Por Wanderley Preite Sobrinho, na revista CartaCapital:
Tinha tudo para os planos do Movimento Brasil Livre (MBL) darem certo. Primeiro, duas manifestações que, somadas, levaram mais de 2 milhões de pessoas às ruas pedindo o impeachment da presidenta Dilma Rousseff –segundo os cálculos generosos da Polícia Militar. Logo em seguida, a encomenda de um estudo feito pela oposição para validar juridicamente a cassação da petista. O apoio político e a comoção popular haviam criado o ambiente propício para o que foi vendido como uma manifestação arrojada, nova, diferente de tudo o que se tinha visto no Brasil desde os protestos de 2013. Como resultado, milhares de brasileiros vestindo verde e amarelo se juntariam ao MBL em uma caminhada de 1.175 quilômetros entre São Paulo e Brasília.
O dia, horário e evento no Facebook também foram acertados. Na data, 24 de abril, uma multidão se concentraria no bairro rico de Pinheiros, na zona oeste da capital, onde sairiam em marcha após o Hino Nacional. A história foi bem outra.
Os manifestantes que abarrotaram em festa a avenida Paulista ensolarada nos domingos de 15 de março e 12 de abril caminhariam mesmo por 30 dias? Marchariam mesmo com idade média de 40 anos e o bolso cheio? Cerca de 20% de quem protestou naqueles dias ganhavam mais de 20 salários mínimos por mês, segundo o Datafolha.
Nada disso passou pela cabeça dos líderes do MBL, nem mesmo pela mais conhecida delas, a de Kim Kataguiri, de 19 anos. “[No dia 27 de maio], ocupemos a frente da Câmara para que os congressistas se sintam pressionados a atender a nossa pauta”, convocou o estudante em um vídeo no Facebook em que explicava cada detalhe da “Marcha pela Liberdade”.
Tudo pronto. Dia 24 de abril, meio-dia, praça Panamericana. Ninguém apareceu. Como há sempre aquele atrasadinho, decidiram esperar por mais uma hora. Às 13h, 22 pessoas iniciaram a marcha. Nem o MBL apareceu direito. Kim esperava pelo menos 60 pessoas do movimento, e o total geral foi de um terço disso.
Para não atrapalhar o trânsito, o grupo foi pela calçada mesmo. Carros e um ônibus, bancado pelo Solidariedade, partido do deputado Paulinho da Força, foram mobilizados para garantir o mínimo conforto a quem pusesse o pé na estrada. Ninguém precisaria levar as mochilas nas costas. Na hora de dormir, os veículos também serviriam de abrigo.
E lá foram eles. Pela rodovia dos Bandeirantes, chegaram a Jundiaí. Naquela cidade, a 57 km da capital, ganharam a rodovia Anhanguera, de onde só saíram para pisar na capital federal. O roteiro incluiu as cidades de Uberlândia, Uberaba, Caldas Novas, Goiânia, Anápolis e cidades satélites de Brasília.
O plano era mobilizar simpatizantes em cada um desses municípios. Pouca gente se animou. Apoio mesmo só de políticos ultraconservadores. No Twitter, o deputado Roberto Freire (PPS-SP) bradou: “Vamos mobilizar todos os partidos de oposição e oposicionistas de todos os partidos para a Marcha e o ato em BSB”.
Onyx Lorenzoni (DEM-RS) chegou a dizer que pretendia participar de um trecho da caminhada, enquanto Ronaldo Caiado (DEM-GO) prometeu receber com festa os manifestantes quando chegassem a Goiânia, sua base eleitoral.
Os dias foram passando, Caiado não deu o ar da graça e a marcha sumiu dos noticiários. A esperança de reunir milhares em frente ao Congresso se esvaiu depois que o parecer jurídico sobre o impeachment da presidenta chegou ao gabinete de Aécio na noite de quarta-feira 20. “Não é agenda para agora”, contemporizou o presidente do PSDB, ao se referir às conclusões do jurista Miguel Reale Júnior, que não viu embasamento jurídico para o impedimento.
Quando pouca gente se lembrava da marcha, Kataguiri e os amigos voltaram às manchetes. Embriagado, José Lino, de 49 anos, colidiu sua caminhonete com outro veículo por volta das 19h do sábado 23 e se viu arremessado contra o acostamento, justamente onde caminhavam os integrantes do MBL.
Kataguiri e Amanda Kailayne Alves, de 28 anos, foram atropelados. Nada grave. Eles foram encaminhados para hospitais da região e medicados. No dia seguinte, Renan Santos (31), outro líder do MBL, compartilhou um vídeo no Facebook politizando o acidente ao revelar sua intenção de averiguar se o motorista era membro do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST).
Os milhares esperados em frente ao Congresso gritando pelo impeachment de Dilma diante de receptivos presidentes da Câmara e do Senado terminaram em um discurso constrangido do coordenador do MBL Rubens Nunes Filho na terça-feira 26 durante a reunião da bancada do DEM: “Conclamo os senhores que recebam a marcha amanhã, às 14 horas. Que estejam na rampa para nos receber e se possível prestar apoio”.
