terça-feira, 21 de junho de 2016

Brasil: Duas Constituições?

Por Aldo Arantes

Vivemos uma grave crise política desencadeada pela oposição golpista, a mídia e os grandes grupos econômicos. A corrupção, nas hostes governistas, surge como um verdadeiro vulcão, com novas revelações.

A constatação é que a realidade trata de mostrar que os sinais da política brasileira estão trocados. Os tidos como combatentes da corrupção são corruptos. Eles tentam rasgar a Constituição para impor um governo ilegítimo.

Desta trama golpista no judiciário participa a maioria dos Ministros do STF, sob o comando de Gilmar Mendes, lideraram este processo golpista no judiciário e juntamente com Eduardo Cunha lideraram o processo golpista. Todavia Cunha foi defenestrado para não “sujar” ainda mais este governo.

Gilmar Mendes continua liderando a parcela de juízes, promotores e polícia federal traindo a Constituição. As ações por ele praticadas não deixam dúvida do seu papel.

A divulgação do conteúdo sigiloso do pedido de prisão contra a cúpula do PMDB o levou a vociferar: “Não se pode brincar com esse tipo de coisa. É processo oculto, pede-se sigilo. Isso é grave”.

Mas quando foram vazados trechos das conversas entre Dilma e Lula Mendes considerou a divulgação correta e seu conteúdo extremamente grave. E mais que as conversas de Jucá não caracterizam qualquer irregularidade. Os fatos são muitos para provar que ele não exerce sua atividade como Ministro, mas como agente do golpe.

A Constituição brasileira é clara ao indicar que o fundamento da república brasileira é a soberania popular. Assim a tentativa de passar por cima dos 52 milhões de votos dados à Presidenta Dilma, com um Impeachment sem fundamento jurídico nada mais é do que golpe de Estado.

Desta vergonhosa traição da Constituição participou a atual diretoria da Ordem dos Advogados do Brasil. Ela entrou como força auxiliar do golpismo e não teve sequer seu pedido de impeachment recebido pelo Presidente da Câmara numa clara demonstração de que sua posição não foi suficiente para exercer um papel preponderante como esperava neste processo.

O relator do processo ao Conselho Federal concluiu seu parecer com a vergonhosa e injurídica conclusão de que a Presidenta Dilma cometeu crime de responsabilidade.

O manifesto "Em defesa da Constituição" ressalta que reconhece “a OAB como legítima representante dos advogados brasileiros e se inspira em seu legado de luta pela liberdade. Todavia, não aprova a política da direção atual, que se encontra enredada em erro histórico – comparável apenas à adesão ao golpe militar de 1964”.

O auxiliar de Gilmar Mendes , Sérgio Moro, foi guindado à condição de “herói” pela revista Conhecer. Em título da edição a ele dedicada sua capa estampa o título "Sérgio Moro: Herói do Brasil".

Na reportagem Porque Sérgio Moro Virou Herói? O texto afirma “nas manifestações de 13 de Março de 2016, as maiores já registradas na historia do país, com mais de 3 milhões de cidadãos indo às ruas por todo o Brasil, um personagem roubou toda a atenção, o juiz Sérgio Moro”. A matéria termina com a frase - Presidente Moro?

E ainda “o juiz federal Sergio Moro responsável pela operação Lava – Jato foi apresentado como um caça-corrupto na capa da revista Norte Americana Americas Quaterly”.

Eu seu texto a revista norte-americana afirmou “Sérgio Moro é uma estrela e não há mistério sobre o motivo. O jovem Juiz Brasileiro abriu a tampa de um esquema de corrupção de longo alcance que havia desviado mais de 3 Bilhões de dólares da Estatal de petróleo para o bolso de membros do governo e partidos políticos”. Isto demonstra que tal revista apoia o golpe em função do interesse das grandes petrolíferas norte-americanas no pré-sal.

Tudo isto comprova que o novo tipo de golpe não executado somente por forças internas, mas conta com um forte auxílio externo nesta nova forma de golpe.

