Por Paulo Moreira Leite, no site Brasil-247:
Apurar os vínculos entre os operadores do gabinete do então deputado Flavio Bolsonaro e os mandantes do assassinato de Marielle Franco e Anderson Gomes devem ocupar a prioridade absoluta nas investigações do Ministério Público do Rio de Janeiro.
É aqui que se encontra o passo decisivo para vencer uma situação inaceitável de incerteza política, que envergonha o país e ameaça o futuro de 210 milhões de brasileiros e brasileiras.
Desvios de dinheiro, "rachadinhas", investimentos-fantasma e cobrança de propina constituem práticas que acompanham os esquemas de poder de muitas décadas, em toda parte, ou quase.
Devem ser apurados, investigados e punidos porque constituem uma força corrosiva que sabota a democracia e corrompe os valores da cidadania.
No entanto, quando a corrupção e o assassinato político caminham de braços dados, estamos diante de uma situação nova, que assinala um grau de degeneração poucas vezes visto na história de qualquer país.
Se a corrupção costuma surgir em todo tipo de regime, o crime que tipifica a existência de uma ditadura é o assassinato, a tolerância diante da eliminação de vidas humanas. Esta é a diferença, a
periculosidade, o horror próprio e repulsivo.
Marca a ascensão de reflexos animalescos e impulsos imundos em mentes que assaltaram o Estado. Assinala a ruptura de um limite básico, essencial, civilizatório - a noção de que todos tem o direito de
usufruir a vida até onde sua natureza permitir. Seu peso - real e simbólico - pode marcar mudanças na história de um país.
De repente, as ditaduras matam, sob a luz do dia - e tudo fica por isso mesmo.
Numa tarde de 28 de março de 1968, no centro do Rio de Janeiro, o jornalista Washington Novaes assistiu pela janela da redação da extinta revista Visão a uma estranha movimentação de soldados da PM nas vizinhanças do restaurante Calabouço. "Vi o momento em que um aspirante da PM se ajoelhou, fez pontaria com o fuzil e deu um tiro,"me contou, 43 anos depois, numa entrevista para meu livro A Mulher que era o General da Casa.
"Também vi o menino caindo", prosseguiu, referindo-se a Edson Luiz Lima Souto, executado de forma premeditada, desnecessária, numa cena que deu uma mensagem de violência e impunidade ao país - institucionalizada, oito meses depois, com a decretação do AI-5.
Um cidadão entre milhões, Washington Novaes jamais foi chamado a contar o que viu. Para ficar quieto, foi perseguido em dois IPMs. Enquanto isso, a máquina que massacrava cidadãos seguia seus
movimentos de réptil gigantesco, pelo país inteiro.
Passados 51 anos, a morte de Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes aguarda os esclarecimentos necessários um país onde a democracia retorna a encruzilhada.
Graças a um cordão sanitário que protege os dois operadores de campo que consumaram o crime, seu silêncio está garantido sob segurança máxima. Proteger essa conexão é alimentar a maior ameaça enfrentada por nossa democracia.
Nós sabemos disso.
Eles também sabem.
Alguma dúvida?
É aqui que se encontra o passo decisivo para vencer uma situação inaceitável de incerteza política, que envergonha o país e ameaça o futuro de 210 milhões de brasileiros e brasileiras.
Desvios de dinheiro, "rachadinhas", investimentos-fantasma e cobrança de propina constituem práticas que acompanham os esquemas de poder de muitas décadas, em toda parte, ou quase.
Devem ser apurados, investigados e punidos porque constituem uma força corrosiva que sabota a democracia e corrompe os valores da cidadania.
No entanto, quando a corrupção e o assassinato político caminham de braços dados, estamos diante de uma situação nova, que assinala um grau de degeneração poucas vezes visto na história de qualquer país.
Se a corrupção costuma surgir em todo tipo de regime, o crime que tipifica a existência de uma ditadura é o assassinato, a tolerância diante da eliminação de vidas humanas. Esta é a diferença, a
periculosidade, o horror próprio e repulsivo.
Marca a ascensão de reflexos animalescos e impulsos imundos em mentes que assaltaram o Estado. Assinala a ruptura de um limite básico, essencial, civilizatório - a noção de que todos tem o direito de
usufruir a vida até onde sua natureza permitir. Seu peso - real e simbólico - pode marcar mudanças na história de um país.
De repente, as ditaduras matam, sob a luz do dia - e tudo fica por isso mesmo.
Numa tarde de 28 de março de 1968, no centro do Rio de Janeiro, o jornalista Washington Novaes assistiu pela janela da redação da extinta revista Visão a uma estranha movimentação de soldados da PM nas vizinhanças do restaurante Calabouço. "Vi o momento em que um aspirante da PM se ajoelhou, fez pontaria com o fuzil e deu um tiro,"me contou, 43 anos depois, numa entrevista para meu livro A Mulher que era o General da Casa.
"Também vi o menino caindo", prosseguiu, referindo-se a Edson Luiz Lima Souto, executado de forma premeditada, desnecessária, numa cena que deu uma mensagem de violência e impunidade ao país - institucionalizada, oito meses depois, com a decretação do AI-5.
Um cidadão entre milhões, Washington Novaes jamais foi chamado a contar o que viu. Para ficar quieto, foi perseguido em dois IPMs. Enquanto isso, a máquina que massacrava cidadãos seguia seus
movimentos de réptil gigantesco, pelo país inteiro.
Passados 51 anos, a morte de Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes aguarda os esclarecimentos necessários um país onde a democracia retorna a encruzilhada.
Graças a um cordão sanitário que protege os dois operadores de campo que consumaram o crime, seu silêncio está garantido sob segurança máxima. Proteger essa conexão é alimentar a maior ameaça enfrentada por nossa democracia.
Nós sabemos disso.
Eles também sabem.
Alguma dúvida?
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