sábado, 14 de agosto de 2021

Senado revoga a LSN, um entulho da ditadura

Por Altamiro Borges

Em um episódio carregado de simbolismo, no mesmo dia em que o fascista Jair Bolsonaro promovia o seu patético desfile de tanques para intimidar o Congresso Nacional no debate sobre o voto impresso, o Senado finalmente enterrava a Lei de Segurança Nacional – a famigerada LSN imposta pelo general João Batista Figueiredo nos estertores da ditadura, em 1983.

Alguns senadores bolsonaristas, como “Flávio Rachadinha” (Patriota-RJ), o filhote 01 do “capetão”, até tentaram evitar os avanços na nova legislação que substituirá a LSN – como o capítulo que prevê aumento da pena quando os crimes forem cometidos por militares ou o item que criminaliza atentados ao direito de manifestação –, mas foram derrotados.

O projeto relatado pelo senador Rogério Carvalho (PT-SE) foi aprovado na terça-feira (10) por ampla maioria. Ele extingue vários entulhos da ditadura, como o artigo que determinava pena de até quatro anos de prisão para quem “caluniasse” os presidentes da República, do Supremo Tribunal Federal, da Câmara dos Deputados e do Senado.

Bolsonaro abusou da lei dos generais

Para o professor de direito da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos-RS), Lenio Streck, “o projeto representa um avanço, fundamentalmente porque, primeiro, revoga a LSN e todos seus resquícios autoritários. Segundo, porque tipifica condutas que vão na contramão da democracia e que representam ameaça às instituições democráticas”.

A nova lei irá agora à sanção do presidente. Jair Bolsonaro já sinalizou que poderá vetar alguns dos novos dispositivos. Na prática, ele adoraria usar ainda mais a LSN. Em 2019 e 2020, foram abertos 77 inquéritos com base nesta famigerada lei. O ex-ministro da Justiça, o “terrivelmente evangélico” André Mendonça – agora indicado para uma vaga no STF – usou a LSN para pedir à Polícia Federal para investigar jornalistas e opositores do governo fascista, como o youtuber Felipe Neto.

A Folha fez um levantamento das principais mudanças na nova legislação que substituirá a famigerada LSN. Vale conferir:

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Crimes contra a soberania nacional

O capítulo dos crimes contra a soberania nacional inclui os crimes de atentado à soberania, espionagem e atentado à integridade nacional. Tais crimes buscam proteger o país em relação a atores externos assim como de ações que visem, por exemplo, separar parte do território nacional.

No crime de espionagem, há uma ressalva de que não constitui crime a comunicação de informações ou documentos quando o objetivo é expor a prática de crime ou a violação de direitos humanos.

Crimes contra as instituições democráticas

Estão previstos neste capítulo os crimes de golpe de Estado e de abolição violenta do Estado democrático de Direito. Este último prevê pena de quatro a oito anos para aquele que “tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais”. Já no caso de golpe de Estado, a pena é de quatro a 12 anos.

Crimes contra o funcionamento das instituições democráticas no processo eleitoral

A princípio, estão previstos três crimes neste capítulo: interrupção do processo eleitoral, comunicação enganosa em massa e violência política. Especialistas criticaram a inclusão de tema eleitoral no Código Penal.

Com pena de um a cinco anos, o projeto criminaliza a ação de promover ou financiar campanha ou iniciativa "para disseminar fatos que sabe inverídicos, e que sejam capazes de comprometer a higidez do processo eleitoral".

O enquadramento só ocorre quando a disseminação ocorre mediante uso de “expediente não fornecido diretamente pelo provedor de aplicação de mensagem privada”.

Também criminaliza a ação de "impedir ou perturbar a eleição ou a aferição de seu resultado, mediante violação indevida de mecanismos de segurança do sistema eletrônico de votação". A pena é de três a seis anos.

A mesma pena se aplica ao crime de violência política, que consiste em restringir, impedir ou dificultar “o exercício de direitos políticos a qualquer pessoa em razão de seu sexo, raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional”, com emprego de violência física, sexual ou psicológica.

Crimes contra o funcionamento dos serviços essenciais

Este capítulo, que em versões anteriores continha outros itens, prevê apenas o crime de sabotagem, com pena de dois a oito anos para aquele que, com o fim de abolir o Estado democrático de Direito destruir ou inutilizar “meios de comunicação ao público, estabelecimentos, instalações ou serviços destinados à defesa nacional”.

Crimes contra a cidadania

Criminaliza o atentado a direito de manifestação, que seria o ato de “impedir, mediante violência ou grave ameaça, o livre e pacífico exercício de manifestação de partidos políticos, de movimentos sociais, de sindicatos, de órgãos de classe ou de demais grupos políticos, associativos, étnicos, raciais, culturais ou religiosos”.

Exceções à aplicação dos dispositivos

O texto ainda afirma que a manifestação crítica aos poderes constitucionais; a atividade jornalística e a reivindicação de direitos e garantias constitucionais (por meio de passeatas, reuniões, greves, aglomerações ou de qualquer outra forma de manifestação política com propósitos sociais) não constituem crime.

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