Reproduzo artigo de Emir Sader, publicado no “Blog da Reforma Agrária”:
Leia artigo do cientista político Emir Sader em resposta a texto publicado pelo compositor Nelson Motta em O Globo e em O Estado de S.Paulo, nesta sexta-feira.
Motta ataca Sader e o dirigente do MST, João Pedro Stedile, defende o Jornal Nacional (TV Globo) e satiriza o programa de banda larga do governo federal.
“Um ex-diretor de cinema tentou retomar o caminho de Paulo Francis, foi para a sede da Time-Life, mas fracassou estrepitosamente”, escreve Sader. “Um ex-compositor, em fim de carreira, também se tornou assalariado dos Marinhos, que lhe dão espaço para atacar a esquerda, defendendo o ponto de vista da empresa favorita da ditadura, agora querendo posar de democrática. E o que mais agrada os patrões do que atacar o MST, Cuba, Venezuela, Lula, a esquerda?”, pergunta.
Leia abaixo o artigo de Emir Sader, que faz parte da Rede de Comunicadores pela Reforma Agrária:
Os filhotes da ditadura
A TV Globo surgiu no auge da ditadura militar, quando assinou um acordo com a Time-Life para instaurar seu canal de televisão no Brasil, que rapidamente se tornou o órgão oficial da ditadura militar.
Gozando do monopólio de fato e das graças do regime mais brutal que o país conheceu, fundado no terrorismo de Estado, conquistou a audiência que lhe permitiu consolidar-se economicamente.
Terminada a ditadura – contra as resistências da própria Globo -, a empresa foi pega em flagrante no caso da Proconsult, tentando fraudar a vitória de Brizola nas eleições para governador, em 1982, assim como tentou desconhecer a campanha das diretas e aquela pela derrubada do Collor (seu candidato). Revelava como não tinha mudado desde os tempos da ditadura.
Nascida das entranhas da ditadura militar, apoiada em um acordo com uma empresa emblemática do império estadunidense, o jornal principal da empresa, O Globo, não poderia ser outra coisa, senão o que é: um órgão sem nenhuma credibilidade.
“O povo não é bobo. Abaixo a Rede Globo” – persegue a todos os funcionários da empresa da família Marinho. A morte do patriarca – amigo íntimo e sócio de ACM, como herança dos tempos da ditadura – tornou ainda mais grotesca a empresa, porque nenhum dos filhos revela qualquer capacidade para dirigir a empresa do pai, acelerando seu mergulho na decadência, sem nunca ter conseguido superar a falta de credibilidade.
Um jornal que tem em Ali Kamel, Merval Pereira e Miriam Leitao como seus principais expoentes, não poderia mesmo nunca conquistar credibilidade alguma.
O que a empresa conseguiu foi comprar uma série de artistas, que conseguiram espaço para repetir o que os donos da empresa desejam, sem nenhuma credibilidade.
Um ex-diretor de cinema tentou retomar o caminho de Paulo Francis, foi para a sede da Time-Life, mas fracassou estrepitosamente, refugiando-se na amargura de lamentar que o Brasil saiu das mãos dos seus patrões para cair nas de um retirante nordestino.
Outros funcionam como penosos escribas preenchendo lamentavelmente as páginas do jornal e os espaços da televisão, para tentar ser os lacerdistas – os corvos – de hoje.
Um ex-compositor, em fim de carreira, também se tornou assalariado dos Marinhos, que lhe dão espaço para atacar a esquerda, defendendo o ponto de vista da empresa favorita da ditadura, agora querendo posar de democrática.
E o que mais agrada os patrões do que atacar o MST, Cuba, Venezuela, Lula, a esquerda? E defender a empresa, em situação econômica periclitante, atacando a generalização da banda larga para todo o país?
Ainda mais alguém especialmente desqualificado para falar de um tema tão importante para a democratização da formação da opinião publica. Mal pode disfarçar, com agressões grosseiras, o nervosismo que medidas como essa provocam na empresa da família Marinho.
Triste fim de gente que termina suas carreiras como ventríloquos dos descendentes da família Marinho, como filhotes da ditadura, que ainda não sabem que “o povo não é bobo”, povo que sabe que “Globo e ditadura, tudo a ver”.
É o desespero de continuar sem conseguir eleger seus candidatos, nem na cidade do Rio de Janeiro, nem no Estado do Rio de Janeiro, nem no Brasil, revelando como estão na contramão do povo do Rio e do povo do Brasil.
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domingo, 25 de abril de 2010
Balanço da jornada de lutas do MST
Reproduzo documento enviado pela secretaria nacional do MST:
1. A história
O mês de abril se tornou um símbolo da luta pela democratização da terra no Brasil e em todo mundo. Em 17 de abril de 1996, 19 trabalhadores rurais, que participavam de uma marcha, foram brutalmente assassinados pela Polícia Militar do Pará, em Eldorado dos Carajás. Era governador do Pará o sr. Almir Garbiel (PSDB). Era presidente do Brasil o sr. Fernando Henrique Cardoso. Segundo o advogado de defesa dos policiais, a empresa Vale do Rio Doce financiou a mobilização da tropa. O Massacre de Carajás foi um dos crimes mais covardes e estúpidos de toda história de nosso país.
Passaram-se tantos anos, e até hoje ninguem foi punido ou condenado.
Em 2002, o presidente Fernando Henrique Cardoso sancionou projeto de lei de iniciativa da senadora Marina Silva, e instituiu o 17 de Abril como Dia Nacional de Luta pela Reforma Agrária. Por isso, no mês de abril, aqui no Brasil e em todo mundo acontecem mobilizações camponesas na luta por melhores condições de vida e para avançar a Reforma Agrária. Neste ano realizamos mais uma jornada de lutas, com mobilizações em todo país, ocupações de terras, protestos e marchas, para seguir pautando as necessidades históricas dos camponeses e camponesas.
Temos na pauta dois temas complementares. O primeiro é a necessidade de retomar o debate sobre a necessidade de mudanças estruturais na propriedade da terra e no modelo agrícola imposto pelo capital internacional em nosso país, o chamado agronegócio. E o segundo são as diversas demandas concretas, compromissos assumidos pelo governo, para melhorar as condições de vida dos trabalhadores de forma imediata.
A eleição do presidente Lula abriu novas perspectivas para os trabalhadores rurais e para a reforma agrária. Depois da posse, acompanhamos a formulação do Plano Nacional de Reforma Agrária, que foi rebaixado por pressão da bancada ruralista e pela falta de prioridade da área econômica.
Em 2005, fizemos uma grande marcha de Goiânia a Brasília, com 12 mil trabalhadores e trabalhadoras rurais, que caminharam mais de 200 km, durante 17 dias. No final da marcha, fomos recebidos pelo presidente Lula e entregamos uma pauta de reivindicações, com sugestões para melhorar a polítia agrária. Naquela ocasião o governo se comprometeu, por escrito, com os seguintes pontos:
1. Priorizar o assentamento de todas as familias acampadas
2. Atualizar os índices de produtividade (ou seja, cumprir a Lei Agrária)
3. Garantir de recursos para a desapropriação de áreas
4. Criar de uma linha de crédito específica para assentados
5. Criar de uma linha especial de crédito no BNDES para agroindústrias e cooperativas nos assentamentos
6. Ampliar os recursos para os programas da educação no campo
2. A conjuntura atual
Foi passando o tempo, e muito pouco foi feito nessa direção. O resultado foi que, nesses anos, aumentou ainda mais a concentração da propriedade da terra. A opção pelo agronegócio por parte de alguns ministérios ficou mais clara.
Jornada a jornada, todos os anos apresentamos praticamente a mesma pauta ao governo. Por isso dizemos que nossa pauta ficou amarela. Nenhuma medida estruturante foi implementada e os poucos assentamentos foram realizados mais como medida de solução de conflitos do que como projeto alternativo para a produção. Milhares de famílias continuam acampadas. E do total de famílias assentadas pelo governo, 65% foram em projetos de regularização fundiária e colonização na Amazônia.
Por outro lado, ao aproximar-se da eleição, a direita se articulou nos espaços onde tem hegemonia, como o Poder Judiciário, a bancada ruralista e setores da mídia burguesa, para atacar a reforma agrária, a luta social e o MST. Nos últimos meses, foi nítida a campanha promovida pelos meios de comunicação da burguesia. Os ataques no Congresso, com a constituição da CPMI da Reforma Agrária, a tentativa de impor mudanças legislativas para pior, como no caso do Código Florestal e outras iniciativas.
No Poder Judiciário, o ministro Gilmar Mendes se transformou em porta-voz do latifúndio, defendendo sempre e apenas o direito absoluto da propriedade, desconhecendo o que diz a Constituição, e abandonando o posto de magistrado para se transformar em advogado dos interesses dos fazendeiros. Ele nunca se preocupou em receber a CNBB e a CPT para explicar porque, dos 1.600 assassinatos de trabalhadores e lideranças no campo de 1985 para cá, apenas 80 têm processos judiciais, 16 foram condenados e apenas oito estão presos. Nem explicou quais medidas o Poder Judiciário está tomando em relação aos flagrantes delitos contra o meio ambiente e as situações de trabalho escravo do latifúndio.
A senadora Kátia Abreu (DEM-TO), que grilou uma terra pública de 2.500 hectares em Tocantins e expulsou os posseiros pobres, levanta-se como baluarte da tradição, da família e propriedade, sonhando em ser vice na chapa do Serra. Pelo papel que ela tem cumprido à frente da CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil), sabemos que ela vai representar os interesses mais reacionários da burguesia brasileira caso consiga disputar as eleições. Os ataques contra os trabalhadores já começaram. Sabemos que podem piorar.
3. Nossa ação
Nos mobilizamos, primeiro, para dizer para a sociedade brasileira que precisamos de mudanças estruturais na propriedade da terra, garantindo a democratização desse bem da natureza que a Constituição garante a todos os brasileiros. Para dizer que o modelo do agronegócio é prejudicial para nossa sociedade, pois produz apenas commodities para exportação, produz em larga escala somente com venenos, transformando o Brasil no maior consumidor mundial de agrotóxicos. Denunciamos ainda que a forma de produzir do agronegócio, além de superexplorar os trabalhadores, degrada o meio ambiente, contribuindo para as mudanças climáticas que afetam a todos.
Nossa mobilização neste abril foi vitoriosa. Milhares de trabalhadores protestaram em quase todos os estados do país. Em todos os lugares a sociedade nos apoiou de diferentes formas. Sem a solidariedade de tantas entidades, sindicatos, igrejas e pessoas de boa vontade seria impossível levar adiante a luta em condiçoes tão adversas. Nos mobilizamos para exigir do governo que honre seus compromissos: que recupere o orçamento do Incra; que viabilize recursos para a desapropriação das fazendas com processos prontos; que publique a portaria que atualiza os índices de produtividade, e que discuta seriamente formas concretas de organizar a produção nos assentamentos. Que cumpra o compromisso de assentar as famílias acampadas há tantos anos.
Fizemos reuniões com diversos ministros: do Planejamento, da Secretaria da Presidência, do MDA. Esperamos que os compromissos sejam, de fato, assumidos e viabilizados. De nossa parte, como movimento social, temos o dever e o direito de seguir organizando os trabalhadores do campo, para que lutemos por nossos direitos. Estaremos atentos.
E conclamamos a todos setores organizados das forças populares a se prepararem e somarem forças na jornada de 18 de maio, para uma mobilização nacional em prol da redução da jornada de 44 para 40 horas semanais, sem redução de salários.
Lutar por Justiça Social é nosso direito.
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O Brasil e a grande recusa argentina
Reproduzo artigo enviado pelo professor e amigo Gilson Caroni:
A condenação de cinco ex-comandantes e do último ditador argentino, general Reinaldo Bignone (1982-1983) por detenção ilegal e tortura de presos políticos, mostra a dimensão poética do regime democrático. Se toda poesia é um ato de assombro, a plenitude dos direitos humanos só existe em sociedades que se reinventam em suas grandes recusas. O espanto diante da beleza da vida só é possível quando conjugado a um inequívoco terror diante do sofrimento humano. Não há liberdade sem negações assertivas, sem um não inaugural. Quando a tensão dialética dá lugar pactos políticos íntraelites, as transições para a democracia costumam não passar de perigosos pastiches.
Os julgamentos dos acusados de crimes durante a ditadura militar foram retomados em 2005, depois da revogação das “leis do perdão" – Ponto Final e Obediência devida – aprovadas na década de 1980. Ao revogá-las, o ex-presidente Néstor Kirchner reafirmou que, em sociedades autenticamente democráticas, não existem Constituições que contemplem tutelas fardadas sobre o Estado e os poderes da República. Se permanecerem frágeis as mediações entre política e sociedade, a possibilidade de recuo para formas nitidamente autoritárias conserva-se como espectro a rondar conquistas recentes. Quando se definiu como “filho" das mães e avós da Praça de Maio, Kirchner voltou no tempo para resgatar o futuro.
Em 1983, a sociedade civil argentina reagiu de forma claramente adversa à lei de anistia que o regime militar acabara de proclamar. Várias organizações de direitos humanos mantiveram milhares de pessoas nas ruas pedindo a aparição com vida dos desaparecidos e a punição dos responsáveis por tudo. Eram estes os dois objetivos que o projeto dos militares pretendia frustrar: sem a grande recusa não se poderia investigar o destino das vítimas da ditadura, e punir os agentes do Estado envolvidos com o desaparecimento de mais de 30 mil pessoas, das quais aproximadamente 400 eram crianças.
A “lei da anistia" beneficiava, fundamentalmente, os autores de "todos os fatos de natureza penal realizados na ocasião ou por motivos de ações dirigidas a prevenir, conjurar, ou acabar com as atividades terroristas, qualquer que seja o bem jurídico lesado", compreendendo "os delitos comuns conexos e os delitos militares conexos"; determinava ainda que ninguém poderia ser " interrogado, investigado, convocado a depor ou inquirido" sobre aqueles fatos. Não fosse a firme resistência da sociedade argentina, este dispositivo legal impossibilitaria às famílias dos desaparecidos de lutar por sua recuperação, saber por que foram presos ou mortos e, neste último caso, recuperar seus restos.
Há 27 anos, a resistência democrática preservou a justiça reclamada e sustentou seus princípios. Rejeitou um diploma que consagrava, perigosamente, o princípio da impunidade para uma repressão ilegal que, pela sua natureza e magnitude, agravou a consciência ética da humanidade. Era o primeiro passo para a reconstrução do tecido social, para a consolidação de uma cultura democrática que faria dos direitos humanos uma política de Estado. O general Bignone talvez não saiba, mas foi aquele o momento em que seu julgamento começou. O dele e o de vários oficiais da ditadura que foram condenados à prisão perpétua.
Seremos efetivamente um país democrático quando aprendermos a lição argentina. Essa luta não é apenas de grupos de direitos humanos e membros do governo, como o ministro Paulo Vannucchi, da Secretaria Especial de Direitos Humanos. Reabrir os casos e promover a revisão da Lei da Anistia é ampliar a democracia. Como afirmou Guillermo O'Donnel, cientista político argentino "todas as transições se fizeram pela coligação de alguns contra outros. No Brasil, a transição parece ser tarefa de todos com todos no qual tudo se admite, com exceção do conflito e da competição".
Precisamos decidir o que queremos: ou transformamos nossas “Escolas Mecânicas da Marinha" em Museus da Memória ou deixamos que a consciência da impunidade permaneça como um cadáver que nos sorri. Os “dossiês especiais da Rede Globo” continuam sancionando o consulado militar e sua versão da história. Quando virá nossa recusa?
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A condenação de cinco ex-comandantes e do último ditador argentino, general Reinaldo Bignone (1982-1983) por detenção ilegal e tortura de presos políticos, mostra a dimensão poética do regime democrático. Se toda poesia é um ato de assombro, a plenitude dos direitos humanos só existe em sociedades que se reinventam em suas grandes recusas. O espanto diante da beleza da vida só é possível quando conjugado a um inequívoco terror diante do sofrimento humano. Não há liberdade sem negações assertivas, sem um não inaugural. Quando a tensão dialética dá lugar pactos políticos íntraelites, as transições para a democracia costumam não passar de perigosos pastiches.
Os julgamentos dos acusados de crimes durante a ditadura militar foram retomados em 2005, depois da revogação das “leis do perdão" – Ponto Final e Obediência devida – aprovadas na década de 1980. Ao revogá-las, o ex-presidente Néstor Kirchner reafirmou que, em sociedades autenticamente democráticas, não existem Constituições que contemplem tutelas fardadas sobre o Estado e os poderes da República. Se permanecerem frágeis as mediações entre política e sociedade, a possibilidade de recuo para formas nitidamente autoritárias conserva-se como espectro a rondar conquistas recentes. Quando se definiu como “filho" das mães e avós da Praça de Maio, Kirchner voltou no tempo para resgatar o futuro.
Em 1983, a sociedade civil argentina reagiu de forma claramente adversa à lei de anistia que o regime militar acabara de proclamar. Várias organizações de direitos humanos mantiveram milhares de pessoas nas ruas pedindo a aparição com vida dos desaparecidos e a punição dos responsáveis por tudo. Eram estes os dois objetivos que o projeto dos militares pretendia frustrar: sem a grande recusa não se poderia investigar o destino das vítimas da ditadura, e punir os agentes do Estado envolvidos com o desaparecimento de mais de 30 mil pessoas, das quais aproximadamente 400 eram crianças.
A “lei da anistia" beneficiava, fundamentalmente, os autores de "todos os fatos de natureza penal realizados na ocasião ou por motivos de ações dirigidas a prevenir, conjurar, ou acabar com as atividades terroristas, qualquer que seja o bem jurídico lesado", compreendendo "os delitos comuns conexos e os delitos militares conexos"; determinava ainda que ninguém poderia ser " interrogado, investigado, convocado a depor ou inquirido" sobre aqueles fatos. Não fosse a firme resistência da sociedade argentina, este dispositivo legal impossibilitaria às famílias dos desaparecidos de lutar por sua recuperação, saber por que foram presos ou mortos e, neste último caso, recuperar seus restos.
Há 27 anos, a resistência democrática preservou a justiça reclamada e sustentou seus princípios. Rejeitou um diploma que consagrava, perigosamente, o princípio da impunidade para uma repressão ilegal que, pela sua natureza e magnitude, agravou a consciência ética da humanidade. Era o primeiro passo para a reconstrução do tecido social, para a consolidação de uma cultura democrática que faria dos direitos humanos uma política de Estado. O general Bignone talvez não saiba, mas foi aquele o momento em que seu julgamento começou. O dele e o de vários oficiais da ditadura que foram condenados à prisão perpétua.
Seremos efetivamente um país democrático quando aprendermos a lição argentina. Essa luta não é apenas de grupos de direitos humanos e membros do governo, como o ministro Paulo Vannucchi, da Secretaria Especial de Direitos Humanos. Reabrir os casos e promover a revisão da Lei da Anistia é ampliar a democracia. Como afirmou Guillermo O'Donnel, cientista político argentino "todas as transições se fizeram pela coligação de alguns contra outros. No Brasil, a transição parece ser tarefa de todos com todos no qual tudo se admite, com exceção do conflito e da competição".
Precisamos decidir o que queremos: ou transformamos nossas “Escolas Mecânicas da Marinha" em Museus da Memória ou deixamos que a consciência da impunidade permaneça como um cadáver que nos sorri. Os “dossiês especiais da Rede Globo” continuam sancionando o consulado militar e sua versão da história. Quando virá nossa recusa?
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Juca Ferreira critica a qualidade da TV
Reproduzo alguns trechos da entrevista de Juca Ferreira, ministro da Cultura, concedida à jornalista Lúcia Rodrigues da revista Caros Amigos:
Ex-presidente da União Brasileira de Estudantes Secundaristas, ex-militante do MR-8 no tempo da luta armada contra a ditadura militar, o atual ministro da Cultura, João Luiz Silva Ferreira, mais conhecido como Juca Ferreira, baiano de Salvador, chegou ao ministério pelas mãos de seu amigo Gilberto Gil. Assumiu o cargo com a saída do ex-ministro e tem dado continuidade ao trabalho de valorizar as manifestações culturais criadas pela comunidade, respeitando a diversidade dos mais diferentes pontos do território nacional. Os Pontos de Cultura cadastrados pelo ministério animam cerca de quatro mil grupos de produção cultural.
