é injustiça em todo lugar. E que, com a ajuda da internet, é possível levar a democracia a um patamar nunca imaginado, em que todo e qualquer poder tem de estar preparado para prestar contas sobre seus atos.

O que Assange traz de novo é a defesa radical da transparência. O raciocínio do grupo de jornalistas investigativos que se reúne em torno do projeto é que, se algum governo ou poder fez algo de que deveria se envergonhar, então o público deve saber. Não cabe aos governos, às assessorias de imprensa ou aos jornalistas esconder essa ou aquela informação por considerar que ela “pode gerar insegurança” ou “atrapalhar o andamento das coisas”. A imprensa simplesmente não tem esse direito.

É por isso que, enquanto o Wikileaks é chamado de “irresponsável”, “ativista”, “antiamericano” e Assange é perseguido, os cinco principais jornais do mundo que se associaram ao lançamento do Cablegate continuam sendo vistos como exemplos de bom jornalismo – objetivo, equilibrado, responsável e imparcial.

Uma ironia e tanto.

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Rádios comunitárias entrevistam Lula

Por Altamiro Borges

Depois da histórica entrevista dada aos blogueiros progressistas, o presidente Lula quebra novamente o monopólio midiático e concede a sua primeira entrevista às rádios comunitárias. Ela ocorrerá nesta quinta-feira, 2 de dezembro, a partir das 9 horas, no Palácio do Planalto, e será transmitida ao vivo pelo Blog do Planalto. Estarão presentes comunicadores sociais de 10 rádios comunitárias de várias partes do país.

A coletiva é promovida pela Secretaria de Comunicação Social da Presidência (Secom), Empresa Brasil de Comunicação (EBC) e Associação Brasileira de Rádios Comunitárias (Abraço). Ela representa uma importante vitória deste movimento, que sempre foi duramente criminalizado. Pode sinalizar para uma nova política de estímulo às rádios comunitárias no país, num novo passo para a democratização da comunicação. Ela ainda ajuda a fortalecer o congresso nacional da Abraço, que ocorrerá em dezembro.

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WikiLeaks e agressão imperialista dos EUA

Por Altamiro Borges

Para os que acham que não existe mais imperialismo, a revelação do sítio Wikileaks de mais de 250 mil novos documentos sobre as atividades de espionagem dos EUA em todo o planeta representa o fim das ilusões de classe. Os textos “confidenciais” mostram a face verdadeira da diplomacia ianque, que trabalha diuturnamente com o objetivo de prolongar seu domínio imperial sobre mundo.

Para manter a sua hegemonia econômica, política, militar e ideológica, os EUA não vacilam em espionar dezenas de nações, orquestram planos para desestabilizar e derrubar governos eleitos democraticamente, financiam organizações e operações “terroristas” e vigiam até mesmo o secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU). O império não tem qualquer escrúpulo para manter o seu domínio.

Confissão do golpe em Honduras

Os documentos revelados pelo Wikileaks contêm informações levantadas por centenas de diplomatas sobre as prioridades da política externa dos EUA, como as ocupações do Afeganistão e Iraque, o Irã e o Paquistão. Além disso, estão incluídas avaliações sobre negociações bilaterais, conversas privadas e avaliações sobre líderes de vários países. Fica evidente a investida contra o Irã para “cortar a cabeça da cobra”, numa das referências ao presidente Mahmud Ahmadinejad. O esforço para derrubar o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, também aparece em vários textos.

A base de dados a que o jornal britânico The Guardian teve acesso revela a atividade de espionagem das embaixadas dos EUA em busca de informação que possa ser usada em chantagem contra dezenas de países, alguns deles aliados. Índia, Afeganistão, Paquistão, países árabes e africanos, assim como Honduras, Colômbia, Paraguai, Brasil e Venezuela, na América Latina, foram objeto de espionagem. No caso de Honduras, telegramas de diplomatas confirmam que houve um golpe militar no país – que os EUA e a mídia colonizada tentaram esconder.

Nelson Jobim, o "aliado"

No caso brasileiro, conversas confirmam o desconforto dos EUA com a política externa soberana praticada pelo Itamaraty. O ministro Celso Amorim e o ex-secretário-geral Samuel Pinheiro Guimarães são encarados como inimigos do império. Já o ministro da Defesa, Nelson Jobim – que infelizmente a presidente Dilma Rousseff pretende manter no posto – é tratado como um “aliado” dos EUA.

A vasta documentação tornada pública, num serviço inestimável da ONG Wikileaks, confirma que a luta contra a agressão imperialista é a principal batalha dos povos na atualidade para superar a opressão e a exploração.

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O diploma e os desafios contemporâneos

Reproduzo artigo de Venício Lima, publicado no Observatório da Imprensa:

São raras as atividades das quais participei nos últimos dois ou três anos nas quais, independente do tema sendo discutido, não aparecesse alguém e cobrasse minha posição sobre a obrigatoriedade do diploma de curso superior em jornalismo para o exercício da profissão de jornalista profissional.

Tenho constatado que a resposta a essa pergunta provoca inesperadas paixões e, em geral, serve como critério para colocar quem a responde no céu ou no inferno. Se a audiência for, majoritariamente, composta de estudantes de jornalismo e/ou militantes de sindicatos de jornalistas, relativizar a importância do diploma e chamar a atenção para as transformações radicais pelas quais passa o campo das comunicações – e as incontornáveis conseqüências desse fato para o jornalismo e a profissão de jornalista – pode ser o caminho seguro para hostilidades e intolerância.

Assumo, mais uma vez, o risco e boto a minha mão no vespeiro.

Transformações radicais

Nos Estados Unidos, como se sabe, não há exigência de diploma para o exercício profissional de jornalista. Aliás, a exigência não é encontrada em nenhum país de tradição democrática.

Em artigo publicado neste Observatório há cerca de três anos, comentei que o College of Communications, na minha alma mater, a Universidade de Illinois, em Urbana-Champaign, estava mudando seu nome para College of Media (ver "Ensino & Pesquisa: Mídia versus comunicação").

Reproduzi a justificativa oferecida pelo então dean do College, Ronald Yates, para a troca de communications por media. Disse ele:

"O que nos realmente fazemos é estudar e ensinar ‘comunicação midiatizada’ [mediated communications] (...). Nós estudamos e ensinamos mídia – mídia velha, mídia nova, mídia emergente, mídia futura. Em resumo, o College of Communications é sobre mídia. O mais importante de tudo isso (…) não é encontrar uma nomenclatura precisa, mas dar conta das mudanças que estão ocorrendo (...). A enorme mudança que produz informação e entretenimento a qualquer hora, em qualquer lugar, tem forçado as pessoas a se adaptarem constantemente. O resultado é que elas estão ficando mais sábias e discernindo melhor como gastar o dinheiro e o tempo delas, como buscar as notícias e como responder à mídia. Essas mudanças nas formas de distribuição [de informação e entretenimento] e na maneira como as pessoas pensam a respeito da mídia provocaram mudanças no escopo das comunicações como disciplina."

Na ocasião comentei também que, guardadas as diferenças, o "mercado" brasileiro demanda hoje um profissional que lembra os velhos pioneiros, isto é, um profissional que compreende a mídia em suas variadas dimensões, sua importância no mundo contemporâneo, e é capaz de produzir "comunicação" que possa ser distribuída em diferentes tecnologias. Em resumo: o profissional de hoje é multimídia, não é um especialista.

Apesar disso, afirmava, entre nós continuam a predominar cursos de graduação em unidades acadêmicas ainda vinculadas às divisões das velhas tecnologias, enquanto na pós-graduação prevalece uma tendência de forte fragmentação do campo de estudos (ver, neste OI, "Fragmentação versus convergência na comunicação").

Posição explicitada

Em pequeno livro concluído antes da decisão do STF, de junho de 2009, que considerou "não recepcionado" pela Constituição de 1988 o decreto que requer a obrigatoriedade do diploma de curso superior em jornalismo para o registro profissional, afirmei:

"Essa é uma questão sobre a qual tenho pensado há muito tempo. Mais recentemente, o surgimento da internet e o aparecimento dos blogs fizeram com que eu consolidasse uma posição amadurecida. Acredito que a melhor solução, aliás, já adotada em muitos países, inclusive no país que sempre é tido como referência na discussão sobre o jornalismo – os EUA – é a seguinte: existem os cursos de jornalismo nas escolas, nas universidades. As entidades profissionais fazem o ranking de qualidade desses cursos, que é amplamente divulgado. Os alunos que passam pelos melhores cursos acabam sendo valorizados no mercado profissional. Apesar disso, não há Lei impedindo alguém que não tenha feito o curso oferecido nessas escolas de exercer a profissão. Isso significa que ter freqüentado cursos de jornalismo, ter diploma, não é critério para o exercício da profissão. Mas também significa, evidentemente, que as escolas de jornalismo não devem deixar de existir. Ao contrário, elas devem existir. As melhores formarão os melhores profissionais" (cf. Bernardo Kucinski e Venício A. de Lima; Diálogos da Perplexidade – reflexões sobre a mídia; Editora Fundação Perseu Abramo, 2009; p. 27).

Formação profissional

Ao longo dos últimos três anos, os fatos parecem confirmar as tendências apontadas e a posição explicitada.

Noticiou-se recentemente que "a Universidade do Colorado estuda fechar seu curso de graduação em Jornalismo para criar um programa que combine preceitos jornalísticos e de ciência da computação". O novo curso seria algo próximo de uma "graduação em mídias". Além disso, informa-se que não é só a Universidade do Colorado "que estuda mudanças drásticas na grade de Jornalismo ou até mesmo a extinção do curso. Ao menos outras trinta escolas no país, entre elas Wisconsin, Cornell, Rutgers e Berkeley, consideram modificar os cursos para que se adequem às novas tendências do mercado de trabalho".

No Brasil, aos poucos, vai desaparecendo a tradição de formação crítica e humanista das universidades públicas. Ela vem sendo substituída pelo comprometimento exclusivo com o "mercado", predominante nos cursos oferecidos nas escolas privadas. Mais recentemente identifica-se uma clara movimentação por parte de setores do empresariado tradicional de mídia no sentido de atuar diretamente na formação profissional de jornalistas.

Além do conhecido e controvertido "Master em Jornalismo" (sic), que há mais de dez anos é oferecido no Brasil em associação com a Universidade de Navarra, recentemente a Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) anunciou que iniciará, no próximo ano, cursos de graduação e pós-graduação em jornalismo. Os cursos terão a parceria do Instituto de Altos Estudos em Jornalismo (IAEJ), criado em 2010 por Roberto Civita, principal executivo do grupo Abril. A pós-graduação terá ênfase em "Direção Editorial", será coordenada pelo jornalista e professor Eugênio Bucci e, nas palavras do diretor-presidente da ESPM, deverá "aliar os valores e práticas do jornalismo independente a noções avançadas de gestão. Vamos desenvolver nos alunos a capacidade de coordenar a produção de conteúdos multimídia de qualidade" (cf. "Um impulso extra para a carreira de jornalistas" in Imprensa, nº 262, pp. 22-25).

Desafios imediatos

Não seria o caso de outros setores da sociedade – além de empresários e grupos ligados a doutrinas religiosas – também se preocuparem com a formação do profissional em "jornalismo independente"? Por exemplo, os sindicatos de trabalhadores?

