Com o golpe de 2016 consumado e contando com o domínio total do Congresso, a oligarquia dominante instituiu uma nova ordem legal e constitucional no país, provocando uma ruptura do pacto constitucional de 1988.
A Constituição “cidadã”, orientada pelos princípios de uma República de bem-estar social, foi violada na sua essência para que o capital e as finanças pudessem turbinar o roubo da riqueza nacional e da renda do povo brasileiro. A guerra do establishment contra a democracia foi, na realidade, uma guerra de saqueio e pilhagem do Brasil.
A nova institucionalidade jurídica forjada com o golpe está representada nos retrocessos profundos promovidos durante os ciclos do usurpador Michel Temer, de 2016 a 2018, e do governo fascista-militar nominalmente presidido por Bolsonaro, de 2019 a 2022.
No mundo do trabalho, por exemplo, foram perpetradas mudanças que retrocedem em décadas os direitos trabalhistas e previdenciários conquistados pela classe trabalhadora principalmente a partir da primeira metade do século 20. A desproteção do trabalhador foi crucial para a recomposição da taxa de reprodução do capital baseada na exploração desmedida.
As finanças sacramentaram o “direito sagrado” de abocanharem a renda nacional por meio da emenda constitucional do Teto de Gastos, mecanismo que comprime os investimentos sociais para assegurar o desvio, todo ano, de bilhões do orçamento nacional para o pagamento eterno da dívida pública.
As regras ambientais foram estilhaçadas. Ao lado do desmonte da institucionalidade de proteção sócio-ambiental, o esvaziamento da legislação permitiu a expansão do setor capitalista mais devastador, mais escravizante, mais etnocida, mais ecocida e mais racista. Os assassinatos do jornalista inglês Dom Philips e do indigenista brasileiro Bruno Pereira foram consequências diretas dessa barbárie estimulada e apoiada pelo governo fascista-militar.
A entrega de ativos da Petrobrás para grupos privados comprometeu a segurança e soberania energética do país. O mecanismo chamado PPI [Preço de Paridade Internacional] para a formação dos preços dos combustíveis da Petrobrás é, na realidade, um duto corrupto por onde escoaram, durante os períodos Temer e Bolsonaro, uma média de mais de R$ 100 bilhões por ano diretamente para as mãos de grupos privados, na sua maioria estrangeiros, na forma de dividendos.
Essa proeza faz da Petrobrás a empresa de petróleo de todo o mundo que mais distribui dividendos. É lamentável que no primeiro trimestre do governo Lula a Petrobrás tenha repetido esse padrão rapineiro com a distribuição de R$ 24,7 bilhões em dividendos.
Outra mudança fundamental para aprofundar a nível inaudito a rapina do Brasil foi a independência do Banco Central, estabelecida para assegurar a liberdade absoluta para as finanças rapinarem com sua volúpia insaciável.
Neste ano, com a taxa exorbitante de juros, o Banco Central obrigará o Tesouro Nacional a desviar R$ 790 bilhões do orçamento, que poderiam ser investidos no SUS, na educação, em habitação, políticas públicas, além de em obras e investimentos prioritários em todo país, para cobrir o aumento das despesas públicas devido ao pagamento dos juros da dívida.
Roberto Campos Neto, o agente bolsonarista da presidência do Banco Central, pratica terrorismo financeiro contra a economia nacional e o governo Lula, o que caracteriza um atentado à soberania popular. Apesar disso, ele não só continua impune, como protegido por um mandato estabelecido em Lei Complementar.
O modelo criminoso de privatização da Eletrobrás tem regras inéditas de lesividade, sem par no mundo inteiro. É um roubo desavergonhado, despudorado, praticado por quem confia na eterna impunidade, mesmo cometendo crimes de lesa-pátria e lesa-povo.
O conjunto das mudanças jurídicas e legais operadas pelas classes dominantes desde o golpe contra Dilma conformam, possivelmente, o maior esquema de rapinagem jamais acontecido em qualquer outro país no mundo contemporâneo.
A pilhagem ocorrida no Brasil entre 2016 e 2022 é de uma magnitude somente comparável ao processo de apropriação e roubo do Brasil durante o período colonial.
O governo Lula se desenrola no contexto dessa guerra de ocupação e pilhagem do Brasil. A força ocupante do território brasileiro não é, porém, nenhum exército estrangeiro, mas sim as cúpulas partidarizadas das Forças Armadas, que funcionam como “gendarmeria” da barbárie ultraliberal.
O Congresso, com sua maioria direitista, ultradireitista e ultraliberal, ao impor essa nova constituticionalidade anti-povo e anti-nação por meio da aprovação de leis e mudanças constitucionais, empresta uma falsa legitimidade à ordem pós-2016 que aumentou a espoliação e o roubo do país.
Arthur Lira, o chefe da Deputadocracia, não cansa de lembrar as pautas inegociáveis já aprovadas pelos saqueadores do país: a revisão do Marco do Saneamento, a doação da Eletrobrás e a independência do Banco Central. O fim do Teto só será aceito se for colocado no seu lugar algo ao estilo do Novo Arcabouço Fiscal – que, aliás, agrada aos neoliberais e ultraliberais por ser uma espécie de Teto dos Gastos com outro nome..
Miriam Leitão, em artigo n’O Globo [14/5], diz que Lula não deve lutar todas as lutas, mas centrar-se na consolidação da democracia e aceitar como favas contadas a privatização da Eletrobrás, o Marco do Saneamento, o fim da CLT, os preços da Petrobrás etc etc.
É como se ela dissesse: aceitamos o Lula, claro. Desde, no entanto, que ele governe com o programa derrotado; ou seja, que o governo dele mantenha intocável o programa que serviu de plataforma para a derrubada da presidente Dilma e que foi executado nos períodos Temer e Bolsonaro.
A oligarquia dominante quer que Lula traia o povo brasileiro e governe com o programa da barbárie capitalista que derrotou em 30 de outubro.
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