Nesta entrevista exclusiva para Caros Amigos, Juca Ferreira fala da atuação do ministério, das atividades culturais e dos meios de comunicação. Ele considera a televisão um “meio incrível”, e admite que “a qualidade da TV brasileira é muito baixa”.
Como o ministério está atuando na sua gestão para preservar a cultura brasileira?
A cultura brasileira não precisa de uma política de preservação nesse sentido. Claro que há uma política de patrimômio, que é uma política de preservação em última instância, mas a estratégia é de desenvolvimento cultural. Eu penso mais em expansão e desenvolvimento do que proteção. A nossa cultura é de boa cepa e tem condições de se desenvolver nesse ambiente de contato e signos e conteúdos vindos de outros países. Acredito que se criarmos igualdade de condições a cultura brasileira se desenvolve.
Como o senhor define a TV brasileira hoje?
A gente incorporou a TV como parte da política cultural. Não só a TV pública como a TV privada também. A convergência digital, dos diversos suportes e mídias tem permitido que a gente pense para além da produção do cinema, que a gente pense a produção do audiovisual. Esses conteúdos migram de uma tela para outra, então é do nosso interesse, é talvez o meio mais popular, um dos mais importantes. Mas a qualidade da televisão brasileira é muito baixa. A nossa tradição é mais da TV de entretenimento, e não satisfaz as necessidades da população. Então é preciso contribuir para a elevação do padrão, seja através da TV pública seja através de estimular que as TVs privadas avancem sua programação, sua grade para coisas mais qualificadas.
Além do entretenimento, que o senhor ressalta, a gente observa o emburrecimento, o Big Brother é um programa que...
É, mas o mundo inteiro gosta. A humanidade tem vínculos com esse tipo de produção. É um voyeurismo. A banalidade exerce um fascínio enorme sobre as pessoas.
O senhor acha que é uma coisa a ficar, ou dá para reverter e entregar para a população um produto de qualidade?
É, mas eu sou a favor da liberdade de escolha por parte da população. Quem quer ver Big Brother que veja. Eu sou uma pessoa que gosta do meio televisão. Às vezes eu assisto coisas absolutamente banais, mas assisto me distanciando, como acredito que a maioria das pessoas faz. Ali é um pretexto para uma série de observações. Eu gosto desses programas de auditório. Se você me perguntar, eu diria que o padrão é baixo, mas tem alguma coisa que me interessa ali. Desde Chacrinha eu gostava.
O senhor assiste Silvio Santos, Faustão?
Eu zapeio muito, mas assisto, sim. Vejo Ratinho, tenho curiosidade. Acho a TV um meio incrível.
Mas o senhor não acha que são programas de baixa qualidade de conteúdo, que contribuem para um conservadorismo, como o caso do programa do Ratinho, que achincalhava as pessoas?
Achicalhando as pessoas, usando as aberrações... É verdade isso. Mas os circos medievais faziam isso. A humanidade tem uma atração.
O senhor considera que a produção regional ainda está muito aquém do que poderia ser? O eixo Rio São Paulo concentra o maior número de emissoras A regionalização do conteúdo da comunicação não é uma saída?
Nenhum país democrático do mundo permite que os radiodifusores transmitam em cadeia nacional o tempo todo. A Suécia é um pouco maior do que Sergipe, tem três regiões culturais, e na época que eu morava lá se não me engano só podia transmitir em rede nacional 25% do total do tempo. O resto tinha que regionalizar para dar emprego, para permitir que a cultura nacional aparecesse. Isso num país de dimensões continentais como o Brasil é um absurdo funcionar o tempo inteiro em rede nacional. Nos Estados Unidos também tem limites, na Europa toda, aqui é que o regime militar achava que tinha que uniformizar culturalmente. Havia uma desconfiança com a diversidade cultural brasileira, que ela pudesse produzir uma dispersão, uma fragmentação do país, por isso que ela incentivou essa homogeneização.
E o que se pode fazer para conseguir avançar nesse sentido, se produzir mais regionalmente?
Acho que a regulação tem que avançar. O PL 29 que está tramitando vai regulamentar a TV a cabo, vai obrigar o percentual de produção brasileira, vai obrigar a produção independente. O Minc tem entrado aos poucos, mas cada vez mais como um fator de estímulo à melhoria tanto na regulamentação, como na área de estímulo à produção.
Tem outro problema que é o conteúdo que vem de fora. Mesmo nas TVs a cabo, acontece um bombardeamento de programas e filmes que vem de fora. Como fazer para reverter essa situação?
Tem que ter percentuais mínimos para conteúdos brasileiros. Isso eu defendo, é necessário. O cinema brasileiro é quase estrangeiro nas salas de exibição e isso tem que mudar, tem que avançar. A gente faz o filme para quem vê, e se nas salas de exibição brasileira o cinema americano é soberano e na televisão também. A gente tem que ter um pouco de soberania no audiovisual brasileiro.
Como daria para fazer incentivo ao cinema nacional?
Uma parte a gente já tratou, que é abrir as salas de exibição para o conteúdo nacional. Temos que ter percentuais garantidos, de que quando um filme brasileiro esteja com um nível de público acima da média, o exibidor não tire para passar um filme estrangeiro, que muitas vezes tem um público menor do que aquele filme. Volta e meia acontece isso. O filme do Daniel Filho “Se eu fosse você” saiu antes de realizar sua missão comercial. O “Besouro” também estava acima da média de público quando foi tirado. Isso é um crime contra o cinema brasileiro. Os filmes que substituem essas produções brasileiras compram pacotes, é dumping, é proibido pela legislação brasileira.
A gente percebe que tem muito enlatado de péssima qualidade que vem para cá e fica aí...
Se fosse de péssima qualidade mas alta aceitação de público é um fato. Mas se é de péssima qualidade, baixo público e menor que o público brasileiro. Isso é o máximo do escândalo.
Mas o senhor não considera, por exemplo, que tem uma aceitação do público porque é aquilo que é oferecido. Se você começa a oferecer um filme de qualidade nacional essa aceitação vem naturalmente?
Historicamente, o público do cinema brasileiro são as classes C, D e E. Com esse encolhimento dessa rede de exibição, o cinema brasileiro ficou sem seu público. Nas salas de shopping center que tem como seu público principal a classe média, a disputa é braba porque há um deslumbramento pelo cinema americano. Há toda uma indústria por detrás que promove esses filmes. Então, pelo nosso lado temos que aumentar o interesse aumentando a qualidade do cinema brasileiro, fazendo filmes que conquistem o público.
Tem um problema de produção também. A gente saiu de pouco mais de 20 filmes ao ano, quando entramos no ministério, e estamos com quase cem filmes ano. Mas muitos desses filmes nem contribuem para o desenvolvimento da linguagem e nem para o aumento de público, que seriam os dois grandes critérios. O que o Ministério da Cultura pode fazer? Aumentar o padrão dos roteiristas, desenvolver linguagens cativantes e atraentes para um número cada vez maior de público. O papel do ministério é estimular isso, criar critérios na disponibilização dos recursos que levem à melhoria do padrão da linguagem e para a conquista de parcelas do público.
E a Embrafilme não seria uma saída para isso?
A gente está disponibilizando mais dinheiro que a Embrafilme. É mais complexo do que a Embrafilme. Precisamos recuperar o cinema popular no Brasil. Está começando aí. Tem vários filmes que tem bombado. Temos que aumentar a cota de filmes que tem capacidade de bombar e por outro lado financiar os filmes que mesmo com pouco público contribuam para o desenvolvimento da linguagem cinematográfica. Existe o problema da distribuição. Precisamos estimular a distribuição brasileira para que possa atuar também no exterior. O ministério tem investido nisso, em apoiar a venda do cinema brasileiro e dos conteúdos audiovisuais brasileiros no exterior. É um processo mais global. Uma distribuidora estatal poderia contribuir assim como o crescimento das distribuidoras privadas. Eu não me fixaria como única alternativa uma distribuidora pública.
Quanto que o ministério investe de recursos em cinema nacional?
Eu não lembro, mas é mais do que da época da Embrafilme. Quando chegamos ao ministério, os recursos orçamentários eram em média 280 e poucos milhões, correspondiam a 0,2 do total do orçamento do governo federal. Passamos esse ano de 2010 de 1% que é o mínimo recomendado pelas Nações Unidas, que corresponde a 2,5 bilhões. Além disso, quando chegamos, a renúncia fiscal era menos de 300 milhões, e agora está em 1 bilhão e meio. E estamos avançando nas regras de disponibilização de recursos. Criamos o fundo setorial do audiovisual, estamos lançando linhas de financiamento junto com o BNDES para financiar a ampliação das salas de exibição, estamos lançando o Vale Cultura, que vai injetar 7 bilhões da economia da cultura. São várias ações convergindo no Estado apoiar e incentivar o crescimento da arte e da cultura no país.
Como funciona o Vale Cultura?
É muito parecido com o Vale Refeição, mas um é para alimentar o estômago e outro para alimentar o espírito. É um cartão magnético que é disponibilizado para o trabalhador com um valor nominal de 50 reais para ele comprar livro, comprar CD, assistir espetáculo de dança, de música, para consumo cultural. Percebemos que não adiantava estimular a produção se o índice de acesso é muito pequeno. O Vale Cultura vai produzir efeitos colaterais muito positivos. Como o controle do uso vai ser muito grande. Vai estimular o consumo do CD legal. Vai estimular abertura de negócios culturais perto de onde os trabalhadores moram. É uma novidade que está sendo estudada até por outros países. Vai incluir 14 milhões de pessoas no consumo cultural.
Em que pé estão as discussões em torno da Lei Rouanet?
Eu rodei o Brasil defendendo a mudança da Lei Rouanet. As estatísticas provam que a lei esgotou o que podia dar de positivo e houve muitas distorções. 80% do dinheiro da lei vai para os Estados de Rio e São Paulo e 60% do dinheiro fica em duas cidades, Rio e São Paulo. 3% dos proponentes ficam com mais da metade desse dinheiro. São sempre os mesmos. Tem estados que não recebem nem 0,0%, então a gente vai democratizar o acesso, disponibilizar o benefício da renúncia fiscal para todas as áreas da cultura, demandar de que os empresários entendam que essa é uma parceria público privada e que não pode ser 100% de renúncias. Se fosse assim, não precisaria de empresas. Nesses 19 anos de Lei Rouanet, foi só 5% de dinheiro privado, então a gente está exigindo um mínimo de 20% de dinheiro privado.
A crítica dos opositores da Lei é de que haverá muita centralização, como o senhor vê isso?
Isso é uma bobagem. Hoje, o ministério avalia as propostas, emite um parecer favorável ou contrário demandando o aperfeiçoamento, vai para a Comissão Nacional de Incentivo à Cultura, que é bipartite. Eles sacralizam ou não o parecer. E vai continuar a mesma coisa. E mais, a gente vai fortalecer o Fundo Nacional de Cultura, Fundo Setorial da Música, da Dança, do Patrimônio.
Os recursos vão todos para esses fundos?
80% vão para os Fundos. Hoje 80% vai para renúncia sem critério o que dificulta muito o desenvolvimento cultural e reduz muito o papel do Estado no apoio à produção cultural brasileira. Permite essas distorções de concentração. Os ingleses estão visitando o Brasil são responsáveis pela política cultural do Reino Unido, disseram que Lei Rouanet jamais poderia acontecer na Inglaterra.
Por que?
Porque segundo eles, e eu concordo, cada centavo que é renunciado, é um centavo a menos a ser disponibilizado para a produção cultural. A visão deles é que mecenato é quando mecenas coloca a mão no próprio bolso para fazer uma benesse cultural. Não é meter a mão no bolso do Estado. O Estado tem a sua responsabilidade muitas vezes de estimular, financiar uma atividade que não é lucrativa e portanto não é atraente para a iniciativa privada. Nem retorno de imagem dá.
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Ex-presidente da União Brasileira de Estudantes Secundaristas, ex-militante do MR-8 no tempo da luta armada contra a ditadura militar, o atual ministro da Cultura, João Luiz Silva Ferreira, mais conhecido como Juca Ferreira, baiano de Salvador, chegou ao ministério pelas mãos de seu amigo Gilberto Gil. Assumiu o cargo com a saída do ex-ministro e tem dado continuidade ao trabalho de valorizar as manifestações culturais criadas pela comunidade, respeitando a diversidade dos mais diferentes pontos do território nacional. Os Pontos de Cultura cadastrados pelo ministério animam cerca de quatro mil grupos de produção cultural.
Nesta entrevista exclusiva para Caros Amigos, Juca Ferreira fala da atuação do ministério, das atividades culturais e dos meios de comunicação. Ele considera a televisão um “meio incrível”, e admite que “a qualidade da TV brasileira é muito baixa”.
Como o ministério está atuando na sua gestão para preservar a cultura brasileira?
A cultura brasileira não precisa de uma política de preservação nesse sentido. Claro que há uma política de patrimômio, que é uma política de preservação em última instância, mas a estratégia é de desenvolvimento cultural. Eu penso mais em expansão e desenvolvimento do que proteção. A nossa cultura é de boa cepa e tem condições de se desenvolver nesse ambiente de contato e signos e conteúdos vindos de outros países. Acredito que se criarmos igualdade de condições a cultura brasileira se desenvolve.
Como o senhor define a TV brasileira hoje?
A gente incorporou a TV como parte da política cultural. Não só a TV pública como a TV privada também. A convergência digital, dos diversos suportes e mídias tem permitido que a gente pense para além da produção do cinema, que a gente pense a produção do audiovisual. Esses conteúdos migram de uma tela para outra, então é do nosso interesse, é talvez o meio mais popular, um dos mais importantes. Mas a qualidade da televisão brasileira é muito baixa. A nossa tradição é mais da TV de entretenimento, e não satisfaz as necessidades da população. Então é preciso contribuir para a elevação do padrão, seja através da TV pública seja através de estimular que as TVs privadas avancem sua programação, sua grade para coisas mais qualificadas.
Além do entretenimento, que o senhor ressalta, a gente observa o emburrecimento, o Big Brother é um programa que...
É, mas o mundo inteiro gosta. A humanidade tem vínculos com esse tipo de produção. É um voyeurismo. A banalidade exerce um fascínio enorme sobre as pessoas.
O senhor acha que é uma coisa a ficar, ou dá para reverter e entregar para a população um produto de qualidade?
É, mas eu sou a favor da liberdade de escolha por parte da população. Quem quer ver Big Brother que veja. Eu sou uma pessoa que gosta do meio televisão. Às vezes eu assisto coisas absolutamente banais, mas assisto me distanciando, como acredito que a maioria das pessoas faz. Ali é um pretexto para uma série de observações. Eu gosto desses programas de auditório. Se você me perguntar, eu diria que o padrão é baixo, mas tem alguma coisa que me interessa ali. Desde Chacrinha eu gostava.
O senhor assiste Silvio Santos, Faustão?
Eu zapeio muito, mas assisto, sim. Vejo Ratinho, tenho curiosidade. Acho a TV um meio incrível.
Mas o senhor não acha que são programas de baixa qualidade de conteúdo, que contribuem para um conservadorismo, como o caso do programa do Ratinho, que achincalhava as pessoas?
Achicalhando as pessoas, usando as aberrações... É verdade isso. Mas os circos medievais faziam isso. A humanidade tem uma atração.
O senhor considera que a produção regional ainda está muito aquém do que poderia ser? O eixo Rio São Paulo concentra o maior número de emissoras A regionalização do conteúdo da comunicação não é uma saída?
Nenhum país democrático do mundo permite que os radiodifusores transmitam em cadeia nacional o tempo todo. A Suécia é um pouco maior do que Sergipe, tem três regiões culturais, e na época que eu morava lá se não me engano só podia transmitir em rede nacional 25% do total do tempo. O resto tinha que regionalizar para dar emprego, para permitir que a cultura nacional aparecesse. Isso num país de dimensões continentais como o Brasil é um absurdo funcionar o tempo inteiro em rede nacional. Nos Estados Unidos também tem limites, na Europa toda, aqui é que o regime militar achava que tinha que uniformizar culturalmente. Havia uma desconfiança com a diversidade cultural brasileira, que ela pudesse produzir uma dispersão, uma fragmentação do país, por isso que ela incentivou essa homogeneização.
E o que se pode fazer para conseguir avançar nesse sentido, se produzir mais regionalmente?
Acho que a regulação tem que avançar. O PL 29 que está tramitando vai regulamentar a TV a cabo, vai obrigar o percentual de produção brasileira, vai obrigar a produção independente. O Minc tem entrado aos poucos, mas cada vez mais como um fator de estímulo à melhoria tanto na regulamentação, como na área de estímulo à produção.
Tem outro problema que é o conteúdo que vem de fora. Mesmo nas TVs a cabo, acontece um bombardeamento de programas e filmes que vem de fora. Como fazer para reverter essa situação?
Tem que ter percentuais mínimos para conteúdos brasileiros. Isso eu defendo, é necessário. O cinema brasileiro é quase estrangeiro nas salas de exibição e isso tem que mudar, tem que avançar. A gente faz o filme para quem vê, e se nas salas de exibição brasileira o cinema americano é soberano e na televisão também. A gente tem que ter um pouco de soberania no audiovisual brasileiro.
Como daria para fazer incentivo ao cinema nacional?
Uma parte a gente já tratou, que é abrir as salas de exibição para o conteúdo nacional. Temos que ter percentuais garantidos, de que quando um filme brasileiro esteja com um nível de público acima da média, o exibidor não tire para passar um filme estrangeiro, que muitas vezes tem um público menor do que aquele filme. Volta e meia acontece isso. O filme do Daniel Filho “Se eu fosse você” saiu antes de realizar sua missão comercial. O “Besouro” também estava acima da média de público quando foi tirado. Isso é um crime contra o cinema brasileiro. Os filmes que substituem essas produções brasileiras compram pacotes, é dumping, é proibido pela legislação brasileira.
A gente percebe que tem muito enlatado de péssima qualidade que vem para cá e fica aí...
Se fosse de péssima qualidade mas alta aceitação de público é um fato. Mas se é de péssima qualidade, baixo público e menor que o público brasileiro. Isso é o máximo do escândalo.
Mas o senhor não considera, por exemplo, que tem uma aceitação do público porque é aquilo que é oferecido. Se você começa a oferecer um filme de qualidade nacional essa aceitação vem naturalmente?
Historicamente, o público do cinema brasileiro são as classes C, D e E. Com esse encolhimento dessa rede de exibição, o cinema brasileiro ficou sem seu público. Nas salas de shopping center que tem como seu público principal a classe média, a disputa é braba porque há um deslumbramento pelo cinema americano. Há toda uma indústria por detrás que promove esses filmes. Então, pelo nosso lado temos que aumentar o interesse aumentando a qualidade do cinema brasileiro, fazendo filmes que conquistem o público.
Tem um problema de produção também. A gente saiu de pouco mais de 20 filmes ao ano, quando entramos no ministério, e estamos com quase cem filmes ano. Mas muitos desses filmes nem contribuem para o desenvolvimento da linguagem e nem para o aumento de público, que seriam os dois grandes critérios. O que o Ministério da Cultura pode fazer? Aumentar o padrão dos roteiristas, desenvolver linguagens cativantes e atraentes para um número cada vez maior de público. O papel do ministério é estimular isso, criar critérios na disponibilização dos recursos que levem à melhoria do padrão da linguagem e para a conquista de parcelas do público.
E a Embrafilme não seria uma saída para isso?
A gente está disponibilizando mais dinheiro que a Embrafilme. É mais complexo do que a Embrafilme. Precisamos recuperar o cinema popular no Brasil. Está começando aí. Tem vários filmes que tem bombado. Temos que aumentar a cota de filmes que tem capacidade de bombar e por outro lado financiar os filmes que mesmo com pouco público contribuam para o desenvolvimento da linguagem cinematográfica. Existe o problema da distribuição. Precisamos estimular a distribuição brasileira para que possa atuar também no exterior. O ministério tem investido nisso, em apoiar a venda do cinema brasileiro e dos conteúdos audiovisuais brasileiros no exterior. É um processo mais global. Uma distribuidora estatal poderia contribuir assim como o crescimento das distribuidoras privadas. Eu não me fixaria como única alternativa uma distribuidora pública.