A questão da obrigatoriedade ou não do diploma, inevitavelmente passará para segundo plano se considerarmos a indiscutível centralidade da mídia nas sociedades contemporâneas e a necessidade que a sociedade civil organizada tem de utilizar plenamente os enormes potenciais democratizantes que a internet oferece para tornar públicas suas posições e travar a cotidiana "batalha das idéias".

Esse é um desafio concreto e imediato que torna mais importante – e não menos – a profissão de jornalista, mas que, ao mesmo tempo, torna inevitável a rediscussão (a) das profundas transformações que ocorrem no campo das comunicações; (b) de suas implicações na redefinição do jornalismo e do jornalista profissional; e, também, (c) do que significa a conquista do pleno exercício do direito à comunicação.

Apesar de todas as paixões que o tema desperta, não podemos esquecer que mais importante do que a obrigatoriedade do diploma de jornalismo para o registro profissional é a universalização da liberdade de expressão e o aprimoramento da democracia.

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terça-feira, 30 de novembro de 2010

O novo e o velho: a mídia em metamorfose

Reproduzo artigo de Izaías Almada, publicado no blog Escrevinhador:

Se dúvida houvesse quanto ao fato de se afirmar que existe uma velha e uma nova mídia no Brasil, sendo esta pautada pela procura da responsabilidade na informação e aquela cada vez mais afundada em compromissos corporativistas, distante, pois, dessa responsabilidade, a entrevista concedida pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva a blogueiros teve – entre outros méritos – o de provar a verdade desse contraste.

Destituída de maiores formalidades, bem organizada, democrática quanto a participação de cada um dos entrevistadores, solta, sem jogos de vaidade por parte dos jornalistas presentes, a entrevista mostrou um presidente bem humorado, falando abertamente aquilo que era possível falar, conforme suas próprias palavras, e sem fugir a alguns questionamentos mais delicados, mas feitos num ambiente de respeito por alguém que, injustamente, sofreu um verdadeiro linchamento da velha mídia por oito anos seguidos.

Ao contrário de analistas e jornalistas da velha mídia (que vai se mostrando cada vez mais velha, diga-se), os blogueiros presentes, onze representantes – e são muitos mais em toda blogosfera brasileira – de um estilo de jornalismo abandonado por seus pares de jornalões, revistões e televisões, tiveram a sensibilidade de entender aquele momento que viviam e construíam.

Momento histórico, já disseram muitos, porque em duas horas de transmissão, cada pergunta e cada resposta percorriam o simples caminho do diálogo entre pessoas que sabem ouvir, mesmo quanto a resposta do entrevistado era passível de uma réplica ou de contestação.

Toda a entrevista falou de um Brasil novo, que quer mudar, apesar dos enormes entraves ainda existentes. Com diplomacia e bom humor, o presidente Lula botava o dedo na ferida de várias mazelas ainda a serem enfrentadas não só pelo poder executivo, mas principalmente nos gargalos conservadores do legislativo e do judiciário. Sempre com o cuidado de dizer que determinadas mudanças só acontecerão quando a sociedade se conscientizar de que esta ou aquela mudança será necessária, como a Reforma Política, por exemplo. Disse mesmo que começaria a lutar por ela já no dia 02 de janeiro próximo dentro do seu próprio partido.

Uma entrevista que, mesmo discutindo problemas do presente e de nosso passado recente, projetava uma nação para o futuro, numa dialética que só é possível quando se faz entre pessoas cujo interesse é buscar soluções para um determinado número de problemas, de soluções para o país. E não só acuar, difamar, procurar os problemas sem indicar soluções que sejam compatíveis com a realidade que se vive no Brasil e no mundo.

Porque é assim que trabalha a velha mídia: desconstrói e achincalha, sem direito a defesa, sem o contraditório, desde que o governo ou a autoridade achincalhada e difamada em âmbito municipal, estadual e federal não dance conforme a música de seus interesses corporativos, conservadores e antinacionais.

Não é difícil mostrar a diferença de prática jornalística a partir da entrevista do presidente aos blogueiros. Vou usar aqui um exemplo que aprendi com o dramaturgo e professor de dramaturgia, meu velho amigo Chico de Assis, um dos formadores do histórico CPC da UNE nos anos 60. Em suas aulas, para tornar claro algum exemplo do tema que abordava, costumava usar uma técnica que era a de “raciocinar pelo absurdo”, isto é, você exagera uma determinada situação até o imponderável ou absurdo e, pela oposição a ela, você é capaz de compreender melhor o tema (no caso uma ação dramática) estudado.

Vamos usar a técnica aqui e, raciocinando pelo absurdo, imaginemos que naquela mesma situação e naquele mesmo cenário o presidente Lula contasse com a presença de jornalistas como Myriam Leitão, Reinaldo Azevedo, Augusto Nunes, Eliana Catanhede, Diogo Mainardi, Arnaldo Jabor, Clóvis Rossi, Merval Pereira, Lúcia Hippólito e outros menos votados…

Começaram a perceber a diferença? Para além da empáfia e do preconceito disfarçado por teorias acadêmicas mal assimiladas, aquele ar de quem sabe tudo sobre todas as coisas, do torresmo aos Diálogos de Platão, do álbum de figurinhas às teorias de Steve Hawkins. A vaidade e o auto-elogio se digladiando contra a ignorância do presidente semi-analfabeto, a Casa Grande contra a senzala, o passado contra o presente (e o futuro), tal grupo de jornalistas aproveitaria a oportunidade para expor a verdade incontestável de seus argumentos, irretorquíveis, próximos à infalibilidade papal.

O ranço e o verniz de uma auto-intitulada elite, digamos intelectual, em confronto com a linguagem mais popular do presidente, mais acessível ao cidadão comum, tão bem entendida por este, que foi capaz de lhe dar mais de 80% de popularidade em final de mandato e fazer de Dilma Roussef a nova presidente do Brasil.

O exemplo é até mais do que absurdo, mas escancara para quem acompanha o que se passa no país nesse momento a inequívoca diferença entre um jornalismo envolto em teias de aranha e naftalina e o nascimento de uma alternativa mais democrática, que respeita a inteligência do cidadão brasileiro, tendo na internet um novo e vigoroso meio de informação com responsabilidade. De tal maneira isso é verdade, que a velha mídia tentou ridicularizar o acontecimento, numa demonstração infantil de que não tem argumentos convincentes para se opor ao novo.

Nesse aspecto, as perspectivas para 2011 são promissoras. A herança bendita que o presidente Lula deixa à sua sucessora traz para ela, entre outras, a responsabilidade de efetivar, na prática, a democratização da informação no Brasil. Por aí se amplia o espaço de discussão de temas relevantes no aprofundamento e na garantia de conquistas e avanços que vão ajudar na superação de mazelas há quase cinco séculos introjetadas pela sociedade brasileira. A primeira delas é a de que um povo que estuda, tem emprego e comida na mesa é capaz de pensar melhor e combater a elite do atraso.

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Jobim é ministro da Defesa (dos EUA)

Reproduzo artigo de Paulo Henrique Amorim, publicado no blog Conversa Afiada:

A Folha teve acesso a alguns documentos do WikiLeaks, o melhor fruto da história da internet.

A Folha até que tentou ajudar o ministro serrista Nelson Jobim – tirou-lhe do título – , mas não conseguiu.

Os documentos revelam um escândalo.

O ministro da defesa (dos EUA) espinafra a política externa do Brasil, num almoço com o embaixador americano.

E reforça a impressão do embaixador de que o Itamaraty é antinorte-americano.

Jobim é textual: a política externa brasileira tem “inclinação anti-norte-americana”.

Um escândalo!

Não à toa que o embaixador americano considera Jobim “íntegro e confiável”.

Mas o próprio embaixador se assusta com o aliado Jobim: acha que se trata de um Ministro da Defesa “inusualmente” enxerido: mete o bedelho onde não deve, diria esse ordinário blogueiro.

Essa é a opinião do diplomata que, em Brasília, serve aos interesses nacionais americanos.

Aquele que deveria promover a defesa dos interesses nacionais brasileiros critica a política externa do Brasil e “dá a ficha” de um colega ministro, o embaixador Samuel Pinto Guimarães, que foi vice-ministro das Relações Exteriores: é alguém que “odeia os Estados Unidos”.

O embaixador americano poderia até supor isso.

Mas, uma informação dessas, “de dentro”, vale ouro.

O ministro da defesa (dos EUA), Nelson Jobim, comete outra transgressão absurdamente inaceitável.

Veja bem, amigo navegante.

Lula sai de um encontro com Evo Morales, presidente da Bolívia, em La Paz.

E conta a Jobim (teoricamente Ministro da Defesa do Brasil) que o presidente boliviano tem um tumor muito grave na cabeça.

E ele, Lula, tinha oferecido a Morales vir ao Brasil se tratar.

O que faz o ministro da defesa (dos EUA)?

Passa essa valiosíssima informação ao embaixador dos Estados Unidos, país que vive às turras com Morales e a Bolívia.

Neste mesmo fim de semana, o New York Times, a propósito do Wikileaks, tratou da conversão a “espião” dos diplomatas americanos.

Trocaram em muitos casos a diplomacia pela reles espionagem.

O que é um erro, segundo o editorial de hoje do New York Times:

The Obama administration should definitely be embarrassed by its decision to continue a Bush administration policy directing American diplomats to collect the personal data — including credit card numbers and frequent flier numbers — of foreign officials. That dangerously blurs the distinction between diplomats and spies and is best left to the spies.

Os embaixadores americanos são agora convocados a obter o número do cartão de credito e dos cartões de milhagem de funcionários estrangeiros.

“Isso é coisa para espião”, diz o New York Times e, não, para diplomata.

Pois, não é que o ministro da defesa (dos EUA) conta ao embaixador americano que o Itamaraty “tem inclinação anti-americana”, que um ministro brasileiro odeia os Estados Unidos e que o presidente da Bolívia tem um grande tumor na cabeça?

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As relações perigosas de Nelson Jobim

Reproduzo artigo de Leandro Fortes, publicado no blog "Brasília, eu vi":

Uma informação incrível, revelada graças às inconfidências do Wikileaks, circula ainda impunemente pela equipe de transição da presidente eleita Dilma Rousseff: o ministro da Defesa, Nelson Jobim, costumava almoçar com o ex-embaixador dos Estados Unidos no Brasil Clifford Sobel para falar mal da diplomacia brasileira e passar informes variados. Para agradar o interlocutor e se mostrar como aliado preferencial dentro do governo Lula, Jobim, ministro de Estado, menosprezava o Itamaraty, apresentado como cidadela antiamericana, e denunciava um colega de governo, o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, como militante antiyankee. Segundo o relato produzido por Clifford Sobel, divulgado pelo Wikileaks, Jobim disse que Guimarães “odeia os EUA” e trabalha para “criar problemas” na relação entre os dois países.

Para quem não sabe, Samuel Pinheiro Guimarães, vice-chanceler do Brasil na época em que Jobim participava de convescotes na embaixada americana em Brasília, é o atual ministro-chefe da Secretaria Assuntos Estratégicos da Presidência da República (SAE). O Ministério da Defesa e a SAE são corresponsáveis pela Estratégia Nacional de Defesa , um documento de Estado montado por Jobim e pelo antecessor de Samuel Guimarães, o advogado Mangabeira Unger – com quem, aliás, Jobim parecia se dar muito bem. Talvez porque Unger, professor em Harvard, é quase um americano, com sotaque e tudo.