Nenhum político juntou-se ao minguado grupo que se reuniu no gramado do Congresso nesta quarta-feira, mas, acompanhados por parlamentares da oposição, o movimento conseguiu se reunir com o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e protocolar o pedido de impeachment.
Trinta e três dias depois, 35,6 quilômetros supostamente caminhados por dia (lembre-se do ônibus e carros de apoio) e um final melancólico para um movimento megalomaníaco.
O dia, horário e evento no Facebook também foram acertados. Na data, 24 de abril, uma multidão se concentraria no bairro rico de Pinheiros, na zona oeste da capital, onde sairiam em marcha após o Hino Nacional. A história foi bem outra.
Os manifestantes que abarrotaram em festa a avenida Paulista ensolarada nos domingos de 15 de março e 12 de abril caminhariam mesmo por 30 dias? Marchariam mesmo com idade média de 40 anos e o bolso cheio? Cerca de 20% de quem protestou naqueles dias ganhavam mais de 20 salários mínimos por mês, segundo o Datafolha.
Nada disso passou pela cabeça dos líderes do MBL, nem mesmo pela mais conhecida delas, a de Kim Kataguiri, de 19 anos. “[No dia 27 de maio], ocupemos a frente da Câmara para que os congressistas se sintam pressionados a atender a nossa pauta”, convocou o estudante em um vídeo no Facebook em que explicava cada detalhe da “Marcha pela Liberdade”.
Tudo pronto. Dia 24 de abril, meio-dia, praça Panamericana. Ninguém apareceu. Como há sempre aquele atrasadinho, decidiram esperar por mais uma hora. Às 13h, 22 pessoas iniciaram a marcha. Nem o MBL apareceu direito. Kim esperava pelo menos 60 pessoas do movimento, e o total geral foi de um terço disso.
Para não atrapalhar o trânsito, o grupo foi pela calçada mesmo. Carros e um ônibus, bancado pelo Solidariedade, partido do deputado Paulinho da Força, foram mobilizados para garantir o mínimo conforto a quem pusesse o pé na estrada. Ninguém precisaria levar as mochilas nas costas. Na hora de dormir, os veículos também serviriam de abrigo.
E lá foram eles. Pela rodovia dos Bandeirantes, chegaram a Jundiaí. Naquela cidade, a 57 km da capital, ganharam a rodovia Anhanguera, de onde só saíram para pisar na capital federal. O roteiro incluiu as cidades de Uberlândia, Uberaba, Caldas Novas, Goiânia, Anápolis e cidades satélites de Brasília.
O plano era mobilizar simpatizantes em cada um desses municípios. Pouca gente se animou. Apoio mesmo só de políticos ultraconservadores. No Twitter, o deputado Roberto Freire (PPS-SP) bradou: “Vamos mobilizar todos os partidos de oposição e oposicionistas de todos os partidos para a Marcha e o ato em BSB”.
Onyx Lorenzoni (DEM-RS) chegou a dizer que pretendia participar de um trecho da caminhada, enquanto Ronaldo Caiado (DEM-GO) prometeu receber com festa os manifestantes quando chegassem a Goiânia, sua base eleitoral.
Os dias foram passando, Caiado não deu o ar da graça e a marcha sumiu dos noticiários. A esperança de reunir milhares em frente ao Congresso se esvaiu depois que o parecer jurídico sobre o impeachment da presidenta chegou ao gabinete de Aécio na noite de quarta-feira 20. “Não é agenda para agora”, contemporizou o presidente do PSDB, ao se referir às conclusões do jurista Miguel Reale Júnior, que não viu embasamento jurídico para o impedimento.
Quando pouca gente se lembrava da marcha, Kataguiri e os amigos voltaram às manchetes. Embriagado, José Lino, de 49 anos, colidiu sua caminhonete com outro veículo por volta das 19h do sábado 23 e se viu arremessado contra o acostamento, justamente onde caminhavam os integrantes do MBL.
Kataguiri e Amanda Kailayne Alves, de 28 anos, foram atropelados. Nada grave. Eles foram encaminhados para hospitais da região e medicados. No dia seguinte, Renan Santos (31), outro líder do MBL, compartilhou um vídeo no Facebook politizando o acidente ao revelar sua intenção de averiguar se o motorista era membro do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST).
Os milhares esperados em frente ao Congresso gritando pelo impeachment de Dilma diante de receptivos presidentes da Câmara e do Senado terminaram em um discurso constrangido do coordenador do MBL Rubens Nunes Filho na terça-feira 26 durante a reunião da bancada do DEM: “Conclamo os senhores que recebam a marcha amanhã, às 14 horas. Que estejam na rampa para nos receber e se possível prestar apoio”.
Nenhum político juntou-se ao minguado grupo que se reuniu no gramado do Congresso nesta quarta-feira, mas, acompanhados por parlamentares da oposição, o movimento conseguiu se reunir com o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e protocolar o pedido de impeachment.
Trinta e três dias depois, 35,6 quilômetros supostamente caminhados por dia (lembre-se do ônibus e carros de apoio) e um final melancólico para um movimento megalomaníaco.
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