Quanto que o ministério investe de recursos em cinema nacional?
Eu não lembro, mas é mais do que da época da Embrafilme. Quando chegamos ao ministério, os recursos orçamentários eram em média 280 e poucos milhões, correspondiam a 0,2 do total do orçamento do governo federal. Passamos esse ano de 2010 de 1% que é o mínimo recomendado pelas Nações Unidas, que corresponde a 2,5 bilhões. Além disso, quando chegamos, a renúncia fiscal era menos de 300 milhões, e agora está em 1 bilhão e meio. E estamos avançando nas regras de disponibilização de recursos. Criamos o fundo setorial do audiovisual, estamos lançando linhas de financiamento junto com o BNDES para financiar a ampliação das salas de exibição, estamos lançando o Vale Cultura, que vai injetar 7 bilhões da economia da cultura. São várias ações convergindo no Estado apoiar e incentivar o crescimento da arte e da cultura no país.
Como funciona o Vale Cultura?
É muito parecido com o Vale Refeição, mas um é para alimentar o estômago e outro para alimentar o espírito. É um cartão magnético que é disponibilizado para o trabalhador com um valor nominal de 50 reais para ele comprar livro, comprar CD, assistir espetáculo de dança, de música, para consumo cultural. Percebemos que não adiantava estimular a produção se o índice de acesso é muito pequeno. O Vale Cultura vai produzir efeitos colaterais muito positivos. Como o controle do uso vai ser muito grande. Vai estimular o consumo do CD legal. Vai estimular abertura de negócios culturais perto de onde os trabalhadores moram. É uma novidade que está sendo estudada até por outros países. Vai incluir 14 milhões de pessoas no consumo cultural.
Em que pé estão as discussões em torno da Lei Rouanet?
Eu rodei o Brasil defendendo a mudança da Lei Rouanet. As estatísticas provam que a lei esgotou o que podia dar de positivo e houve muitas distorções. 80% do dinheiro da lei vai para os Estados de Rio e São Paulo e 60% do dinheiro fica em duas cidades, Rio e São Paulo. 3% dos proponentes ficam com mais da metade desse dinheiro. São sempre os mesmos. Tem estados que não recebem nem 0,0%, então a gente vai democratizar o acesso, disponibilizar o benefício da renúncia fiscal para todas as áreas da cultura, demandar de que os empresários entendam que essa é uma parceria público privada e que não pode ser 100% de renúncias. Se fosse assim, não precisaria de empresas. Nesses 19 anos de Lei Rouanet, foi só 5% de dinheiro privado, então a gente está exigindo um mínimo de 20% de dinheiro privado.
A crítica dos opositores da Lei é de que haverá muita centralização, como o senhor vê isso?
Isso é uma bobagem. Hoje, o ministério avalia as propostas, emite um parecer favorável ou contrário demandando o aperfeiçoamento, vai para a Comissão Nacional de Incentivo à Cultura, que é bipartite. Eles sacralizam ou não o parecer. E vai continuar a mesma coisa. E mais, a gente vai fortalecer o Fundo Nacional de Cultura, Fundo Setorial da Música, da Dança, do Patrimônio.
Os recursos vão todos para esses fundos?
80% vão para os Fundos. Hoje 80% vai para renúncia sem critério o que dificulta muito o desenvolvimento cultural e reduz muito o papel do Estado no apoio à produção cultural brasileira. Permite essas distorções de concentração. Os ingleses estão visitando o Brasil são responsáveis pela política cultural do Reino Unido, disseram que Lei Rouanet jamais poderia acontecer na Inglaterra.
Por que?
Porque segundo eles, e eu concordo, cada centavo que é renunciado, é um centavo a menos a ser disponibilizado para a produção cultural. A visão deles é que mecenato é quando mecenas coloca a mão no próprio bolso para fazer uma benesse cultural. Não é meter a mão no bolso do Estado. O Estado tem a sua responsabilidade muitas vezes de estimular, financiar uma atividade que não é lucrativa e portanto não é atraente para a iniciativa privada. Nem retorno de imagem dá.
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Karl Marx e a questão judaica
A Boitempo acaba de publicar o oitava livro da coletânea de Karl Marx e Friedrich Engels – “Sobre a questão judaica”. A série teve início com a edição comemorativa dos 150 anos do “Manifesto Comunista”. Em seguida foram lançados: “A sagrada família”, “Os manuscritos econômico-filosóficos”, “Crítica da filosofia do direito de Hegel”, “Sobre o suicídio”, “A ideologia alemã” e “A situação da classe trabalhadora na Inglaterra”. O novo lançamento traz a apresentaçao de Daniel Bensaïd, num dos últimos textos escritos pelo filósofo e militante político francês falecido em janeiro último. Reproduzo abaixo a resenha de Arlene Clemesha:
“Sobre a questão judaica”, ensaio de Karl Marx redigido em 1843 e publicado em 1844 no único número dos Anais Franco-Alemães, é considerado um marco na passagem do democratismo liberal-radical de sua primeira juventude em direção ao comunismo. Foi também seu único texto dedicado exclusivamente ao tema. Com seu modo caracteristicamente antitético de escrever, “Sobre a questão judaica” provocou as reações mais diversas. Marx viria a ser acusado de antijudeu, não obstante sua conhecida origem judaica; e seu ensaio, de constituir um chamado precoce à aniquilação física dos judeus da Europa, cem anos antes do nazismo. Acusações estas que seriam, no mínimo, decorrência de leituras superficiais e fora de contexto. Na realidade, Marx transforma a análise da religião e da questão judaica em uma profunda crítica social. O verdadeiro problema colocado aos judeus, diria Marx, seria ultrapassar o estágio da conquista da igualdade civil – resultado da emancipação política – rumo à verdadeira igualdade, como fruto da emancipação social.
O Estado moderno, outra preocupação central de Marx nesse momento, seria a própria expressão de uma sociedade fundada sobre a desigualdade entre os homens. Ao realizar a igualdade no plano político – mediante a concessão de direitos iguais a todos os cidadãos independentemente de posse, religião ou etnia –, o Estado moderno preservava a desigualdade real entre os homens. Daí a passagem mais polêmica, na qual Marx explica que para se libertar verdadeiramente, os judeus devem se emancipar do elemento social que ao longo da história moderna possibilitou, ao mesmo tempo, a preservação do judaísmo e a perseguição aos judeus, qual seja, o próprio capitalismo (“a emancipação social do judeu equivale à emancipação da sociedade em relação ao judaísmo”, diria Marx, empregando “judaísmo”, isto é, Judentum, no sentido derivativo de “comércio” que o termo possuía na época, sob influência de seus contemporâneos Moses Hess e Feuerbach). Hoje, pode-se dizer que o texto de Marx é tão atual quanto a constatação de que sequer a criação de um Estado judeu foi capaz de resolver a questão judaica. Pelo contrário, o Estado exclusivista judeu, fundado sobre a base da segregação racial dos árabes palestinos, apenas acrescentou ao problema judeu o problema palestino.
Longe de constituir um lapso na trajetória intelectual de Marx, como quiseram alguns, o ensaio aqui apresentado marca o assentamento das bases do materialismo histórico, mediante a total integração, pela primeira vez na obra de Marx, do homem na sociedade e da atividade humana na atividade social. Ou seja, a união interativa entre sujeito e objeto, entre o homem e o seu meio. Sem ter chegado ainda à visão do proletariado como a única classe portadora do universal, o profundo humanismo expresso por Marx nos Anais Franco-Alemães é inseparável da defesa da transformação social.
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“Sobre a questão judaica”, ensaio de Karl Marx redigido em 1843 e publicado em 1844 no único número dos Anais Franco-Alemães, é considerado um marco na passagem do democratismo liberal-radical de sua primeira juventude em direção ao comunismo. Foi também seu único texto dedicado exclusivamente ao tema. Com seu modo caracteristicamente antitético de escrever, “Sobre a questão judaica” provocou as reações mais diversas. Marx viria a ser acusado de antijudeu, não obstante sua conhecida origem judaica; e seu ensaio, de constituir um chamado precoce à aniquilação física dos judeus da Europa, cem anos antes do nazismo. Acusações estas que seriam, no mínimo, decorrência de leituras superficiais e fora de contexto. Na realidade, Marx transforma a análise da religião e da questão judaica em uma profunda crítica social. O verdadeiro problema colocado aos judeus, diria Marx, seria ultrapassar o estágio da conquista da igualdade civil – resultado da emancipação política – rumo à verdadeira igualdade, como fruto da emancipação social.
O Estado moderno, outra preocupação central de Marx nesse momento, seria a própria expressão de uma sociedade fundada sobre a desigualdade entre os homens. Ao realizar a igualdade no plano político – mediante a concessão de direitos iguais a todos os cidadãos independentemente de posse, religião ou etnia –, o Estado moderno preservava a desigualdade real entre os homens. Daí a passagem mais polêmica, na qual Marx explica que para se libertar verdadeiramente, os judeus devem se emancipar do elemento social que ao longo da história moderna possibilitou, ao mesmo tempo, a preservação do judaísmo e a perseguição aos judeus, qual seja, o próprio capitalismo (“a emancipação social do judeu equivale à emancipação da sociedade em relação ao judaísmo”, diria Marx, empregando “judaísmo”, isto é, Judentum, no sentido derivativo de “comércio” que o termo possuía na época, sob influência de seus contemporâneos Moses Hess e Feuerbach). Hoje, pode-se dizer que o texto de Marx é tão atual quanto a constatação de que sequer a criação de um Estado judeu foi capaz de resolver a questão judaica. Pelo contrário, o Estado exclusivista judeu, fundado sobre a base da segregação racial dos árabes palestinos, apenas acrescentou ao problema judeu o problema palestino.
Longe de constituir um lapso na trajetória intelectual de Marx, como quiseram alguns, o ensaio aqui apresentado marca o assentamento das bases do materialismo histórico, mediante a total integração, pela primeira vez na obra de Marx, do homem na sociedade e da atividade humana na atividade social. Ou seja, a união interativa entre sujeito e objeto, entre o homem e o seu meio. Sem ter chegado ainda à visão do proletariado como a única classe portadora do universal, o profundo humanismo expresso por Marx nos Anais Franco-Alemães é inseparável da defesa da transformação social.
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PSDB, FMI e a turma dos 30%
Reproduzo exclente análise enviada pelo amigo Artur Araújo:
O espectro de uma pergunta deveria estar rondando as redações e, se formulada, desnudaria o que realmente separa as duas principais candidaturas à presidência. Bastaria indagar de José Serra: “o senhor propõe parar o Brasil?”
Explico-me, a partir de três exemplos muito recentes: um artigo de Luis Carlos Mendonça de Barros, as manchetes sobre a orientação do FMI para que o Brasil reduza sua taxa de crescimento e os 50 anos de Brasília.
Em artigo publicado na FSP de 16/04, Mendonça de Barros, o ex-ministro de FHC de volta a sua vida de financista, desnuda o que é o coração da "economia política" do PSDB. Tido e havido como desenvolvimentista, anti-Malan, da escola de Sérgio Guerra e José Serra, Mendonça tem uma tese: "a euforia pelo crescimento nos levará a bater no muro das restrições econômicas; esse filme tem final triste". E para quem esperava as clássicas formulações – sobre os gargalos de infraestrutura, a baixa taxa de expansão da capacidade instalada, a "gastança” em custeio que impede o investimento público – ele abre seu coração e surpreende:
“A maior parte da oferta na economia brasileira é constituída por bens e serviços que não podem ser importados. O mais importante deles é o mercado de trabalho e nele é que está a componente mais ameaçadora que vejo para a frente... Poderemos chegar ao fim deste ano com uma taxa de desemprego da ordem de 6%, mantido o crescimento atual da geração de postos de trabalho. Em março, o número de empregos formais aumentou em 266 mil, número muito forte para o mês.
“A pressão sobre os salários desse segmento dos trabalhadores já está ocorrendo e deve se acelerar... São evidências de instabilidade grave. Dou um exemplo: a produção de caminhões da Mercedes-Benz brasileira em março foi o dobro da matriz na Alemanha. Mesmo com a crise na Alemanha esse número é um aleijão para mim”.
Trocando em miúdos: crescer rápido é um "problema", porque pode gerar aumentos salariais para os trabalhadores e reduzir a taxa corrente de lucros. A ótica do imediatismo salta aos olhos; nem mesmo de relance, o articulista se refere a um ciclo virtuoso, em que o crescimento real da massa salarial implica ampliação da demanda efetiva, cria as condições para expansão da capacidade produtiva (e da formação de mão-de-obra) e para a expansão da própria acumulação de capital, pelo crescimento do volume produzido e realizado.
O seu negócio é o aqui e agora, é o lucro já e o futuro, provavelmente, nem a Deus pertence. O espantalho que agita é o da inflação de demanda, que se recusa a atacar pela via do choque de oferta, do mercado interno de massas e da expansão das exportações de maior valor agregado. Sua panacéia é o aumento dos juros.
Já na cobertura dos jornais paulistas sobre os 50 anos de Brasília, um velho espectro ressurgiu, explicitamente referido, por exemplo, em editorial de “O Estado de São Paulo”: Brasília, entre outras mil de suas supostas mazelas, estaria na origem da espiral inflacionária do início dos anos 1960. Sem, até hoje, compreender o que de fato Brasília realizou, como meta-síntese do programa de desenvolvimento nacional de Juscelino, as vozes do passado ressurgem, opondo-se às obras públicas, à ação do Estado na criação de infraestrutura, na indução econômica e na integração democrática de todos os brasileiros e de todo o território nacional.
A rádio CBN tem apresentado uma ótima série de reportagens sobre a história da criação de Brasília. Em um dos programas, o tema era o debate na imprensa daquela época. A matéria narrava a campanha cerrada que o engenheiro da UDN Gustavo Corção, guru de Carlos Lacerda, movia contra a construção da cidade. Um de seus temas preferidos era o Lago Paranoá que, do alto de sua sapiência, o Dr. Corção garantia que nunca ficaria cheio, dados o regime de chuvas e as características do solo do cerrado.
No dia em que o lago ficou completo, JK, pleno de mineirice e bom humor, telegrafou para a redação do jornal em que Corção escrevia. Usou uma só palavra: “Encheu”.
O que Juscelino enfrentava era uma herança maldita, um Brasil litorâneo que só via a si mesmo, que desprezava mais de dois terços de seu território. A Marcha para o Oeste significou, muito além de Brasília, a experiência pioneira de Ceres, cidade-modelo agrícola implantada em Goiás, em que se desenvolveram as técnicas de correção de solo que permitiriam a expansão agrícola e que hoje fazem do Brasil um ator mundial em alimentos e biomassa para geração de energia. Significou, também, a abertura da rodovia Belém-Brasília (aquela que a UDN chamava de estrada para onça), articulando os eixos Norte e Oeste do desenvolvimento nacional.
E significou, mais do que tudo, para todos os brasileiros, trabalhadores ou empresários, uma mudança de postura e ângulo; Brasíla permitiu que olhássemos mais e melhor para os nossos próprios potenciais e capacidades.
O FMI, que não é daqui, ecoa a mesma lógica. Seu mais recente relatório, diz a FSP em manchete, “vê economia brasileira ‘no limite’”. Forçado pelos fatos a revisar – para cima – sua estimativa de crescimento da economia do Brasil, “aponta demanda ‘em estágio avançado’ e espera medidas para desacelerar crescimento de 5,5% neste ano para 4,1% em 2011”. Tanta coincidência, até de terminologia, é sintoma de um alinhamento automático, de um modo de pensar e conduzir o país.
O PSDB de hoje, por vezes até mais que os “demos”, olha a economia e o Brasil com esse viés. O que os orienta é o mundo internacional das finanças e a propensão a pensar em pedaços, em satisfazer-se com políticas que miram só um terço dos brasileiros – os mais ricos – e só uma parte de nosso território – o sul-sudeste. É a turma dos 30%.
Expansão de consumo, crescimento de salários, ampliação da produção, desenvolvimento da infraestrutura, inclusão e capacitação das pessoas, todos esses são temas ausentes de suas formulações – ou vistos como “aleijões”. Aumento continuado e real do salário mínimo, instituição de pisos salariais nacionais, redução de jornada de trabalho, pleno emprego, PAC, PROUNI, são pautas que os levam à beira do pânico. Tudo que seja para todos é risco, não oportunidade.
Ainda que se dê a José Serra o benefício da dúvida, do quanto ele ainda preserva de seu suposto desenvolvimentismo, não é despropositado indagar o quanto ele “resistiria” à pressão combinada do tucanato econômico, do udenismo paralisante e elitista e da banca mundial, falando pela boca do FMI. A experiência FHC não traz muitas esperanças quanto a isso. Um jornalista arguto qualificaria a pergunta que abre este texto e questionaria o que o candidato faria com a turma dos 30%, aqueles que, há décadas, sempre estiveram do seu lado e sempre quiseram que o Brasil pudesse menos.
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O espectro de uma pergunta deveria estar rondando as redações e, se formulada, desnudaria o que realmente separa as duas principais candidaturas à presidência. Bastaria indagar de José Serra: “o senhor propõe parar o Brasil?”
Explico-me, a partir de três exemplos muito recentes: um artigo de Luis Carlos Mendonça de Barros, as manchetes sobre a orientação do FMI para que o Brasil reduza sua taxa de crescimento e os 50 anos de Brasília.
Em artigo publicado na FSP de 16/04, Mendonça de Barros, o ex-ministro de FHC de volta a sua vida de financista, desnuda o que é o coração da "economia política" do PSDB. Tido e havido como desenvolvimentista, anti-Malan, da escola de Sérgio Guerra e José Serra, Mendonça tem uma tese: "a euforia pelo crescimento nos levará a bater no muro das restrições econômicas; esse filme tem final triste". E para quem esperava as clássicas formulações – sobre os gargalos de infraestrutura, a baixa taxa de expansão da capacidade instalada, a "gastança” em custeio que impede o investimento público – ele abre seu coração e surpreende:
“A maior parte da oferta na economia brasileira é constituída por bens e serviços que não podem ser importados. O mais importante deles é o mercado de trabalho e nele é que está a componente mais ameaçadora que vejo para a frente... Poderemos chegar ao fim deste ano com uma taxa de desemprego da ordem de 6%, mantido o crescimento atual da geração de postos de trabalho. Em março, o número de empregos formais aumentou em 266 mil, número muito forte para o mês.
“A pressão sobre os salários desse segmento dos trabalhadores já está ocorrendo e deve se acelerar... São evidências de instabilidade grave. Dou um exemplo: a produção de caminhões da Mercedes-Benz brasileira em março foi o dobro da matriz na Alemanha. Mesmo com a crise na Alemanha esse número é um aleijão para mim”.
Trocando em miúdos: crescer rápido é um "problema", porque pode gerar aumentos salariais para os trabalhadores e reduzir a taxa corrente de lucros. A ótica do imediatismo salta aos olhos; nem mesmo de relance, o articulista se refere a um ciclo virtuoso, em que o crescimento real da massa salarial implica ampliação da demanda efetiva, cria as condições para expansão da capacidade produtiva (e da formação de mão-de-obra) e para a expansão da própria acumulação de capital, pelo crescimento do volume produzido e realizado.
O seu negócio é o aqui e agora, é o lucro já e o futuro, provavelmente, nem a Deus pertence. O espantalho que agita é o da inflação de demanda, que se recusa a atacar pela via do choque de oferta, do mercado interno de massas e da expansão das exportações de maior valor agregado. Sua panacéia é o aumento dos juros.
Já na cobertura dos jornais paulistas sobre os 50 anos de Brasília, um velho espectro ressurgiu, explicitamente referido, por exemplo, em editorial de “O Estado de São Paulo”: Brasília, entre outras mil de suas supostas mazelas, estaria na origem da espiral inflacionária do início dos anos 1960. Sem, até hoje, compreender o que de fato Brasília realizou, como meta-síntese do programa de desenvolvimento nacional de Juscelino, as vozes do passado ressurgem, opondo-se às obras públicas, à ação do Estado na criação de infraestrutura, na indução econômica e na integração democrática de todos os brasileiros e de todo o território nacional.