Após a divulgação dos telegramas de Sobel ao Departamento de Estado dos EUA, Jobim foi obrigado a se pronunciar a respeito. Em nota oficial, admitiu que realmente “em algum momento” (qual?) conversou sobre Pinheiro com o embaixador americano, mas, na oportunidade, afirma tê-lo mencionado “com respeito”. Para Jobim, o ministro da SAE é “um nacionalista, um homem que ama profundamente o Brasil”, e que Sobel o interpretou mal. Como a chefe do Departamento de Estado dos EUA, Hillary Clinton, decretou silêncio mundial sobre o tema e iniciou uma cruzada contra o Wikileaks, é bem provável que ainda vamos demorar um bocado até ouvir a versão de Mr. Sobel sobre o verdadeiro teor das conversas com Jobim. Por ora, temos apenas a certeza, confirmada pelo ministro brasileiro, de que elas ocorreram “em algum momento”.

Mais adiante, em outro informe recolhido no WikiLeaks, descobrimos que o solícito Nelson Jobim outra vez atuou como diligente informante do embaixador Sobel para tratar da saúde de um notório desafeto dos EUA na América do Sul, o presidente da Bolívia, Evo Morales. Por meio de Jobim, o embaixador Sobel foi informado que Morales teria um “grave tumor” localizado na cabeça. Jobim soube da novidade em 15 de janeiro de 2009, durante uma reunião realizada em La Paz, onde esteve com o presidente Lula. Uma semana depois, em 22 de janeiro, Sobel telegrafava ao Departamento de Estado, em Washington, exultante com a fofoca.

No despacho, Sobel revela que Jobim foi além do simples papel de informante. Teceu, por assim dizer, considerações altamente pertinentes. Jobim revelou ao embaixador americano que Lula tinha oferecido a Morales exame e tratamento em um hospital em São Paulo. A oferta, revela Sobel no telegrama a Washington, com base nas informações de Jobim, acabou protelada porque a Bolívia passava por um “delicado momento político”, o referendo, realizado em 25 de janeiro do ano passado, que aprovou a nova Constituição do país. “O tumor poderia explicar por que Morales demonstrou estar desconcentrado nessa e em outras reuniões recentes”, avisou Jobim, segundo o amigo embaixador.

Não por outra razão, Nelson Jobim é classificado pelo embaixador Clifford Sobel como “talvez um dos mais confiáveis líderes no Brasil”. Não é difícil, à luz do Wikileaks, compreender tamanha admiração. Resta saber se, depois da divulgação desses telegramas, a presidente eleita Dilma Rousseff ainda terá argumentos para manter Jobim na pasta da Defesa, mesmo que por indicação de Lula. Há outros e piores precedentes em questão.

Jobim está no centro da farsa que derrubou o delegado Paulo Lacerda da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), acusado de grampear o ministro Gilmar Mendes, do STF. Jobim apresentou a Lula provas falsas da existência de equipamentos de escutas que teriam sido usados por Lacerda para investigar Mendes. Foi desmentido pelo Exército. Mas, incrivelmente, continuou no cargo. Em seguida, Jobim deu guarida aos comandantes das forças armadas e ameaçou renunciar ao cargo junto com eles caso o governo mantivesse no texto do Plano Nacional de Direitos Humanos a idéia (!) da instalação da Comissão da Verdade para investigar as torturas e os assassinatos durante a ditadura militar. Lula cedeu à chantagem e manteve Jobim no cargo.

Agora, Nelson Jobim, ministro da Defesa do Brasil, foi pego servindo de informante da Embaixada dos Estados Unidos. Isso depois de Lula ter consolidado, à custa de enorme esforço do Itamaraty e da diplomacia brasileira, uma imagem internacional independente e corajosa, justamente em contraponto à política anterior, formalizada no governo FHC, de absoluta subserviência aos interesses dos EUA.

Foi preciso oito anos para o país se livrar da imagem infame do ex-ministro das Relações Exteriores Celso Lafer tirando os sapatos no aeroporto de Miami, em dezembro de 2002, para ser revistado por seguranças americanos. De certa forma, os telegramas de Clifford Sobel nos deixaram, outra vez, descalços no quintal do império.

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Diplomacia dos EUA e o golpe em Honduras

Reproduzo o telegrama da Embaixada dos EUA em Tegucigalpa datado de 24 de julho de 2009. O documento "confidencial" foi revelado pela ONG Wikileaks e desmascara os defensores do golpe, inclusive na mídia brasileira:

ID:217920

Date:2009-07-24 00:23:00

Origin:09TEGUCIGALPA645

Source:Embassy Tegucigalpa

Classification:CONFIDENTIAL

Dunno:09TEGUCIGALPA578

Destination:VZCZCXYZ0000

OO RUEHWEB

DE RUEHTG #0645/01 2050023

ZNY CCCCC ZZH

O 240023Z JUL 09

FM AMEMBASSY TEGUCIGALPA

TO RUEHC/SECSTATE WASHDC IMMEDIATE 0237

INFO RUEHZA/WHA CENTRAL AMERICAN COLLECTIVE IMMEDIATE

RUEHCV/AMEMBASSY CARACAS IMMEDIATE 0735

RHEHAAA/THE WHITE HOUSE WASHDC IMMEDIATE

RUEAIIA/CIA WASHDC IMMEDIATE

RHEFDIA/DIA WASHINGTON DC IMMEDIATE

RUEIDN/DNI WASHINGTON DC IMMEDIATE

RHEHAAA/NATIONAL SECURITY COUNCIL WASHINGTON DC IMMEDIATE

RUMIAAA/USSOUTHCOM MIAMI FL IMMEDIATE

C O N F I D E N T I A L TEGUCIGALPA 000645

SIPDIS

WHA FOR A/S TOM SHANNON

L FOR HAROLD KOH AND JOAN DONOGHUE

NSC FOR DAN RESTREPO

E.O. 12958: DECL: 07/23/2019

TAGS: PGOV, KDEM, KJUS, TFH01, HO

SUBJECT: TFHO1: OPEN AND SHUT: THE CASE OF THE HONDURAN COUP

REF: TEGUCIGALPA 578

INFORMAÇÃO CONFIDENCIAL

De: Embaixador Hugo Llorens, razões 1.4 (b e d)

1. (C) RESUMO: Mensagem tentou esclarecer algumas questões legais e constitucionais que cercam a remoção forçada do presidente Manuel “Mel” Zelaya dia 28/6. A perspectiva da embaixada é de que não há dúvidas de que os militares, a Corte Suprema e o Congresso Nacional conspiraram dia 28/6, conspiração que resultou em golpe ilegal e inconstitucional contra o Executivo, ao mesmo tempo en que aceitaram sem qualquer investigação que Zelaya teria cometido ilegalidades inclusive de violação da constituição. Tampouco há qualquer dúvida, de nosso ponto de vista, de que a ascensão ao poder, de Roberto Micheletti foi ilegítima. Contudo, é também evidente que a própria constituição talvez seja deficiente, na medida em que não determina com clareza os procedimentos para lidar com atos ilegais cometidos pelo presidente nem para resolver conflitos entre os vários ramos do governo. FIM DO RESUMO.

2. (U) Desde a remoção e a expulsão do presidente Zelaya dia 28/6 pelas forças armadas, a Embaixada tem consultado advogados especialistas em Direito hondurenho (não se encontra em Honduras nenhuma opinião legal profissional que não seja enviesada, na atual atmosfera politicamente carregada) e temos revisto o texto da Constituição de Honduras e outras leis, para alcançar melhor compreensão dos argumentos apresentandos pelos apoiadores e opositores do golpe.

Argumentos dos Defensores do Golpe

3. (SBU) Os defensores do golpe de 28/6 apresentam argumentos em que se combinam alguns dos seguintes argumentos, sempre ambíguos, para comprovar a legalidade do golpe:

– Zelaya desrespeitou a lei (alegado, mas não provado);

– Zelaya renunciou (completa invenção);

– Zelaya planejava estender o próprio mandato (suposição);

– Se lhe fosse permitido continuar com o projeto de plebiscito do dia 28/6 para reformar a constituição, Zelaya teria dissolvido o Congresso no dia seguinte e convocado uma assembleia constituinte (suposição);

– Foi necessário remover Zelaya do país, para evitar um banho de sangue;

– O Congresso depôs Zelaya “por unanimidade” (umas versões falam de 123-5 votos); (depois da deposição ter sido feita clandestinamente); e

– Zelaya teria cessado “automaticamente” de ser presidente, no momento em que sugeriu modificações na proibição constitucional de reeleição do presidente.

4. (C) Do nosso ponto de vista, nenhum dos argumentos acima tem qualquer validade substantiva nos termos da Constituição de Honduras. Alguns são absolutamente mentirosos. Outros são meras suposições ou racionalização ex-post de ato patentemente ilegal. Essencialmente:

– os militares não tinham qualquer autoridade para tirar Zelaya do país;

– o Congresso não tinha autoridade constitucional para destituir presidente hondurenho;

– O Congresso e o Judiciário depuseram Zelaya em processo que durou 48 horas, por ato de agressão, ad-hoc, extralegal e secreto;

– a carta “de renúncia” é falsa e sequer foi apresentada como documento que justificasse a ação do Congresso dia 28/6; e

– A prisão e sequestro de Zelaya, levado para fora do país, viola múltiplas garantias constitucionais, inclusive a proibição de expatriação, a presunção de inocência e o direito a devido processo legal perfeito.

O tema do Impeachment, na Constituição de Honduras

5. (U) Nos termos da atual constituição escrita de Honduras, o presidente só pode ser destituído por morte, renúncia ou incapacidade. Só a Suprema Corte pode determinar que um presidente seja destituído “por incapacidade”, ou por prática de crime.

6. (U) Na Constituição de Honduras de 1982, não há qualquer previsão explícita para o procedimento de impeachment. Originalmente, o artigo 205-15 determinava que o Congresso tinha competência para determinar se havia “caso” contra o presidente, mas não estipulava qualquer regra ou mediante quais procedimentos. O artigo 319-2 determinava que a Suprema Corte “ouviria” os casos de acusação de prática de crimes comuns ou oficiais cometidos pelos servidores da alta hierarquia, depois de investigação conduzida pelo Congresso.

Isso implicava um vago processo de impeachment do Executivo envolvendo os dois outros poderes do governo, mas sem especificar critérios ou procedimentos.

Mas o artigo 205 foi suprimido em 2003, e a correspondente provisão do artigo 319 (renumerado para 313) foi revista, passando a dizer apenas que a Suprema Corte ouviria “processos abertos” conta altos funcionários. Assim sendo, parece que nos termos da atual Constituição escrita, a remoção de presidente ou de alto funcionário do governo é questão completamente judicial.

7. (U) Pareceres de respeitados especialistas confirmaram que a remoção de presidente é questão judicial. Segundo livro publicado em 2006 por respeitado professor de Direito, Enrique Flores Valeriano – pai, já falecido, do ministro Enrique Flores Lanza do governo Zelaya –, o artigo 112 da Lei da Justiça Constitucional dispõe que, se funcionário do governo for preso por violação da Constituição, o acusado deve ser imediatamente removido do cargo pela mais alta autoridade Constitucional: a Suprema Corte.

