Por Paulo Kliass, no site Outras Palavras:
O governo do capitão vai completar cinco meses de vida na semana que vem. O grau de insatisfação no interior das próprias forças políticas que atuaram para sua vitória no pleito de outubro passado só faz aumentar a cada dia. A frustração que acomete uma parcela significativa de nossa população acaba tendo impactos também no interior do próprio Congresso Nacional. Em nenhum momento de nossa História havia sido registrado um grau de impopularidade tão elevado para uma equipe em início de mandato presidencial.
Um dos maiores obstáculos que Bolsonaro enfrenta refere-se à incapacidade do responsável pelo superministério da economia em oferecer soluções que atendam às expectativas da retomada do crescimento das atividades. O encantamento dos setores do financismo com o candidato da extrema direita era justificado pela presença de Paulo Guedes como o todo-poderoso da pasta que unificou os antigos Planejamento, Fazenda e Desenvolvimento da Indústria e Comércio.
Ocorre que não bastam as boas intenções. O cardápio oferecido pelo comando da economia se resume a praticar a austeridade extremada na dimensão fiscal e prometer a privatização das empresas estatais federais. Trata-se de uma reedição do conto de fadas das “expectativas de mercado”, como se a retomada da produção e dos investimentos fosse tão somente uma questão de vontade. O problema é que a saída da recessão só será viabilizada se houver uma recuperação do protagonismo do Estado. Fora disso, a situação fica como está: todo mundo esperando para ver como é que fica.
Assim, os índices oficiais acabam por confirmar o quadro de estagnação generalizada. Há um ano atrás, a pesquisa Focus do Banco Central (BC) revelava uma expectativa de crescimento do PIB na faixa de 3% para 2019. Naquele momento, não havia nenhuma informação objetiva que permitisse levar a tal conclusão. A única razão para que tal otimismo sem base na realidade aflorasse na consulta patrocinada pela autoridade monetária reside na esfera do político-ideológico. Era o início do fim do governo Temer e nada do que havia sido prometido à época do golpeachment contra Dilma Rousseff se concretizou. Com isso, os representantes do financismo dobravam sua aposta no processo sucessório e renovavam o mantra da necessidade de reformas conservadoras para reativar a economia.
Recessão, estagnação ou depressão?
A situação ficou tão complicada que até mesmo consultorias tradicionais do mercado financeiro passam a jogar a toalha e reconhecem finalmente que o plano inicial furou. Com isso, as páginas e as telas de economia dos grandes meios de comunicação passam a veicular outros conceitos na tentativa de caracterizar o descalabro que o Brasil vive. Assim, não estaríamos mais em “recessão”. De acordo com os relatórios produzidos por elas, estamos atravessando uma “depressão”. Como o PIB ainda cresce um pouquinho, mas o PIB per capita fica estacionado, estaríamos retornando a níveis do passado. Outros economistas ligados ao financismo ainda tentam salvar a própria pele e a do guru Guedes, afirmando que a economia estaria em “regressão”. Haja paciência para tanta maquiagem!
Enfim, independentemente do “ão” de preferência de cada analista para descrever a calamidade em que a ortodoxia monetarista nos enfiou, o fato é que a realidade social grita mais forte. São mais de 13 milhões de desempregados, mais de 27 milhões de pessoas sendo subaproveitadas em sua força de trabalhando e vivendo na informalidade. Os níveis reduzidos de consumo e a espiral crescente de falências decretadas confirmam o quadro de desassossego que nos afeta, que atinge a grande maioria da população.
Está mais do que provado que não basta bradar aos quatro ventos a necessidade da Reforma da Previdência. O caminho passa pela recuperação do nível de atividade por meio de um conjunto de políticas públicas afirmativas, onde o ingrediente do gasto público é fundamental. Há muito tempo que alertamos para a necessidade de um desenho de política econômica contracíclica, onde a ação do Estado contribua para orientar a retomada do crescimento com segurança e sustentabilidade. Ou seja, precisamos de uma estratégia oposta à que está sendo tentada por Paulo Guedes.
