sexta-feira, 18 de março de 2022

Medo da cadeia tornou Bolsonaro competitivo

Charge: Junião
Por Luís Costa Pinto, no site Brasil-247:

A eleição presidencial de 2022 segue sendo um pleito com chances reais de ser resolvida em turno único, no dia 2 de outubro, num cenário que já podia se vislumbrar há três meses.

Quem se dispusesse a contemplar com mais profundidade a ruína socioeconômica brasileira, até ali submersa nas águas turvas da pandemia, conseguia divisar no horizonte um único líder capaz de galvanizar forças políticas diversas e dirigi-las no sentido de uma união pela reconstrução nacional.

Era Lula, claro, e ele estava só na estrada.

Naquele momento, fim da 1ª quinzena de dezembro, contavam-se os dias para secar a tinta da caneta com as quais Jair Bolsonaro assinava os empenhos às emendas orçamentárias designadas para tal, ardilosa e diligentemente, pelo presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, e pelo ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira.

Se as regras valessem para todos, a partir de 2 de janeiro de 2022, 1º dia útil do ano eleitoral, o presidente da República candidato à reeleição deveria se submeter a todo o aparato legal destinado a estabelecer freios e contrapesos ao poder imperial que chefes de Executivo sempre gostam de ter – sobretudo os autocratas de fancaria como Bolsonaro.

Entretanto, como o Brasil não é uma Nação fácil de explicar para quem se apega a regras pré-estabelecidas, a contratos sociais inabaláveis ou a disputas eleitorais democráticas e isonômicas, estamos aqui para advertir: num consórcio de ilegalidades, o Palácio do Planalto, tendo à frente Bolsonaro e Ciro Nogueira e o Congresso Nacional, com atuação ativa de Arthur Lira e a passividade irritante de Rodrigo Pacheco, tratam de mudar leis e dispositivos em escala industrial a fim de adaptarem as regras jurídicas à necessidade do governo e do presidente de seguirem assaltando o Orçamento da União.

Quebram os limites prudenciais da administração fiscal a fim de produzirem diariamente novas possibilidades de gastos públicos cujo objetivo final é irrigar com intenções de votos Jair Bolsonaro e sua chapa reeleitoral.

Como a empreitada de assaltar o erário e derrubar as imposições vem obtendo sucessos nunca antes vistos na História deste país, o Jair Bolsonaro minguante e isolado de dezembro do ano passado não existe mais.

O incumbente, como os cientistas-políticos gostam de chamar governantes candidatos à reeleição, abriu o ano eleitoral tonificado pelo auxílio emergencial de R$ 400,00 que cuidou de pôr no lugar do estruturado Bolsa Família, confiscando o nome do programa consolidado nos governos do PT; pela aprovação do Projeto-de-lei 4059/2021 na Câmara (aguardando votação no Senado) que pôs por terra o limite legal de gastos com publicidade de governo em anos eleitorais, um escândalo sem eco na mídia tradicional porque serve para pagar as contas da empresas e empresários vinculados a ela e ainda pelo mais recente pacote de R$ 150 bilhões de benefícios que vão desde o saque de R$ 1.000,00 de 38 milhões de contas ativas do FGTS e da antecipação do 13º salário de aposentados e pensionistas do INSS para já, até a concessão de crédito de R$ 3.000,00 a microempreendedores individuais (MEIs) sem necessidade de submissão dos pedidos de empréstimos à malha fina que divide bons e maus devedores.

A tudo isso, somar-se-á, ainda, o fundo de intervenção no preço do combustível que o governo vai constituir com o “colchão tributário” descrito pelo ministro das Minas e Energia, Bento Albuquerque, sob o argumento de reagir à alta do preço internacional do petróleo em razão da guerra detonada com a invasão da Ucrânia pela Rússia. Com o beneplácito da oposição, do Judiciário e da Corte de Contas, debaixo de um vergonhoso manto de silêncio dos operadores do mercado financeiro, durante a campanha eleitoral, o Planalto intervirá nos preços da gasolina e do diesel com o argumento da guerra para esconder a gigantesca incompetência gerencial e administrativa que demonstrou ter em todos os atos – todos os atos – que deveriam ser “de governo” e nos últimos três anos não deixam dúvidas: temos um não-governo.

As chances de reeleição de Bolsonaro são reais, e nos levam a uma encruzilhada trágica

Pelo exposto nos dois parágrafos imediatamente anteriores, e porque exceto o ex-presidente Lula, que saiu da injusta e ilegal prisão em Curitiba (assentada em sentenças viciadas prolatadas pelo ex-juiz parcial e investigado por corrupção Sérgio Moro), ninguém mais tem chances eleitorais reais de segurar Bolsonaro, a criatura mais vil e perversa que já envergou a faixa presidencial tem chances reais de se reeleger. E esta constatação é apavorante.

Desqualificado, ignorante, dono de uma personalidade abjeta e desprovido da mais ínfima e risível qualidade que se espera numa liderança política (ou mesmo num ser humano digno de tal definição), Jair Bolsonaro apoderou-se da Presidência da República com a legitimidade que as urnas de 2018 conferiram ao discurso de destruição que ele entabulou. Sequer precisou dizer o que faria. Era, tão somente, a encarnação do “anti-PT”, do “anti-Lula”.

Foi dessa forma que Bolsonaro surfou aquela onda nefasta do tsunami produzido pelas erupções vulcânicas da Lava Jato.

Instalado no Planalto, descobertas as rachadinhas salariais adotadas pelo clã em todos os gabinetes públicos usados pelo presidente e por seus filhos, emersas as redes de conspirações antidemocráticas que uniam o bolsonarismo a movimentos extremistas cujo fim sempre foi revogar a Constituição de 1988 e direitos e garantias individuais de quem lhes faz oposição, Jair Bolsonaro esteve no 7 de Setembro de 2021 ao mesmo tempo próximo de sacramentar um golpe de Estado e da cadeia por traição à Constituição.

A reação institucional liderada pelo Supremo Tribunal Federal foi corajosa ante a real ameaça golpista.

Porém, houve covardia ao ser a interrompida a sequência de atos legais que deveriam ter sido detonados para impor a Bolsonaro o único castigo pertinente a traidores da Constituição e da República: a queda, a prisão provisória destinada a cortar-lhe os vasos comunicantes com os co-conspiradores e o julgamento.

O ex-presidente Lula rascunha como um esteta da política o amplo arco de alianças que vai apoiar a chapa que ele formará com o ex-governador Geraldo Alckmin, agora no PSB, na disputa presidencial. Lula e Alckmin são os favoritos a vencer um pleito que caminha para ser decidido em 1º turno. A eleição presidencial deste ano caminha, sim, para uma solução em 2 de outubro.

Entretanto, pela esqualidez de “terceiras-vias” que jamais puderam ser levadas a sério e porque o incumbente Jair Bolsonaro soube usar como nenhum outro presidente candidato à reeleição as brechas deixadas pelas instituições para o cometimento de ilegalidades eleitoralmente oportunas, não é ilação despropositada especular a chance de ver o traste que exerce a Presidência reeleito – e já em 1º turno.

A margem da estrada que nos conduz a essa encruzilhada trágica de nossa História é muito estreita e não permitirá manobras desagregadoras.

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