sábado, 9 de junho de 2018

O Brasil embranquecido na tela da TV

Por Carol Castro, na revista CartaCapital:

Não dá mais para esconder a cor majoritariamente negra do Brasil. No último censo do IBGE, 54% das pessoas confirmaram sua negritude. Mas a televisão, e a cena artística em geral, ainda tenta pintar de branco a cara do País. E o Ministério Público do Trabalho (MPT) anda atento à falta de representatividade nas emissoras brasileiras.

Logo que a novela Segundo sol, da Rede Globo, estreou, em maio, a internet se enfureceu para questionar o óbvio: como pode uma trama sobre axé, na Bahia (o estado mais negro do Brasil), ter pouquíssimos atores e atrizes negros?

A direção da novela se esforçou para arranjar desculpas. Mas nenhuma delas colou. Como resposta, o Grupo de Trabalho de Raça do MPT enviou uma notificação alertando sobre a ausência de negros nos programas e recomendando à emissora maior atenção à diversidade em suas contratações.

Poucas semanas depois, na última terça-feira, 5, o MPT protocolou notificação semelhante à Record e ao SBT. Segundo pesquisa de um site de notícias, só 8% dos atores dessas emissoras são negros.

Em até 45 dias, as duas precisam apresentar um cronograma para indicar quais atitudes serão tomadas para obedecer à recomendação. Se não fizerem nada, serão convocadas a prestar esclarecimentos em audiência pública e firmar um “termo de compromisso de ajustamento de conduta”.

Essa medida vem logo depois de rolarem discussões fervorosas nas redes sociais sobre negritude, racismo e falta de representatividade. A Globo causou outro burburinho depois de colocar Camila Silva, repórter da área esportiva, nos telejornais da madrugada em pleno ano de Copa do Mundo. As redes acusaram a emissora de querer esconder sua única repórter esportiva negra.

No fim da última semana, Fabiana Cozza reacendeu o papo sobre colorismo ao aceitar o papel de Dona Ivone Lara. A atriz sofreu críticas pesadas de alguns ativistas negros por topar interpretar uma personagem que tem a pele muito mais escura do que a dela. Em poucos dias, Fabiana renunciou ao papel.

Não se trata só de avaliar tonalidades de pele. Artistas negros com a pele mais clara conseguem um pouquinho a mais de visibilidade do que seus irmãos retintos, segundo vozes do movimento tratadas aqui. Por uma razão fácil de entender: com traços mais semelhantes aos dos brancos, eles tornam-se mais “palatáveis” ao gosto de quem toma as decisões – ou seja, aos brancos.

A publicidade também vacila na escolha de atrizes e atores. Segundo pesquisa de Renato Meirelles, do instituto de pesquisa Locomotiva, mais de 90% dos protagonistas das campanhas publicitárias são brancas. Uma loucura sem tamanho quando se analisa outro dado: em 2018, a soma de renda dos negros será de R$ 1,65 trilhões. Se todos os negros brasileiros formassem um só país, seria o 17º maior mercado consumidor do mundo, de acordo com o estudo.

Enquanto isso, no exterior, a galera se dedica a pensar em elencos quase inteiramente negros – e fora de papéis estereotipados, com personagens muito além de escravos, bandidos e empregados domésticos. E é essa fórmula, com diálogos e tramas quem discutem e jogam o racismo na cara do mundo todo, sem medo, que cria tanto sucesso.

Basta ver os últimos hits: Pantera Negra entrou para o top 10 das maiores bilheterias do cinema; o clipe This is America, de Childish Gambino (ou Donald Glover) passou de 250 milhões de visualizações.

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