terça-feira, 13 de setembro de 2016

Modelo de concessões elevará as tarifas

Por Tereza Cruvinel, em seu blog:

"As críticas ao modelo de concessões do governo Dilma não enganam ninguém. O que eles querem é adotar um modelo ditado pelo mercado, em que os investidores pagarão juros de mercado, impondo aos usuários tarifas mais altas. Além do mais, relicitando o que foi concedido, mudando as regras depois do jogo, acenam com uma preocupante insegurança jurídica”, diz a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), na véspera do anúncio do novo modelo de concessões pela administração Temer.

O modelo que será anunciado hoje - baseado em “premissas realistas”, segundo a presidente do BNDES, Maria Silvia Bastos Marques - trará duas mudanças fundamentais em relação ao que foi adotado por Dilma. A “modicidade tarifária”, pela qual é vencedora de um edital a empresa que oferecer a menor tarifa (taxa de embarque em aeroportos, pedágios em estradas etc.), deixa de ser o critério fundamental nas licitações. E fica descartada a concessão de financiamentos pelo BNDES com juros subsidiados. Os juros impacta diretamente os custos das obras e, por consequência, o valor da tarifa. Uma medida provisória será enviada ao Congresso permitindo que as concessões feitas por Dilma sejam relicitadas.

– Quando a presidente do BNDES fala em “premissas realistas”, está dizendo que vão adotar um modelo para atender ao mercado, em que o usuário deixa de ser levado em conta. Todas as críticas que estão sendo feitas ao modelo adotado no governo Dilma buscam apenas justificar esta servidão ao mercado, que terá outras consequências, além das tarifas elevadas – diz a senadora.

Se os juros não poderão ser subsidiados pelo BNDES, vão prevalecer as taxas de mercado, seja em financiamentos concedidos pelo banco estatal ou por outros bancos, públicos ou privados. Mesmo com juros de mercado, eles não emprestam no longo prazo exigido por obras de infraestrutura como portos, aeroportos, rodovias e ferrovias, entre outras, que exigem grandes volumes de investimentos. Os juros mais altos, naturalmente, vão impactar a tarifa cobrada pelos concessionários. Gleisi explica a relação entre subsídio e tarifa no modelo Dilma que agora será descartado:

– O modelo que adotamos previu que o BNDES garantiria financiamento a juros subsidiados para assegurar a tarifa mais módica e compatível com a situação econômica do país e com a capacidade de pagamento da população usuária. Houve uma discussão sobre a TIR, a taxa interna de retorno do investimento, que alguns consideraram muito baixa. Atendemos a estes reclamos elevando a TIR, em alguns casos até a 10% . Mas na hora do lance, algumas empresas ofereceram deságios tão significativos que a taxa, em alguns casos, ficou até menor do que a inicialmente oferecida. Os leilões foram um sucesso, embora nem tenhamos podido celebrar, tamanha era fuzilaria negativa. Licitamos seis aeroportos, oito trechos de rodovias, avançamos em alguns portos, especialmente nos TUPs, terminais de uso privado. Hoje, ninguém mais reclama dos aeroportos nem há filas nos terminais portuários. Na Copa e nas Olimpíadas, os aeroportos foram um dos itens mais elogiados pelos usuários que avaliaram a logística brasileira. As rodovias estão sendo construídas ou duplicadas, e os pedágios são realmente módicos. E agora, querem relicitar estas concessões que já foram feitas, o que será um péssimo sinal para os investidores, sinal de que no Brasil as mudanças políticas e econômicas podem levar à quebra de regras e contratos já assumidos – recorda Gleisi.

Alega o governo, e isso foi dito com ênfase especial por Maria Silvia em sua entrevista à Folha de S. Paulo, que o modelo Dilma inviabilizou algumas da concessões: sem dinheiro, sem financiamento, algumas empresas não estão conseguindo cumprir os prazos e compromissos assumidos. Por isso a MP autorizará a relicitação de suas concessões, prevendo que o ganhador de cada leilão indenize o atual concessionário pelos investimentos já realizados.

