sexta-feira, 7 de maio de 2010

Música latina faz sucesso em Ho Chi Minh

O oitavo artigo de Breno Altman sobre o Vietnã, publicado no sítio Opera Mundi:

O Hotel Caravelle abriga lembranças fabulosas. Ali pousavam, durante a guerra, correspondentes de importantes jornais e militares de alta patente. Era também alvo de ataques. Um de seus andares foi explodido por um comando guerrilheiro em 1964, quando ganhava força a escalada de Washington contra o Vietnã. Dois soldados norte-americanos morreram e 78 ficaram feridos.

Atualmente, o Caravelle é a torre de babel mais badalada de Ho Chi Minh. Principalmente por causa de seu famoso bar, o Saigon, Saigon. Localizado no nono andar, atrai estrangeiros e nacionais. Seus frequentadores apreciam o elogiado cardápio de comes e bebes, além da oportunidade de ver as ruas e edifícios iluminados do centro da cidade.

Mais que tudo, porém, gostam mesmo é de ouvir música ao vivo e se esbaldar na aconchegante pista de dança. Ali a festa entra pela madrugada. A animação da noite, de terça a domingo, desde setembro de 2008, está aos cuidados do grupo cubano Warapo. Seus ritmos latinos – salsa, merengue, chá-chá-chá, cumbia – fazem ferver a casa.

O quinteto tem uma formação eclética. O bandleader Alexei González, 31 anos, toca teclado e canta. O percussionista e vocalista Elder González, 38 anos, é apenas parcialmente homônimo de Alexei. O guitarrista Armando Lopez, 28 anos, que está de mudança para a Indonésia e dará lugar a outro músico de percussão, Raul Lopez, que não é seu irmão nem parente. E duas cantoras-bailarinas, Madelin Corona e Lissette Garcia, 23 e 22 anos, que deixam muitos clientes sem ar.

Formado em 1998 na Universidade de Las Villas, em Santa Clara, interior de Cuba, o Warapo é uma invenção de González e González. Alexei estudou cibernética. Elder era aluno de filologia. Não demoraram a se aventurar em Havana. Arrebentaram. Gravaram dois CDs, participaram de festivais e realizaram apresentações concorridas. Sempre com músicas de autoria dos fundadores da banda.

Ida para o Vietnã

Mas um dia resolveram se arriscar pelo mundo. Mandaram músicas e histórias para vários países. A proposta mais concreta veio do distante Vietnã. Um convite para assumir a noite em um dos mais importantes hotéis de Ho Chi Minh. Alguns meses depois estavam com contrato assinado e malas prontas. O acerto inicial era de um ano. Prorrogaram por outro mais.

“Somos o único grupo latino por aqui”, conta Alexei, que acabou conhecendo, na antiga Saigón, a também cubana Janet Leyva, 22 anos, uma rara estrangeira fluente em vietnamita. Casaram-se e o primeiro filho nascerá nos próximos meses. “No início, quem vinha ao bar ouvir nosso grupo eram turistas e residentes de outras nacionalidades. Mas pouco a pouco os vietnamitas começaram a aparecer”, conta.

“Eles sentavam nas mesas mais tranquilas e afastadas do palco”, lembra-se Elder. “Muitas vezes vinham famílias inteiras. Pareciam impressionados tanto com a batida das músicas quanto com o bailado de Madelin e Lissette. Não demorou muito para alguns deles darem suas primeiras requebradas latinas.”

Os cubanos também foram descobrindo que havia, em Ho Chi Minh, escolas de dança de salão. Os alunos, informados da nova atração no Saigon, Saigon, tinham encontrado um lugar para praticar os passos aprendidos. O boca-a-boca fez a fama do Warapo na cidade. Acabaram atraindo também a atenção da imprensa local.

O repertório do grupo inclui canções famosas de vários rincões, mescladas com algumas às quais eles próprios deram vida. Até sambas saem de suas vozes e instrumentos. O público vai ao delírio.

A adesão dos vietnamitas à música quente dos latinos não é a única surpresa cultural que reservam aos estrangeiros desavisados. Possivelmente dez em dez turistas apostariam que o ping-pong ou alguma luta marcial seria o esporte nacional. Perderiam feio. Eles gostam mesmo é de futebol, o bong dá, acompanhado com fanatismo por homens e mulheres. Vários brasileiros jogam e são ídolos no país.

Esse ambiente aberto a descobertas estimulou o Warapo a vôos mais altos. Quando acabar o contrato com o Caravelle, em julho, continuarão no Vietnã. A banda tem convites para tocar em várias cidades, o que ainda não foi possível por conta do compromisso de exclusividade que os prende ao Saigon, Saigon. Mas já se decidiram a pegar estrada.

“Nós ainda vamos encher as praças e os estádios daqui com o som do Caribe”, aposta Alexei. “Os vietnamitas não têm medo de experimentar o novo.”

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