A rádio CBN tem apresentado uma ótima série de reportagens sobre a história da criação de Brasília. Em um dos programas, o tema era o debate na imprensa daquela época. A matéria narrava a campanha cerrada que o engenheiro da UDN Gustavo Corção, guru de Carlos Lacerda, movia contra a construção da cidade. Um de seus temas preferidos era o Lago Paranoá que, do alto de sua sapiência, o Dr. Corção garantia que nunca ficaria cheio, dados o regime de chuvas e as características do solo do cerrado.
No dia em que o lago ficou completo, JK, pleno de mineirice e bom humor, telegrafou para a redação do jornal em que Corção escrevia. Usou uma só palavra: “Encheu”.
O que Juscelino enfrentava era uma herança maldita, um Brasil litorâneo que só via a si mesmo, que desprezava mais de dois terços de seu território. A Marcha para o Oeste significou, muito além de Brasília, a experiência pioneira de Ceres, cidade-modelo agrícola implantada em Goiás, em que se desenvolveram as técnicas de correção de solo que permitiriam a expansão agrícola e que hoje fazem do Brasil um ator mundial em alimentos e biomassa para geração de energia. Significou, também, a abertura da rodovia Belém-Brasília (aquela que a UDN chamava de estrada para onça), articulando os eixos Norte e Oeste do desenvolvimento nacional.
E significou, mais do que tudo, para todos os brasileiros, trabalhadores ou empresários, uma mudança de postura e ângulo; Brasíla permitiu que olhássemos mais e melhor para os nossos próprios potenciais e capacidades.
O FMI, que não é daqui, ecoa a mesma lógica. Seu mais recente relatório, diz a FSP em manchete, “vê economia brasileira ‘no limite’”. Forçado pelos fatos a revisar – para cima – sua estimativa de crescimento da economia do Brasil, “aponta demanda ‘em estágio avançado’ e espera medidas para desacelerar crescimento de 5,5% neste ano para 4,1% em 2011”. Tanta coincidência, até de terminologia, é sintoma de um alinhamento automático, de um modo de pensar e conduzir o país.
O PSDB de hoje, por vezes até mais que os “demos”, olha a economia e o Brasil com esse viés. O que os orienta é o mundo internacional das finanças e a propensão a pensar em pedaços, em satisfazer-se com políticas que miram só um terço dos brasileiros – os mais ricos – e só uma parte de nosso território – o sul-sudeste. É a turma dos 30%.
Expansão de consumo, crescimento de salários, ampliação da produção, desenvolvimento da infraestrutura, inclusão e capacitação das pessoas, todos esses são temas ausentes de suas formulações – ou vistos como “aleijões”. Aumento continuado e real do salário mínimo, instituição de pisos salariais nacionais, redução de jornada de trabalho, pleno emprego, PAC, PROUNI, são pautas que os levam à beira do pânico. Tudo que seja para todos é risco, não oportunidade.
Ainda que se dê a José Serra o benefício da dúvida, do quanto ele ainda preserva de seu suposto desenvolvimentismo, não é despropositado indagar o quanto ele “resistiria” à pressão combinada do tucanato econômico, do udenismo paralisante e elitista e da banca mundial, falando pela boca do FMI. A experiência FHC não traz muitas esperanças quanto a isso. Um jornalista arguto qualificaria a pergunta que abre este texto e questionaria o que o candidato faria com a turma dos 30%, aqueles que, há décadas, sempre estiveram do seu lado e sempre quiseram que o Brasil pudesse menos.
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sábado, 24 de abril de 2010
As pesquisas e a “vacina” democrática
Reproduzo artigo de Eduardo Guimarães, do blog Cidadania.com:
Nesta quinta-feira, 22 de abril de 2010, o Movimento dos Sem Mídia encaminhou ao procurador-geral eleitoral, que é também o procurador-geral da República, o doutor Roberto Gurgel, representação pedindo investigação de todos os quatro grandes institutos de pesquisa de opinião, o Datafolha, o Ibope, o Sensus e o Vox Populi, os quais, tradicionalmente, dedicam-se a captar as diversas intenções de voto do eleitorado brasileiro.
Além de um ato da mais pura, desinteressada e autêntica cidadania, a peça jurídica dessa legítima organização da sociedade civil que é o MSM se materializa em um momento doloroso para os cidadãos brasileiros, no qual, uma vez mais, paira sobre a nação uma sombra de dúvidas quanto às condições em que se dará o processo eleitoral que, acima de tudo, elegerá o presidente da República Federativa do Brasil, aquele que dará o norte à nação pelos quatro próximos anos.
Digo isto, sobre o momento ser doloroso, por várias razões. E, para explicá-las, devo aludir um pouco àquele que tomou esta iniciativa de, mais uma vez, recusar-se a aceitar que o poder econômico se imponha sobre o Brasil de forma injusta, em uma sua tentativa torpe de escolher aquele que terá substantivo poder de tomar decisões sobre as vidas de todos os brasileiros durante o próximo quadriênio.
Quero dizer por que decidi tomar tal iniciativa. Ela não me renderá cargos ou pagamentos subsidiados por dinheiro público; não receberei benesses de governo nenhum; não serei convidado para almoços, jantares nem festas; não auferirei absolutamente nada caso deste ato vier a decorrer qualquer notoriedade, pois continuarei fazendo o que faço para pagar minhas contas, ou seja, atuando como representante comercial autônomo e consultor de comércio exterior.
Não sou jornalista, não vivo de jornalismo, não tenho pretensões no jornalismo, de forma que nem renome profissional posso almejar ao fazer este blog ou ao tomar atitudes como as que tomei no passado e como a que tomo no presente.
Não espero que entendam minhas razões porque nem a minha família (mulher, filhas e filho) ou amigos entendem ou concordam com o que gasto de meu tempo neste blog e na ONG que presido e administro sem qualquer recurso, sendo muitas vezes obrigado a subsidiar financeiramente ações importantes como as representações, os atos públicos, as palestras e debates aos quais me disponho a ir sem cobrar nem um único centavo.
Mas eu e muitos dos meus leitores entendemos muito bem o que faço. Porque o prazer que nos dá exercermos a nossa cidadania, ao chegarmos mesmo a pagar por isso, ao investirmos tempo que poderíamos usar em proveito próprio despendendo-o em benefício da coletividade, esses atos constituem recompensa que faz com que nos sintamos gigantes morais diante de nós mesmos, sobretudo naqueles momentos solitários em que nos miramos no espelho da alma.
Agora, depois deste longo e necessário preâmbulo, discorrerei sobre aquele momento doloroso que vive o país ao qual aludi no início do texto, mas aludirei também a uma vacina democrática que foi aplicada no momento em que o Movimento dos Sem Mídia despachou a Brasília a representação à Justiça Eleitoral para que investigue, do início deste ano ao fim do processo eleitoral, cada pesquisa de intenção de voto apurada por cada instituto para o cargo de presidente da República.
É doloroso porque, mais uma vez, uma eleição no Brasil transcorrerá sob o signo da trapaça, da esperteza, da malandragem, da injustiça, da prepotência, da opressão do poder econômico.
Hoje, por exemplo, soube-se que a representação que o PSDB tentou encaminhar à Justiça Eleitoral antes da que ora faz o Movimento dos Sem Mídia, e que o partido faz meramente contra o instituto de pesquisas que apresentou resultado que desfavoreceu seu candidato à Presidência da República, bateu e voltou.
Isso ocorreu simplesmente por conta de erro tão ou mais grave do que aquele que o mesmo partido, bem como seus jornais, tevês, rádios e portais de internet alardearam para desqualificar o instituto Sensus, que errou ao registrar uma pesquisa no TSE e foi acusado de má fé, o que autoriza que cidadãos que pensam como os que integram o PSDB acusem o partido do mesmo que ele acusou o instituto de pesquisa.
Matéria da Folha de São Paulo, ironicamente do jornal que desencadeou essa guerra de pesquisas que fere tanto o exercício de um processo eleitoral limpo, dá conta de que o PSDB informou dados flagrantemente errados ao acusar o Sensus. E nem me darei ao trabalho de reproduzir essa matéria porque, com a velocidade com que hoje corre a informação, todos já sabem ao que me refiro.
Pouco antes, uma concessão pública, a concessão de tevê das poderosas Organizações Globo, esbofeteou a sociedade ao usar sua prerrogativa de concessionária para fazer uma descarada campanha eleitoral em prol de seu candidato, o ex-governador tucano José Serra, do PSDB. Tão descarada que a emissora a tirou do ar cerca de 24 horas depois de lançada, até porque seu objetivo já havia sido alcançado.
A concessão pública em questão, o jornal que iniciou essa guerra estúpida e imoral de pesquisas e o próprio PSDB tentam manipular as eleições deste ano tanto quanto fizeram nas de anos anteriores, novamente materializando essa praga de eleições no país serem marcadas por malandragens, golpes, dossiês, denúncias etc., com a grande imprensa sempre tomando partido e beneficiando alguns em detrimento de outros, muitas vezes valendo-se até de meios que pertencem a todos como é o caso do espectro radioelétrico.
A representação do Movimento dos Sem Mídia, pois, constituir-se-á em uma vacina democrática que fará todos os quatro institutos de pesquisa supra mencionados pensarem duas vezes antes de tentarem alguma gracinha, pois supomos que a Justiça Eleitoral acatará nosso pleito flagrantemente desinteressado para que tanto os institutos tidos como “petistas” quanto os considerados “tucanos” fiquem na berlinda.
A partir da madrugada desta sexta-feira 23 de abril, portanto, este blog publicará a íntegra da representação.
No mesmo post, o Movimento dos Sem Mídia pede que cada internauta que tiver acesso à sua peça jurídica em qualquer página da internet, e que concordar com o que lhe será apresentado, que deixe comentário neste blog manifestando seu apoio, pois cada um desses comentários será posteriormente anexado à representação de forma a lhe conceder maior representatividade.
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Nesta quinta-feira, 22 de abril de 2010, o Movimento dos Sem Mídia encaminhou ao procurador-geral eleitoral, que é também o procurador-geral da República, o doutor Roberto Gurgel, representação pedindo investigação de todos os quatro grandes institutos de pesquisa de opinião, o Datafolha, o Ibope, o Sensus e o Vox Populi, os quais, tradicionalmente, dedicam-se a captar as diversas intenções de voto do eleitorado brasileiro.
Além de um ato da mais pura, desinteressada e autêntica cidadania, a peça jurídica dessa legítima organização da sociedade civil que é o MSM se materializa em um momento doloroso para os cidadãos brasileiros, no qual, uma vez mais, paira sobre a nação uma sombra de dúvidas quanto às condições em que se dará o processo eleitoral que, acima de tudo, elegerá o presidente da República Federativa do Brasil, aquele que dará o norte à nação pelos quatro próximos anos.
Digo isto, sobre o momento ser doloroso, por várias razões. E, para explicá-las, devo aludir um pouco àquele que tomou esta iniciativa de, mais uma vez, recusar-se a aceitar que o poder econômico se imponha sobre o Brasil de forma injusta, em uma sua tentativa torpe de escolher aquele que terá substantivo poder de tomar decisões sobre as vidas de todos os brasileiros durante o próximo quadriênio.
Quero dizer por que decidi tomar tal iniciativa. Ela não me renderá cargos ou pagamentos subsidiados por dinheiro público; não receberei benesses de governo nenhum; não serei convidado para almoços, jantares nem festas; não auferirei absolutamente nada caso deste ato vier a decorrer qualquer notoriedade, pois continuarei fazendo o que faço para pagar minhas contas, ou seja, atuando como representante comercial autônomo e consultor de comércio exterior.
Não sou jornalista, não vivo de jornalismo, não tenho pretensões no jornalismo, de forma que nem renome profissional posso almejar ao fazer este blog ou ao tomar atitudes como as que tomei no passado e como a que tomo no presente.
Não espero que entendam minhas razões porque nem a minha família (mulher, filhas e filho) ou amigos entendem ou concordam com o que gasto de meu tempo neste blog e na ONG que presido e administro sem qualquer recurso, sendo muitas vezes obrigado a subsidiar financeiramente ações importantes como as representações, os atos públicos, as palestras e debates aos quais me disponho a ir sem cobrar nem um único centavo.
Mas eu e muitos dos meus leitores entendemos muito bem o que faço. Porque o prazer que nos dá exercermos a nossa cidadania, ao chegarmos mesmo a pagar por isso, ao investirmos tempo que poderíamos usar em proveito próprio despendendo-o em benefício da coletividade, esses atos constituem recompensa que faz com que nos sintamos gigantes morais diante de nós mesmos, sobretudo naqueles momentos solitários em que nos miramos no espelho da alma.
Agora, depois deste longo e necessário preâmbulo, discorrerei sobre aquele momento doloroso que vive o país ao qual aludi no início do texto, mas aludirei também a uma vacina democrática que foi aplicada no momento em que o Movimento dos Sem Mídia despachou a Brasília a representação à Justiça Eleitoral para que investigue, do início deste ano ao fim do processo eleitoral, cada pesquisa de intenção de voto apurada por cada instituto para o cargo de presidente da República.
É doloroso porque, mais uma vez, uma eleição no Brasil transcorrerá sob o signo da trapaça, da esperteza, da malandragem, da injustiça, da prepotência, da opressão do poder econômico.
Hoje, por exemplo, soube-se que a representação que o PSDB tentou encaminhar à Justiça Eleitoral antes da que ora faz o Movimento dos Sem Mídia, e que o partido faz meramente contra o instituto de pesquisas que apresentou resultado que desfavoreceu seu candidato à Presidência da República, bateu e voltou.
Isso ocorreu simplesmente por conta de erro tão ou mais grave do que aquele que o mesmo partido, bem como seus jornais, tevês, rádios e portais de internet alardearam para desqualificar o instituto Sensus, que errou ao registrar uma pesquisa no TSE e foi acusado de má fé, o que autoriza que cidadãos que pensam como os que integram o PSDB acusem o partido do mesmo que ele acusou o instituto de pesquisa.
Matéria da Folha de São Paulo, ironicamente do jornal que desencadeou essa guerra de pesquisas que fere tanto o exercício de um processo eleitoral limpo, dá conta de que o PSDB informou dados flagrantemente errados ao acusar o Sensus. E nem me darei ao trabalho de reproduzir essa matéria porque, com a velocidade com que hoje corre a informação, todos já sabem ao que me refiro.
Pouco antes, uma concessão pública, a concessão de tevê das poderosas Organizações Globo, esbofeteou a sociedade ao usar sua prerrogativa de concessionária para fazer uma descarada campanha eleitoral em prol de seu candidato, o ex-governador tucano José Serra, do PSDB. Tão descarada que a emissora a tirou do ar cerca de 24 horas depois de lançada, até porque seu objetivo já havia sido alcançado.
A concessão pública em questão, o jornal que iniciou essa guerra estúpida e imoral de pesquisas e o próprio PSDB tentam manipular as eleições deste ano tanto quanto fizeram nas de anos anteriores, novamente materializando essa praga de eleições no país serem marcadas por malandragens, golpes, dossiês, denúncias etc., com a grande imprensa sempre tomando partido e beneficiando alguns em detrimento de outros, muitas vezes valendo-se até de meios que pertencem a todos como é o caso do espectro radioelétrico.
A representação do Movimento dos Sem Mídia, pois, constituir-se-á em uma vacina democrática que fará todos os quatro institutos de pesquisa supra mencionados pensarem duas vezes antes de tentarem alguma gracinha, pois supomos que a Justiça Eleitoral acatará nosso pleito flagrantemente desinteressado para que tanto os institutos tidos como “petistas” quanto os considerados “tucanos” fiquem na berlinda.
A partir da madrugada desta sexta-feira 23 de abril, portanto, este blog publicará a íntegra da representação.
No mesmo post, o Movimento dos Sem Mídia pede que cada internauta que tiver acesso à sua peça jurídica em qualquer página da internet, e que concordar com o que lhe será apresentado, que deixe comentário neste blog manifestando seu apoio, pois cada um desses comentários será posteriormente anexado à representação de forma a lhe conceder maior representatividade.
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Quem “controla” a mídia?
Reproduzo artigo do professor Venício A. de Lima, publicado no sítio Carta Maior:
Você já ouviu falar em Alexander Lebedev, Alexander Pugachev, Rupert Murdoch, Carlos Slim ou Nuno Rocha dos Santos Vasconcelos? Talvez não, mas eles já “controlam” boa parte da informação e do entretenimento que circulam no planeta e, muito provavelmente, chegam diariamente até você, leitor (a).
Enquanto na América Latina, inclusive no Brasil, a grande mídia continua a “fazer de conta” que as ameaças à liberdade de expressão partem exclusivamente do Estado, em nível global, confirma-se a tendência de concentração da propriedade e controle da mídia por uns poucos mega empresários.
Na verdade, uma das conseqüências da crise internacional que atinge, sobretudo, a mídia impressa, tem sido a compra de títulos tradicionais por investidores – russos, árabes, australianos, latino-americanos, portugueses – cujo compromisso maior é exclusivamente o sucesso de seus negócios. Aparentemente, não há espaço para o interesse público.
Na Europa e nos Estados Unidos
Já aconteceu com os britânicos The Independent e The Evening Standard e com o France-Soir na França. Na Itália, rola uma briga de gigantes no mercado de televisão envolvendo o primeiro ministro e proprietário de mídia Silvio Berlusconi (Mediaset) e o australiano naturalizado americano Ropert Murdoch (Sky Itália). O mesmo acontece no leste europeu. Na Polônia, tanto o Fakt (o diário de maior tiragem), quanto o Polska (300 mil exemplares/dia) são controlados por grupos alemães.
Nos Estados Unidos, a News Corporation de Murdoch avança a passos largos: depois do New York Post, o principal tablóide do país, veio a Fox News, canal de notícias 24h na TV a cabo; o tradicionalíssimo The Wall Street Journal; o estúdio Fox Films e a editora Harper Collins. E o mexicano Carlos Slim é um dos novos acionistas do The New York Times.
E no Brasil?
Entre nós, anunciou-se recentemente que o Ongoing Media Group – apesar do nome, um grupo português – que edita o “Brasil Econômico” desde outubro, comprou o grupo “O Dia”, incluindo o “Meia Hora” e o jornal esportivo “Campeão”. O Ongoing detem 20% do grupo Impressa (português), é acionista da Portugal Telecom e controla o maior operador de TV a cabo de Portugal, o Zon Multimídia.
Aqui sempre tivemos concentração no controle da mídia, até porque , ao contrário do que acontece no resto do mundo, nunca houve preocupação do nosso legislador com a propriedade cruzada dos meios. Historicamente são poucos os grupos que controlam os principais veículos de comunicação, sejam eles impressos ou concessões do serviço público de radio e televisão. Além disso, ainda padecemos do mal histórico do coronelismo eletrônico que vincula a mídia às oligarquias políticas regionais e locais desde pelo menos a metade do século passado.
Desde que a Emenda Constitucional n. 36, de 2002, permitiu a participação de capital estrangeiro nas empresas brasileiras de mídia, investidores globais no campo da informação e do entretenimento, atuam aqui. Considerada a convergência tecnológica, pode-se afirmar que eles, na verdade, chegaram antes, isto é, desde a privatização das telecomunicações.
Apesar da dificuldade de se obter informações confiáveis nesse setor, são conhecidas as ligações do Grupo Abril com a sul-africana Naspers; da NET/Globo com a Telmex (do grupo controlado por Carlos Slim) e da Globo com a News Corporation/Sky.
Tudo indica, portanto, que, aos nossos problemas históricos, se acrescenta mais um, este contemporâneo.
Quem ameaça a liberdade de expressão?
Diante dessa tendência, aparentemente mundial, de onde partiria a verdadeira ameaça à liberdade de expressão?
Em matéria sobre o assunto publicada na revista Carta Capital n. 591 o conhecido professor da New York University, Crispin Miller, afirma em relação ao que vem ocorrendo nos Estados Unidos:
“O grande perigo para a democracia norte-americana não é a virtual morte dos jornais diários. É a concentração de donos da mídia no país. Ironicamente, há 15 anos, se dizia que era prematuro falar em uma crise cívica, com os conglomerados exercendo poder de censura sobre a imensidão de notícias disponíveis no mundo pós-internet (...)”.