8. (U) Vários especialistas em Direito Constitucional também confirmaram para nós que o processo hondurenho para impedir um presidente ou outros altos governantes é procedimento judicial. Afirmaram que, pela lei de Honduras, o processo é iniciado por acusação formalizada pelo Advogado Geral contra o acusado, apresentada à Suprema Corte. A Suprema Corte pode aceitar ou rejeitar as acusações. Se a Corte indiciar o acusado, nomeará um magistrado ou corte de magistrados para investigar o assunto e acompanhar o julgamento.

O processo é aberto e transparente e o acusado tem pleno direito de autodefesa. Se condenado pelo Tribunal de impeachment, os magristrados têm competência para destituir o Presidente ou outro alto funcionário. Removido o presidente, segue-se o processo constitucional de seleção. Nesse caso, se o presidente é formalmente acusado e condenado, e destituído, deve ser substituído no cargo pelo vice-presidente, que será Presidente Designado. Na atual situação, em Honduras, dado que o vice-presidente Elvin Santos renunciou em dezembro passado, para poder candidatar-se à presidência pelo Partido Liberal, o sucessor do presidente Zelaya seria o presidente do Congresso Roberto Micheletti.

Infelizmente, o presidente não chegou jamais a ser processado ou condenado e não foi destituído da presidência por vias legais, que permitiriam a sucessão também em termos legais.

As acusações feitas a Zelaya

9. (C) Os opositores de Zelaya alegam que ele teria cometido várias violações da Constituição, algumas aparentemente válidas, outras não:

– Recusou-se a submeter o Orçamento ao Congresso: A Constituição ordena claramente que o Executivo submeta o Orçamento ao Congresso até 15 de setembro de cada ano

(Art. 367), que o Congresso aprove o Orçamento (Art. 366) e proíbe pagamentos e recebimentos que não sejam previstos no Orçamento aprovado (Art. 364);

– Recusou-se a prever fundos para o Congresso: O Art. 212 determina que o Terouro aporte semestralmente os fundos necessários para o funcionamento do Congresso;

– Propôs referendum constitucional ilegal: A Constituição só pode ser modificada por maioria de 2/3 dos votos, em duas sessões concecutivas (Art. 373 e 375); por nova Assembleia Constituinte, como Zelaya pretendia, seria, assim, inconstitucional. Mas ninguém afirmou com clareza que a simples proposição de Assembleia Constituinte seria, só a proposição, algum tipo de violação da Constituição, só que as mudanças resultantes dessa Assembleia não seriam válidas;

– Resistiu ao cumprimento de decisão de corte competente: Zelaya insistiu em manter a proposta de referendum para reforma constitucional, mesmo depois de uma corte de primeira instância e uma corte de apelação ordenaram-lhe que suspendesse todos os esforços naquela direção. Contudo, apesar de Zelaya ter manifestado clara intenção de realizar o referendum, de fato não o fez;

– Propôs reformas em artigos não-reformáveis: Dado que a Assembleia Constituinte que Zelaya propôs teria poderes ilimitados para reformar a Constituição, a proposta violaria o Artigo 374 (das cláusulas pétreas, não reformáveis). Também aqui, outra vez, Zelaya jamais propôs qualquer mudança nas cláusulas pétreas. De fato, apenas se pressupõe que ele teria planos de alterá-las;

– Demitiu o Chefe das Forças Armadas: Dia 25/6, a Suprema Corte decidiu que Zelaya teria violado a Constituição ao demitir o Chefe da Defesa Vasquez Velasquez. Mas a Constituição (Art. 280) diz claramente que o presidente pode livremente nomear e demitir o Chefe das Forças Armadas. Apesar disso, a Corte decidiu que, dado que Zelaya demitiu-o porque se recusou a organizar um referendo que a Corte declarara ilegal, a demissão também seria ilegal.

10. (C) Apesar de ser possível instaurar processo contra Zelaya por algumas das alegadas violações da Constituição acima listadas, jamais houve qualquer investigação nem qualquer avaliação pública de provas, nem, em nenhum caso, qualquer processo que se possa considerar como “devido processo legal”.

O ‘golpe’ do artigo 239 [orig: art. 239 Cannard]

11. (U) O artigo 239, que os apoiadores do golpe começaram a citar depois do golpe para justificar a remoção de Zelaya (mas que não aparece mencionado nenhuma vez no volumoso dossiê do processo judicial contra Zelaya), declara que qualquer funcionário que proponha reforma da Constituição no item que proíbe a reeleição do presidente deve ser imediatamente destituído de suas funções e torna-se inelegível para qualquer cargo por 10 anos. Os defensores do golpe declararam que Zelaya teria deixado automaticamente de ser presidente quando propôs a ideia de uma Assembleia Constituinte para reformar a Constituição.

12. (C) Várias análises indicam que o argumento do artigo 239 é vicioso sob vários aspectos:

– Embora muitos assumissem que o motivo pelo qual Zelaya tentava convocar uma Assembleia Constituinte seria o desejo de emendar a Constituição para que permitisse a reeleição do presidente, Zelaya jamais o declarou publicamente;

– O artigo 239 não diz quem ou como determina se houve ou não violação da Constituição, mas é razoável supor que não suspenda outras garantias de devido processo legal nem a presunção de inocência;

– O artigo 94 declara que não se aplica pena sem que o acusado seja ouvido e condenado por corte competente;

– Muitos outros funcionários de Honduras, inclusive presidentes, desde o primeiro governo eleito sob a Constituição de 1982, propuseram a legalização da reeleição do presidente, e nem por isso foram declarados automaticamente derrubados da presidência.

13. (C) Acusações posteriores mencionam que o próprio Micheletti também deveria ser forçado a renunciar, pela lógica do mesmo argumento do artigo 239, porque, como Presidente do Congresso, Micheletti encaminhava projeto de lei para que se criasse uma “quarta urna” nas eleições de novembro, na qual os eleitores se manifestariam sobre a convocação de uma Assembleia Constituinte. E todos os deputados que discutiram a proposta de Micheletti, pelo mesmo argumento, também deveriam ser forçados a renunciar, e o candidato Pepe Lobo, do Partido Nacional, que aprovava a ideia, também se tornaria inelegível por dez anos.

A deposição do presidente pelos militares foi claramente ilegal

14. (C) Independente de determinar se Zelaya violou ou não a constituição, é evidentemente claro. Qualquer leitura, por superficial que seja, comprova que a deposição do presidente por militares foi ilegal. Nem os mais aplicados defensores do golpe conseguiram construir argumentos convincentes que ultrapassassem o fosso intelectual que há, sem sombra de dúvida, entre “Zelaya descumpriu a lei” até “portanto os militares o despacharam para a Costa Rica, sem qualquer tipo de processo ou julgamento legal”.

– Por mais que os apoiadores do golpe aleguem que a Corte Suprema emitiu mandato de prisão contra Zelaya por desobediência a ordens da CS sobre o referendum, o mandato, emitido vários dias depois, autorizava a prendê-lo e apresentá-lo à autoridade competente. Nenhum mandato da Corte Suprema jamais autorizou que o presidente fosse sequestrado e enviado a país estrangeiro.

– Ainda que a CS tivesse ordenado que Zelaya fosse enviado a país estrangeiro, a ordem seria inconstitucional; o artigo 81 determina que todos os cidadãos hondurenhos têm direito de viver em território naciona, exceto em alguns poucos casos, bem claros expostos no art. 187, que podem ser invocados pelo presidente da República, com aprovação do Conselho de Ministros. E o art. 102 proíbe a expatriação de cidadão hondurenho.

– As forças armadas são absolutamente incompetentes para executar ordens judiciais. Originalmente, o art. 272 determinava que as forças amadas eram responsáveis por “manter a paz e a ordem pública e o ‘domínio’ da Constituição”, mas essa terminologia foi alterada em 1998; conforme o texto atual, só a polícia é competente pela execução de ordens judiciais (Art. 293);

– Relatos do sequestro de Zelaya pelos militares indicam que nenhum “mandato” lhe foi exibido, como a lei exige; os soldados invadiram o local onde ele estava, rebentaram cadeados e fechaduras e, de fato, sequestraram o presidente.

15. (U) O Conselheiro Jurídico das Forças Armadas Coronel Herberth Bayardo Inestroza, reconheceu em entrevista publicada na imprensa de Honduras dia 5/7, que as Forças Armadas violaram a lei ao conduzir Zelaya contra sua vontade, para fora do país. Na mesma data, houve notícias de que o Ministéri Público abrira inqueérito para investigar as ações das Forças Armadas na prisão e deportação de Zelaya dia 28/6 e que a Suprema Corte convocara as Forças Armadas para que esclarecessem as circunstâncias sob as quais se dera seu exílio forçado.

16. (C) Como reportado reftel [noutro telegrama], o conselheiro legal da Suprema Corte contou a Poloff que pelo menos alguns magistrados da Corte entendiam que a prisão e deportação de Zelaya pelos militares fora ato ilegal.

O Congresso não tinha autoridade para remover Zelaya

17. (C) Como já se explicou acima, a Constituição, depois da emenda de 2003, aparentemente daria autoridade ao Judiciário para remover presidentes. A ação do Congresso, dia 28/6, foi noticiada em alguns jornais e televisões como gesto de aceitação da renúncia de Zelaya, baseada em carta falsificada, datada de 25/6, que só apareceu depois do golpe. Contudo, a decisão do Congresso, do dia 28/6, não declara que o Congresso aceitaria a renúncia de Zelaya. Diz que o Congresso “desaprova” a conduta de Zelaya e “separa” Zelaya e o gabinete da Presidência – decisão que o autoridade o Congresso não tem. Além disso, fonte na liderança do Congresso contou-nos que não havia quórum na sessão que aprovou aquela resolução – o que invalida a Resolução. Não há votação registrada, nem gravada, nem a chamada oficial para que os deputados votem “sim” ou “não”.

18. (C) Em resumo, para que a substituição de Zelaya por Micheletti acontecesse, teria de acontecer alguma de várias exigências:

Zelaya renuncia, ou morre ou sofre incapacitação médica permanente (a ser determinada por autoridades médicas e judiciaia), ou, como já discutimos, é formalmente julgado, condenado e destituído da presidência. Não se dando nenhum desses casos, e dado que o Congresso não tinha autoridade legal para remover o presidente, as ações de 28/6 têm de ser descritas como golpe de Estado pelos deputados, com apoio das autoridades do Poder Judiciário e dos militares, contra o Executivo.

Vale mencionar que, apesar de a Resolução aprovada pelo Congresso dia 28/6 aplicar-se só a Zelaya, foi utilizada para derrubar todo o poder Executivo. São ações que claramente extrapolam a autoridade legal do Congresso.

Comentário

19. (C) A análise da Constituição lança interessante luz sobre os eventos de 28/6. O establishment hondurenho enfrentava um dilema: praticamente todos, a unanimidade de todas as instituições do Estado e os políticos entendiam que Zelaya extrapolara seus poderes e violara a Constituição. Mas não tinham opinião formada sobre como proceder. Ante a dificulgade, os militares e/ou quem tenha ordenado o golpe, a partir das informações que tinha, – o modo tradicional como se derrubam presidentes em Honduras: falsa carta de renúncia e passagem de ida sem volta para algum país vizinho.