O problema é que nem todos são prejudicados por esse tipo de direção imposta pelo ex-aluno da Universidade de Chicago. Apesar da recessão ampla e do desastre generalizado, os setores que se acomodam no topo de nossa pirâmide da concentração continuam muito bem, obrigado. Os indicadores de desigualdade social e econômica continuam apontando para uma piora expressiva.
Aumento da desigualdade
Estudo recente da própria FGV carioca, por meio do instituto IBRE, revela que o índice de Gini vem apresentando queda consecutiva há 17 trimestres. A deterioração mais significativa tem início em 2013, com subida expressiva a partir de 2015 e apresenta um aumento da concentração de renda mesmo entre os que vivem de rendimentos do trabalho. O Índice de Gini mede a concentração e pode ser interpretado como expressão do grau de desigualdade.
Se esse fenômeno ocorre no interior dos próprios assalariados, quando saírem dados sobre o conjunto da população envolvendo os que vivem de renda financeira, aí sim a confirmação oficial da deterioração certamente será ainda mais gritante.
Afinal, as estatísticas do próprio IBGE apontam para o crescimento continuado do número de pessoas em situação de pobreza e miséria. Em 2017 eram 55 milhões de pessoas, subindo 2 milhões em relação a 2016. Caso sejam considerados apenas os segmentos de 0 a 14 anos, o retrato é terrível. Os dados apontam que 12,5% dessa parcela da população brasileira viviam na extrema pobreza e 43,4% na pobreza. Isso significa em números absolutos que 5,2 milhões de brasileiros de 0 a 14 anos estão na condição de extrema pobreza e 18,2 milhões na de pobreza.
Para o mesmo período, por outro lado, a renda média dos setores do topo da pirâmide cresceu 6%, ao passo que o restante da população teve queda de quase 4% nos seus rendimentos. Estudos mostram que as famílias do 1% mais ricos se apropriam de 30% da riqueza total do País. E, para exemplificar com dados ainda mais chocantes, apenas os 5 multibilionários brasileiros acumulam o equivalente ao patrimônio de metade de toda nossa população.
Mas o governo lança uma nova campanha publicitária, ao custo de R$ 37 milhões, com o intuito desesperado de convencer a população sobre a necessidade da PEC 06/2019. Mas ninguém mais se deixa enganar com o discurso de que a reforma previdenciária pretende acabar com “privilégios”. Os verdadeiros privilegiados seguem intocados e não fazem parte do universo de trabalhadores nem de atuais aposentados.
Como vimos, recessão rima com aumento das desigualdades. Essa política econômica assassina é de interesse dos setores da elite. O caminho para superar esse triste quadro passa pela reversão das políticas austericidas de Guedes e pela retomada do crescimento da economia.
O governo do capitão vai completar cinco meses de vida na semana que vem. O grau de insatisfação no interior das próprias forças políticas que atuaram para sua vitória no pleito de outubro passado só faz aumentar a cada dia. A frustração que acomete uma parcela significativa de nossa população acaba tendo impactos também no interior do próprio Congresso Nacional. Em nenhum momento de nossa História havia sido registrado um grau de impopularidade tão elevado para uma equipe em início de mandato presidencial.
Um dos maiores obstáculos que Bolsonaro enfrenta refere-se à incapacidade do responsável pelo superministério da economia em oferecer soluções que atendam às expectativas da retomada do crescimento das atividades. O encantamento dos setores do financismo com o candidato da extrema direita era justificado pela presença de Paulo Guedes como o todo-poderoso da pasta que unificou os antigos Planejamento, Fazenda e Desenvolvimento da Indústria e Comércio.
Ocorre que não bastam as boas intenções. O cardápio oferecido pelo comando da economia se resume a praticar a austeridade extremada na dimensão fiscal e prometer a privatização das empresas estatais federais. Trata-se de uma reedição do conto de fadas das “expectativas de mercado”, como se a retomada da produção e dos investimentos fosse tão somente uma questão de vontade. O problema é que a saída da recessão só será viabilizada se houver uma recuperação do protagonismo do Estado. Fora disso, a situação fica como está: todo mundo esperando para ver como é que fica.