Todas estas questões deveriam servir de contrapeso para equilibrar a pauta imposta pela grande mídia brasileira em torno das “ameaças” a liberdade de expressão. Afinal, diante das tendências mundiais, quem, de fato, “controla” a mídia e representa perigo para as liberdades democráticas?
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Você já ouviu falar em Alexander Lebedev, Alexander Pugachev, Rupert Murdoch, Carlos Slim ou Nuno Rocha dos Santos Vasconcelos? Talvez não, mas eles já “controlam” boa parte da informação e do entretenimento que circulam no planeta e, muito provavelmente, chegam diariamente até você, leitor (a).
Enquanto na América Latina, inclusive no Brasil, a grande mídia continua a “fazer de conta” que as ameaças à liberdade de expressão partem exclusivamente do Estado, em nível global, confirma-se a tendência de concentração da propriedade e controle da mídia por uns poucos mega empresários.
Na verdade, uma das conseqüências da crise internacional que atinge, sobretudo, a mídia impressa, tem sido a compra de títulos tradicionais por investidores – russos, árabes, australianos, latino-americanos, portugueses – cujo compromisso maior é exclusivamente o sucesso de seus negócios. Aparentemente, não há espaço para o interesse público.
Na Europa e nos Estados Unidos
Já aconteceu com os britânicos The Independent e The Evening Standard e com o France-Soir na França. Na Itália, rola uma briga de gigantes no mercado de televisão envolvendo o primeiro ministro e proprietário de mídia Silvio Berlusconi (Mediaset) e o australiano naturalizado americano Ropert Murdoch (Sky Itália). O mesmo acontece no leste europeu. Na Polônia, tanto o Fakt (o diário de maior tiragem), quanto o Polska (300 mil exemplares/dia) são controlados por grupos alemães.
Nos Estados Unidos, a News Corporation de Murdoch avança a passos largos: depois do New York Post, o principal tablóide do país, veio a Fox News, canal de notícias 24h na TV a cabo; o tradicionalíssimo The Wall Street Journal; o estúdio Fox Films e a editora Harper Collins. E o mexicano Carlos Slim é um dos novos acionistas do The New York Times.
E no Brasil?
Entre nós, anunciou-se recentemente que o Ongoing Media Group – apesar do nome, um grupo português – que edita o “Brasil Econômico” desde outubro, comprou o grupo “O Dia”, incluindo o “Meia Hora” e o jornal esportivo “Campeão”. O Ongoing detem 20% do grupo Impressa (português), é acionista da Portugal Telecom e controla o maior operador de TV a cabo de Portugal, o Zon Multimídia.
Aqui sempre tivemos concentração no controle da mídia, até porque , ao contrário do que acontece no resto do mundo, nunca houve preocupação do nosso legislador com a propriedade cruzada dos meios. Historicamente são poucos os grupos que controlam os principais veículos de comunicação, sejam eles impressos ou concessões do serviço público de radio e televisão. Além disso, ainda padecemos do mal histórico do coronelismo eletrônico que vincula a mídia às oligarquias políticas regionais e locais desde pelo menos a metade do século passado.
Desde que a Emenda Constitucional n. 36, de 2002, permitiu a participação de capital estrangeiro nas empresas brasileiras de mídia, investidores globais no campo da informação e do entretenimento, atuam aqui. Considerada a convergência tecnológica, pode-se afirmar que eles, na verdade, chegaram antes, isto é, desde a privatização das telecomunicações.
Apesar da dificuldade de se obter informações confiáveis nesse setor, são conhecidas as ligações do Grupo Abril com a sul-africana Naspers; da NET/Globo com a Telmex (do grupo controlado por Carlos Slim) e da Globo com a News Corporation/Sky.
Tudo indica, portanto, que, aos nossos problemas históricos, se acrescenta mais um, este contemporâneo.
Quem ameaça a liberdade de expressão?
Diante dessa tendência, aparentemente mundial, de onde partiria a verdadeira ameaça à liberdade de expressão?
Em matéria sobre o assunto publicada na revista Carta Capital n. 591 o conhecido professor da New York University, Crispin Miller, afirma em relação ao que vem ocorrendo nos Estados Unidos:
“O grande perigo para a democracia norte-americana não é a virtual morte dos jornais diários. É a concentração de donos da mídia no país. Ironicamente, há 15 anos, se dizia que era prematuro falar em uma crise cívica, com os conglomerados exercendo poder de censura sobre a imensidão de notícias disponíveis no mundo pós-internet (...)”.
Todas estas questões deveriam servir de contrapeso para equilibrar a pauta imposta pela grande mídia brasileira em torno das “ameaças” a liberdade de expressão. Afinal, diante das tendências mundiais, quem, de fato, “controla” a mídia e representa perigo para as liberdades democráticas?
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A mídia esconde sua partidarização
Reproduzo a esclarecedora entrevista do professor Laurindo Lalo Leal Filho, concecida à jornalista Ana Cláudia Barros, do Terra Magazine:
Considerada mito sob os olhares mais críticos, a imparcialidade nos meios de comunicação sempre foi objeto de discussões infindáveis, sobretudo, do lado de dentro dos muros acadêmicos. Em tempos de corrida eleitoral, a questão, polêmica por excelência, volta a monopolizar os debates, na maioria das vezes, inflamados pelas paixões partidárias. Estaria a grande imprensa se portando de maneira equilibrada em relação aos candidatos, principalmente, no que diz respeito aos postulantes à cobiçada vaga de “comandante-mor” da nação? Na análise do sociólogo e jornalista Laurindo Leal Filho, professor da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (USP), a resposta é não.
“A diferença entre quase todos os meios de comunicação do Brasil e os do exterior é que, no exterior, eles assumem, publicamente, o candidato ou o partido que estão apoiando”, afirma. Categórico, ele diz que a mídia brasileira esconde sua posição política. “É praticamente impossível a isenção total”, dispara.
Leal defende que a mesma postura adotada por outros países seja incorporada pelos veículos impressos daqui, para evitar que gatos e lebres sejam colocados em um balaio comum. “É o caminho mais honesto. Do contrário, você acaba enganando o leitor com a suposta imparcialidade que, na verdade, não existe”.
Terra Magazine: Como o senhor avalia a atual cobertura eleitoral feita pela mídia? Na sua opinião, os candidatos são retratados com equilíbrio?
Laurindo Leal Filho: Não. A mídia, de uma maneira geral, não só no Brasil, mas em todos os países mais desenvolvidos, sempre assume uma posição, principalmente, nos pleitos majoritários, como é o caso de uma eleição para presidente da República. É praticamente impossível a isenção total. Os meios de comunicação, na maioria dos países, não têm nenhuma preocupação com isso. A diferença entre quase todos os meios de comunicação do Brasil e os do exterior é que, no exterior, eles assumem, publicamente, o candidato ou o partido que estão apoiando. Isso não quer dizer que vão fazer uma cobertura distorcida do pleito. Eles não escondem que têm preferência por esse ou aquele candidato. Isso, na França, na Inglaterra, é muito comum. Os jornais acompanham uma determinada tendência política, e o leitor sabe disso.
Estabelece-se uma relação mais franca com o leitor…
Infelizmente, no Brasil, alguns jornais ou a maioria deles anuncia que é independente, equidistante dos candidatos, mas, na verdade, acabam exercendo isso, que é muito ruim. Acabam escondendo do leitor a sua posição política. Acho que duas honrosas exceções no Brasil, na mídia impressa, são o Jornal O Estado de S.Paulo – que, nas duas últimas eleições, tem apoiado os candidatos do PSDB explicitamente – e a revista Carta Capital, que tem apoiado os candidatos do PT.
O senhor acredita que esse deveria ser o caminho adotado pela mídia impressa de maneira geral?
É o caminho mais honesto. Do contrário, você acaba enganando o leitor com a suposta imparcialidade que, na verdade, não existe. Basta ver o que os jornais já estão fazendo hoje nesta eleição, com posições claramente a favor do candidato da oposição. Os três grandes jornais brasileiros, Globo, Folha (de São Paulo) e Estado (de São Paulo) estão nitidamente se colocando a favor do candidato da oposição. E as revistas semanais, com exceção da Carta Capital, também. Especialmente, a Veja. Claramente, estão fazendo uma cobertura da cena política brasileira muito favorável à oposição.
Para o senhor, isso torna a disputa desleal?
Contribui. No Brasil, é pior ainda, porque os jornais impressos têm uma abrangência de cobertura relativamente pequena em relação à população, mas eles acabam pautando o rádio e a televisão. Estes, sim, atingem, praticamente, toda a população brasileira. Acompanham essa tendência não só por serem pautados nas suas linhas editoriais, nas suas coberturas, pelos grandes jornais, mas por também assumirem as candidaturas da oposição. Estou falando das grandes redes, o que é pior, porque se trata de uma ação ilegal. A televisão e o rádio são concessões públicas, diferente da mídia impressa, que são empresas particulares. São concessões públicas que estão usando o espaço público para interesses privados, que são os interesses políticos em relação a determinados candidatos. Então, eu acho que, para responder claramente, há uma distorção do processo eleitoral brasileiro no que diz respeito à cobertura da imprensa. Jornais impressos e revistas deveriam claramente divulgar para o leitor qual é a sua posição, e o rádio e a televisão deveriam se abster de fazer esse tipo de opção. Deveriam buscar o máximo possível a insenção, coisa que não fazem.
Na sua opinião, a imprensa tem o poder de eleger um candidato?
Não tem poder absoluto, porque se defronta com outras variáveis, mas contribui. Em outros momentos, a imprensa já teve mais força. Hoje, no caso específico das últimas eleições, está provado que a ação política do governo tem superado o jogo eleitoral da imprensa, mas não de uma forma absoluta.
Quais seriam essas variáveis?
Por exemplo, ações do governo que atingem diretamente o cidadão e melhoram sua condição de vida.
O Bolsa Família (programa de transferência de renda do governo federal), por exemplo?
Bolsa Família, projetos urbanos de habitação, de transporte. O Bolsa Família talvez seja o principal. Eles atingem de forma tão direta o cidadão que, por mais que a imprensa tome posição contrária, não consegue mudar a tendência de voto. Agora, não que isso seja absoluto. Nas eleições de 2006, a ação da imprensa foi decisiva para levar o candidato Geraldo Alckmin para o segundo turno. No final do primeiro turno, quando se previa uma vitória de Lula, a ação concentrada dos meios de comunicação a favor do candidato Geraldo Alckmin mudou o panorama. Não determinou a vitória dele, mas o levou ao segundo turno. A história do dossiê, que supostamente o PT teria comprado, colocada nas primeiras páginas dos jornais. Mas não foi só. Foi colocada no Jornal Nacional. Em outros momentos mais antigos, como no famoso debate Lula x Collor, foi decisiva a ação da televisão, editando o debate na véspera da eleição, mostrando que um dos candidatos tinha melhores condições e qualidade do que o outro. A ordem da Globo foi editar o debate com todos os momentos ruins de Lula e os minutos bons do Collor. Aquilo foi decisivo. Acho que a imprensa não define 100% um pleito, mas ela influi bastante.
O senhor acha que o eleitor brasileiro está preparado para fazer uma leitura crítica disso tudo?
Infelizmente, não. Temos no Brasil um processo de concentração da mídia que impede ao leitor, ao telespectador, ao ouvinte estabelecer comparações, alternativas. Temos uma mídia praticamente homogênea. Então, isso dificulta muito o que chamamos de leitura crítica da comunicação. Há a possibilidade de estabelecer essa crítica de que você está falando ou nos bancos escolares, o que não existe, ou então através de outro leque de opções de meios de comunicação, que deem a possibilidade de você perceber que um trata a política de um jeito e outro, de outro jeito. Aí, você pode fazer escolha crítica. No Brasil, não existe isso. Há uma situação quase que homogênea dos veículos, então, o telespectador, o leitor, o ouvinte têm dificuldade para fazer a crítica.
Isso, de certa forma, não compromete o processo democrático?
Sem dúvida. Tenho convicção de que, enquanto não tivermos uma redefinição do quadro de comunicação no Brasil, uma legislação, por exemplo, no caso do rádio e da TV, que estabeleça critérios mais rígidos, não para censurar, mas para aumentar a diversidade. No caso dos meios impressos, que se tenha mais atores nesse processo, jornais de outras tendências, enquanto não tivermos isso, nós não teremos completado o processo democrático. A democracia continuará meio capenga.
Para o senhor, a internet pode ser um instrumento nesse processo, uma vez que ela abre espaço para o debate?
Ela já é uma alternativa. Só que é muito restrita no Brasil. Às vezes, as pessoas acham, porque é na classe média onde os formadores de opinião circulam, que toda a população está sendo beneficiada pela internet. A internet só atinge, hoje, 18% da população brasileira. É uma parcela muito pequena. Ainda vai demorar um bom tempo para a democratização dela, 18% é o acesso domiciliar à internet, e não são 100% que têm acesso à banda larga. Acho que, no Brasil, a internet é um instrumento de democratização, mas ainda limitado a uma parcela pequena da sociedade.
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Considerada mito sob os olhares mais críticos, a imparcialidade nos meios de comunicação sempre foi objeto de discussões infindáveis, sobretudo, do lado de dentro dos muros acadêmicos. Em tempos de corrida eleitoral, a questão, polêmica por excelência, volta a monopolizar os debates, na maioria das vezes, inflamados pelas paixões partidárias. Estaria a grande imprensa se portando de maneira equilibrada em relação aos candidatos, principalmente, no que diz respeito aos postulantes à cobiçada vaga de “comandante-mor” da nação? Na análise do sociólogo e jornalista Laurindo Leal Filho, professor da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (USP), a resposta é não.
“A diferença entre quase todos os meios de comunicação do Brasil e os do exterior é que, no exterior, eles assumem, publicamente, o candidato ou o partido que estão apoiando”, afirma. Categórico, ele diz que a mídia brasileira esconde sua posição política. “É praticamente impossível a isenção total”, dispara.
Leal defende que a mesma postura adotada por outros países seja incorporada pelos veículos impressos daqui, para evitar que gatos e lebres sejam colocados em um balaio comum. “É o caminho mais honesto. Do contrário, você acaba enganando o leitor com a suposta imparcialidade que, na verdade, não existe”.
Terra Magazine: Como o senhor avalia a atual cobertura eleitoral feita pela mídia? Na sua opinião, os candidatos são retratados com equilíbrio?
Laurindo Leal Filho: Não. A mídia, de uma maneira geral, não só no Brasil, mas em todos os países mais desenvolvidos, sempre assume uma posição, principalmente, nos pleitos majoritários, como é o caso de uma eleição para presidente da República. É praticamente impossível a isenção total. Os meios de comunicação, na maioria dos países, não têm nenhuma preocupação com isso. A diferença entre quase todos os meios de comunicação do Brasil e os do exterior é que, no exterior, eles assumem, publicamente, o candidato ou o partido que estão apoiando. Isso não quer dizer que vão fazer uma cobertura distorcida do pleito. Eles não escondem que têm preferência por esse ou aquele candidato. Isso, na França, na Inglaterra, é muito comum. Os jornais acompanham uma determinada tendência política, e o leitor sabe disso.
Estabelece-se uma relação mais franca com o leitor…
Infelizmente, no Brasil, alguns jornais ou a maioria deles anuncia que é independente, equidistante dos candidatos, mas, na verdade, acabam exercendo isso, que é muito ruim. Acabam escondendo do leitor a sua posição política. Acho que duas honrosas exceções no Brasil, na mídia impressa, são o Jornal O Estado de S.Paulo – que, nas duas últimas eleições, tem apoiado os candidatos do PSDB explicitamente – e a revista Carta Capital, que tem apoiado os candidatos do PT.
O senhor acredita que esse deveria ser o caminho adotado pela mídia impressa de maneira geral?
É o caminho mais honesto. Do contrário, você acaba enganando o leitor com a suposta imparcialidade que, na verdade, não existe. Basta ver o que os jornais já estão fazendo hoje nesta eleição, com posições claramente a favor do candidato da oposição. Os três grandes jornais brasileiros, Globo, Folha (de São Paulo) e Estado (de São Paulo) estão nitidamente se colocando a favor do candidato da oposição. E as revistas semanais, com exceção da Carta Capital, também. Especialmente, a Veja. Claramente, estão fazendo uma cobertura da cena política brasileira muito favorável à oposição.
Para o senhor, isso torna a disputa desleal?
Contribui. No Brasil, é pior ainda, porque os jornais impressos têm uma abrangência de cobertura relativamente pequena em relação à população, mas eles acabam pautando o rádio e a televisão. Estes, sim, atingem, praticamente, toda a população brasileira. Acompanham essa tendência não só por serem pautados nas suas linhas editoriais, nas suas coberturas, pelos grandes jornais, mas por também assumirem as candidaturas da oposição. Estou falando das grandes redes, o que é pior, porque se trata de uma ação ilegal. A televisão e o rádio são concessões públicas, diferente da mídia impressa, que são empresas particulares. São concessões públicas que estão usando o espaço público para interesses privados, que são os interesses políticos em relação a determinados candidatos. Então, eu acho que, para responder claramente, há uma distorção do processo eleitoral brasileiro no que diz respeito à cobertura da imprensa. Jornais impressos e revistas deveriam claramente divulgar para o leitor qual é a sua posição, e o rádio e a televisão deveriam se abster de fazer esse tipo de opção. Deveriam buscar o máximo possível a insenção, coisa que não fazem.
Na sua opinião, a imprensa tem o poder de eleger um candidato?
Não tem poder absoluto, porque se defronta com outras variáveis, mas contribui. Em outros momentos, a imprensa já teve mais força. Hoje, no caso específico das últimas eleições, está provado que a ação política do governo tem superado o jogo eleitoral da imprensa, mas não de uma forma absoluta.
Quais seriam essas variáveis?
Por exemplo, ações do governo que atingem diretamente o cidadão e melhoram sua condição de vida.
O Bolsa Família (programa de transferência de renda do governo federal), por exemplo?
Bolsa Família, projetos urbanos de habitação, de transporte. O Bolsa Família talvez seja o principal. Eles atingem de forma tão direta o cidadão que, por mais que a imprensa tome posição contrária, não consegue mudar a tendência de voto. Agora, não que isso seja absoluto. Nas eleições de 2006, a ação da imprensa foi decisiva para levar o candidato Geraldo Alckmin para o segundo turno. No final do primeiro turno, quando se previa uma vitória de Lula, a ação concentrada dos meios de comunicação a favor do candidato Geraldo Alckmin mudou o panorama. Não determinou a vitória dele, mas o levou ao segundo turno. A história do dossiê, que supostamente o PT teria comprado, colocada nas primeiras páginas dos jornais. Mas não foi só. Foi colocada no Jornal Nacional. Em outros momentos mais antigos, como no famoso debate Lula x Collor, foi decisiva a ação da televisão, editando o debate na véspera da eleição, mostrando que um dos candidatos tinha melhores condições e qualidade do que o outro. A ordem da Globo foi editar o debate com todos os momentos ruins de Lula e os minutos bons do Collor. Aquilo foi decisivo. Acho que a imprensa não define 100% um pleito, mas ela influi bastante.
O senhor acha que o eleitor brasileiro está preparado para fazer uma leitura crítica disso tudo?
Infelizmente, não. Temos no Brasil um processo de concentração da mídia que impede ao leitor, ao telespectador, ao ouvinte estabelecer comparações, alternativas. Temos uma mídia praticamente homogênea. Então, isso dificulta muito o que chamamos de leitura crítica da comunicação. Há a possibilidade de estabelecer essa crítica de que você está falando ou nos bancos escolares, o que não existe, ou então através de outro leque de opções de meios de comunicação, que deem a possibilidade de você perceber que um trata a política de um jeito e outro, de outro jeito. Aí, você pode fazer escolha crítica. No Brasil, não existe isso. Há uma situação quase que homogênea dos veículos, então, o telespectador, o leitor, o ouvinte têm dificuldade para fazer a crítica.
