segunda-feira, 11 de novembro de 2019

A genialidade da oratória de Lula

São Bernardo do Campo, 9/11/19
Por Bepe Damasco, em seu blog:

Estou diante do computador para escrever sobre o discurso de Lula em frente ao Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo terminado há pouco. Mas há cerca de quinze minutos não sai nada. O problema é que Lula descarrega em suas falas uma overdose de assuntos relevantes, muitos deles de importância crucial, tornando difícil a missão do escriba de selecionar os principais pontos.

Mas o que foi esse discurso de Lula deste sábado, gente! Quem imaginou que o ex-presidente, reconhecido orador natural e brilhante, pudesse estar meio enferrujado depois de 580 dias preso e sem falar em público, se enganou redondamente. Até adversários reconhecem que Lula tem o dom da oratória e é um comunicador político de primeiríssima linha. Essas qualidades em muito contribuíram inclusive para catapultar sua vitoriosa carreira política.

Contudo, seu talento para se expressar da forma que todos entendem, sem prejuízo do conteúdo político, ganhou, aos 74 anos, um novo elemento de oratória: a capacidade que parece infinita de abordar uma quantidade cada vez maior de assuntos, tudo devidamente temperado por doses consideráveis de emoção, afeto, bom humor, indignação, compromisso, generosidade e despojamento. Para avalizar sua retórica, apresenta como credenciais sua história de vida, sua trajetória política e as realizações de seus governos.

E, se pararmos para pensar que Lula fala de improviso, que não tem uma reles anotação a ampará-lo, a façanha torna-se ainda mais notável. Como não tem jeito, atrevo-me a pinçar alguns momentos da fala de Lula, mas na certeza de que muita coisa substantiva ficará de fora. A rigor, só a reprodução na íntegra de seu discurso resolveria esse dilema.

Líder da esquerda – As citações frequentes de figuras públicas de partidos de esquerda aliados do PT, inclusive em algumas oportunidades mencionando-as primeiro do que os petistas, mostra a preocupação de Lula de se posicionar como liderança da esquerda, para além do PT. No caso do deputado do PSOL, Marcelo Freixo, possível candidato da oposição de esquerda à prefeitura do Rio, Lula teve até o cuidado de denunciar o caráter miliciano do governo Bolsonaro. O enfrentamento das milícias marca, como se sabe, a militância de Freixo.

Chamada para a luta na rua – Denunciou a piora nas condições de vida povo, em todos os sentidos, desde que ele foi preso, e reafirmou sua disposição de percorrer o Brasil, para mobilizar o povo e impedir a destruição do país. Convidou todos os partidos de esquerda, movimentos sociais e sindicatos a marcharem com ele, além de fazer um conclamação especial à juventude. Para o ex-presidente, passou o tempo de só resistir: “Precisamos atacar também.”

Internacionalismo latino americano – Lula chamou a atenção do exemplo do povo do Chile, que está nas ruas para derrotar o modelo que Guedes pretende implantar no Brasil. Saudou a vitória de Alberto Fernández e Cristina na Argentina –“deram um surra no Macri” -, manifestou preocupação com as articulações golpistas contra a vitória de Evo Morales e falou da torcida pela vitória da Frente Ampla, no Uruguai.

Pancada forte em Moro e Dallagnol - Lula duvidou que os que estiveram à frente de sua condenação fraudulenta durmam com a mesma consciência tranquila que ele e bateu duro em Moro e Dallagnol : “Moro é um juiz canalha e Dallagnol está envolvido em corrupção, inclusive com dinheiro da Petrobras. Ambos são mentirosos.”

“O exterminador de sonhos” – Assim Lula classificou o ministro Paulo Guedes, no trecho do discurso em que denuncia a vergonhosa concentração de renda no Brasil.

“Bolsonaro já é um palavrão” – Quando pediu para as pessoas cessarem com o coro “Ei, Bolsonaro, VTNC”, Lula levantou a multidão ao dizer ser desnecessário xingá-lo porque “ele já é um palavrão.” Bateu na tecla da aposentadoria ainda muito jovem de Bolsonaro, para apontar a contradição e a perversidade de retirar a aposentadoria das pessoas.

No fígado da Globo, SBT e Record – Lula sentiu na pele a inutilidade de utilizar linguagem moderada e contida para tratar do oligopólio midiático. Agora, ele diz o que é preciso. Seu cartão de visitas foi dizer que o helicóptero da Globo estava lá para “falar as merdas que sempre falam da gente.” Depois, no fim do discurso, emendou: “Como fiquei esse tempo preso, tive que assistir TV aberta. Gente, a TV do Sílvio Santos é uma vergonha. A Record é outra vergonha e a Globo continua sendo uma vergonha.”

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