Esta situação tem relação direta com a crise política. O BNDES inicialmente concedeu empréstimos-ponte, financiamentos iniciais para capitalizar as empresas até que fossem assinados os contratos de longo prazo, a juros subsidiados. Nisso, estourou a Lava Jato e muitas construtoras, ganhadoras de concessões, ficaram impedidas de receber recursos do Estado, a qualquer título.

– A presidenta Dilma editou então a MP 703, a dos acordos de leniência. A proposta separava a pessoa física do empresário investigado da pessoa jurídica que é a empresa, viabilizando a concessão dos financiamentos. E o que fez o douto Congresso? Não votou, a MP caducou e os contratos com o BNDES não puderam ser assinados – recorda Gleisi.

– Agora temos aí a Maria Sílvia dizendo que o BNDES não fará empréstimos-ponte nem financiamentos com juros subsidiados porque o BNDES não existiria para isso. Para que serve então um banco de fomento, se não pode financiar os projetos de que o país necessita para seu desenvolvimento? E ainda querem que o banco devolva R$ 100 bilhões ao Tesouro. Mas por que não injetar este dinheiro na economia, viabilizando estas grandes obras? Protesta a senadora.

Gleisi rebate ainda o argumento de que os aportes do Tesouro ao BNDES aumentaram o endividamento, lembrando que, para evitar os efeitos nefastos da crise internacional, outros países injetaram recursos no aquecimento da economia. Os governos da Espanha e dos Estados Unidos destinaram recursos astronômicos à estabilização de seus sistemas bancários.

– Amanhã (hoje) vão anunciar a relicitação das concessões que fizemos. As empresas concessionárias não estão gostando nada disso. Elas se organizaram para realizar as obras e explorar os serviços pelo prazo determinado no edital, fizeram investimentos e foram escolhidas segundo as regras que estavam em vigor. O que elas querem é que o governo cumpra a previsão dos editais, garantindo o financiamento a juros subsidiados pelo BNDES. Acredito que vão combater esta MP aqui no Congresso. Vai ser uma boa briga. Duvido que, com esta reviravolta, o governo consiga tirar alguma concessão do papel. Duvido que os investidores confiem num governo que muda as regras do jogo desse modo.

Com o novo modelo, Gleisi prevê que os pedágios que hoje custam menos de R$ 5,00 nas rodovias licitadas poderão alcançar os preços praticados nas rodovias paulistas concedidas, que chegam a ser de R$ 20 por cada 100 km rodados. O Brasil, diz Gleisi, não é São Paulo, onde a renda da população permite estas tarifas fixadas pelo modelo tucano, baseado em “premissas realistas”.

– Outro resultado deste modelo será uma nova concentração de obras de infraestrutura no Sul-Sudeste, em detrimento do Norte-Nordeste, onde é necessária uma tarifa mais módica, viabilizada pelos juros subsidiados.

Maria Silvia disse ainda que o governo Temer vai começar suas concessões pelas áreas de grande demanda social, como Saneamento e Transporte. Por isso incluiu no elenco de concessões a serem anunciadas hoje pelo secretário-executivo do PPI (Programa de Parcerias para Investimentos), Moreira Franco, a exploração dos serviços de saneamento. Empresas do Rio de Janeiro, Rondônia e Pará foram incluídas, a pedido dos governadores.

– Imagine de quanto será a tarifa de água e esgoto no Nordeste? Com financiamentos a juros de mercado, seu valor será impraticável, e os interessados vão perceber que a população não terá condições de pagá-la. Este governo vai na contramão do que tentamos assegurar: serviços de boa qualidade com tarifas acessíveis. É para viabilizar este modelo que atende ao mercado e não aos usuários que estão levantando esta cortina de fumaça, com críticas ao modelo que adotamos, com lendas como a de que Dilma controlava a taxa de retorno dos investidores. Nada disso está sendo discutido a sério. Agora temos um espécie de silêncio cúmplice da mídia, que tanto se aplicava em analisar criticamente o modelo de Dilma – conclui a senadora.

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