Por Marcos Coimbra, na revista CartaCapital:
Ninguém nunca esperou muito do Conselho. Primeiro, por ter sido composto, quase que exclusivamente, por burocratas do governo federal, da Abin, dos ministérios, do Exército e do próprio TSE, nenhum dos quais conhecido por sua competência na área. Apenas três dos integrantes tinham perfil técnico. Segundo, por ter ficado sob a batuta de Luiz Fux, presidente do TSE até agosto de 2018, ministro notável por sua tonitruância verbal e inoperância substantiva. Era previsível que não passasse de bravata a declaração de que “eleições influenciadas por fake news podem ser anuladas”, como chegou a dizer o impagável Fux.
Ao que parece, a última reunião do Conselho aconteceu no início de junho, quando foi decidido que tudo que havia sido tratado até então estava classificado como “reservado”. Por isso, nem sequer sabemos se ainda funciona, embora se desconfie que não. Do período em que atuou, vazaram algumas notícias. A mais cômica veio da reunião de janeiro de 2018, para a qual foram convidados representantes do Facebook, WhatsApp, Google e Twitter. Nela, os conselheiros ouviram promessas para boi dormir, como a do WhatsApp, de que podiam todos ficar tranquilos, pois a empresa havia implantado “uma ferramenta que impossibilitava o envio em larga escala de mensagens provenientes de uma mesma origem”. Como vimos depois, era uma piada.
O que esse Conselho discutiu, o que ouviu, que medidas tomou? Por que o acesso da sociedade às atas de suas reuniões foi proibido? Por que só daqui a cinco anos, depois que houver terminado o período de governo do capitão Bolsonaro, o conteúdo estará franqueado?No começo de 2018, a ideia de combater as fake news na eleição brasileira fazia sentido, em plena efervescência do escândalo da atuação do Facebook e da Cambridge Analytica na eleição de Trump. Não faz nenhum sentido, no entanto, que a atuação do Conselho fosse interrompida em junho, a três meses da eleição, quando o bom senso sugeria que era mais necessária. Pior, interrompida e com suas atas guardadas a sete chaves, por cinco anos.
Em uma época de ataques à democracia e às regras da convivência civilizada, o Tribunal Superior Eleitoral acaba de cometer outra barbaridade. O Judiciário, através de uma das mais altas cortes, volta a decepcionar. A renovação da decisão de manter sob sigilo, até 2023, as atas das reuniões do Conselho Consultivo sobre internet e eleições é um despropósito. Sua única função é impedir que a sociedade brasileira conheça o que esse Conselho, criado para sugerir medidas que coibissem a disseminação de fake news e o uso de robôs na eleição de 2018, discutiu e apurou ao longo do processo que culminou na suspeitíssima vitória de Bolsonaro.
Ninguém nunca esperou muito do Conselho. Primeiro, por ter sido composto, quase que exclusivamente, por burocratas do governo federal, da Abin, dos ministérios, do Exército e do próprio TSE, nenhum dos quais conhecido por sua competência na área. Apenas três dos integrantes tinham perfil técnico. Segundo, por ter ficado sob a batuta de Luiz Fux, presidente do TSE até agosto de 2018, ministro notável por sua tonitruância verbal e inoperância substantiva. Era previsível que não passasse de bravata a declaração de que “eleições influenciadas por fake news podem ser anuladas”, como chegou a dizer o impagável Fux.
Ao que parece, a última reunião do Conselho aconteceu no início de junho, quando foi decidido que tudo que havia sido tratado até então estava classificado como “reservado”. Por isso, nem sequer sabemos se ainda funciona, embora se desconfie que não. Do período em que atuou, vazaram algumas notícias. A mais cômica veio da reunião de janeiro de 2018, para a qual foram convidados representantes do Facebook, WhatsApp, Google e Twitter. Nela, os conselheiros ouviram promessas para boi dormir, como a do WhatsApp, de que podiam todos ficar tranquilos, pois a empresa havia implantado “uma ferramenta que impossibilitava o envio em larga escala de mensagens provenientes de uma mesma origem”. Como vimos depois, era uma piada.