Assim, os índices oficiais acabam por confirmar o quadro de estagnação generalizada. Há um ano atrás, a pesquisa Focus do Banco Central (BC) revelava uma expectativa de crescimento do PIB na faixa de 3% para 2019. Naquele momento, não havia nenhuma informação objetiva que permitisse levar a tal conclusão. A única razão para que tal otimismo sem base na realidade aflorasse na consulta patrocinada pela autoridade monetária reside na esfera do político-ideológico. Era o início do fim do governo Temer e nada do que havia sido prometido à época do golpeachment contra Dilma Rousseff se concretizou. Com isso, os representantes do financismo dobravam sua aposta no processo sucessório e renovavam o mantra da necessidade de reformas conservadoras para reativar a economia.
Financismo distorce e mente
Pois agora esses mesmos dirigentes de empresas financeiras e de bancos consultados pelo BC assumem que tudo se resumia a uma grande falácia. Ao longo dessas 52 semanas as expectativas foram sendo reduzidas e agora situam-se na faixa de minguado 1,24% para o crescimento do PIB para o ano em curso. Uma loucura! Um erro de quase 60% em suas previsões, com o objetivo puramente político de dourar a pílula para o futuro governo. Porém, por mais que tenham exagerado na operação de reforço às supostas capacidades técnicas e à competência de Paulo Guedes, a realidade falou mais alto. Ninguém dentre eles vai ser responsabilizado pelo dano causado à nossa sociedade por essa estratégia criminosa de inflar artificialmente o crescimento futuro do PIB. Assim são tomadas as decisões de política econômica em nosso País. O quartel general das classes dominantes sempre governado em causa própria.
A recessão atual teve início com o estelionato eleitoral praticado por Dilma ainda em 2015. A indicação de Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda marcou a consolidação do austericídio como política oficial de governo. Desde então a economia veio se afundando e atravessamos a maior recessão de nossa História entre 2015 e 2016. Nos dois anos seguintes, o crescimento do Produto foi pífio, mal superando o crescimento populacional. As perspectivas para o ano em curso são as piores possíveis.
Pois agora esses mesmos dirigentes de empresas financeiras e de bancos consultados pelo BC assumem que tudo se resumia a uma grande falácia. Ao longo dessas 52 semanas as expectativas foram sendo reduzidas e agora situam-se na faixa de minguado 1,24% para o crescimento do PIB para o ano em curso. Uma loucura! Um erro de quase 60% em suas previsões, com o objetivo puramente político de dourar a pílula para o futuro governo. Porém, por mais que tenham exagerado na operação de reforço às supostas capacidades técnicas e à competência de Paulo Guedes, a realidade falou mais alto. Ninguém dentre eles vai ser responsabilizado pelo dano causado à nossa sociedade por essa estratégia criminosa de inflar artificialmente o crescimento futuro do PIB. Assim são tomadas as decisões de política econômica em nosso País. O quartel general das classes dominantes sempre governado em causa própria.
A recessão atual teve início com o estelionato eleitoral praticado por Dilma ainda em 2015. A indicação de Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda marcou a consolidação do austericídio como política oficial de governo. Desde então a economia veio se afundando e atravessamos a maior recessão de nossa História entre 2015 e 2016. Nos dois anos seguintes, o crescimento do Produto foi pífio, mal superando o crescimento populacional. As perspectivas para o ano em curso são as piores possíveis.
Recessão, estagnação ou depressão?
A situação ficou tão complicada que até mesmo consultorias tradicionais do mercado financeiro passam a jogar a toalha e reconhecem finalmente que o plano inicial furou. Com isso, as páginas e as telas de economia dos grandes meios de comunicação passam a veicular outros conceitos na tentativa de caracterizar o descalabro que o Brasil vive. Assim, não estaríamos mais em “recessão”. De acordo com os relatórios produzidos por elas, estamos atravessando uma “depressão”. Como o PIB ainda cresce um pouquinho, mas o PIB per capita fica estacionado, estaríamos retornando a níveis do passado. Outros economistas ligados ao financismo ainda tentam salvar a própria pele e a do guru Guedes, afirmando que a economia estaria em “regressão”. Haja paciência para tanta maquiagem!
