sábado, 13 de abril de 2013

O inelutável mercado

Por Mino Carta, na revista CartaCapital:

Pergunto aos meus reflexivos botões o que vem a ser o mercado. Ou seria o caso de dizer MERCADO? Segue-se este diálogo.

“Trata-se, ao que tudo indica, de uma entidade sobrenatural, incontrastável na sua onipotência”, proclamam os inquiridos com certa ênfase.



“Deus, portanto, não é mesmo?”, apresso-me a anotar.

“Deixemos Deus no lugar que lhe compete, de alguma forma o MERCADO assemelha-se mais aos fados gregos…”

Interrompo. “Donde, agente do destino…”

“Não, não, algo maior e mais exato, de alguma forma o MERCADO é o próprio destino.”

“Quer dizer, o que determina é definitivo e irretorquível. É porque é, digo, filosoficamente…”

“Eis aí, é na condição indiscutível de manifestação do real, não nos atiraríamos a discutir o fato de que a Terra gira em torno do Sol.”

Pareceu-me entender a razão da diferença entre MERCADO e Deus. O Altíssimo, embora nem sempre usado para os melhores fins, é o primeiro motor da religião, na qual se entrelaçam fé e emoção. Já me referi inúmeras vezes à religião do deus mercado, e agora me arrependo, e a quem me leu peço perdão. Não se exige fé para acreditar no MERCADO. Ele existe, na qualidade de suprema verdade factual, igual à vida e à morte.

O inelutável suscita algum espanto, como as ideias de eternidade e do infinito propostas a quem é irremediavelmente condicionado por tempo e espaço. Entendo, porém, que os botões riem. Ouço distintamente o marulhar de sua peculiar risada, de cachorro maldoso, mostra os dentes, mas vem do fundo da garganta, e como se o som passasse sobre lixa. Estou perplexo, o comportamento dos botões contradiz agora tudo o que foi dito antes.

Encaro-os atônito. No tom de quem chama à ordem o desavisado, esclarecem: “Ora, ora, o que dissemos é como o mundo encara o mercado, o mundo cada vez mais crédulo, intelectualmente indigente, negado à frequentação do espírito crítico. Donde, pronto a engolir o que interessa às oligarquias financeiras criadas pelo neoliberalismo, enquanto prejudicam gravemente o resto da humanidade”.

A sociedade, à qual Margaret Thatcher negava existência em benefício do indivíduo, assiste impávida, ao menos por enquanto, ao esforço dos países do ex-Primeiro Mundo para combater a crise ao favorecer quem a provocou. De sorte que as coisas pioram. Na Europa, de 2008 a 2012, 10 milhões de empregos foram perdidos. Um milhão e pouco só na Itália no ano passado, e ali, no mesmo período, 5 mil empresas morreram. Oitenta multinacionais, e entre elas o narcotráfico, comandam a economia global e impõem sua vontade aos governos nacionais.

O mundo, ah, o mundo dá sinais inequívocos de senectude, em meio a delírios que incluem as ameaças atômicas do ditador norte-coreano. Incluem também situações aparentemente mais comezinhas e menos arriscadas. Refiro-me, a escolher uma entre tantas, à reação da mídia mundial ao falecimento de Margaret Thatcher. Salvo algumas exceções, fala-se de uma Mary Poppins revolucionária capaz de devolver o Reino Unido às glórias pregressas. E haja glória. A Dama de Ferro, que se presumia destinada a uma vida doméstica, ao se instalar no número 10 de Downing Street tornou-se fundadora do neoliberalismo, entrave aparentemente ineludível dos dias de hoje. Antes de Ronald Reagan, ela merece a primazia.

Não há questionamento possível, sofremos, em primeiro lugar, por causa dela se o simples mercado transmudou-se no MERCADO. Como a grei de Panurge, o mundo foi atrás da senhora Thatcher. Alguns, os beneficiários da operação, de caso pensado, para tomar o bonde da história que transitava na esquina. Outros, sem se darem conta do desastre. Outros ainda porque não entendiam coisa alguma.

P.S.: Em entrevista à rede CNT, o ministro Paulo Bernardo dá seu revide à capa de CartaCapital de duas semanas atrás, que o via como protetor do plim-plim e do trim-trim. O canal é insignificante e o ministro tem lida difícil com o vernáculo. Mesmo assim, percebe-se a sua tese: fingimos ser o que não somos. Pregamos a moral que não praticamos. Sem pestanejar, vendemos a alma. Pois o ministro deveria saber, por intermináveis razões, que Mefistófeles, conosco, perderia seu tempo.

3 comentários:

Mauricio disse...

Lá no PS é que o Mino vai explicar o que tinha em mente quando começou a escrever – a atuação do ministro Paulo Bernardo, objeto de muitas críticas da blogosfera, algumas, a meu ver, pueris. A blogosfera, como os EUA, para sobreviver parece precisar de um inimigo. Daniel Dantas, um mero lobista, afinal foi esquecido. Antes disso, deu muito pano para manga. O problema costuma ficar restrito à área das comunicações: antes era Dantas, agora Bernardo. Não é fácil, porém, substitui-lo. Dilma já deve estar com o pacová cheio de tantas críticas ao seu ministro. Não o substitui porque, no caso, teria de dispensar um casal ministerial. Além do que é impossível que alguém, nesse cargo, não seja “contaminado” pelas empresas de comunicação. O lobby é muito forte. Seria o mesmo que alguém pretendesse dirigir a CBF sem um bom relacionamento com os cartolas dos clubes. Nem chegaria a esquentar a cadeira. O que querem os críticos de Bernardo? Que o ministério reestabeleça a estatização das comunicações? Os assuntos tratados por Bernardo na citada entrevista são complexos. Muita gente anda criticando o ministro sem conhecer os problemas da pasta. http://www.youtube.com/watch?v=CfpIt5kyzZQ

Unknown disse...

Mino Carta, Sensato! como sempre a evidenciar as mazelas e a promiscuidade da mídia conservadora golpista e terrorista exigindo o aumento das famigeradas taxas de juros! 900 bilhões de reais é o que o Brasil paga aos agiotas internacionais contra 71,7 bilhões investidos na Educação; é grande a disparidade, um aumento de 1% nas taxas significa 90 bilhões a menos na economia brasileira. a lei que regulamenta a mídia conservadora seria um grande avanço no sentido de dar a sociedade uma chance diante do terrorismo midiático venal e golpista.

PQuadros disse...

Caro Mauricio,
Dantas, mero lobista???????
O mero lobista tem tentaculos soh em:
-Gado
-Telefonia
-Bancos
-Esportes(soh meu bahia quando da sua passagem pelo bahia s/a se transformou na maior lavanderia do Brasil)
-portos
E outros mais!
E vc o chama de MERO LOBISTA?????
Entao posso chamar-lhe de mero leitor de veja/globo!