De qualquer modo, sejam quais forem os argumentos que haja contra Zelaya, a remoção do presidente pelos militares foi claramente ilegal e a posse de Micheletti como “presidente interino” foi totalmente ilegítima.

20. (C) Tudo isso considerado, vê-se que a própria incerteza constitucional que pôs a classe política ante aquele dilema ofereceu a via para solucioná-lo. Os mais ardentes defensores do golpe não conseguiram produzir argumentos sólidos nem qualquer tipo de prova dos supostos crimes de Zelaya e que justificassem arrancá-lo da cama à noite e enviá-lo por avião para a Costa Rica.

É estimulante que, hoje, o Gabinete do Procurador Geral e a Corte Suprema estejam questionando a legalidade desse passo final. Daí pode advir alguma ideia que salve a imagem dos dois lados, que ainda estão presos no mesmo impasse. Fim do Comentário. LLORENS

Tradução: Coletivo de Tradutores Vila Vudu

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WikiLeaks e a face suja dos EUA

Reproduzo matéria publicada no sítio Vermelho:

Com a revelação de mais de 250 mil novos documentos sobre as atividades de espionagem dos Estados Unidos em todo o planeta neste domingo (28), o site WikiLeaks mostra a face verdadeira da diplomacia estadunidense, que trabalha com o objetivo de prolongar o domínio imperial sobre o planeta.

Os 250 mil documentos foram divulgados por vários jornais internacionais e mostraram que os Estados Unidos espionaram dezenas de nações, fizeram planos de mudança de governo e ataques contra nações soberanas e também espionaram o secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU).

Os documentos contêm informações e avaliações levantadas por centenas de diplomatas americanos sobre temas chave da política externa dos EUA, como as ocupações do Afeganistão e do Iraque, o Irã e o Paquistão. Além disso, estão incluídas nos documentos avaliações sobre negociações bilaterais, conversas privadas e conclusões sobre líderes de vários países do mundo.

Uma das situações mais presentes nos documentos é a pressão que os Estados Unidos têm feito contra o Irã. Tony Blair, ex-premiê do Reino Unido, defende o uso da força militar contra o país do Oriente Médio, enquanto a monarquia saudita pede aos diplomatas-espiões dos EUA "que se corte a cabeça da cobra", em alusão ao presidente do Irã, Mahmud Ahmadinejad.

Apesar de espionar também os líderes aliados, o papel da diplomacia-espiã dos Estados Unidos já foi cantado antes por dirigentes como Fidel Castro, que alertou há meses a existência de planos militares dos EUA para derrubar o governo iraniano e destruir suas centrais de energia nuclear.

Fidel Castro há meses vem alertando o mundo sobre o risco de uma conflagração nuclear desatada pelos Estados Unidos, que agora veio à tona com os documentos sobre ataques ao Irã. Outro objetivo, já denunciado antes, é derrubar o presidente da Venezuela, Hugo Chávez.

A base de dados a que o jornal britânico The Guardian teve acesso revela a atividade de espionagem exercida pelas embaixadas dos Estados Unidos na Bósnia, Bulgária, Croácia, Macedônia e Turquia, em busca de informação que possa ser utilizada em chantagens contra esses países, alguns deles aliados dos Estados Unidos na Europa Oriental.

Armênia, Azerbaijão e Geórgia também aparecem nos documentos vazados, além também de Rússia, China e República Popular Democrática da Coreia (RPDC). Índia, Afeganistão, Paquistão, países árabes e africanos, assim como Honduras, Colômbia, Paraguai, Brasil e Venezuela, na América Latina, foram também objetos de ampla espionagem por parte dos Estados Unidos.

Ban Ki-moon espionado

Os documentos revelados no domingo incluem um pedido da secretária de Estado americana, Hillary Clinton, para que seus diplomatas descubram detalhes técnicos sobre a comunicação entre funcionários da ONU, o que incluiria o secretário-geral Ban Ki-moon.

O porta-voz das Nações Unidas, Farhan Haq, evitou falar especificamente sobre os documentos, mas lembrou que a ONU deve ser tratada como uma organização inviolável.

"A ONU não está em posição de comentar a autenticidade do documento que tem por objetivo reunir informações sobre funcionários da ONU e suas atividades", afirmou.

Israel não tem vergonha

O premiê de Israel, Benjamin Netanyahu, afirmou para a mídia internacional que os documentos mostram "apenas" que seu país estava "cuidando" da situação de tensão com o Irã. Segundo os documentos, o serviço secreto israelense, o Mossad, trocou informações com os arapongas americanos para executar um plano militar contra o Irã.

Outro envolvido na questão contra o Irã é o rei Abdullah, da Arábia Saudita, que pediu reiteradamente a Washington que atacasse o Irã para destruir seu programa nuclear. O rei saudita afirma textualmente que é necessário "cortar a cabeça da cobra", em alusão ao presidente do Irã.

O governo americano também capturou ilicitamente dados biográficos e biométricos, inclusive do DNA, de candidatos à presidência do Paraguai. Um dos documentos vazados dava ordens aos diplomatas no Paraguai para que fizessem perfis das posições políticas de cada candidato.

Em relação à China, os espiões americanos foram instruídos a recolher informações sobre a segurança cibernética do país, a situação da Região Autônoma do Tibete e de Xinjiang, objeto de atos de terrorismo nos anos de 2008 e 2009.

WikiLeaks prova golpe

Manuel Zelaya, presidente hondurenho deposto em um golpe no ano de 2009, falou sobre a cumplicidade americana no golpe que o tirou do governo em julho de 2009, após verificar os documentos sobre o seu país.

"Fica clara a cumplicidade dos EUA ao conhecer previamente o planejamento e a execução do golpe de Estado e mesmo assim fazer silêncio", diz Zelaya em nota enviada da República Dominicana.

Hillary irada

A secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton, considerou o vazamento das informações como "não só um ataque à diplomacia dos Estados Unidos, mas à comunidade internacional".

Hillary é hoje a chefe da diplomacia americana e, na entrevista coletiva, evidentemente não fez nenhuma censura à espionagem diplomática cometida sob os auspícios de George W. Bush e do atual presidente, Barack Obama. Hillary quer que o assunto seja visto como um ataque às "alianças e negociações em busca da paz e da segurança mundial que estão andamento em nível internacional".

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segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Todos os dias o povo come veneno

Reproduzo artigo de João Pedro Stedile, integrante da coordenação nacional do MST, publicado no sítio da Adital:

O Brasil se transformou desde 2007, no maior consumidor mundial de venenos agrícolas. E na ultima safra as empresas produtoras venderam nada menos do que um bilhão de litros de venenos agrícolas. Isso representa uma media anual de 6 litros por pessoa ou 150 litros por hectare cultivado. Uma vergonha. Um indicador incomparável com a situação de nenhum outro país ou agricultura.

Há um oligopólio de produção por parte de algumas empresas transnacionais que controlam toda a produção e estimulam seu uso, como a Bayer, a Basf, Syngenta, Monsanto, Du Pont, Shell química etc.

O Brasil possui a terceira maior frota mundial de aviões de pulverização agrícola. Somente esse ano foram treinados 716 novos pilotos. E a pulverização aérea é a mais contaminadora e comprometedora para toda a população.

Há diversos produtos sendo usados no Brasil que já estão proibidos nos países de suas matrizes. A ANVISA conseguiu proibir o uso de um determinado veneno agrícola. Mas as empresas ganharam uma liminar no "neutral poder judiciário" brasileiro, que autorizou a retirada durante o prazo de três anos... e quem será o responsável pelas conseqüências do uso durante esses três anos? Na minha opinião é esse Juiz irresponsável que autorizou na verdade as empresas desovarem seus estoques.

Os fazendeiros do agronegócio usam e abusam dos venenos, como única forma que tem de manter sua matriz na base do monocultivo e sem usar mão-de-obra. Um dos venenos mais usados é o secante, que é aplicado no final da safra para matar as próprias plantas e assim eles podem colher com as maquinas num mesmo período. Pois bem esse veneno secante vai para atmosfera e depois retorna com a chuva, democraticamente atingindo toda população inclusive das cidades vizinhas.

O Dr. Vanderley Pignati da Universidade Federal do Mato Grosso tem várias pesquisas comprovando o aumento de aborto e outras conseqüências na população que vive no ambiente dominado pelos venenos da soja.

Diversos pesquisadores do Instituto Nacional do Câncer e da Universidade federal do Ceara já comprovaram o aumento do câncer, na população brasileira, conseqüência do aumento do uso de agrotóxicos.

A ANVISA - responsável pela vigilância sanitária de nosso país -, detectou e destruiu mais de 500 mil litros de venenos adulterados, somente esse ano, produzido por grandes empresas transnacionais. Ou seja, alem de aumentar o uso do veneno, eles falsificavam a fórmula autorizada, para deixar o veneno mais potente, e assim o agricultor se iludir ainda mais.

O Dr. Nascimento Sakano, consultor de saúde, da insuspeita revista Caras, escreveu em sua coluna que ocorrem anualmente ao redor de 20 mil casos de câncer de estomago no Brasil, a maioria conseqüente dos alimentos contaminados, e destes 12 mil vão a óbito.

Tudo isso vem acontecendo todos os dias. E ninguém diz nada. Talvez pelo conluio que existe das grandes empresas com o monopólio dos meios de comunicação. Ao contrário, a propaganda sistemática das empresas fabricantes que tem lucros astronômicos é de que, é impossível produzir sem venenos. Uma grande mentira.

A humanidade se reproduziu ao longo de 10 milhões de anos sem usar venenos. Estamos usando veneno, apenas depois da segunda guerra mundial para cá, como uma adequação das fabricas de bombas químicas agora, para matar os vegetais e animais. Assim, o poder da Monsanto começou fabricando o Napalm e o agente laranja, usado largamente no Vietnam. E agora suas fabricas produzem o glifosato, que mata ervas, pequenos animais, contamina as águas e vai parar no seu estômago.

Esperamos que na próxima legislatura, com parlamentares mais progressistas e com novo governo, nos estados e a nível federal, consigamos pressão social suficiente, para proibir certos venenos, proibir o uso de aviação agrícola, proibir qualquer propaganda de veneno e responsabilizar as empresas por todas as conseqüências no meio ambiente e na saúde da população.

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Os donos da mídia estão nervosos

Reproduzo artigo de Laurindo Lalo Leal Filho, publicado no sítio Carta Maior:

O blogueiro Renato Rovai contou durante o curso anual do Núcleo Piratininga de Comunicação, realizado semana passada no Rio, que a Veja andou atrás dele querendo saber como foi feita a articulação para que o presidente Lula concedesse uma entrevista a blogs de diferentes pontos do Brasil. Estão preocupadíssimos.

À essa informação somam-se as matérias dos jornalões e de algumas emissoras de TV sobre a coletiva, sempre distorcidas, tentando ridicularizar entrevistado e entrevistadores.

O SBT chegou a realizar uma edição cuidadosa daquele encontro destacando as questões menos relevantes da conversa para culminar com um encerramento digno de se tornar exemplo de mau jornalismo.