Isso, de certa forma, não compromete o processo democrático?
Sem dúvida. Tenho convicção de que, enquanto não tivermos uma redefinição do quadro de comunicação no Brasil, uma legislação, por exemplo, no caso do rádio e da TV, que estabeleça critérios mais rígidos, não para censurar, mas para aumentar a diversidade. No caso dos meios impressos, que se tenha mais atores nesse processo, jornais de outras tendências, enquanto não tivermos isso, nós não teremos completado o processo democrático. A democracia continuará meio capenga.
Para o senhor, a internet pode ser um instrumento nesse processo, uma vez que ela abre espaço para o debate?
Ela já é uma alternativa. Só que é muito restrita no Brasil. Às vezes, as pessoas acham, porque é na classe média onde os formadores de opinião circulam, que toda a população está sendo beneficiada pela internet. A internet só atinge, hoje, 18% da população brasileira. É uma parcela muito pequena. Ainda vai demorar um bom tempo para a democratização dela, 18% é o acesso domiciliar à internet, e não são 100% que têm acesso à banda larga. Acho que, no Brasil, a internet é um instrumento de democratização, mas ainda limitado a uma parcela pequena da sociedade.
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A Idade Mendes se encerra. Vade retro!
Reproduzo excelente artigo do jornalista Leandro Fortes, do blog “Brasília, eu vi”:
No fim das contas, a função primordial do ministro Gilmar Mendes à frente do Supremo Tribunal Federal foi a de produzir noticiário e manchetes para a falange conservadora que tomou conta de grande parte dos veículos de comunicação do Brasil. De forma premeditada e com muita astúcia, Mendes conseguiu fazer com que a velha mídia nacional gravitasse em torno dele, apenas com a promessa de intervir, como de fato interveio, nas ações de governo que ameaçavam a rotina, o conforto e as atividades empresariais da nossa elite colonial.
Nesse aspecto, os dois habeas corpus concedidos ao banqueiro Daniel Dantas, flagrado no mesmo crime que manteve o ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda no cárcere por 60 dias, foram nada mais que um cartão de visitas. Mais relevante do que tudo foi a capacidade de Gilmar Mendes fixar na pauta e nos editoriais da velha mídia a tese quase infantil da existência de um Estado policialesco levado a cabo pela Polícia Federal e, com isso, justificar, dali para frente, a mais temerária das gestões da Suprema Corte do País desde sua criação, há mais cem anos.
Num prazo de pouco menos de dois anos, Mendes politizou as ações do Judiciário pelo viés da extrema direita, coisa que não se viu nem durante a ditadura militar (1964-1985), época em que a Justiça andava de joelhos, mas dela não se exigia protagonismo algum. Assim, alinhou-se o ministro tanto aos interesses dos latifundiários, aos quais defende sem pudor algum, como aos dos torturadores do regime dos generais, ao se posicionar publicamente contra a revisão da Lei da Anistia, de cuja à apreciação no STF ele se esquivou, herança deixada a céu aberto para o novo presidente do tribunal, ministro Cezar Peluso. Para Mendes, tal revisão poderá levar o País a uma convulsão social. É uma tese tão sólida como o conto da escuta telefônica, fábula jornalística que teve o presidente do STF como personagem principal a dialogar canduras com o senador Demóstenes Torres, do DEM de Goiás.
A farsa do grampo, publicada pela revista Veja e repercutida, em série, por veículos co-irmãos, serviu para derrubar o delegado Paulo Lacerda do comando da PF, com o auxílio luxuoso do ministro da Defesa, Nelson Jobim, que se valeu de uma mentira para tal. E essa, não se enganem, foi a verdadeira missão a ser cumprida. Na aposentadoria, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva terá tempo para refletir e registrar essa história amarga em suas memórias: o dia em que, chamado “às falas” por Gilmar Mendes, não só se submeteu como aceitou mandar para o degredo, em Portugal, o melhor e mais importante diretor geral que a Polícia Federal brasileira já teve. O fez para fugir de um enfrentamento necessário e, por isso mesmo, aceitou ser derrotado. Aliás, creio, a única verdadeira derrota do governo Lula foi exatamente a de abrir mão da política de combate permanente à corrupção desencadeada por Lacerda na PF para satisfazer os interesses de grupos vinculados às vontades de Gilmar Mendes.
O presidente do STF deu centenas de entrevistas sobre os mais diversos assuntos, sobretudo aqueles sobre os quais não poderia, como juiz, jamais se pronunciar fora dos autos. Essa é, inclusive, a mais grave distorção do sistema de escolha dos nomes ao STF, a de colocar não-juízes, como Mendes, na Suprema Corte, para julgar as grandes questões constitucionais da nação. Alheio ao cargo que ocupava (ou ciente até demais), o ministro versou sobre tudo e sobre todos. Deu força e fé pública a teses as mais conservadoras. Foi um arauto dos fazendeiros, dos banqueiros, da guarda pretoriana da ditadura militar e da velha mídia. Em troca, colheu farto material favorável a ele no noticiário, um relicário de elogios e textos laudatórios sobre sua luta contra o Estado policial, os juízes de primeira instância, o Ministério Público e os movimentos sociais, entre outros moinhos de vento vendidos nos jornais como inimigos da democracia.
Na imprensa nacional, apenas CartaCapital, por meio de duas reportagens (“O empresário Gilmar” e “Nos rincões de Mendes”), teve coragem de se contrapor ao culto à personalidade de Mendes instalado nas redações brasileiras como regra de jornalismo. Por essa razão, somos, eu e a revista, processados pelo ministro. Acusa-nos, o magistrado, de má fé ao divulgar os dados contábeis do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), uma academia de cursinhos jurídicos da qual Mendes é sócio. Trata-se de instituição construída com dinheiro do Banco do Brasil, sobre terreno público praticamente doado pelo ex-governador do DF Joaquim Roriz e mantido às custas de contratos milionários fechados, sem licitação, com órgãos da União.
Assim, a figura de Gilmar Mendes, além de tudo, está inserida eternamente em um dos piores momentos do jornalismo brasileiro. E não apenas por ter sido o algoz do fim da obrigatoriedade do diploma para se exercer a profissão, mas, antes de tudo, por ter dado enorme visibilidade a maus jornalistas e, pior ainda, fazer deles, em algum momento, um exemplo servil de comportamento a ser seguido como condição primordial de crescimento na carreira. Foi dessa simbiose fatal que nasceu não apenas a farsa do grampo, mas toda a estrutura de comunicação e de relação com a imprensa do STF, no sombrio período da Idade Mendes.
Emblemática sobre essa relação foi uma nota do informe digital “Jornalistas & Companhia”, de abril de 2009, sobre o aniversário do publicitário Renato Parente, assessor de imprensa de Gilmar Mendes no STF (os grifos são originais):
“A festa de aniversário de 45 anos de Renato Parente, chefe do Serviço de Imprensa do STF (e que teve um papel importante na construção da TV Justiça, apontada como paradigma na área da tevê pública), realizada na tarde do último domingo (19/4), em Brasília, mostrou a importância que o Judiciário tem hoje no cenário nacional. Estiveram presentes, entre outros, a diretora da Globo, Sílvia Faria, a colunista Mônica Bergamo, e o próprio presidente do STF, Gilmar Mendes, entre outros”.
Olha, quando festa de aniversário de assessor de imprensa serve para mostrar a importância do Poder Judiciário, é sinal de que há algo muito errado com a instituição. Essa relação de Renato Parente com celebridades da mídia é, em todos os sentidos, o pior sintoma da doença incestuosa que obriga jornalistas de boa e má reputação a se misturarem, em Brasília, em cerimônias de beija-mão de caráter duvidoso. Foi, como se sabe, um convescote de sintonia editorial. Renato Parente é o chefe da assessoria que, em março de 2009, em nome de Gilmar Mendes, chamou o presidente da Câmara, deputado Michel Temer (PMDB-SP), às falas, para que um debate da TV Câmara fosse retirado do ar e da internet. Motivo: eu critiquei o posicionamento do presidente do STF sobre a Operação Satiagraha e fiz justiça ao trabalho do delegado federal Protógenes Queiroz, além de citar a coragem do juiz Fausto De Sanctis ao mandar prender, por duas vezes, o banqueiro Daniel Dantas.
Certamente em consonância com o “paradigma na área de tevê pública” da TV Justiça tocada por Renato Parente, a censura na Câmara foi feita com a conivência de um jornalista, Beto Seabra, diretor da TV Câmara, que ainda foi mais além: anunciou que as pautas do programa “Comitê de Imprensa”, a partir dali, seriam monitoradas. Um vexame total. Denunciei em carta aberta aos jornalistas e em todas as instâncias corporativas (sindicatos, Fenaj e ABI) o ato de censura e, com a ajuda de diversos blogs, consegui expor aquela infâmia, até que, cobrada publicamente, a TV Câmara foi obrigada a capitular e recolocar o programa no ar, ao menos na internet. Foi uma das grandes vitórias da blogosfera, até então, haja vista nem um único jornal, rádio ou emissora de tevê, mesmo diante de um gravíssimo caso de censura e restrição de liberdade de expressão e imprensa, ter tido coragem de tratar do assunto. No particular, no entanto, recebi centenas de e-mails e telefonemas de solidariedade de jornalistas de todo o país.
Não deixa de ser irônico que, às vésperas de deixar a presidência do STF, Gilmar Mendes tenha sido obrigado, na certa, inadvertidamente, a se submeter ao constrangimento de ver sua gestão resumida ao caso Daniel Dantas, durante entrevista no youtube. Como foi administrada pelo Google, e não pelo paradigma da TV Justiça, a sabatina acabou por destruir o resto de estratégia ainda imaginada por Mendes para tentar passar à história como o salvador da pátria ameaçada pelo Estado policial da PF. Ninguém sequer tocou nesse assunto, diga-se de passagem. As pessoas só queriam saber dos HCs a Daniel Dantas, do descrédito do Judiciário e da atuação dele e da família na política de Diamantino, terra natal dos Mendes, em Mato Grosso. Como último recurso, a assessoria do ministro ainda tentou tirar o vídeo de circulação, ao menos no site do STF, dentro do sofisticado e democrático paradigma de tevê pública bolado por Renato Parente.
Como derradeiro esforço, nos últimos dias de reinado, Mendes dedicou-se a dar entrevistas para tentar, ainda como estratégia, vincular o próprio nome aos bons resultados obtidos por ações do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), embora o mérito sequer tenha sido dele, mas de um juiz de carreira, Gilson Dipp. Ministro do Superior Tribunal de Justiça e corregedor do órgão, Dipp foi nomeado para o cargo pelo presidente Lula, longe da vontade de Gilmar Mendes. Graças ao ministro do STJ, foi feita a maior e mais importante devassa nos tribunais de Justiça do Brasil, até então antros estaduais intocáveis comandados, em muitos casos, por verdadeiras quadrilhas de toga.
É de Gilson Dipp, portanto, e não de Gilmar Mendes, o verdadeiro registro moralizador do Judiciário desse período, a Idade Mendes, de resto, de triste memória nacional.
Mas que, felizmente, se encerra hoje.
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No fim das contas, a função primordial do ministro Gilmar Mendes à frente do Supremo Tribunal Federal foi a de produzir noticiário e manchetes para a falange conservadora que tomou conta de grande parte dos veículos de comunicação do Brasil. De forma premeditada e com muita astúcia, Mendes conseguiu fazer com que a velha mídia nacional gravitasse em torno dele, apenas com a promessa de intervir, como de fato interveio, nas ações de governo que ameaçavam a rotina, o conforto e as atividades empresariais da nossa elite colonial.
Nesse aspecto, os dois habeas corpus concedidos ao banqueiro Daniel Dantas, flagrado no mesmo crime que manteve o ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda no cárcere por 60 dias, foram nada mais que um cartão de visitas. Mais relevante do que tudo foi a capacidade de Gilmar Mendes fixar na pauta e nos editoriais da velha mídia a tese quase infantil da existência de um Estado policialesco levado a cabo pela Polícia Federal e, com isso, justificar, dali para frente, a mais temerária das gestões da Suprema Corte do País desde sua criação, há mais cem anos.
Num prazo de pouco menos de dois anos, Mendes politizou as ações do Judiciário pelo viés da extrema direita, coisa que não se viu nem durante a ditadura militar (1964-1985), época em que a Justiça andava de joelhos, mas dela não se exigia protagonismo algum. Assim, alinhou-se o ministro tanto aos interesses dos latifundiários, aos quais defende sem pudor algum, como aos dos torturadores do regime dos generais, ao se posicionar publicamente contra a revisão da Lei da Anistia, de cuja à apreciação no STF ele se esquivou, herança deixada a céu aberto para o novo presidente do tribunal, ministro Cezar Peluso. Para Mendes, tal revisão poderá levar o País a uma convulsão social. É uma tese tão sólida como o conto da escuta telefônica, fábula jornalística que teve o presidente do STF como personagem principal a dialogar canduras com o senador Demóstenes Torres, do DEM de Goiás.
A farsa do grampo, publicada pela revista Veja e repercutida, em série, por veículos co-irmãos, serviu para derrubar o delegado Paulo Lacerda do comando da PF, com o auxílio luxuoso do ministro da Defesa, Nelson Jobim, que se valeu de uma mentira para tal. E essa, não se enganem, foi a verdadeira missão a ser cumprida. Na aposentadoria, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva terá tempo para refletir e registrar essa história amarga em suas memórias: o dia em que, chamado “às falas” por Gilmar Mendes, não só se submeteu como aceitou mandar para o degredo, em Portugal, o melhor e mais importante diretor geral que a Polícia Federal brasileira já teve. O fez para fugir de um enfrentamento necessário e, por isso mesmo, aceitou ser derrotado. Aliás, creio, a única verdadeira derrota do governo Lula foi exatamente a de abrir mão da política de combate permanente à corrupção desencadeada por Lacerda na PF para satisfazer os interesses de grupos vinculados às vontades de Gilmar Mendes.
O presidente do STF deu centenas de entrevistas sobre os mais diversos assuntos, sobretudo aqueles sobre os quais não poderia, como juiz, jamais se pronunciar fora dos autos. Essa é, inclusive, a mais grave distorção do sistema de escolha dos nomes ao STF, a de colocar não-juízes, como Mendes, na Suprema Corte, para julgar as grandes questões constitucionais da nação. Alheio ao cargo que ocupava (ou ciente até demais), o ministro versou sobre tudo e sobre todos. Deu força e fé pública a teses as mais conservadoras. Foi um arauto dos fazendeiros, dos banqueiros, da guarda pretoriana da ditadura militar e da velha mídia. Em troca, colheu farto material favorável a ele no noticiário, um relicário de elogios e textos laudatórios sobre sua luta contra o Estado policial, os juízes de primeira instância, o Ministério Público e os movimentos sociais, entre outros moinhos de vento vendidos nos jornais como inimigos da democracia.
Na imprensa nacional, apenas CartaCapital, por meio de duas reportagens (“O empresário Gilmar” e “Nos rincões de Mendes”), teve coragem de se contrapor ao culto à personalidade de Mendes instalado nas redações brasileiras como regra de jornalismo. Por essa razão, somos, eu e a revista, processados pelo ministro. Acusa-nos, o magistrado, de má fé ao divulgar os dados contábeis do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), uma academia de cursinhos jurídicos da qual Mendes é sócio. Trata-se de instituição construída com dinheiro do Banco do Brasil, sobre terreno público praticamente doado pelo ex-governador do DF Joaquim Roriz e mantido às custas de contratos milionários fechados, sem licitação, com órgãos da União.
Assim, a figura de Gilmar Mendes, além de tudo, está inserida eternamente em um dos piores momentos do jornalismo brasileiro. E não apenas por ter sido o algoz do fim da obrigatoriedade do diploma para se exercer a profissão, mas, antes de tudo, por ter dado enorme visibilidade a maus jornalistas e, pior ainda, fazer deles, em algum momento, um exemplo servil de comportamento a ser seguido como condição primordial de crescimento na carreira. Foi dessa simbiose fatal que nasceu não apenas a farsa do grampo, mas toda a estrutura de comunicação e de relação com a imprensa do STF, no sombrio período da Idade Mendes.
Emblemática sobre essa relação foi uma nota do informe digital “Jornalistas & Companhia”, de abril de 2009, sobre o aniversário do publicitário Renato Parente, assessor de imprensa de Gilmar Mendes no STF (os grifos são originais):
“A festa de aniversário de 45 anos de Renato Parente, chefe do Serviço de Imprensa do STF (e que teve um papel importante na construção da TV Justiça, apontada como paradigma na área da tevê pública), realizada na tarde do último domingo (19/4), em Brasília, mostrou a importância que o Judiciário tem hoje no cenário nacional. Estiveram presentes, entre outros, a diretora da Globo, Sílvia Faria, a colunista Mônica Bergamo, e o próprio presidente do STF, Gilmar Mendes, entre outros”.
Olha, quando festa de aniversário de assessor de imprensa serve para mostrar a importância do Poder Judiciário, é sinal de que há algo muito errado com a instituição. Essa relação de Renato Parente com celebridades da mídia é, em todos os sentidos, o pior sintoma da doença incestuosa que obriga jornalistas de boa e má reputação a se misturarem, em Brasília, em cerimônias de beija-mão de caráter duvidoso. Foi, como se sabe, um convescote de sintonia editorial. Renato Parente é o chefe da assessoria que, em março de 2009, em nome de Gilmar Mendes, chamou o presidente da Câmara, deputado Michel Temer (PMDB-SP), às falas, para que um debate da TV Câmara fosse retirado do ar e da internet. Motivo: eu critiquei o posicionamento do presidente do STF sobre a Operação Satiagraha e fiz justiça ao trabalho do delegado federal Protógenes Queiroz, além de citar a coragem do juiz Fausto De Sanctis ao mandar prender, por duas vezes, o banqueiro Daniel Dantas.
Certamente em consonância com o “paradigma na área de tevê pública” da TV Justiça tocada por Renato Parente, a censura na Câmara foi feita com a conivência de um jornalista, Beto Seabra, diretor da TV Câmara, que ainda foi mais além: anunciou que as pautas do programa “Comitê de Imprensa”, a partir dali, seriam monitoradas. Um vexame total. Denunciei em carta aberta aos jornalistas e em todas as instâncias corporativas (sindicatos, Fenaj e ABI) o ato de censura e, com a ajuda de diversos blogs, consegui expor aquela infâmia, até que, cobrada publicamente, a TV Câmara foi obrigada a capitular e recolocar o programa no ar, ao menos na internet. Foi uma das grandes vitórias da blogosfera, até então, haja vista nem um único jornal, rádio ou emissora de tevê, mesmo diante de um gravíssimo caso de censura e restrição de liberdade de expressão e imprensa, ter tido coragem de tratar do assunto. No particular, no entanto, recebi centenas de e-mails e telefonemas de solidariedade de jornalistas de todo o país.
Não deixa de ser irônico que, às vésperas de deixar a presidência do STF, Gilmar Mendes tenha sido obrigado, na certa, inadvertidamente, a se submeter ao constrangimento de ver sua gestão resumida ao caso Daniel Dantas, durante entrevista no youtube. Como foi administrada pelo Google, e não pelo paradigma da TV Justiça, a sabatina acabou por destruir o resto de estratégia ainda imaginada por Mendes para tentar passar à história como o salvador da pátria ameaçada pelo Estado policial da PF. Ninguém sequer tocou nesse assunto, diga-se de passagem. As pessoas só queriam saber dos HCs a Daniel Dantas, do descrédito do Judiciário e da atuação dele e da família na política de Diamantino, terra natal dos Mendes, em Mato Grosso. Como último recurso, a assessoria do ministro ainda tentou tirar o vídeo de circulação, ao menos no site do STF, dentro do sofisticado e democrático paradigma de tevê pública bolado por Renato Parente.
Como derradeiro esforço, nos últimos dias de reinado, Mendes dedicou-se a dar entrevistas para tentar, ainda como estratégia, vincular o próprio nome aos bons resultados obtidos por ações do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), embora o mérito sequer tenha sido dele, mas de um juiz de carreira, Gilson Dipp. Ministro do Superior Tribunal de Justiça e corregedor do órgão, Dipp foi nomeado para o cargo pelo presidente Lula, longe da vontade de Gilmar Mendes. Graças ao ministro do STJ, foi feita a maior e mais importante devassa nos tribunais de Justiça do Brasil, até então antros estaduais intocáveis comandados, em muitos casos, por verdadeiras quadrilhas de toga.
