quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Os riscos da contribuição negocial

Por Altamiro Borges

Em plena campanha eleitoral, quando o sindicalismo deveria estar unido para viabilizar a vitória de candidatos progressistas nas capitais e principais cidades do país, um projeto do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) tende a causar enorme cizânia neste campo. Ele trata do sistema de custeio do sindicalismo, propondo a extinção das atuais contribuições compulsórias pagas pelos trabalhadores – sindical, assistencial e a confederativa –, que seriam substituídas pela chamada contribuição negocial, no valor de 1% do salário bruto no ano. Esta dependeria das negociações coletivas firmadas com o patronato e precisaria ser aprovada em assembléia pelas categorias.


Como sintetizou o jornalista João Franzin, consultor da Agência Sindical, a proposta “está longe de gerar consenso. A totalidade da CUT apóia o projeto. Nas outras centrais não é bem assim. Na Força Sindical, exceto no comando metalúrgico, enfrenta resistências na própria cúpula. A CTB é contra e a NCST informou o ministério seu desacordo, devendo mobilizar as confederações de trabalhadores neste sentido. Já o Diap, instituto que tem justamente o papel de assessorar o sindicalismo junto ao Congresso Nacional, publicou parecer em que, na prática, desaprova o projeto. E a Conlutas. Bem, ela é contra o imposto sindical e contra a contribuição negocial”.

Projeto de lei fere a Constituição

De fato, a proposta da contribuição negocial é bastante polêmica e coloca em risco a sustentação financeira das entidades sindicais. Como alerta o parecer técnico do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), assinado pelo advogado Hélio Gherardi, a minuta do projeto possui várias armadilhas. “Não só desfigura a condição legal de tributo da contribuição sindical, como possibilita o excessivo número de ações de Ministério Público do Trabalho para que esta referida contribuição não seja recolhida de toda a categoria, mas tão somente dos associados”.

Para Gherardi, a proposta fere a Constituição. “Se o projeto de lei objetiva, exatamente, retirar a compulsoriedade e a tipificação da contribuição sindical como tributo, além de inconstitucional, ele fere a própria segurança jurídica da aplicabilidade e do seu recolhimento que, aprovado em assembléia e ficando adstrito à vontade individual, evidentemente deixa de existir”. Desta forma, o desconto estaria incluído no ordenamento jurídico, mas, de fato, não seria aplicável. O parecer do Diap só confirmou os temores do sindicalismo e a Nova Central Sindical dos Trabalhadores (NCST) já ingressou com Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) contra o projeto de lei.

A posição da CUT e da Conlutas

Apenas a CUT, que sempre advogou teses liberais no sindicalismo, defende a proposta. Segundo Vagner Freitas, integrante da executiva desta central, “o projeto vai criar uma realidade em que o trabalhador dirá se quer ou não o desconto. E, se quiser, ele pagará bem menos do que paga hoje, quando nem sequer é consultado a respeito”. Sem levar em conta a forte pressão do patronato no mundo “encantado” do capitalismo e retomando seu velho discurso, os caciques cutistas afirmam que a atual contribuição sindical só serve “para alimentar velhos pelegos”. Esta postura idílica e sectária, porém, gera resistências no interior da própria entidade, conforme indicam seus últimos congressos em que a maioria dos delegados apoiou a manutenção da atual contribuição.

Já a Coordenação Nacional de Lutas (Conlutas), comandada pelo PSTU, vai além da CUT, alvo da sua raivosa oposição. Em nota oficial, ela pregou “a extinção imediata do imposto sindical”, rechaçou a própria contribuição negocial e ainda espinafrou o reconhecimento das centrais. “Isto é vergonhoso. É resultado da política de parceria destas entidades com o governo para garantir a retirada de direitos. Todas elas estão a serviço dos interesses do capital, traindo os interesses dos trabalhadores”, esbravejou a Conlutas, que recentemente sofreu nova fratura com a desfiliação dos sindicalistas do Movimento Esquerda Socialista (MES), da deputada Luciana Genro.

Água no moinho dos patrões

Bem diferente destas posições principistas, as demais centrais condenam a extinção abrupta da contribuição sindical e questionam a eficácia da contribuição negocial. A CTB, que conquistou a legalidade em tempo recorde, avalia que ela “carece de segurança jurídica e pode comprometer, e em alguns casos até inviabilizar, o financiamento do sindicalismo, enfraquecendo a luta contra a exploração capitalista”. Em nota oficial, ela conclama os sindicatos “a centrarem suas fileiras em defesa da contribuição sindical, assim como da unicidade. A mudança pretendida pelo Ministério do Trabalho, respaldada por correntes divisionistas, joga água no moinho dos patrões”.

No mesmo rumo, Ricardo Patah, presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT), ironizou a pressa da CUT em fechar um acordo com o governo. Lembrou que uma comissão foi criada pelo Ministério do Trabalho para apresentar a nova proposta de custeio do sindicalismo, mas que não houve acordo sobre o melhor mecanismo, o que indicaria que o tema é complexo e exige maior amadurecimento. “Ela foi muito afoita para defender a proposta do governo. Se a CUT quer tanta pressa no fim do imposto, porque ela não abre mão do dinheiro que vai receber neste ano”.

Com base nos critérios de representatividade que garantiram o reconhecimento de seis centrais, a CUT levará a maior fatia da contribuição sindical: R$ 19,8 milhões; a Força ficará com R$ 15,1 milhões; a UGT com R$ 8,8 milhões; a NCST com R$ 6,6 milhões; a CTB com R$ 2,9 milhões; e a CGTB com 2,4 milhões. Esta distribuição dos recursos foi estabelecida pela lei nº 11.648, que regulamentou pela primeira vez na história a legalização das centrais. Até então, elas não tinham respaldo para suas atividades. A extinção abrupta da contribuição sindical, além de levar à falência milhares de sindicatos, colocará em risco a própria conquista recente das centrais.

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