Enfim, independentemente do “ão” de preferência de cada analista para descrever a calamidade em que a ortodoxia monetarista nos enfiou, o fato é que a realidade social grita mais forte. São mais de 13 milhões de desempregados, mais de 27 milhões de pessoas sendo subaproveitadas em sua força de trabalhando e vivendo na informalidade. Os níveis reduzidos de consumo e a espiral crescente de falências decretadas confirmam o quadro de desassossego que nos afeta, que atinge a grande maioria da população.
Está mais do que provado que não basta bradar aos quatro ventos a necessidade da Reforma da Previdência. O caminho passa pela recuperação do nível de atividade por meio de um conjunto de políticas públicas afirmativas, onde o ingrediente do gasto público é fundamental. Há muito tempo que alertamos para a necessidade de um desenho de política econômica contracíclica, onde a ação do Estado contribua para orientar a retomada do crescimento com segurança e sustentabilidade. Ou seja, precisamos de uma estratégia oposta à que está sendo tentada por Paulo Guedes.
O problema é que nem todos são prejudicados por esse tipo de direção imposta pelo ex-aluno da Universidade de Chicago. Apesar da recessão ampla e do desastre generalizado, os setores que se acomodam no topo de nossa pirâmide da concentração continuam muito bem, obrigado. Os indicadores de desigualdade social e econômica continuam apontando para uma piora expressiva.
Aumento da desigualdade
Estudo recente da própria FGV carioca, por meio do instituto IBRE, revela que o índice de Gini vem apresentando queda consecutiva há 17 trimestres. A deterioração mais significativa tem início em 2013, com subida expressiva a partir de 2015 e apresenta um aumento da concentração de renda mesmo entre os que vivem de rendimentos do trabalho. O Índice de Gini mede a concentração e pode ser interpretado como expressão do grau de desigualdade.
Se esse fenômeno ocorre no interior dos próprios assalariados, quando saírem dados sobre o conjunto da população envolvendo os que vivem de renda financeira, aí sim a confirmação oficial da deterioração certamente será ainda mais gritante.
Afinal, as estatísticas do próprio IBGE apontam para o crescimento continuado do número de pessoas em situação de pobreza e miséria. Em 2017 eram 55 milhões de pessoas, subindo 2 milhões em relação a 2016. Caso sejam considerados apenas os segmentos de 0 a 14 anos, o retrato é terrível. Os dados apontam que 12,5% dessa parcela da população brasileira viviam na extrema pobreza e 43,4% na pobreza. Isso significa em números absolutos que 5,2 milhões de brasileiros de 0 a 14 anos estão na condição de extrema pobreza e 18,2 milhões na de pobreza.
Para o mesmo período, por outro lado, a renda média dos setores do topo da pirâmide cresceu 6%, ao passo que o restante da população teve queda de quase 4% nos seus rendimentos. Estudos mostram que as famílias do 1% mais ricos se apropriam de 30% da riqueza total do País. E, para exemplificar com dados ainda mais chocantes, apenas os 5 multibilionários brasileiros acumulam o equivalente ao patrimônio de metade de toda nossa população.
Mas o governo lança uma nova campanha publicitária, ao custo de R$ 37 milhões, com o intuito desesperado de convencer a população sobre a necessidade da PEC 06/2019. Mas ninguém mais se deixa enganar com o discurso de que a reforma previdenciária pretende acabar com “privilégios”. Os verdadeiros privilegiados seguem intocados e não fazem parte do universo de trabalhadores nem de atuais aposentados.
Como vimos, recessão rima com aumento das desigualdades. Essa política econômica assassina é de interesse dos setores da elite. O caminho para superar esse triste quadro passa pela reversão das políticas austericidas de Guedes e pela retomada do crescimento da economia.
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