Por Paulo Moreira Leite, em seu blog:
Reproduzindo uma ideia cada vez mais frequente em levantamentos sobre o mercado de trabalho, a reportagem "Um futuro de raros empregos", publicada pelo Valor Econômico (22/11/2019) aponta uma única atividade remunerada que terá lugar assegurado em nossa sociedade - cuidadoras de idosos.
"São alguns dos empregos que se manterão no futuro", anuncia a legenda de uma foto na qual duas imigrantes de traços asiáticos alimentam duas senhoras de idade avançadíssima numa "residência de repouso na Alemanha."
Embora essa visão seja frequente na maioria das discussões sobre o assunto, a dura realidade é que nem este serviço tem futuro garantido - pelo menos na escala que se imagina necessária.
É certo que, tecnicamente, as vagas para cuidadoras (e cuidadores) de idosos atendem a uma necessidade social inegável.
Com o prolongamento das expectativas de vida, será cada vez mais necessário internar pais, avós e bisávos em residências capazes de oferecer conforto e segurança a um número sempre mais numeroso de pessoas sem autonomia para gerir as próprias vidas.
Isso acontece porque não se descobriu - e talvez nunca se descubra - como esses serviços essenciais e delicados, que exigem empatia entre as partes, poderiam ser realizados por computadores em forma de robôs.
Ninguém pode ignorar a necessidade de alimentar, banhar e entreter homens e mulheres em idade avançadíssima, que não poderiam sobreviver adequadamente sem os cuidados e sem o indispensável calor que apenas um ser humano pode proporcionar a seu semelhante.
Economicamente, contudo, mesmo este mercado de trabalho estará sob risco numa sociedade na qual a eliminação contínua de empregos estáveis e redução dos salários da maioria dos trabalhadores já produz vários efeitos maléficos.
Enquanto reformas dilacerantes já derrubam tradicionais sistemas públicos de previdência, a crescente concentração de renda limita o mercado para aposentadorias obtidas pelo sistema privado.
Outro sinal dos novos tempos é enfraquecer os serviços públicos de forma geral, obrigando várias famílias a gastar hoje -- com saúde e educação -- uma poupança que poderia ser reservada para despesas futuras.
Em vez de apostar na permanência dos empregos de cuidadoras - e cuidadores - no futuro, talvez seja mais prudente fazer a pergunta que não quer calar: quem vai pagar pelos salários e toda estrutura de bem-estar aí envolvida?
O debate sobre emprego está na ordem do dia na maioria dos países - em particular no Brasil, país no qual as reformas e cortes promovidos pelos governos Temer-Bolsonaro alimentam longo período de crescimento baixo e um período inédito - 14 trimestres consecutivos - de ampliação da desigualdade.
Em toda parte, a questão essencial é a mesma.
Trata-se de encontrar um meio de combinar o desenvolvimento tecnológico de altíssima produtividade atingido pelo sistema capitalista nas primeiras década do século XXI com a necessidade de assegurar a todos uma existência digna, compatível com o progresso econômico dos últimos 100 anos.
Se a riqueza de povos e países multiplicou-se várias vezes nas últimas décadas, só a falta de soluções adequadas -- do ponto de vista da maioria -- para a nova situação explica o ressurgimento da pobreza e da miséria aonde havia condições materiais para que fossem eliminadas para sempre.
Esse debate envolve a definição de interesses e prioridades de cada sociedade, a partir de respostas que só podem ser oferecidas pela instituição capaz de responder pelo interesse comum -- o Estado.
Longe de ser uma questão para economistas e futurólogos, é uma discussão questão essencialmente política, que envolve o futuro de toda sociedade e não apenas os interesses de mercado. O tema é mudar a prioridade.
Este é o ponto a ser debatido, antes que faltem até vagas para cuidadoras.
Alguma dúvida?
Reproduzindo uma ideia cada vez mais frequente em levantamentos sobre o mercado de trabalho, a reportagem "Um futuro de raros empregos", publicada pelo Valor Econômico (22/11/2019) aponta uma única atividade remunerada que terá lugar assegurado em nossa sociedade - cuidadoras de idosos.
"São alguns dos empregos que se manterão no futuro", anuncia a legenda de uma foto na qual duas imigrantes de traços asiáticos alimentam duas senhoras de idade avançadíssima numa "residência de repouso na Alemanha."
Embora essa visão seja frequente na maioria das discussões sobre o assunto, a dura realidade é que nem este serviço tem futuro garantido - pelo menos na escala que se imagina necessária.
É certo que, tecnicamente, as vagas para cuidadoras (e cuidadores) de idosos atendem a uma necessidade social inegável.
Com o prolongamento das expectativas de vida, será cada vez mais necessário internar pais, avós e bisávos em residências capazes de oferecer conforto e segurança a um número sempre mais numeroso de pessoas sem autonomia para gerir as próprias vidas.
Isso acontece porque não se descobriu - e talvez nunca se descubra - como esses serviços essenciais e delicados, que exigem empatia entre as partes, poderiam ser realizados por computadores em forma de robôs.
Ninguém pode ignorar a necessidade de alimentar, banhar e entreter homens e mulheres em idade avançadíssima, que não poderiam sobreviver adequadamente sem os cuidados e sem o indispensável calor que apenas um ser humano pode proporcionar a seu semelhante.
Economicamente, contudo, mesmo este mercado de trabalho estará sob risco numa sociedade na qual a eliminação contínua de empregos estáveis e redução dos salários da maioria dos trabalhadores já produz vários efeitos maléficos.
Enquanto reformas dilacerantes já derrubam tradicionais sistemas públicos de previdência, a crescente concentração de renda limita o mercado para aposentadorias obtidas pelo sistema privado.
Outro sinal dos novos tempos é enfraquecer os serviços públicos de forma geral, obrigando várias famílias a gastar hoje -- com saúde e educação -- uma poupança que poderia ser reservada para despesas futuras.
Em vez de apostar na permanência dos empregos de cuidadoras - e cuidadores - no futuro, talvez seja mais prudente fazer a pergunta que não quer calar: quem vai pagar pelos salários e toda estrutura de bem-estar aí envolvida?
O debate sobre emprego está na ordem do dia na maioria dos países - em particular no Brasil, país no qual as reformas e cortes promovidos pelos governos Temer-Bolsonaro alimentam longo período de crescimento baixo e um período inédito - 14 trimestres consecutivos - de ampliação da desigualdade.
Em toda parte, a questão essencial é a mesma.
Trata-se de encontrar um meio de combinar o desenvolvimento tecnológico de altíssima produtividade atingido pelo sistema capitalista nas primeiras década do século XXI com a necessidade de assegurar a todos uma existência digna, compatível com o progresso econômico dos últimos 100 anos.
Se a riqueza de povos e países multiplicou-se várias vezes nas últimas décadas, só a falta de soluções adequadas -- do ponto de vista da maioria -- para a nova situação explica o ressurgimento da pobreza e da miséria aonde havia condições materiais para que fossem eliminadas para sempre.
Esse debate envolve a definição de interesses e prioridades de cada sociedade, a partir de respostas que só podem ser oferecidas pela instituição capaz de responder pelo interesse comum -- o Estado.
Longe de ser uma questão para economistas e futurólogos, é uma discussão questão essencialmente política, que envolve o futuro de toda sociedade e não apenas os interesses de mercado. O tema é mudar a prioridade.
Este é o ponto a ser debatido, antes que faltem até vagas para cuidadoras.
Alguma dúvida?
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