Ao ressaltar o problema da inexistência de leis no Brasil que garantam o direito de resposta, tratado na entrevista, o jornal do SBT fechou a matéria dizendo que qualquer um que se sinta prejudicado pela mídia tem amplos caminhos legais para contestação (em outras palavras). Com o que nem o ministro Ayres Brito, do Supremo, ídolo da grande mídia, concorda.

Jornalões e televisões ficaram nervosos ao perceberem que eles não são mais o único canal existente de contato entre os governantes e a sociedade.

Às conquistas do governo Lula soma-se mais essa, importante e pouco percebida. E é ela que permite entender melhor o apoio inédito dado ao atual governo e, também, a vitória da candidata Dilma Roussef.

Lula, como presidente da República, teve a percepção nítida de que se fosse contar apenas com a mídia tradicional para se dirigir à sociedade estaria perdido. A experiência de muitos anos de contato com esses meios, como líder sindical e depois político, deu a ele a possibilidade de entendê-los com muita clareza.

Essa percepção é que explica o contato pessoal, quase diário, do presidente com públicos das mais diferentes camadas sociais, dispensando intermediários.

Colunistas o criticavam dizendo que ele deveria viajar menos e dar mais expediente no palácio. Mas ele sabia muito bem o que estava fazendo. Se não fizesse dessa forma corria o risco de não chegar ao fim do mandato.

Mas uma coisa era o presidente ter consciência de sua alta capacidade de comunicador e outra, quase heróica, era não ter preguiça de colocá-la em prática a toda hora em qualquer canto do pais e mesmo do mundo.

Confesso que me preocupei com sua saúde em alguns momentos do mandato. Especialmente naquela semana em que ele saía do sul do país, participava de evento no Recife e de lá rumava para a Suíça. Não me surpreendi quando a pressão arterial subiu, afinal não era para menos. Mas foi essa disposição para o trabalho que virou o jogo.

Um trabalho que poderia ter sido mais ameno se houvesse uma mídia menos partidarizada e mais diversificada. Sem ela o presidente foi para o sacrifício.

Pesquisadores nas áreas de história e comunicação já tem um excelente campo de estudos daqui para frente. Comparar, por exemplo, a cobertura jornalística do governo Lula com suas realizações. O descompasso será enorme.

As inúmeras conquistas alcançadas ficariam escondidas se o presidente não fosse às ruas, às praças, às conferências setoriais de nível nacional, aos congressos e reuniões de trabalhadores para contar de viva voz e cara-a-cara o que o seu governo vinha fazendo. A NBR, televisão do governo federal, tem tudo gravado. É um excelente acervo para futuras pesquisas.

Curioso lembrar as várias teses publicadas sobre a sociedade mediatizada, onde se tenta demonstrar como os meios de comunicação estabelecem os limites do espaço público e fazem a intermediação entre governos e sociedade.

Pois não é que o governo Lula rompeu até mesmo com essas teorias. Passou por cima dos meios, transmitiu diretamente suas mensagens e deixou nervosos os empresários da comunicação e os seus fiéis funcionários, abalados com a perda do monopólio da transmissão de mensagens.

Está dada, ao final deste governo, mais uma lição. Governos populares não podem ficar sujeitos ao filtro ideológico da mídia para se relacionarem com a sociedade.

Mas também não pode depender apenas de comunicadores excepcionais como é caso do presidente Lula. Se outros surgirem ótimo. Mas uma sociedade democrática não pode ficar contando com o acaso.

Daí a importância dos blogueiros, dos jornais regionais, das emissoras comunitárias e de uma futura legislação da mídia que garanta espaços para vozes divergentes do pensamento único atual.

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Aécio, Anastasia e o desvio de R$ 4,3 bi

Reproduzo artigo de Fabricio Menezes, publicado no sítio da Associação dos Jornalistas do Serviço Público (Ajosp) em setembro último:

Sob a grave acusação de desvio de R$ 4,3 bilhões do orçamento do Estado de Minas Gerais e que deveriam ser aplicados na saúde pública, a administração Aécio Neves/Antônio Anastasia (PSDB) – respectivamente ex e atual governador mineiro – terá que explicar à Justiça Estadual qual o destino da bilionária quantia que supostamente teria sido investida em saneamento básico pela Copasa entre 2003 a 2009.

Devido à grandeza do rombo e às investigações realizadas pelo Ministério Público Estadual (MPE) desde 2007, por meio das Promotorias Especializadas de Defesa da Saúde e do Patrimônio Público, o escândalo saiu do silêncio imposto à mídia mineira e recentemente foi divulgado até por um jornal de âmbito nacional.

Se prevalecer na Justiça o conjunto de irregularidades constatadas pelo MPE na Ação Civil Pública que tramita na 5ª Vara da Fazenda Pública Estadual sob o número 0904382-53.2010 e a denúncia na ação individual contra os responsáveis pelo rombo contra a saúde pública, tanto o ex-governador Aécio Neves, quanto o candidato tucano Antônio Anastasia, o presidente da Copasa, Ricardo Simões, e a contadora geral do Estado poderão ser condenados por improbidade administrativa.

Dos R$ 4,3 bilhões desviados, R$ 3,3 bilhões constam da ação do MPE, que são recursos supostamente transferidos pelo governo estadual (maior acionista da Copasa) para investimento em saneamento básico, na rubrica saúde, conforme determina a lei, entre 2003 e 2008. Como a Justiça negou a liminar solicitada pela promotoria no ano passado, para que fossem interrompidas as supostas transferências, a sangria no orçamento do Estado não foi estancada.

De acordo com demonstrativos oficiais da Secretaria de Estado da Fazenda, somente em 2009 a Copasa recebeu mais de R$ 1,017 bilhões do governo Aécio/Anastasia para serem aplicados em ações e serviços públicos de saúde para cumprimento da Emenda Constitucional nº 29/2000, à qual os estados e municípios estão submetidos, devendo cumpri-la em suas mínimas determinações, como, por exemplo, a aplicação de 12% do orçamento em saúde pública (a partir de 2004), considerada a sua gratuidade e universalidade. Em 2003 a determinação era que se aplicasse o mínimo de10% da arrecadação.

Da mesma forma que não se sabe o destino dos R$ 3,3 bilhões questionados pelo MPE, também não se sabe onde foi parar esses R$ 1,017 supostamente transferidos para a Copasa em 2009.

O cerco do MPE às prestações de contas do governo estadual iniciou-se em 2007, quando os promotores Josely Ramos Ponte, Eduardo Nepomuceno de Sousa e João Medeiros Silva Neto ficaram alertas com os questionamentos e recomendações apresentadas nos relatórios técnicos da Comissão de Acompanhamento da Execução Orçamentária (CAEO), órgão do Tribunal de Contas do Estado (TCE), desde a primeira prestação de contas do governo Aécio. Chamou-lhes a atenção, também, o crescimento, ano a ano, a partir de 2003, das transferências de recursos à Copasa para aplicação em saneamento e esgotamento sanitário.

Os promotores Josely Ramos, Eduardo Nepomuceno e João Medeiros querem que a administração do governo de Minas e da Copasa, conduzida na gestão Aécio Neves/Anastasia, devolva ao Fundo Estadual de Saúde os R$ 3,3 bilhões que é objeto da Ação Civil Pública que tramita na 5ª Vara da Fazenda Pública Estadual e que segundo eles podem ter sido desviados da saúde pública.

No pedido de liminar na ação, os promotores já antecipavam e solicitavam à Justiça que “seja julgado procedente o pedido, com lastro preferencial na metodologia dos cálculos apresentados pelo Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais, para condenar os réus, solidariamente ou não, à devolução de todos os valores transferidos à COPASA do orçamento vinculado às ações e serviços de saúde que não foram utilizados em saneamento básico entre os anos de 2003 e 2008, totalizando R$ 3.387.063.363,00 (três bilhões, trezentos e oitenta e sete milhões, sessenta e três mil e trezentos e sessenta e três reais), a serem depositados no Fundo Estadual de Saúde.”

Como o MPE encurralou o governo e Copasa

Para encurralar o governo do Estado e a Copasa, o MPE se valeu de sua autonomia investigativa e requereu às duas instituições as provas que pudessem revelar como foram aplicados os recursos públicos constantes das prestações de contas do Executivo e nos demonstrativos financeiros da empresa.

O que os promotores constataram foi outra coisa ao analisarem os pareceres das auditorias externas realizadas durante esse período: “Além disto, as empresas que realizaram auditoria externa na COPASA, durante o período de 2002 a 2008, não detectaram nos demonstrativos financeiros da empresa os recursos públicos que deveriam ser destinados a ações e serviços da saúde.”

As discrepâncias contidas nas prestações de contas do Estado levaram os promotores a consultar a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), à qual a Copasa deve apresentar seus demonstrativos financeiros e balanços anuais.

Em sua resposta à consulta, a CVM respondeu ao Ministério Público Ofício que “após análise de toda a documentação, não foram encontrados evidências da transferência de recursos da saúde pública para investimentos da COPASA, nos termos da Lei Orçamentária do Estado de Minas Gerais e na respectiva prestação de contas do Estado de Minas Gerais, conforme mencionado na consulta realizada por esta Promotoria de Justiça”.

Na página 26 das 30 que compõem a ação, os promotores afirmam o seguinte sobre a ausência das autoridades convocadas para prestar esclarecimentos sobre o assunto:

“Ressalte-se que a COPASA recusou-se a prestar informações ao Ministério Público sobre os fatos aqui explicitados. Notificado a comparecer na Promotoria de Justiça de Defesa da Saúde, seu Presidente apresentou justificativa na data marcada e não compareceu.A Contadora Geral do Estado também notificada a prestar esclarecimentos, na condição de técnica que assina a Prestação de Contas, também apresentou justificativa pífia e não compareceu na data marcada. Finalmente, a Auditora Geral do Estado, que também assina as Prestações de Contas do Estado, que poderia e até deveria colaborar com a investigação, arvorou-se da condição de servidora com status de Secretário de Estado, por força de dispositivo não aplicável à espécie, contido em lei delegada estadual (sic) e não apresentou qualquer esclarecimento ao Ministério Público.”

Dois governadores foram presos este ano no país

No início do mês o Brasil foi surpreendido com prisão do governador do Amapá, Pedro Paulo Dias (PP), candidato à reeleição, e de seu antecessor – de quem Dias era vice até abril – Waldez Góes (PDT), candidato ao Senado. Detidos em decorrência da Operação Mãos Limpas, desencadeada pela Polícia Federal, Dias e Góes foram presos em 10 de setembro juntamente com outras 16 autoridades, todos acusados de corrupção e desvio de recursos públicos. As informações preliminares apontam para um montante de R$ 300 milhões, desviados das áreas de educação, saúde, assistência social, entre outras.

Esta, porém, não foi a primeira vez que um governador é preso no país, após a redemocratização, em 1985. No início do ano, em fevereiro de 2010, o caso que ficou conhecido como “mensalão do DEM”, uma operação orquestrada no governo do Distrito Federal há 10 anos, culminou na prisão do então ocupante do cargo, José Roberto Arruda (DEM). Seu vice, Paulo Otávio, renunciou ao cargo, e a Câmara Distrital escolheu um dos deputados para concluir o mandato.