É de Gilson Dipp, portanto, e não de Gilmar Mendes, o verdadeiro registro moralizador do Judiciário desse período, a Idade Mendes, de resto, de triste memória nacional.
Mas que, felizmente, se encerra hoje.
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sexta-feira, 23 de abril de 2010
Gilmar Mendes (ou Dantas?) já vai tarde
Nesta sexta-feira, o sinistro Gilmar Mendes finalmente deixou a presidência do Supremo Tribunal Federal (STF). As reações diante da sua despedida foram distintas. A mídia privada chorou a saída. Editorial da Folha bajulou o ministro. O Estadão também choramingou. Já a TV Globo despeja diariamente confetes e até poderia, dramatizando a troca de comando, acionar o repórter Heraldo Pereira para chorar na telinha. Afinal, ele é serviçal da Gilmar Mendes – nas horas vagas, ele dá aulas no Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), a escola privada do ex-presidente do STF.
Já os movimentos sociais e os democratas festejaram a sua saída. Para estes, Gilmar Mendes já vai tarde! Ou melhor: ele nunca deveria ter assumido o comando da mais alta corte do Brasil. Afinal, ele jamais teve a isenção necessária para exercer a função. Sempre foi um tucano de carteirinha – ou um “juristucano”, segunda a corrosiva ironia do jornalista Elio Gaspari. De 1996 a 2000, ele foi subchefe de assuntos jurídicos da Casa Civil no governo FHC. Depois, o protegido do grão-tucano galgou o posto de advogado-geral da União, que exerceu com reconhecida mediocridade.
Habeas corpus para especuladores
Seu ingresso no STF foi a fórceps. FHC interveio ativamente para bancar o seu nome no Senado. Dos 11 ministros da casa, ele teve o maior número de votos contrários (15) da história recente. Na véspera da sessão que aprovou sua indicação, em junho de 2002, Dalmo de Abreu Dallari, um dos mais renomados juristas do país, até alertou: “Se essa indicação vier a ser aprovada no Senado, não há exagero em afirmar que estarão correndo sérios riscos a proteção dos direitos no Brasil, o combate à corrupção e a própria normalidade constitucional”. Proféticas palavras!
Durante a sua presidência, o STF colecionou os piores momentos da sua história. Gilmar Mendes virou estrela por conceder dois habeas corpus ao rentista Daniel Dantas, retirando-o da prisão em tempo recorde. Tanto que o jornalista Paulo Henrique Amorim o apelidou de Gilmar Dantas! A revista CartaCapital, que nunca deu tréguas aos crimes do agiota “orelhudo”, também criticou as atitudes do ex-presidente do STF. Na prática, ele ficou conhecido como o advogado de defesa do especulador-mor do país, expressão maior da impunidade dos bandidos de colarinho branco.
“Que Deus nos livre de Mendes”
Ao mesmo em que socorria banqueiros e ricaços, Gilmar Mendes ficou famoso por criminalizar os movimentos sociais. Em várias ocasiões, ele atacou os que lutam por justiça no país. Rotulou o MST de “movimento de bandidos”, exigindo atuação mais implacável da Justiça na punição aos “invasores de terras”. Também criticou o governo Lula por dar subsídios para as entidades da reforma agrária, afirmando que o dinheiro seria desviado para “práticas ilegais”. Diante destes abusos de poder, a Comissão Pastoral da Terra (CPT) “excomungou” o ex-presidente do STF.
“O ministro Gilmar Mendes não esconde sua parcialidade e de que lado está. Como proprietário de terra no Mato Grosso, ele é um representante das elites brasileiras, ciosas dos seus privilégios. Para ele e para elas, os que valem são os que impulsionam o ‘progresso’, embora ao preço do desvio de recursos, da grilagem de terra, da destruição do meio-ambiente e da exploração da mão-de-obra em condições análogas às do trabalho escravo... Que o Deus da Justiça ilumine o nosso país e o livre de juízes como Gilmar Mendes”, afirmou uma dura nota da CPT.
Ícone da direita, o “Berlusconi brasileiro”
O ex-presidente da STF também não poupou o movimento sindical brasileiro, investindo contra suas formas de sustentação financeira. Já entre os jornalistas, Gilmar Mendes foi eleito inimigo jurado. Ele foi o mentor do fim do diploma da categoria e da extinção da Lei de Imprensa, duas exigências antigas dos barões da mídia para precarizar o trabalho e gozar de total libertinagem. Tanto que os jornalistas aproveitaram a sexta-feira para fazer o bota-fora do carrasco, realizando protestos em vários estados com o slogan “Ele já vai tarde”.
Gilmar Mendes virou o ícone da direita, o “Berlusconi brasileiro”, sendo bajulado pela oposição demotucano. Em vários momentos, ele foi o principal porta-voz dos ataques preconceituosos ao governo Lula. Sem provas e num gesto irresponsável, chegou a acusar o Executivo de promover escutas telefônicas e atirou: “Não há mais como descer na escala da degradação institucional... Gravar clandestinamente os telefonemas do presidente do STF é coisa de regime totalitário”. Ele extrapolou nas suas funções e colocou em risco o próprio equilíbrio entre os poderes.
Gilmar Mendes sai da presidência do STF sem deixar saudade. No próprio Supremo, ele foi alvo de ásperas críticas. Num dos momentos mais tensos do Judiciário, o ministro Joaquim Barbosa lavou a alma dos brasileiros ao espinafrar, em público, a sua postura autoritária e elitista. “Vossa excelência está destruindo a Justiça deste país... Saia à rua, saia à rua. Vossa excelência não está na rua, não. Vossa excelência está na mídia, destruindo a credibilidade do judiciário brasileiro... Vossa excelência, quando se dirige a mim não está falando com seus capangas do Mato Grosso”. Barbosa falou por todos nós. Gilmar Mendes (ou Dantas, ou Mentes?) já vai tarde!
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quinta-feira, 22 de abril de 2010
Serra tira os sapatinhos para os EUA
O presidenciável demotucano José Serra vai aos poucos soltando suas asinhas. Quando sua pré-candidatura foi oficializada, no início de abril, ele se fingiu de bonzinho. Evitando se confrontar com a alta popularidade do presidente Lula, afirmou que manteria o que há de positivo no atual governo e lançou o bordão adocicado “O Brasil pode mais” – que logo foi encampado pela TV Globo numa desastrada propaganda subliminar. Mas o “Serrinha paz e amor” não se sustenta. É pura estratégia eleitoral, coisa de marqueteiro esperto para embalar um produto falsificado.
Na semana passada, num evento com empresários de Minas Gerais, José Serra começou a fazer a demarcação dos projetos em disputa da eleição de outubro. Ele criticou o Plano de Aceleração do Crescimento, o que reforça a confissão à revista Veja do presidente do PSDB, Sérgio Guerra, de que o PAC será extinto. Também afirmou que irá “rever o papel” do BNDES. O que chamou a atenção no seu discurso, porém, foi o ataque ao Mercosul. Para ele, o bloco regional “atrapalha as relações comerciais do Brasil”. O discurso deve ter agradado aos seus amos dos EUA.
“Alinhamento automático” com o império
De há muito que a política externa do presidente Lula, mais altiva e ativa na defesa da soberania nacional, é motivo de duras críticas da oposição neoliberal-conservadora. Os demotucanos nunca engoliram a prioridade dada ao Mercosul e à integração regional; tentaram sabotar o ingresso da Venezuela no bloco regional e são inimigos declarados dos governos progressistas da região; não se pronunciaram contra o golpe militar em Honduras, mas condenaram o governo por dar abrigo ao presidente deposto. Para eles, como revela José Serra, a integração latino-americana atrapalha.
Presença nauseante nos telejornais da Globo e nas páginas dos jornalões e revistonas direitistas, os embaixadores tucanos Celso Lafer, Rubens Barbosa e Luiz Felipe Lampreia sempre pregaram o retorno à política de FHC do “alinhamento automático” com os EUA. No episódio recente da ameaça do governo Lula de retaliar produtos ianques em oposição ao seu protecionismo, alguns deles saíram em defesa dos EUA. Eles temem qualquer postura mais soberana diante do império. São contra a política de diversificação comercial do Brasil, contra a ênfase nas relações Sul-Sul.
Complexo de vira-lata dos demotucanos
Este é o time do candidato José Serra. Essa é a sua orientação para a política externa. Na prática, a oposição neoliberal-conservadora sonha com o retorno ao “alinhamento automático”. Mercosul e outras iniciativas visando quebrar o unilateralismo imperial seriam enterradas com a eleição do demotucano. O Brasil regrediria para o triste período de FHC, de total subserviência às potências capitalistas – do complexo de “vira-lata”. Serra tenta se afastar da imagem desgastada de FHC, mas sua política externa seria idêntica – não como farsa, mas como tragédia no mundo atual.
Para entender o que representaria este retrocesso vale a pena ler o livro “As relações perigosas: Brasil-Estados Unidos (de Collor a Lula, 1990-2004)”, do renomado historiador Luiz Alberto Moniz Bandeira. Ele comprova, como farta documentação, como a política externa regrediu nos oito anos de reinado de FHC. Neste período nefasto, o país só não aderiu ao tratado neocolonial dos EUA, a Área de Livre Comércio das Américas (Alca), devido à reação da sociedade. Esta resistência também evitou que Alcântara, no Maranhão, virasse uma base militar ianque.
Tratamento humilhante para o Brasil
Entre outros casos vexatórios da política de FHC, Moniz Bandeira relata a sumária exoneração do embaixador Samuel Pinheiro Guimarães do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais (IPRI) do Itamaraty, por este ter alertado o governo para os graves riscos da Alca. Cita a atitude acovardada do ex-ministro Celso Lafer diante das pressões dos EUA para afastar o embaixador brasileiro José Maurício Bustani da direção da Organização para a Proibição de Armas Químicas (OPAQ), ligada à ONU, por este ter tentado evitar a guerra genocida no Iraque. Lembra ainda os discursos do ex-ministro de FHC propondo a participação do Brasil no genocídio no Iraque com base no draconiano Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR).
O ápice dessa postura subserviente se deu quando o diplomata aceitou tirar seus sapatinhos nos aeroportos dos EUA. “Em 31 de janeiro de 2002, Celso Lafer, ministro das Relações Exteriores do Brasil, sujeitou-se a tirar os sapatos e ficar descalço, a fim de ser revistado por seguranças do aeroporto, ao desembarcar em Miami. Esse desaire, ele novamente aceitou antes de tomar o avião para Washington, e mais uma vez desrespeitou a si próprio e desonrou não apenas o cargo de ministro, como também o governo ao qual servia. E, ao desembarcar em Nova York, voltou a tirar os sapatos, submetendo-se, pela terceira vez, ao mesmo tratamento humilhante”.
Subserviência ou soberania nacional?
Com base nas suas pesquisas, Moniz Bandeira garante que a eleição de Lula deu início a uma guinada na política externa, retomando a trajetória seguida por Vargas e outros nacionalistas. Ele lembra os discursos do então candidato contra a Alca, a indicação de Celso Amorim e de Samuel Pinheiro para o seu Ministério de Relações Exteriores, a prioridade às negociações do Mercosul, os esforços para a construção de um bloco regional sul-americano e a frenética investida na diversificação das relações com outros países em desenvolvimento – como China, Índia e Rússia. Cita ainda os duros discursos contra a ocupação do Iraque e o veto à base ianque em Alcântara.
Para o autor, após a longa fase de subserviência ao império, as relações do Brasil com os EUA voltaram a ficar tensas. Ele registra os vários discursos hidrófobos da direita estadunidense e não descarta manobras ardilosas e violentas para sabotar o atual projeto de autonomia nacional. Mas se mostra confiante na habilidade e ousadia da atual equipe do Itamaraty. Reproduzindo artigo do jornal O Globo, ele afirma que “há tempos (Celso Amorim) avisou a embaixadora dos EUA que não há força no mundo capaz de fazê-lo tirar os sapatos durante a revista de segurança dos aeroportos americanos. ‘Vou preso, mas não tiro o sapato’”. Conforme indica Moniz Bandeira, este é o dilema do Brasil na atualidade: subserviência ou soberania nacional?
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Na semana passada, num evento com empresários de Minas Gerais, José Serra começou a fazer a demarcação dos projetos em disputa da eleição de outubro. Ele criticou o Plano de Aceleração do Crescimento, o que reforça a confissão à revista Veja do presidente do PSDB, Sérgio Guerra, de que o PAC será extinto. Também afirmou que irá “rever o papel” do BNDES. O que chamou a atenção no seu discurso, porém, foi o ataque ao Mercosul. Para ele, o bloco regional “atrapalha as relações comerciais do Brasil”. O discurso deve ter agradado aos seus amos dos EUA.
“Alinhamento automático” com o império
De há muito que a política externa do presidente Lula, mais altiva e ativa na defesa da soberania nacional, é motivo de duras críticas da oposição neoliberal-conservadora. Os demotucanos nunca engoliram a prioridade dada ao Mercosul e à integração regional; tentaram sabotar o ingresso da Venezuela no bloco regional e são inimigos declarados dos governos progressistas da região; não se pronunciaram contra o golpe militar em Honduras, mas condenaram o governo por dar abrigo ao presidente deposto. Para eles, como revela José Serra, a integração latino-americana atrapalha.
Presença nauseante nos telejornais da Globo e nas páginas dos jornalões e revistonas direitistas, os embaixadores tucanos Celso Lafer, Rubens Barbosa e Luiz Felipe Lampreia sempre pregaram o retorno à política de FHC do “alinhamento automático” com os EUA. No episódio recente da ameaça do governo Lula de retaliar produtos ianques em oposição ao seu protecionismo, alguns deles saíram em defesa dos EUA. Eles temem qualquer postura mais soberana diante do império. São contra a política de diversificação comercial do Brasil, contra a ênfase nas relações Sul-Sul.
Complexo de vira-lata dos demotucanos
Este é o time do candidato José Serra. Essa é a sua orientação para a política externa. Na prática, a oposição neoliberal-conservadora sonha com o retorno ao “alinhamento automático”. Mercosul e outras iniciativas visando quebrar o unilateralismo imperial seriam enterradas com a eleição do demotucano. O Brasil regrediria para o triste período de FHC, de total subserviência às potências capitalistas – do complexo de “vira-lata”. Serra tenta se afastar da imagem desgastada de FHC, mas sua política externa seria idêntica – não como farsa, mas como tragédia no mundo atual.
Para entender o que representaria este retrocesso vale a pena ler o livro “As relações perigosas: Brasil-Estados Unidos (de Collor a Lula, 1990-2004)”, do renomado historiador Luiz Alberto Moniz Bandeira. Ele comprova, como farta documentação, como a política externa regrediu nos oito anos de reinado de FHC. Neste período nefasto, o país só não aderiu ao tratado neocolonial dos EUA, a Área de Livre Comércio das Américas (Alca), devido à reação da sociedade. Esta resistência também evitou que Alcântara, no Maranhão, virasse uma base militar ianque.
Tratamento humilhante para o Brasil
Entre outros casos vexatórios da política de FHC, Moniz Bandeira relata a sumária exoneração do embaixador Samuel Pinheiro Guimarães do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais (IPRI) do Itamaraty, por este ter alertado o governo para os graves riscos da Alca. Cita a atitude acovardada do ex-ministro Celso Lafer diante das pressões dos EUA para afastar o embaixador brasileiro José Maurício Bustani da direção da Organização para a Proibição de Armas Químicas (OPAQ), ligada à ONU, por este ter tentado evitar a guerra genocida no Iraque. Lembra ainda os discursos do ex-ministro de FHC propondo a participação do Brasil no genocídio no Iraque com base no draconiano Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR).
O ápice dessa postura subserviente se deu quando o diplomata aceitou tirar seus sapatinhos nos aeroportos dos EUA. “Em 31 de janeiro de 2002, Celso Lafer, ministro das Relações Exteriores do Brasil, sujeitou-se a tirar os sapatos e ficar descalço, a fim de ser revistado por seguranças do aeroporto, ao desembarcar em Miami. Esse desaire, ele novamente aceitou antes de tomar o avião para Washington, e mais uma vez desrespeitou a si próprio e desonrou não apenas o cargo de ministro, como também o governo ao qual servia. E, ao desembarcar em Nova York, voltou a tirar os sapatos, submetendo-se, pela terceira vez, ao mesmo tratamento humilhante”.
Subserviência ou soberania nacional?
Com base nas suas pesquisas, Moniz Bandeira garante que a eleição de Lula deu início a uma guinada na política externa, retomando a trajetória seguida por Vargas e outros nacionalistas. Ele lembra os discursos do então candidato contra a Alca, a indicação de Celso Amorim e de Samuel Pinheiro para o seu Ministério de Relações Exteriores, a prioridade às negociações do Mercosul, os esforços para a construção de um bloco regional sul-americano e a frenética investida na diversificação das relações com outros países em desenvolvimento – como China, Índia e Rússia. Cita ainda os duros discursos contra a ocupação do Iraque e o veto à base ianque em Alcântara.
Para o autor, após a longa fase de subserviência ao império, as relações do Brasil com os EUA voltaram a ficar tensas. Ele registra os vários discursos hidrófobos da direita estadunidense e não descarta manobras ardilosas e violentas para sabotar o atual projeto de autonomia nacional. Mas se mostra confiante na habilidade e ousadia da atual equipe do Itamaraty. Reproduzindo artigo do jornal O Globo, ele afirma que “há tempos (Celso Amorim) avisou a embaixadora dos EUA que não há força no mundo capaz de fazê-lo tirar os sapatos durante a revista de segurança dos aeroportos americanos. ‘Vou preso, mas não tiro o sapato’”. Conforme indica Moniz Bandeira, este é o dilema do Brasil na atualidade: subserviência ou soberania nacional?
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Como perder uma eleição ganha
Reproduzo artigo de Eduardo Guimarães, do blog Cidadania.com:
Este texto já foi escrito um bilhão de vezes por mim e por muitos outros, se me permitem o exagero. Trata da forma mais eficiente (sic) para um bom governante, extremamente popular e com seu povo vibrando de satisfação, conseguir perder uma eleição ganha simplesmente não fazendo a menor força para vencer.
Aliás, trata-se de um método de autofagia eleitoral que a ex-prefeita Marta Suplicy usou com enorme “competência” em sua campanha à prefeitura paulistana em 2008, dando minha cidade de presente para o boneco inflável do Serra enchê-la de água com excrementos até a tampa, entre outros danos que vem causando a São Paulo. Aliás, a obra kassabiana é o que tem feito sua popularidade mergulhar em queda livre.
A sorte da direita, porém, é a de que o paulista é o povo mais alienado da América Latina. Viajo por este país e por este continente há 30 anos e não conheço um povo mais inexplicável do que o do Estado e da cidade nos quais eu e minhas quatro ou cinco gerações de ascendentes vivemos. Só um povo assim para não se lembrar que quem lhe deu Kassab foi Serra.
Mas tudo isso seria contornável simplesmente porque São Paulo não é o Brasil e porque, além disso, um terço dessa enorme população tem miolos, de forma que a unidade federativa mais reacionária da América Latina pode conseguir eleger seus prefeitos e governadores reacionários o quanto quiser, mas está provado que não pode impedir o Brasil de ir para lado diametralmente oposto.
Só que, para usar essa brecha para impedir que o país caia de novo nas mãos dos vampiros tucanos e pefelês, seria preciso travar o debate político em todas as frentes, não aceitando que a parte da imprensa aliada do PSDB infrinja a lei eleitoral ao não abrir mão de denunciá-la no amplo espaço que o PT teve e que terá na TV, que é onde acontece a eleição.
No segundo turno de 2008, em vez de Marta Suplicy permitir que sua campanha desandasse para a baixaria ao atacar a vida privada de Kassab da mesma forma suja com que a ex-prefeita sempre foi atacada, ela poderia ter usado o horário eleitoral para pelo menos perder bonito, fazendo uma denúncia que o PT nunca ousou fazer na TV em campanhas eleitorais, de que este, aquele e aquele jornal, tevê, revista, rádio têm lado devido a motivos escusos.