Denunciado a forma “moderna” que o neoliberalismo inventou para o golpe um grupo de intelectuais franceses, se manifestou no sentido de que Dilma Rousseff está sendo deposta por políticos diretamente ligados aos escândalos de corrupção da Lava Jato e que a direita brasileira está querendo implantar uma agenda conservadora e neoliberal, ameaçando os ganhos sociais recentes no continente.

Para atingir seus objetivos tais forças procuram impor o impeachment sem base jurídica, sem a caracterização de crime de responsabilidade. Quem afirma isto é o próprio Gilmar Mendes que em declarações dadas ao jornalista Wellington Calasans, na Universidade de Estocolmo, Suécia declarou que o processo contra Dilma é mais político do que jurídico(....) e que se ela tivesse cometido crime, e ficasse flagrantemente comprovado ela não seria processada.

Sobre o respeito à Constituição o manifesto "Traidor da Constituição é traidor da pátria", assinado por 43 dos maiores juristas do País, lembra que na promulgação da Constituição de 1988, o Presidente da Assembleia Nacional Constituinte, Ulisses Guimarães afirmou “a Constituição certamente não é perfeita. Ela própria o confessa a admitir a reforma. Quanto a dela discordar, sim. Descumprir, jamais. Afrontá-la nunca. Traidor da Constituição é traidor da Pátria. Conhecemos o caminho maldito. Rasgar a Constituição, trancar as portas do parlamento, garrotear as liberdades, mandar os patriotas para a cadeia, o exílio e o cemitério”.

O fato de passar por cima da Constituição, negar o estado democrático de direito, impor um impeachment sem base jurídica é analisado pelo jurista alemão Hauke Brunkhorst em seu artigo A decapitação do legislador: a crise europeia – paradoxos da constitucionalização do capitalismo democrático.

Ao examinar os três estágios das constituições europeias - a constituição econômica, jurídica e política - afirma que “a ordem concreta do direito e da economia triunfa sobre a constituição formal do direito e da democracia”.

Ao apreciar o estagio da constituição política ressalta que “podemos perceber o paradoxo: a constitucionalização avança e é desconstitucionalizada por seus próprios avanços, ao mesmo tempo. Essa estrutura paradoxal se deve à emergência do direito constitucional formal juntamente com o seu oposto: o direito de prerrogativa informal. Ambas as formações constitucionais constituem o duplo - Estado europeu. É esta contradição entre a constituição formal e informal que causa uma crise de legitimidade (...) as decisões mais importantes devem ser tomadas não pelo legislador ou pelo governo, mas pelos juízes”.

Tal análise se aplica à situação que vivemos no Brasil. Assim a negação da democracia e do estado democrático de direito é a expressão da constituição informal, do capitalismo financeiro, se sobrepondo à Constituição de 1988.

Estamos, pois, diante de uma grave crise institucional que coloca em risco a democracia e os direitos incorporados à Constituição de 1988.

Para enfrentá-la é fundamental unificar todas as iniciativas de organização de advogados e juristas em torno de uma ampla frente pela democracia e pela legalidade. A esquerda é fundamental nesta articulação. Todavia para assegurar a incorporação de importantes advogados e juristas nesta ampla frente ela deve ter um caráter democrático e se constituir em torno da legalidade e da democracia.

São os advogados e juristas os que têm as melhores condições jurídico-políticas para demonstrar ao povo o caráter inconstitucional e ilegal do golpe. Só assim será possível atrair amplos setores da classe média fundamentais para o momento crítico que enfrentamos.

A tarefa central do momento é a mobilização da sociedade em torno de uma alternativa que expresse o desejo de milhões de brasileiros.

O caminho que está conseguindo sensibilizar amplos setores da sociedade é a convocação de um plebiscito para que o povo decida sobre realização de eleições diretas já para Presidente da República. Esta é a tarefa central do da luta pela legalidade. Ela coloca nas mãos do povo a saída para a crise.

União do povo brasileiro contra o golpe, em defesa da Constituição o e do estado democrático de direito.

* Aldo Arantes é advogado e Constituinte de 1988.

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