Fonte: Portal Minaslivre.com.br

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A regulação da mídia nos EUA

Reproduzo artigo de Luis Nassif, publicado em seu blog:

No Seminário Internacional de Mídia – que ocorreu nos dias 9 a 10 em Brasília –, visando colher subsídios para uma regulação do setor, uma das palestras mais instrutivas foi de Susan Ness, que participou da Federal Communication Comission (FCC), o órgão regulador do mercado norte-americano.

Segundo a tradição norte-americana, há uma ênfase em princípios gerais, em vez de detalhamento excessivo. Esses princípios – que norteiam a ação do FCC (o órgão regulador) são: investimento privado, competição, serviços universais e regionalismo. Além disso, tentou permanecer tecnologicamente neutra.

Emissoras de TV aberta nada pagam ao governo por seus canais de 6Mhz, mas têm que cumprir exigências. Há limites à propriedade, obrigatoriedade de três horas semanais de programação educativa para crianças, programação de produtores independentes.

As empresas de cabo precisam incluir emissoras locais, reservar canais para o governo e disponibilizar canais para serem alugados para fornecedores independentes e programação de minorias.

Um dos pontos centrais da regulação é o estímulo à competição. Como explicou Susan, "as políticas da FCC são dirigidas para facilitar a competição, em benefício dos consumidores, para ampliar as oportunidades de escolha e baixar os preços". Hoje em dia os setores de telefonia, de televisão a cabo ou por satélite são ferozmente competitivos, cada um deles oferecendo três tipos de serviço: voz, data e vídeo.

Poder político

No caso da infraestrutura, o governo reconhece a necessidade de estimular os investimentos privados. Para tanto foram alocados recursos públicos para permitir a universalização da banda larga.

Explica Susan que "o atual Plano de Banda Larga da FCC tem como objetivo garantir para todas as comunidades o acesso local a notícias e informação na medida em que o mercado se transforma das mídias tradicionais para as novas".

Um dos desafios norte-americanos é a carência de espectro de frequência para tanta tecnologia nova. Nos últimos três anos, algumas redes de dados sem fio experimentaram aumentos de até 5 mil porcento no tráfego móvel, especialmente pelo hábito de baixar vídeos.

O que a FCC tem feito é defender o uso flexível do espectro, sem donos fixos, permitindo às partes de ajustarem. Em junho passado, o presidente Barack Obama conclamou FCC e congresso a realocarem 500 MHz de espectro para permitir a universalização da banda larga.

A FCC está recorrendo a duas iniciativas. Se possível, gostaria que as emissoras devolvessem voluntariamente parte de seu espectro através de leilões de incentivo. O espectro seria leiloado e as emissoras receberiam parte da renda.

Outra iniciativa foi a liberação de canais de TV vagos para aplicações não licenciadas, como o Super Wi-Fi.

Um dos pontos centrais é a regulamentação do conteúdo. O governo norte-americano não controla conteúdo nem na broadcast, cabo ou satélite. No caso da radiodifusão, a exceção é para conteúdos obscenos, visando proteger as crianças.

Qual o problema maior? O poder político da velha mídia. Nas últimas campanhas, foi gasto mais dinheiro na radiodifusão tradicional e a cabo do que em todas as eleições anteriores. Constata a pesquisadora: "Embora a nova mídia esteja transformando o mercado, a mídia tradicional ainda é bastante poderosa".

A FCC – 1

A FCC foi criada pela Lei da Comunicação de 1934. Com o tempo, o Congresso passou à FCC a incumbência de regular televisão aberta e a cabo, telefonia sem fio, telefonia e satélites, bem como para distribuir freqüências eletromagnéticas e distribuir licenças para não governamentais. Hoje regulam televisão com sinal aberto, cabo, telefonia móvel e fixa.

A FCC – 2

A FCC possui cinco comissários, nomeados pelo presidente e confirmados pelo Senado para um mandato de cinco anos. No máximo, pode-se ter três comissários filiados a um mesmo partido. As decisões são tomadas por maioria simples – com o voto do presidente sendo igual ao de outro conselheiro. A FCC é independente e não faz parte da administração do Presidente. A voz do Executivo é a NTIA.

A NTIA

A NTIA (Administração Nacional de Telecomunicação e Informação) é a voz da Administração Federal no setor. Pertence ao Departamento de Comércio. Ela pode comentar decisões da FCC. Também legislam sobre o setor o Departamento de Justiça e a Comissão Federal de Comércio, incumbidos de zelar pela lei antitruste. Qualquer proposta de fusão passa por ambos os órgãos. A FCC precisa prestar contas periódicas ao Congresso.

O Judiciário

Todas as medidas desses órgãos podem ser apreciadas pelo Judiciário. Essa possibilidade cria disputas que levam anos para serem resolvidas, gerando incerteza no mercado. Segundo Susan, durante três anos essas disputas jurídicas impediram o FCC de estimular a competição nos mercados locais. E acaba gerando desequilíbrio, porque atores menos poderosos não têm condições de enfrentar causas custosas conntra grupos poderosos.

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Cresce a concentração nas telecomunicações

Reproduzo artigo de Jacson Segundo, publicado no Observatório do Direito à Comunicação:

Em compasso com o que ocorre no resto do mundo, o mercado de telecomunicações no Brasil está cada vez mais oligopolizado. Movimentos recentes das empresas do setor comprovam a tendência. Este ano a Portugal Telecom (PT), de Portugal, comprou parte da Oi. Em contrapartida, a PT vendeu sua participação na Vivo para a Telefônica.

A transação foi anunciada pela Portugal Telecom em 28 de julho deste ano. A empresa afirmou que pretende adquirir até 22,4% das ações da Oi - a um custo de cerca de R$ 8 bilhões -, o que a deixaria na posição de maior acionista da Oi. A PT tem metade de suas receitas no mercado internacional, basicamente nos países de língua portuguesa.

O presidente da Oi, Luiz Eduardo Falco, acredita que a união entre as operadoras vai gerar ganhos para ambas. Ele prevê, por exemplo, a possibilidade de compras conjuntas de equipamentos de rede.

Essa operação foi condição para que a a PT vendesse sua parte na Vivo à Telefônica. Ao assumir o controle da Vivo, a Telefónica passa a ser a maior empresa de telecomunicações do país, tanto em receita quanto em número de assinantes. Segundo reportagem da revista CartaCapital, o faturamento da empresa espanhola deve ser da ordem de R$ 32 bilhões anuais, ante R$ 29,9 bilhões da Oi/Portugal Telecom. A nova companhia ainda terá 68,4 milhões de clientes, ante 62,3 milhões da “supertele”, agora luso-brasileira.

No entanto, o impacto desse tipo de acordo comercial no mercado dificilmente é motivo para desfazer uma operação. A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), por exemplo, emitiu em 29 de outubro deste ano sua anuência para entrada da Portugal Telecom no bloco de controle da Oi. O Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) ainda não emitiu parecer sobre o assunto.

Falta controle

A permissão que a Anatel vem dando a esses processos de mudanças societárias é outro porém. O Tribunal de Contas da União (TCU) tem questionado os acordos feitos entre a Anatel e as concessionárias. Neste último caso, envolvendo PT e Oi, o TCU avaliou que as condicionantes impostas pela agência não avaliaram corretamente os impactos anticoncorrenciais que a fusão deve gerar.

O parecer do TCU sobre a fusão da Brasil Telecom com a Oi também criticou a atuação da Anatel. O Tribunal afirmou que as condicionantes feitas pela agência reguladora foram todas sugeridas pela própria beneficiada. Além disso, parte delas eram obrigações legais ou regulamentares já existentes, demonstrando falta de um controle mais rígido por parte do órgão regulador.

“O capitalismo hoje é global e, se o países fazem esforços enormes para atraírem capital estrangeiro, a essas agências cabe mais é referendar esses movimentos, consumando fatos já criados”, comenta o professor da Unisinos Valério Brittos.

Dessa forma, as fusões seguem acontecendo sem entraves e imposição de condicionantes mais agressivas por parte do poder público. “A competição entre operadoras é vista na Anatel como um inconveniente maior, capaz de colocar em risco o objetivo principal. Sendo assim, todo o resto é acessório, inclusive o direito que todo o cidadão tem ao acesso aos serviços de telecomunicações. Para verificar na prática o que estou dizendo, basta ir a São Sebastião, periferia de Brasília, para constatar que a 15 KM da Anatel e do Ministério das Comunicações nenhuma empresa oferece banda larga”, critica o presidente da Federação Interestadual dos Trabalhadores em Telecomunicações (Fittel), Brígido Ramos.

Depois da movimentação entre PT e Oi, Telefônica e Vivo, se cogita outra grande fusão. Segundo o jornal O Estado de S. Paulo existe um processo de unificação entre três gigantes ligadas ao grupo América Movilles, do mexicano Carlos Slim: a operadora de celular Claro, a operadora de telefonia fixa Embratel e a Net, que oferece TV paga e banda larga. No entanto, esse negócio ainda não foi oficializado.

Assim como em outros setores da economia, a oligopolização das telecomunicações pode trazer grandes prejuízos aos cidadãos. Não é à toa que a falta de concorrência é apontada por especialistas como um fator determinante para termos serviços de telefonia e internet entre os piores do mundo. E por isso também que um dos eixos do Programa Nacional de Banda Larga é o estímulo à concorrência.

O presidente da Fittel até acredita que a fusão entre Oi e PT pode gerar certos barateamentos de serviços, advindos dos ganhos de escala que serão gerados. “Mas a questão não é essa. O fato é que os brasileiros pagam muito mais por um serviço do que a maioria dos habitantes do planeta. Pesquisa da UIT/ONU feita no ano passado revela que o país é o 114º colocado entre 150, no que diz respeito ao comprometimento da renda com serviços de telecomunicações”, avalia Brígido Ramos.

Internacionalização

Outro risco previsto na operação da Oi é de sua desnacionalização. Apesar de o presidente Lula ter afirmado que a empresa continuará “brasileira da silva”, a transferência do controle da Oi não parece ser apenas uma alteração societária. Ela também pode significar mudanças de atuação no mercado, já que a PT pretende ter força nas definições estratégicas da Oi. “Não estamos investindo para ser mais um minoritário”, disse o presidente executivo da PT, Zeinal Bava, em teleconferência com analistas.

De certa forma, fica no ar um suposta contradição com o discurso anterior do governo no momento da fusão da Brasil Telecom com a Oi (BrOi), em que pretendia-se criar uma “supertele” nacional para competir com as operadoras internacionais. Agora, enquanto o Cade ainda nem emitiu um parecer favorável a essa transação da BrOi, ele próprio terá que se debruçar sobre outra mudança societária na Oi, envolvendo um grupo estrangeiro.

“Além de contraditório, o discurso do governo foi enganoso. Não sei se foi ato premeditado da parte do governo, com o intuito de desmobilizar a sociedade organizada e os trabalhadores da Brasil Telecom, mas o fato é que o discurso nacionalista não foi sincero, foi propaganda”, opina Brígido Ramos.

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Os efeitos de Lula na blogosfera

Reproduzo artigo de Carlos Castilho, publicado no Observatório da Imprensa:

Caso o presidente Lula leve adiante a sua idéia de ingressar na blogosfera logo depois de passar o governo em janeiro, esta decisão representará a transformação da internet brasileira numa nova arena partidária, com muitas chances de ofuscar os debates parlamentares e reduzir ainda mais o papel da imprensa na mediação com o público.

