Por Marcos Coimbra, na revista CartaCapital:
Quando se usa o termo opinião pública, é preciso entender que ele possui duas dimensões. E que entre eles pode coexistir uma contradição. A primeira dimensão diz respeito às atitudes e comportamentos conjunturais. São emoções e opiniões, modos de pensar e agir em relação ao presente. É volátil e desestruturada, e não estabelece compromissos com o conteúdo. Em um dia, pode-se estar furioso com alguma coisa. No outro, contente.
A segunda, ao contrário, tende à estabilidade e à estruturação, com uma referência de tempo maior e menos sujeita à influência dos acontecimentos imediatos. As identidades são um de seus elementos mais importantes. Elas demoram a se formar e a se modificar.
Façamos uma analogia óbvia com um assunto que todos conhecem, o futebol. Quem gosta e acompanha o esporte costuma ter um time, sentir-se identificado com ele e a se definir como seu torcedor (o que, frequentemente, significa repudiar os demais, em rivalidade que pode chegar à irracionalidade e ao ódio).
As identidades clubistas são parte da segunda dimensão. Em regra, constituem-se cedo e raramente mudam. Como diz o hino: “Uma vez Flamengo, sempre Flamengo”.
Por mais arraigada que seja sua identidade com determinado clube, o torcedor continua, porém, a ter opiniões e sentimentos conjunturais em relação a ele. Pode estar satisfeito ou aborrecido com aquela diretoria, aquele plantel, com o modo como o time jogou em determinado dia. Pode agir em função disso, decidindo ir ou se ausentar do estádio no próximo jogo. Mas não troca de time.
Em matéria de opiniões políticas, acontece algo semelhante e é necessário não perder de vista a existência dessas duas dimensões. Senão, ficamos incapacitados de compreender como o conjuntural e o estrutural se articulam e se influenciam reciprocamente.
A interação entre essas dimensões fica clara nas situações em que uma delas, por qualquer razão, é muito pequena, como aconteceu no Brasil logo após o fim do regime militar. A ditadura havia abolido os partidos e sido incapaz de criar novos, o que fez com que retornássemos à democracia com uma opinião pública desestruturada, sem identidades e presa de maneira exacerbada à conjuntura.
Que o diga José Sarney, em cujo governo vimos subir de supetão a popularidade, para, em questão de meses, desabar ao fundo do poço. Que o diga o PMDB, que chegou a ter a “simpatia partidária” de mais da metade da população, patamar jamais atingido por qualquer partido em nossa história. Que o diga Fernando Collor, vencedor de uma eleição no figurino de paladino de sua própria causa. Muito provavelmente, nada disso teria acontecido se nossa opinião pública não fosse tão “imatura” e estivesse estruturada sobre sentimentos e identidades estáveis.
Hoje, o debate político está influenciado por resultados de pesquisas que só olham para a dimensão conjuntural. Como se apenas ela existisse e nossa cultura política não houvesse amadurecido. Como se o futuro fosse determinado exclusivamente pelo presente e não tivesse relação com o passado.
O momento de intenso desgaste da imagem do governo, do PT e de suas principais lideranças é evidente e foi retratado por todas as pesquisas. Elas medem a consequência de erros cometidos e, acima disso, da mais longa e concertada campanha de desconstrução de imagem de nossa história, em que as grandes corporações de mídia explicitaram seu partidarismo e antipetismo.
Mas elas não mostram apenas resultados conjunturais negativos. Quando vão além do imediato, revelam que a opinião pública é mais estável do que imaginam aqueles que apostam que o PT vive seu juízo final.
Não faz muito tempo, durante o segundo governo Lula e no início do primeiro mandato de Dilma Rousseff, as pesquisas sugeriam haver um quase “consenso petista” na sociedade brasileira, com governantes aprovados por 90% ou mais do País. Quando chegou a hora de votar, vimos, porém, a prevalência dos sentimentos profundos do eleitorado. As disputas tiveram resultados apertados.
Hoje difunde-se uma igual ilusão conjuntural, com sinal trocado. Assim como era irreal a unanimidade pró-PT, é falsa a noção de que todos são contra o partido. Estavam errados aqueles que fantasiavam vitórias retumbantes e erra agora quem profetiza derrotas petistas acachapantes.
