quinta-feira, 15 de março de 2018

João Doria, o camaleão paulista

Por Tereza Cruvinel, no Jornal do Brasil:

O primeiro estelionato da campanha eleitoral deste ano já foi cometido. João Dória elegeu-se prefeito de São Paulo demonizando os políticos. Ele era apenas um gestor. O “João trabalhador”. Em um ano e pouco de mandato só fez política, enquanto crescia na cidade o “apagão dos postes” e os buracos de rua. Profissionais de saúde e educação da prefeitura estão anunciando uma paralisação. Na campanha, ele documentou fartamente a promessa de que ficaria no cargo quatro anos mas vai cometer o estelionato se vencer a prévia do PSDB no domingo. Deixará a prefeitura em 7 de abril para ser candidato a governador.

Com Dória candidato e livre para fazer política, o governador Geraldo Alckmin vai ter um problema a mais para administrar, no esforço para dar impulso à sua candidatura presidencial. O homem é uma espécie de “deus de muitas faces”, aquele cultuado por personagens de Game of Thrones. Como as candidaturas só serão registradas em agosto, se a oportunidade aparecer, ele pode muito bem desarquivar seu projeto de concorrer ao Planalto. Principalmente se Alckmin não decolar.

Logo que tomou posse, em 2017, embriagado pela vitória em primeiro turno, Dória desandou a viajar pelo país, tentando encarnar simultaneamente dois papéis: o anti-Lula que era ao mesmo tempo o procurado “nome novo”. Nas passagens pela capital paulista, ia trocando de máscaras. Ora se vestia de gari, ora aparecia como cadeirante, ora como agente de trânsito. Mas logo ficaram evidentes a traição ao padrinho Alckmin, inventor de sua candidatura a prefeito, e o excesso de marquetagem. No final do ano passado sua popularidade despencou e ele desistiu da candidatura a presidente.

Agora, ele tenta convencer os paulistanos de que está rompendo a contragosto a promessa de governar quatro anos. A inscrição de seu nome na prévia foi feita por um coletivo partidário. Logo, ele está sendo convocado, quase obrigado a quebrar a promessa. Inscrito, disse não precisar do aval de Alckmin pois já tem o do partido. Só esta declaração já devia preocupar o governador, a quem ele pede agora, através de terceiros, para que convença dois inscritos na prévia a desistirem: o secretário Floriano Pesaro e o cientista político Luiz Felipe D’Ávila. O terceiro é o ex-deputado e suplente de senador José Aníbal, que não admite conversa sobre desistência. O que ele fala de Dória, não deixa dúvidas sobre o quão dividido o PSDB sairá da disputa. “Este sujeito é um caso de esquizofrenia aguda. Mente de forma contumaz”. Se o candidato a governador não unir os tucanos, não dará um bom palanque a Alckmin.

Nesta semana que precede as prévias, diz Aníbal, ele recusou todos os convites para um debate. “Recusa porque não tem o que dizer. Vai continuar dizendo que não é político? Eu digo que sou político e sou gestor. Fui bom gestor tanto na Secretaria de Ciência e Tecnologia como na de Energia e Meio Ambiente. O que ele fez na prefeitura foi deixar o mato crescer, como se pode ver para todo lado na cidade”.

Mas, disputando a prévia no cargo, apoiado por deputados estaduais desesperados para se reelegerem, Dória tem mais chances de vencer. E se for o candidato, haverá estilhaços no PSDB.

Vetor partidário 
A avaliação da preferência partidária pela pesquisa CNI-IBOPE divulgada ontem deve ser levada em conta pelos projetores de cenários eleitorais. Apesar dos tropeços, o PT, com 19% de preferência ou simpatia, ganhou de longe do MDB (7%) e do PSDB (6%). Isso conta a favor do candidato que Lula lançará se confirmada sua inabilitação. O problema é a hora. Muito cedo, estaria jogando a toalha. Muito tarde, já perto do primeiro turno, pode ser tarde para a efetivação da transferência de votos.

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