Mas o PT tem medo. A Globo faz uma vinheta para Serra e põe no seu espaço comercial mais caro (o intervalo do Fantástico, no domingo) e fica por isso mesmo. Ou seja: apesar de ter recuado depois que, como relatou o blogueiro Ricardo Noblat, um de seus advogados recebeu um aviso do próximo presidente do TSE, ministro Ricardo Lewandovsky, a emissora de Serra fez seu trabalhinho sujo.
Dezenas de milhões de Homers Simpsons assistiram, no domingo passado à noite, a uma propaganda de Serra dizendo que o Brasil quer mais em resposta ao seu bordão de que o Brasil pode mais. Está feito, minha gente. Propaganda para um lado só. Foi uma só e foi só o que bastou.
O PT deveria ir à Justiça Eleitoral e pedir espaço no intervalo do Fantástico para pregar que concessões públicas não sejam usadas com fim eleitoral para um só dos candidatos. Deveria explicar que o espectro eletromagnético pertence a todos os brasileiros e não apenas aos eleitores de Serra, mesmo sendo eles os concessionários públicos.
Mas o mundo caiu sobre a cabeça do coordenador da campanha de Dilma na internet, Marcelo Branco, só por ele fazer uma observação no Twitter sobre o partidarismo descarado de uma vinheta televisiva em que até o logo da desculpa para ser feita, o dos 45 anos da Globo, usou fonte praticamente idêntica ao do logo do PSDB, e que aludiu sem parar ao bordão do Serra dizendo que o Brasil quer mais quando o tucano diz que ele pode mais – repetirei isso sem parar, também.
Em seguida, a mídia diz que Branco levou uma carraspana do PT por ter dito o que era preciso, por ter se contraposto a uma propaganda eleitoral absolutamente ilegal em favor de um dos pré-candidatos a presidente. É verdade? Dizem que não, que Branco foi, na verdade, efusivamente cumprimentado pelo PT. Que é mentira essa versão da mídia.
Só que quem cala, consente. Se é mentira que Branco foi advertido pelo PT por criticar a vinheta da Globo, advertência que a nota da coluna Painel da Folha desta quarta-feira diz que o publicitário recebeu, por que o partido não emite uma nota dizendo que o publicitário tem todo seu apoio pela crítica que fez?
Aliás, uma curiosidade: o PT pretendia aceitar aquele absurdo? Se Branco não tivesse chiado, o partido assistiria impassível àquela propaganda explícita de Serra, com logo igual ao do partido dele e dizendo que o Brasil quer mais depois de o pré-candidato do PSDB dizer que o Brasil pode mais? Será possível que os petistas não tiraram uma só lição de 2008?
Daí, alguns aloprados, desesperados pela falta de competência das lideranças petistas, inventam de jogar sujo questionando a sexualidade de uma pessoa ou comprando dossiês tentando vencer eleições perdidas. E quem é que paga o pato? Lula, Dilma, Marta... Ainda que, no caso da última, apesar de ser uma política com P maiúsculo, a ex-prefeita teve culpa no cartório em 2008, sim. Não vou tapar o sol com a peneira.
A militância petista está a um passo da desmobilização. O jornalista Mauro Carrara captou bem a situação em artigo amplamente reproduzido em blogs e sites pela internet e em listas de emails. Ele bem captou que estão transformando Dilma em Marta. É isso o que a direita faz com as mulheres na política, o que explica elas serem só dez por cento da classe política apesar de serem mais da metade da população brasileira.
Dilma tem tudo para ser eleita. O governo Lula é um sucesso. O povo quer sua continuidade. Contudo, começo a achar que o PT me subsidiará novo artigo igual a este que talvez eu tenha que escrever depois da eleição deste ano, um artigo que teria como título a frase “Como perder uma eleição ganha”.
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Este texto já foi escrito um bilhão de vezes por mim e por muitos outros, se me permitem o exagero. Trata da forma mais eficiente (sic) para um bom governante, extremamente popular e com seu povo vibrando de satisfação, conseguir perder uma eleição ganha simplesmente não fazendo a menor força para vencer.
Aliás, trata-se de um método de autofagia eleitoral que a ex-prefeita Marta Suplicy usou com enorme “competência” em sua campanha à prefeitura paulistana em 2008, dando minha cidade de presente para o boneco inflável do Serra enchê-la de água com excrementos até a tampa, entre outros danos que vem causando a São Paulo. Aliás, a obra kassabiana é o que tem feito sua popularidade mergulhar em queda livre.
A sorte da direita, porém, é a de que o paulista é o povo mais alienado da América Latina. Viajo por este país e por este continente há 30 anos e não conheço um povo mais inexplicável do que o do Estado e da cidade nos quais eu e minhas quatro ou cinco gerações de ascendentes vivemos. Só um povo assim para não se lembrar que quem lhe deu Kassab foi Serra.
Mas tudo isso seria contornável simplesmente porque São Paulo não é o Brasil e porque, além disso, um terço dessa enorme população tem miolos, de forma que a unidade federativa mais reacionária da América Latina pode conseguir eleger seus prefeitos e governadores reacionários o quanto quiser, mas está provado que não pode impedir o Brasil de ir para lado diametralmente oposto.
Só que, para usar essa brecha para impedir que o país caia de novo nas mãos dos vampiros tucanos e pefelês, seria preciso travar o debate político em todas as frentes, não aceitando que a parte da imprensa aliada do PSDB infrinja a lei eleitoral ao não abrir mão de denunciá-la no amplo espaço que o PT teve e que terá na TV, que é onde acontece a eleição.
No segundo turno de 2008, em vez de Marta Suplicy permitir que sua campanha desandasse para a baixaria ao atacar a vida privada de Kassab da mesma forma suja com que a ex-prefeita sempre foi atacada, ela poderia ter usado o horário eleitoral para pelo menos perder bonito, fazendo uma denúncia que o PT nunca ousou fazer na TV em campanhas eleitorais, de que este, aquele e aquele jornal, tevê, revista, rádio têm lado devido a motivos escusos.
Mas o PT tem medo. A Globo faz uma vinheta para Serra e põe no seu espaço comercial mais caro (o intervalo do Fantástico, no domingo) e fica por isso mesmo. Ou seja: apesar de ter recuado depois que, como relatou o blogueiro Ricardo Noblat, um de seus advogados recebeu um aviso do próximo presidente do TSE, ministro Ricardo Lewandovsky, a emissora de Serra fez seu trabalhinho sujo.
Dezenas de milhões de Homers Simpsons assistiram, no domingo passado à noite, a uma propaganda de Serra dizendo que o Brasil quer mais em resposta ao seu bordão de que o Brasil pode mais. Está feito, minha gente. Propaganda para um lado só. Foi uma só e foi só o que bastou.
O PT deveria ir à Justiça Eleitoral e pedir espaço no intervalo do Fantástico para pregar que concessões públicas não sejam usadas com fim eleitoral para um só dos candidatos. Deveria explicar que o espectro eletromagnético pertence a todos os brasileiros e não apenas aos eleitores de Serra, mesmo sendo eles os concessionários públicos.
Mas o mundo caiu sobre a cabeça do coordenador da campanha de Dilma na internet, Marcelo Branco, só por ele fazer uma observação no Twitter sobre o partidarismo descarado de uma vinheta televisiva em que até o logo da desculpa para ser feita, o dos 45 anos da Globo, usou fonte praticamente idêntica ao do logo do PSDB, e que aludiu sem parar ao bordão do Serra dizendo que o Brasil quer mais quando o tucano diz que ele pode mais – repetirei isso sem parar, também.
Em seguida, a mídia diz que Branco levou uma carraspana do PT por ter dito o que era preciso, por ter se contraposto a uma propaganda eleitoral absolutamente ilegal em favor de um dos pré-candidatos a presidente. É verdade? Dizem que não, que Branco foi, na verdade, efusivamente cumprimentado pelo PT. Que é mentira essa versão da mídia.
Só que quem cala, consente. Se é mentira que Branco foi advertido pelo PT por criticar a vinheta da Globo, advertência que a nota da coluna Painel da Folha desta quarta-feira diz que o publicitário recebeu, por que o partido não emite uma nota dizendo que o publicitário tem todo seu apoio pela crítica que fez?
Aliás, uma curiosidade: o PT pretendia aceitar aquele absurdo? Se Branco não tivesse chiado, o partido assistiria impassível àquela propaganda explícita de Serra, com logo igual ao do partido dele e dizendo que o Brasil quer mais depois de o pré-candidato do PSDB dizer que o Brasil pode mais? Será possível que os petistas não tiraram uma só lição de 2008?
Daí, alguns aloprados, desesperados pela falta de competência das lideranças petistas, inventam de jogar sujo questionando a sexualidade de uma pessoa ou comprando dossiês tentando vencer eleições perdidas. E quem é que paga o pato? Lula, Dilma, Marta... Ainda que, no caso da última, apesar de ser uma política com P maiúsculo, a ex-prefeita teve culpa no cartório em 2008, sim. Não vou tapar o sol com a peneira.
A militância petista está a um passo da desmobilização. O jornalista Mauro Carrara captou bem a situação em artigo amplamente reproduzido em blogs e sites pela internet e em listas de emails. Ele bem captou que estão transformando Dilma em Marta. É isso o que a direita faz com as mulheres na política, o que explica elas serem só dez por cento da classe política apesar de serem mais da metade da população brasileira.
Dilma tem tudo para ser eleita. O governo Lula é um sucesso. O povo quer sua continuidade. Contudo, começo a achar que o PT me subsidiará novo artigo igual a este que talvez eu tenha que escrever depois da eleição deste ano, um artigo que teria como título a frase “Como perder uma eleição ganha”.
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PT subestima a força da velha imprensa
Reproduzo abaixo o importante alerta do jornalista Rodrigo Vianna, do blog Escrevinhador:
A mídia conservadora deita e rola. E o PT segue calado, quase amortecido. À sombra de Lula.
Trata-se de um erro.
Lula uma vez disse: "que ninguém, nunca mais, ouse duvidar da capacidade de luta da classe trabalhadora".
Mas é preciso lembrar: "que ninguém, jamais, ouse subestimar a capacidade de manipulação da elite brasileira e de sua imprensa oligárquica".
Por que lembro disso?
Semana passada, participei de um debate no Sindicato dos Bancários de São Paulo, sobre internet e eleições.
Minha avaliação, que expus aos sindicalistas, é a seguinte:
1) devemos comemorar o papel dos blogs e redes sociais, como contraponto à velha imprensa;
2) mas não podemos superestimar o papel da chamada blogosfera.
Ainda falamos para um público limitado. Incomodamos, é verdade. Tanto que a Globo teve que suspender o comercial serrista dos 45 anos da emissora.
Mas não dá pra comparar nosso poder de fogo com a artilharia pesada de Globo, Veja e - em menor escala - de Folha, Estadão, Zero Hora, Correio Braziliense, RBS...
Fazemos guerrilha. Eles têm o exército convencional.
O poder da velha imprensa diminuiu bastante, é verdade. Mas é preciso lembrar que em 2006, por exemplo, a eleição só foi ao segundo turno graças ao bombardeio contra Lula nas duas últimas semanas de campanha.
Quem fez a diferença em 2006? A Globo, sobretudo.
A Globo tem chance de ganhar a eleição para Serra em 2010? Sozinha, não.
2010 não é 1989, quando a Globo "fez" de Collor o presidente.
Mas a Globo e seus aliados do café Millenium podem - sim - garantir 5% ou 6% dos votos, percentual suficiente para decidir um pleito que deve ser tão disputado.
Há outro detalhe a ressaltar. A Globo precisa agir de forma um pouco mais dissimulada do que seus aliados Milenares. Veja, Folha e Estadão falam para guetos conservadores. A Globo fala para todo Brasil.
Tudo que a TV carioca não quer é ter Lula por aí a dizer: "a Globo é inimiga do povo". Tudo que a Globo não quer é ganhar o rótulo de antipopular.
Pois é o que Lula deveria fazer...
Sei que no começo do ano o presidente recebeu os Marinho para um conversa. Em tese, uma tentativa de aplainar terreno em ano eleitoral. Os Marinho fingem que ficaram "bonzinhos". Mas Ali Kamel segue na coleira, pronto para ser lançado contra a candidata de Lula.
Depois do recuo da Globo no episódio do clip serrista, imaginem que a a emissora dos Marinho pode se fingir de "neutra" nos próximos 4 ou 5 meses. Afinal vem aí Copa do Mundo, depois o horário político ganha peso...
Mas, na reta final, o povão volta a acompanhar o noticiário, pra decidir. Se a Globo farejar que pode dar o empurrão final para garantir a vitória a Serra, Ali Kamel vai sair da coleira para agir.
Em 2006, foi exatamente assim.
Subestimar o papel do Jornal Nacional numa reta final de eleição é desconhecer o que ainda é o Brasil. O Brasil não é a blogosfera!
O PT, estranhamente, segue calado. À sombra de Lula.
Foi preciso um rapaz (Marcelo Branco) - que nem tem mandato político - vir a público botar a Globo contra a parede no episódio do clip serista.
No caso DataSerra, foi preciso um deputado do PDT subir à tribuna para cobrar providências.
O partido do presidente e de Dilma não se manifesta.
Salto alto? Talvez...
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quarta-feira, 21 de abril de 2010
José Serra e o sumiço do Paulinho
Reproduzo uma piadinha que está circulando pela internet. Ela é ótima:
Serra foi a uma escola conversar com as criancinhas, acompanhado de uma comitiva do Jornal Nacional, da Veja e da Folha de São Paulo. Depois de apresentar todas as maravilhosas propostas para seu governo (se eleito), disse às criancinhas que iria responder perguntas.
Uma das crianças levantou a mão e Serra perguntou:
- Qual é o seu nome, meu filho?
- Paulinho.
- E qual é a sua pergunta?
- Eu tenho duas perguntas.
A primeira é "Quanto tempo o senhor vai esperar para sujar a barra da Dilma como fez com a Roseana Sarney??"
A segunda é "Onde sua filha Verônica conseguiu grana para ser dona de 10% do Ebay/Mercado Livre, estudar na Harvard Business School pagando R$ 60.000,00 por mês e ainda por cima "comprar" uma mansão em Trancoso onde o senhor passou o Reveillon???
Serra fica desnorteado, mas neste momento a campainha para o recreio toca e ele aproveita e diz que continuará a responder depois do recreio.
Após o recreio, Serra diz:
-OK, onde estávamos? Acho que eu ia responder perguntas. Quem tem perguntas?
Um outro garotinho levanta a mão e Serra aponta para ele, sorrindo para as câmeras da Globo.
-Pode perguntar, meu filho.
-Como é seu nome?
-Joãozinho, e tenho 4 perguntas:
A primeira é "Quanto tempo o senhor vai esperar para sujar a barra da Dilma como fez com a Roseana Sarney??"
A segunda é "Onde sua filha Verônica conseguiu grana para ser dona de 10% do Ebay/Mercado Livre, estudar na Harvard Business School pagando R$ 60.000,00 por mês e ainda por cima "comprar" uma mansão em Trancoso onde o senhor passou o Reveillon???
E a terceira é "Por que o sino do recreio tocou meia hora mais cedo?".
A quarta é... "Cadê o Paulinho??"
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Serra foi a uma escola conversar com as criancinhas, acompanhado de uma comitiva do Jornal Nacional, da Veja e da Folha de São Paulo. Depois de apresentar todas as maravilhosas propostas para seu governo (se eleito), disse às criancinhas que iria responder perguntas.
Uma das crianças levantou a mão e Serra perguntou:
- Qual é o seu nome, meu filho?
- Paulinho.
- E qual é a sua pergunta?
- Eu tenho duas perguntas.
A primeira é "Quanto tempo o senhor vai esperar para sujar a barra da Dilma como fez com a Roseana Sarney??"
A segunda é "Onde sua filha Verônica conseguiu grana para ser dona de 10% do Ebay/Mercado Livre, estudar na Harvard Business School pagando R$ 60.000,00 por mês e ainda por cima "comprar" uma mansão em Trancoso onde o senhor passou o Reveillon???
Serra fica desnorteado, mas neste momento a campainha para o recreio toca e ele aproveita e diz que continuará a responder depois do recreio.
Após o recreio, Serra diz:
-OK, onde estávamos? Acho que eu ia responder perguntas. Quem tem perguntas?
Um outro garotinho levanta a mão e Serra aponta para ele, sorrindo para as câmeras da Globo.
-Pode perguntar, meu filho.
-Como é seu nome?
-Joãozinho, e tenho 4 perguntas:
A primeira é "Quanto tempo o senhor vai esperar para sujar a barra da Dilma como fez com a Roseana Sarney??"
A segunda é "Onde sua filha Verônica conseguiu grana para ser dona de 10% do Ebay/Mercado Livre, estudar na Harvard Business School pagando R$ 60.000,00 por mês e ainda por cima "comprar" uma mansão em Trancoso onde o senhor passou o Reveillon???
E a terceira é "Por que o sino do recreio tocou meia hora mais cedo?".
A quarta é... "Cadê o Paulinho??"
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Veja tem lado e não é o do bom jornalismo
Reproduzo artigo enviado pelo amigo Sylvio Micelli:
Deixei de ler a revista Veja há mais de uma década. Acredito que, mais ou menos, desde quando obtive o, já em desuso, diploma de jornalista. São mais de 13 anos. Não faço sua leitura, exceto por educação ou algo muito específico, nem mesmo para saber, como diria meu grande amigo jornalista Gaspar Bissolotti Neto, “o que pensa o lado negro da força”.
Os motivos são vários, mas podem ser facilmente resumidos. O que a Veja fazia no final dos anos 90 não era jornalismo. Ao menos, não era aquele jornalismo ético e imparcial que havíamos aprendido na faculdade. Os mais críticos certamente dirão que a Veja nunca fez um jornalismo isento até porque, dentro do contexto histórico, a publicação foi, digamos, uma concessão do regime militar que em 1968, um dos anos mais violentos da ditadura e da edição do Ato Institucional nº 5, precisava “combater” outras publicações extremamente inteligentes e por isso mesmo, prejudiciais ao regime, em especial a revista Realidade.
À época da faculdade cheguei a assinar a revista. Muito mais por obrigação. Os professores acreditavam que a Veja era importante no processo de redemocratização do país e, afinal, era formadora da opinião da classe média a que todos nós pertencíamos. Uma grande bobagem. A publicação sempre defendeu um lado. Lado que nunca pertenci.
Passo longe dos discursos político-partidários. E muitos hão de achar que não leio a revista porque não comungo da campanha em prol do PSDB que a Veja encampa. Outra grande bobagem. Não sou partidário de José Serra. Nem de Dilma Roussef. E, para ser bem sincero, vejo com desdém esse maniqueísmo eleitoral ou campanha plebiscitária a envolver os dois partidos mais representativos do país – PT e PSDB – tendo o PMDB ora a servir este ou aquele cliente. Consigo ver, pessoalmente, outras opções melhores dentre os pré-candidatos apresentados.
A capa da revista Veja desta semana é risível. E seria cômico se não fosse trágico. Traz um José Serra clicado como um dândi, embalado a vácuo pronto para consumo. Tive a oportunidade de conhecer o ex-governador pessoalmente. Ele não é dócil. Muito pelo contrário. Tem um estilo firme e, aparentemente, está de eterno mau humor. Questão de estilo, apenas. E nem entro no mérito de sua administração que para mim foi péssima. A capa ainda fica mais ridícula ao ler uma chamada no alto para um artigo da “principal” oponente de Serra, Dilma Roussef. Certamente, a revista tentou camuflar dizendo que abre espaço para todos.
Enfim, a revista Veja é isso. Pseudo-jornalismo destinado à classe dominante. E pobre do país que tem uma publicação como esta, entre as mais lidas pela população. Isso explica muita coisa. Em especial nosso eterno atraso para questões muito mais importantes do que decidir, meramente, quem será o próximo presidente do Brasil.
Passou da hora da grande mídia repensar muitas de suas práticas. Com a Internet, blogs e redes sociais toda manipulação será questionada.
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