Quando se usa o termo opinião pública, é preciso entender que ele possui duas dimensões. E que entre eles pode coexistir uma contradição. A primeira dimensão diz respeito às atitudes e comportamentos conjunturais. São emoções e opiniões, modos de pensar e agir em relação ao presente. É volátil e desestruturada, e não estabelece compromissos com o conteúdo. Em um dia, pode-se estar furioso com alguma coisa. No outro, contente.
A segunda, ao contrário, tende à estabilidade e à estruturação, com uma referência de tempo maior e menos sujeita à influência dos acontecimentos imediatos. As identidades são um de seus elementos mais importantes. Elas demoram a se formar e a se modificar.
Façamos uma analogia óbvia com um assunto que todos conhecem, o futebol. Quem gosta e acompanha o esporte costuma ter um time, sentir-se identificado com ele e a se definir como seu torcedor (o que, frequentemente, significa repudiar os demais, em rivalidade que pode chegar à irracionalidade e ao ódio).
As identidades clubistas são parte da segunda dimensão. Em regra, constituem-se cedo e raramente mudam. Como diz o hino: “Uma vez Flamengo, sempre Flamengo”.
Por mais arraigada que seja sua identidade com determinado clube, o torcedor continua, porém, a ter opiniões e sentimentos conjunturais em relação a ele. Pode estar satisfeito ou aborrecido com aquela diretoria, aquele plantel, com o modo como o time jogou em determinado dia. Pode agir em função disso, decidindo ir ou se ausentar do estádio no próximo jogo. Mas não troca de time.
Em matéria de opiniões políticas, acontece algo semelhante e é necessário não perder de vista a existência dessas duas dimensões. Senão, ficamos incapacitados de compreender como o conjuntural e o estrutural se articulam e se influenciam reciprocamente.
A interação entre essas dimensões fica clara nas situações em que uma delas, por qualquer razão, é muito pequena, como aconteceu no Brasil logo após o fim do regime militar. A ditadura havia abolido os partidos e sido incapaz de criar novos, o que fez com que retornássemos à democracia com uma opinião pública desestruturada, sem identidades e presa de maneira exacerbada à conjuntura.
Que o diga José Sarney, em cujo governo vimos subir de supetão a popularidade, para, em questão de meses, desabar ao fundo do poço. Que o diga o PMDB, que chegou a ter a “simpatia partidária” de mais da metade da população, patamar jamais atingido por qualquer partido em nossa história. Que o diga Fernando Collor, vencedor de uma eleição no figurino de paladino de sua própria causa. Muito provavelmente, nada disso teria acontecido se nossa opinião pública não fosse tão “imatura” e estivesse estruturada sobre sentimentos e identidades estáveis.
Hoje, o debate político está influenciado por resultados de pesquisas que só olham para a dimensão conjuntural. Como se apenas ela existisse e nossa cultura política não houvesse amadurecido. Como se o futuro fosse determinado exclusivamente pelo presente e não tivesse relação com o passado.
O momento de intenso desgaste da imagem do governo, do PT e de suas principais lideranças é evidente e foi retratado por todas as pesquisas. Elas medem a consequência de erros cometidos e, acima disso, da mais longa e concertada campanha de desconstrução de imagem de nossa história, em que as grandes corporações de mídia explicitaram seu partidarismo e antipetismo.
Mas elas não mostram apenas resultados conjunturais negativos. Quando vão além do imediato, revelam que a opinião pública é mais estável do que imaginam aqueles que apostam que o PT vive seu juízo final.
Não faz muito tempo, durante o segundo governo Lula e no início do primeiro mandato de Dilma Rousseff, as pesquisas sugeriam haver um quase “consenso petista” na sociedade brasileira, com governantes aprovados por 90% ou mais do País. Quando chegou a hora de votar, vimos, porém, a prevalência dos sentimentos profundos do eleitorado. As disputas tiveram resultados apertados.
Hoje difunde-se uma igual ilusão conjuntural, com sinal trocado. Assim como era irreal a unanimidade pró-PT, é falsa a noção de que todos são contra o partido. Estavam errados aqueles que fantasiavam vitórias retumbantes e erra agora quem profetiza derrotas petistas acachapantes.
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