Por Breno Altman, em seu blog:
Os violentos ataques militares de Israel contra civis palestinos, na cerca divisória da Faixa de Gaza, com dezenas de mortos e centenas de feridos, em manifestações pacíficas, são apenas o retrato mais recente de um processo nefasto desde o seu nascedouro.
O sionismo, fonte ideológica do Estado de Israel, forjado por Theodore Herzl e seus seguidores no final do século XIX, desde a pia batismal carregava os genes das teratologias praticadas por Benjamin Netanyahu.
Essa doutrina apresentava-se, nos primórdios, como expressão politico-cultural da legitima reivindicação do povo judeu à emancipação e à construção de sua própria nação, em resposta a séculos de expropriação e perseguição. A mensagem, ao menos no início, parecia resplandecer como libertária e democrática, arrastando vastos contingentes judaicos que estavam integrados a correntes socialistas nos países adotivos de seus ancestrais.
Ao contrário de outros movimentos de libertação nacional, empenhados em expulsar invasores de fronteiras que não lhes pertenciam, contudo, a concretização da empreitada sionista na Palestina representou, desde o início, um sonho de independência às custas da colonização de outra etnia, os árabes, que há muito tinham repovoado a região.
Não é à toa que o sionismo, inicialmente laico, se funde com ramos religiosos para criar uma narrativa de direito histórico à Terra Prometida, remontando-o à trajetória dos tempos bíblicos.
A teoria de Herzl, assim, sempre se assentou sobre uma contradição fatal, que acabaria por expurgar seus valores mais humanistas: a soberania de um povo através da submissão de outro povo somente poderia redundar em opressão, violência e guerra.
A criação do Estado de Israel, em 1948, impulsionada pelo Holocausto, refletiu a enorme autoridade moral das ideias sionistas. Lideranças e intelectuais árabes, atormentados com o isolamento do pós-guerra, muitas vezes abraçaram o antissemitismo e a negação do genocídio judaico, facilitando ainda mais a estratégia de seus inimigos.
A partilha aprovada pelas Nações Unidas em 1947, dividindo a área em litígio entre duas pátrias, acabou por ser rechaçada pelos grupos palestinos e países árabes. Desorganizados, desunidos e mal-armados, provocaram espiral bélica cujo resultado foi a expansão territorial de Israel.
A ameaça externa, desde então, passou a configurar novo álibi para o colonialismo sionista, levando a guerras ilegais de anexação que abalaram a hipótese de um Estado palestino. Aliado aos Estados Unidos a partir do início dos anos 50, Israel logo se transformou em um dos países militarmente mais poderosos do mundo, além de ganhar proteção no Conselho de Segurança da ONU para violar resoluções internacionais em seu desfavor.
Essa dinâmica também afetou as estruturas de Israel, cada vez mais assemelhado a um híbrido sistema de castas. Para a maioria dos judeus, um país moderno, democrático e relativamente justo. Para os árabes-israelenses, que constituem 20% da população interna, um regime segregacionista e cidadania de segunda classe. Para os árabes-palestinos, que vivem nos territórios ocupados depois da Guerra de 1967, um apartheid brutal e implacável.
No final de abril, o governo Netanyahu conseguiu aprovar no parlamento, na primeira de três votações necessárias, nova lei básica, com poderes constitucionais. Por esse novo estatuto, o árabe deixa de ser a segunda língua oficial, bairros exclusivamente de judeus são legalizados, as leis religiosas passam a orientar a Justiça e Israel torna-se oficialmente identificado como uma nação judaica.
São passos firmes, em marcha batida, para um Estado teocrático, racista e colonial, chocando o ovo da serpente fertilizado há mais de cem anos.
* Breno Altman é jornalista e fundador do site Opera Mundi. Este artigo foi originalmente publicado na Folha de S.Paulo, em 14 de maio de 2018, na página 3.
O sionismo, fonte ideológica do Estado de Israel, forjado por Theodore Herzl e seus seguidores no final do século XIX, desde a pia batismal carregava os genes das teratologias praticadas por Benjamin Netanyahu.
Essa doutrina apresentava-se, nos primórdios, como expressão politico-cultural da legitima reivindicação do povo judeu à emancipação e à construção de sua própria nação, em resposta a séculos de expropriação e perseguição. A mensagem, ao menos no início, parecia resplandecer como libertária e democrática, arrastando vastos contingentes judaicos que estavam integrados a correntes socialistas nos países adotivos de seus ancestrais.
Ao contrário de outros movimentos de libertação nacional, empenhados em expulsar invasores de fronteiras que não lhes pertenciam, contudo, a concretização da empreitada sionista na Palestina representou, desde o início, um sonho de independência às custas da colonização de outra etnia, os árabes, que há muito tinham repovoado a região.
Não é à toa que o sionismo, inicialmente laico, se funde com ramos religiosos para criar uma narrativa de direito histórico à Terra Prometida, remontando-o à trajetória dos tempos bíblicos.
A teoria de Herzl, assim, sempre se assentou sobre uma contradição fatal, que acabaria por expurgar seus valores mais humanistas: a soberania de um povo através da submissão de outro povo somente poderia redundar em opressão, violência e guerra.
A criação do Estado de Israel, em 1948, impulsionada pelo Holocausto, refletiu a enorme autoridade moral das ideias sionistas. Lideranças e intelectuais árabes, atormentados com o isolamento do pós-guerra, muitas vezes abraçaram o antissemitismo e a negação do genocídio judaico, facilitando ainda mais a estratégia de seus inimigos.
A partilha aprovada pelas Nações Unidas em 1947, dividindo a área em litígio entre duas pátrias, acabou por ser rechaçada pelos grupos palestinos e países árabes. Desorganizados, desunidos e mal-armados, provocaram espiral bélica cujo resultado foi a expansão territorial de Israel.
A ameaça externa, desde então, passou a configurar novo álibi para o colonialismo sionista, levando a guerras ilegais de anexação que abalaram a hipótese de um Estado palestino. Aliado aos Estados Unidos a partir do início dos anos 50, Israel logo se transformou em um dos países militarmente mais poderosos do mundo, além de ganhar proteção no Conselho de Segurança da ONU para violar resoluções internacionais em seu desfavor.
Essa dinâmica também afetou as estruturas de Israel, cada vez mais assemelhado a um híbrido sistema de castas. Para a maioria dos judeus, um país moderno, democrático e relativamente justo. Para os árabes-israelenses, que constituem 20% da população interna, um regime segregacionista e cidadania de segunda classe. Para os árabes-palestinos, que vivem nos territórios ocupados depois da Guerra de 1967, um apartheid brutal e implacável.
No final de abril, o governo Netanyahu conseguiu aprovar no parlamento, na primeira de três votações necessárias, nova lei básica, com poderes constitucionais. Por esse novo estatuto, o árabe deixa de ser a segunda língua oficial, bairros exclusivamente de judeus são legalizados, as leis religiosas passam a orientar a Justiça e Israel torna-se oficialmente identificado como uma nação judaica.
São passos firmes, em marcha batida, para um Estado teocrático, racista e colonial, chocando o ovo da serpente fertilizado há mais de cem anos.
* Breno Altman é jornalista e fundador do site Opera Mundi. Este artigo foi originalmente publicado na Folha de S.Paulo, em 14 de maio de 2018, na página 3.
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