O que esse Conselho discutiu, o que ouviu, que medidas tomou? Por que o acesso da sociedade às atas de suas reuniões foi proibido? Por que só daqui a cinco anos, depois que houver terminado o período de governo do capitão Bolsonaro, o conteúdo estará franqueado?No começo de 2018, a ideia de combater as fake news na eleição brasileira fazia sentido, em plena efervescência do escândalo da atuação do Facebook e da Cambridge Analytica na eleição de Trump. Não faz nenhum sentido, no entanto, que a atuação do Conselho fosse interrompida em junho, a três meses da eleição, quando o bom senso sugeria que era mais necessária. Pior, interrompida e com suas atas guardadas a sete chaves, por cinco anos.
A performance de Bolsonaro e de seu governo é tão ridícula, sua perspectiva de sucesso tão improvável, que a discussão a respeito de como chegou ao cargo perdeu espaço. Diante de um presente e de um futuro medíocres, o passado tornou-se menos relevante.
Há indícios abundantes de que o capitão se beneficiou do uso intenso e ilegal de fake news na campanha. Desde o primeiro turno, eles se multiplicam, na forma de denúncias, depoimentos, reportagens, estudos acadêmicos e técnicos, conduzidos dentro e fora das universidades. As pesquisas de intenção de voto realizadas no período também oferecem pistas da manipulação que atingiu parte expressiva da população. Bolsonaro foi eleito jogando sujo, abusando do direito de criticar seu adversário e de fabricar rejeição a ele. Sem as mentiras que inventou, maciçamente impulsionadas através do WhatsApp mediante investimentos milionários, é provável que não tivesse vencido.
Depois do que aconteceu em muitas eleições mundo afora, depois do que sabemos hoje da indiferença dos grandes provedores em elucidar suspeitas como essas a fim de proteger seus lucros, a decisão da Justiça é absurda. A sociedade tem o direito de saber logo o que aconteceu na eleição e somente a ela pode recorrer. Bolsonaro e turma, no controle do Executivo e contando com a cumplicidade de seu preposto no Ministério da Justiça, não vão fazer nada. No Legislativo, o grupo majoritário no Congresso não tem interesse em mexer uma palha. O lastimável é que quem esperava algo do Judiciário viu o que seus integrantes pretendem fazer. O segredo que impuseram revela o estofo moral de que são feitos e os acordos em que estão enredados.
Há indícios abundantes de que o capitão se beneficiou do uso intenso e ilegal de fake news na campanha. Desde o primeiro turno, eles se multiplicam, na forma de denúncias, depoimentos, reportagens, estudos acadêmicos e técnicos, conduzidos dentro e fora das universidades. As pesquisas de intenção de voto realizadas no período também oferecem pistas da manipulação que atingiu parte expressiva da população. Bolsonaro foi eleito jogando sujo, abusando do direito de criticar seu adversário e de fabricar rejeição a ele. Sem as mentiras que inventou, maciçamente impulsionadas através do WhatsApp mediante investimentos milionários, é provável que não tivesse vencido.
Depois do que aconteceu em muitas eleições mundo afora, depois do que sabemos hoje da indiferença dos grandes provedores em elucidar suspeitas como essas a fim de proteger seus lucros, a decisão da Justiça é absurda. A sociedade tem o direito de saber logo o que aconteceu na eleição e somente a ela pode recorrer. Bolsonaro e turma, no controle do Executivo e contando com a cumplicidade de seu preposto no Ministério da Justiça, não vão fazer nada. No Legislativo, o grupo majoritário no Congresso não tem interesse em mexer uma palha. O lastimável é que quem esperava algo do Judiciário viu o que seus integrantes pretendem fazer. O segredo que impuseram revela o estofo moral de que são feitos e os acordos em que estão enredados.
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