A entrevista de Lula a blogueiros, no dia 25 de novembro, pode ser vista como o primeiro passo concreto nesta direção, marcando um novo espaço político onde o presidente vai interagir diretamente com os internautas, passando ao largo do seu próprio partido. Pode ser o que um amigo definiu como “Lula em estado puro”, sem o protocolo presidencial e sem os entraves institucionais.

Caso ele aprenda a manejar os segredos de um blog e do twitter, o presidente poderá voltar ao estilo conversa em “porta de fábrica” que lhe trouxe tanta popularidade. Só que agora usando o espaço cibernético, cujo alcance é muitíssimo maior do que o megafone dos seus tempos de sindicato.

Se Lula inaugurou um novo estilo de governar durante os seus oito anos de presidente, ele agora pode promover mais uma inovação, ao criar um novo modelo de fazer política, sem a mediação da imprensa e dos partidos políticos. O contexto lhe é muito favorável já que vai sair do Planalto com a popularidade em alta e, mesmo fora do governo, tudo o que disser acabará na agenda política nacional, com ou sem blog.

É inevitável. Se não for Lula, pode ser qualquer outro político a empunhar o computador como ferramenta de comunicação, da mesma forma que Brizola usou a rádio para projetar-se no cenário político nacional, nos idos de 1961.

O ingresso de políticos na blogosfera é apenas uma questão de tempo, porque o sistema oferece vantagens demasiado atraentes para serem desprezadas. Para os políticos é uma plataforma barata e eficientíssima, por conta de seu alcance universal. Para o cidadão é ainda mais atraente porque lhe dá a possibilidade de intervir no debate, coisa que até agora era inviável.

Durante a campanha eleitoral de 2010, a blogosfera entrou em transe por conta das discussões contra e a favor de Lula. Vocês já imaginaram o que acontecerá quando e se o próprio Lula começar a postar sobre tudo e sobre todos?

Há, no entanto, uma outra cara da moeda. A polarização inevitavelmente gera uma guerra informativa em que a verdade é sempre a primeira vítima. Já tivemos um pouco disso na última campanha eleitoral, mas o fenômeno pode se tornar ainda mais intenso, caso a polêmica entre lulistas e anti-lulistas se transfira de corpo e alma para o espaço cibernético, onde as limitações são muito menores.

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Marcelo Madureira e o fim do Casseta

Por Altamiro Borges

Para a tristeza dos tucanos e de outros bichos da direita nativa, a Central Globo de Comunicação informou na sexta-feira (26) que o programa "Casseta & Planeta Urgente", exibido há 18 anos pela emissora, sairá do ar no final de dezembro. O elenco até tentou maquiar o enterro, informando em seu sítio que tiraria "férias". Mas os patrões confirmaram que as férias serão eternas, que o programa chegou mesmo ao fim.

Segundo o grupo, um novo projeto humorístico poderá entrar no ar no segundo semestre de 2011. Não há idéia de que como será. "Se a gente tivesse uma não precisaríamos sair dessa forma", relatou de la Peña, em entrevista ao G1. Ele explicou que o fim do "Casseta", que era transmitido às noites das terças-feiras, ocorreu após um período de "inquietação do grupo" e não teve relação com alguma decisão da TV Globo.

Amarga queda de audiência

De acordo com o sítio da Folha, porém, a decisão de encerrar o programa não foi tão amigável assim. Parece que nem a TV Globo aguentava mais o "humor" do elenco. Nos últimos meses, o humorístico amargava uma das piores audiências da década, chegando a registrar médias na casa dos 20 pontos (cada ponto corresponde a 60 mil domicílios na Grande SP). Há dois anos, ele registrava 30 pontos de média.

O grupo poderia aproveitar as "férias" para analisar o "humorismo" de alguns de seus integrantes, em especial do bravateiro Marcelo Madureira. Na fase recente, ele se transformou num ícone da direita brasileira. Virou estrela do Instituto Millenium, uma organização golpista que reúne os barões da mídia e outros ricaços. Deu várias declarações fascistóides contra o governo Lula e a candidata Dilma Rousseff.

Bico de "bobo da corte"

Com o fim do "Casseta", Madureira até poderia fazer um bico junto ao seu candidato derrotado. Seria o bobo da corte para alegrar as noites de Serra, um ranzinza que ficou ainda mais deprimido com o resultado das eleições e das brigas internas no PSDB.

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"Brasil tem um caminho duro pela frente"

Reproduzo reportatem de Katarina Peixoto, publicada no sítio Carta Maior:

A economista Maria da Conceição Tavares defendeu nesta sexta-feira, durante a Conferência do Desenvolvimento, promovida pelo IPEA, em Brasília, que o Brasil deve proteger sua economia, reverter o processo de sobrevalorização do real e adotar mecanismos de controle de capital para evitar um ataque especulativo. Em sua fala, ela deixou algumas sugestões para o futuro governo Dilma: "Eu diria que a primeira preocupação agora é, sem dúvida nenhuma, com o setor externo. Se ele continuar assim vai haver degradação da indústria, déficit crescente da balança de pagamentos e uma fragilidade externa que na crise de 2008 nós não tivemos".

O sexto painel da Conferência do Desenvolvimento, promovida pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), em Brasília, apresentou um tema abrangente e desafiador: Macroeconomia e Desenvolvimento. Um tema à altura da homenagem feita pelo IPEA aos 80 anos da professora Maria da Conceição Tavares, formadora de mais de uma geração de economistas brasileiros. Bem humorada, ela brincou com a relação entre a homenagem e o tema escolhido para a conferência:

“Esta homenagem está gloriosa, porque o clima é Woodstock, não é. Vamos ver se sou capaz de tocar guitarra elétrica. O tema proposto para mim, só tocando guitarra elétrica. Macroeconomia e desenvolvimento não são temas pensados conjuntamente, geralmente”.

O propósito da política macroeconômica, lembrou, é evitar os desequilíbrios. E agora mais do que nunca em função da crise econômica mundial. Maria da Conceição Tavares fez um rápido resumo do quadro atual.

“Neste ano que passou foram os países ditos emergentes que cresceram. O primeiro mundo não cresceu nada. A crise de 2008, agora em 2010, veio repicada com a crise na Europa. A política macroeconômica na Europa deve estar fazendo Keynes se remover na tumba. Um desemprego cavalar e eles vêm com ajuste fiscal. Além de tudo há uma pletora de dólares. O Banco Central europeu está sustentando os países mais pobres da UE, mas o problema não é de liquidez, mas de insolvência”.

Frente a essa situação, alertou, o Brasil precisa ficar atento: “Nossa taxa de juros é historicamente cavalar. Não é uma maluquice do presidente do Banco Central. Desde a década de 70 que a taxa de juros primária é muito alta. E as taxas ativas dos bancos também são muito altas. Então estamos numa situação braba: que tipo de investimentos essa taxa de juros elevada atrai? O investimento direto não tem nenhum problema, desde que sejam estertores importantes do desenvolvimento. Mas nossas taxas de juros fazem com que sejamos atrativos para o capital especulativo. Resultado: estamos com uma grande sobrevalorização do real”.

Diante deste quadro, acrescentou, a economia brasileira precisa se proteger, não apenas dos Estados Unidos, mas também da China. Neste ponto, ela fez algumas advertências importantes ao governo Lula e, principalmente, ao futuro governo Dilma:

“Temos aumentado desvairadamente as importações. Está um festival de importação. Nós estamos diminuindo o conteúdo de valor agregado de nossa indústria, até com coeficiente em importação em aço, no qual temos competitividade internacional, temos 15% da importação em aço. Há sobra de aço na Europa, que está fazendo dumping para cima da gente e nós deixamos. Eu diria que a primeira preocupação agora é, sem dúvida nenhuma, com o setor externo. Se ele continuar assim vai haver degradação da indústria, déficit crescente da balança de pagamentos e uma fragilidade externa que na crise de 2008 nós não tivemos. Foi a primeira vez que o Brasil passou por uma crise sem se arrebentar. Ao contrário, somos credores líquidos internacionais. Passar dessa situação, outra vez, para devedor líquido é péssimo. Só não passamos a tanto porque o governo é credor líquido. Mas as grandes empresas, o capital privado já está devendo. O que significa que qualquer repique da crise internacional pode nos trazer problemas”.

O governo tem de estar atento, enfatizou a economista, para não agravar o déficit fiscal. “A inflação é de custos, não de demanda. Então, não é o caso elevar taxa de juros, para não agravar o déficit fiscal, aumentando o serviço da dívida. Isso tira a possibilidade de desenvolvimento. Como se faz desenvolvimento com uma taxa de juros dessas?” - indagou.

A economista garantiu que não discutiu pessoalmente esses temas com ninguém do governo. E reafirmou a defesa da adoção do controle de capitais para proteger o país de um ataque especulativo. “Já disse publicamente e repito, penso que numa situação como essa tem de ter controle de capitais. Todos os controles quantitativos. Aumenta o compulsório. Controla a taxa de crédito. Mas não com essa taxa de juros. Mesmo que o FMI tenha dito que controle de capitais pode ser recomendado, na atual conjuntura, o “mercado” e “os do mercado” aqui no Brasil não suportam ouvir isso. Mas temos no Banco Central gente discreta, não vedetes. Eu acho que a mudança do presidente do BC se prende a isso”.

O Brasil, recomendou ainda a economista, precisa fazer uma política fina e ir diminuindo lentamente a taxa de juros e a taxa de câmbio. “Devagar com o andor que o santo é de barro. Tem de andar devagar”, enfatizou. E criticou aqueles que defendem o corte de gastos para promover um duro ajuste fiscal.

“O eixo deste governo é a política econômica com eixo social. Esse é o nosso custeio. Cortar para investir, para agradar a imprensa? Eu acho que não há sentido nenhum. No desenvolvimento econômico, o eixo social está correto. Mas se não cuidarmos da parte cambial, não conseguiremos fazer política industrial e tecnológica e, no longo prazo, não há desenvolvimento econômico regredindo nessas coisas”.

Maria da Conceição Tavares manifestou confiança na capacidade da presidente eleita Dilma Rousseff enfrentar esses problemas: "Graças a deus a nossa presidente é uma mulher de coragem, de discernimento e economista competente. Este primeiro ano dela é complicado, em todos os sentidos. Enfim, que deus a proteja. Não adianta pedir que deus proteja individualmente nestas questões. Nestas questões é melhor proteger o coletivo”.

“Tenho muita fé na presidente, mas uma coisa é saber, outra é operar – não sei se a proporção de forças dos industriais pesam tanto quanto a dos banqueiros. Para sair dessa encrenca, agora mais do que nunca, não dá para deixar para o mercado ou a divina providência. A solução é humana e de todo o governo. Até o fim dessa década vamos erradicar a miséria, para que isso ocorra não podemos fazer coisas que abortem essas intenções.”

O Brasil tem um caminho duro pela frente, concluiu, e “deve agir com a autonomia de um país independente e soberano”. “Precisamos fazer uma defesa soberana da política industrial, cambial e de balanço de pagamentos. Não quero que me impinjam política macroeconômica que me atrapalhe o desenvolvimento. E que não se espere que o G7, G20, o G 400 resolvam alguma coisa, porque a ordem mundial está uma bagunça e o mundo hoje é multipolar. Acho melhor cumprir o nosso papel”.

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